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MOBILIZAÇÕES SOCIAIS NO AMBIENTE DIGITAL

Desde o surgimento da Internet e suas inúmeras aplicabilidades até os dias atuais, muitas ferramentas foram descobertas, redescobertas, rejeitadas, criadas e recriadas. As interações sociais que aconteciam no espaço offline ganharam um espaço novo e repleto de novas possibilidades. Se pudermos utilizar uma expressão que contemple essas novas ferramentas e as interações sociais no espaço on-line, poderia ser “novas possibilidades”, principalmente nas relações sociais que são constituídos pelas interações sociais e troca de informações. Raquel Recuero (2009) fala que não há hierarquia nessas relações sociais, pois o objetivo é facilitar o processo de disseminação e compartilhamento de conteúdo. As transformações vindas juntamente com a modernidade, trazem com elas uma perspectiva nova em relação às práticas do cotidiano.

Essas novas formas de sociabilidade, as novas tecnologias, a internet, o ciberespaço e as redes sociais se tornam objetos de estudo cada vez mais frequentes, aonde os comunicadores, antropólogos e cientistas sociais buscam estudar as novas formas de interação social e suas influências na sociedade atual, a partir de interesses em comum e relações estabelecidas no espaço virtual, da representação do eu pelo outro.

As práticas comunicacionais que estão acontecendo no ciberespaço, nos trazem diversas facilidades e novas leituras em relação à discussão de questões sociais que por muitos anos não eram pautadas dentro da mídia tradicional, como vimos no capítulo anterior. Para André Lemos (2003) “não se trata mais uma vez, de substituição de formas estabelecidas de relação social (face a face, telefone, correio, espaço público físico), mas do surgimento de

novas relações mediadas” 34, enquanto Levy (1999, p. 17) afirma que a cibercultura é “um conjunto de técnicas (materiais e intelectuais), de práticas, de atitudes, de modos de pensamento e de valores que se desenvolvem juntamente com o crescimento do ciberespaço” e tem como valor a universalidade, a tentativa da mídia de realizar interligações entre as informações, as máquinas e os homens, enquanto o ciberespaço “não especifica apenas a infraestrutura material da comunicação digital, mas também o universo oceânico de informações que ela abriga, assim como os seres humanos que navegam e alimentam esse universo” (LEVY, 1999, p. 16). A mídia deve ser pensada como um processo de mediação aonde os significados são produzidos, oferecidos ou transformados, num mundo cada vez mais baseado numa ideologia de direito do indivíduo do consumo, é possível ouvir diversas vozes buscando legitimidade em seus anseios (SILVERSTONE, 2002).

A noção de redes sociais busca apoiar “a análise e descrição daqueles processos sociais que envolvem conexões que transpassam os limites de grupos e categorias” (BARNES, 1987, p. 163). Uma rede social é composta por um conjunto de dois elementos: os atores sociais (pessoas, instituições ou grupos) e suas conexões, chamadas de laços sociais. No ciberespaço não são os atores sociais que atuam, mas suas representações. As redes sociais por fim são constituídas de atores sociais virtuais, que representam e expressam suas individualidades no espaço de interação.

[...] entender como os atores constroem esses espaços de expressão é também essencial para compreender como as conexões são estabelecidas. É através dessas percepções que são construídas pelos atores que padrões de conexões são gerados (RECUERO, 2009, p. 27).

Novas práticas sociais surgem através dessa interação nas redes sociais, a produção e divulgação de conteúdos são resultados desta interação como, por exemplo, o compartilhamento de fotos, vídeos e textos. Os sujeitos sociais são fundamentais no entendimento dos fatores e das formas de apropriação e (re)significação de sentidos que frequentam a pluralidade dos discursos contemporâneos (MARTÍN-BARBERO, 2003).

34 LEMOS, André; CUNHA, Paulo (orgs). Cibercultura. Alguns Pontos para compreender a nossa época. In:____. Olhares sobre a Cibercultura. Porto Alegre: Sulina, 2003, p.11-23. Disponível em: <https://www.researchgate.net/publication/237248286_cibercultura_alguns_pontos_para_compreender_a_nossa _epoca>. Acesso em: 03 mar. 2019.

Em nossa sociedade, o espaço público dos movimentos sociais é construído como um espaço híbrido entre as redes sociais da internet e o espaço urbano ocupado: conectando o ciberespaço com o espaço urbano numa interação implacável e constituindo, tecnológica e culturalmente, comunidades instantâneas de prática transformadora (CASTELLS, 2013, p. 20).

Acerca dos movimentos sociais Castells (2013, p. 131) aponta que “as redes sociais digitais baseadas na internet e nas plataformas sem fio são ferramentas decisivas para mobilizar, organizar, deliberar, coordenar e decidir”. Para o autor os movimentos sociais surgem a partir de conflitos específicos na sociedade, resultantes de revoltas de determinadas experiências e vivências. Para o autor a utilização das redes sociais nesse processo de mobilização, acaba inspirando outros movimentos, mesmo sendo em contexto social diferente. Para ele “ver e ouvir protestos em outro lugar” (CASTELLS, 2013, p. 131) pode instigar e inspirar o surgimento de novas mobilizações em detrimento de insatisfações que até então não haviam sido problematizadas.

Os movimentos são simultaneamente locais e globais. Começam em contextos específicos, por motivos próprios, constituem suas próprias redes e constroem seu espaço público ao ocupar o espaço urbano e se conectar as redes da internet. Mas também são globais, pois estão conectados com o mundo inteiro, aprendem com outras experiências e, de fato, muitas vezes são estimulados por essas experiências a se envolver em sua própria mobilização (CASTELLS, 2013, p. 130).

A urgência de uma discussão que traz em seus tópicos centrais as questões identitárias que englobem raça, gênero e classe, por exemplo, encontrou na utilização das redes sociais um espaço que talvez pudesse revolucionar as novas formas de ativismo. Essas novas possibilidades de mobilização por intermédio do ambiente digital é denominada como ciberativismo, uma estratégia para “formar coalizões temporais de pessoas” (UGARTE, 2008, p. 81) que ao utilizarem do ambiente digital acabam por gerar debates que podem desencadear em transformações sociais (UGARTE, 2008).

Partindo desse ponto de redes sociais como um meio de interação e aproximação de pessoas movidas por interesses em comum, diversas pautas são discutidas em rede, as temáticas negras são algumas delas. Questões como racismo são expostas e discutidas por pessoas negras que passam por determinadas situações e relatam nas redes suas experiências. Enquanto grupos e coletivos a partir do desconforto e indignação pelos motivos citados por

Castells criam em fóruns, grupos ou páginas um local de interação, algumas vezes para promover a deliberação de medidas de combate ao racismo.

As redes sociais se tornaram ferramentas potentes para organizar e articular as práticas vivenciadas pelos atores sociais no meio online, construindo novas narrativas e novas formas de pertencimento, buscando “satisfação de seus desejos e necessidades econômicas, sociais, políticas e principalmente culturais” (LINHARES, 2006, p. 161). As novas tecnologias e principalmente o uso das redes sociais trariam alterações nas novas formas de reivindicação. O entendimento de um novo momento na história, que agora coloca como centro as identidades dos sujeitos, é de fundamental importância para compreender os próximos passos.