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Em diferentes sistemas reais, podemos observar que a semelhan¸ca entre seus compo- nentes ´e um forte fator para que estes estabele¸cam liga¸c˜oes. ´E f´acil percebermos isto em nosso cotidiano, pois as pessoas tendem a se aproximar mais facilmente se entre elas existir algum tipo de afinidade. Por exemplo, pessoas que estudam em uma mesma escola, que fazem um esporte em comum, que compartilham da mesma f´e, que gostam de um mesmo cantor ou escritor, que torcem por um mesmo time de futebol ou que compartilham da mesma opini˜ao pol´ıtica, s˜ao mais prov´aveis de estabelecerem rela¸c˜oes. Isto tamb´em ´e not´avel nas atuais tecno- logias de relacionamentos (Facebook, Twitter, YouTube, WhatsApp...), onde as pessoas tˆem uma preferˆencia de se conectarem com outras pessoas que tenham algo em comum. Exemplo disto, s˜ao as comunidades formadas por pessoas que compartilham uma mesma opini˜ao sobre algo, que sejam a favor de uma mesma causa ou que tenham valores e objetivos em comum. Poder´ıamos continuar citando diversos exemplos sobre como os v´ınculos entre compo- nentes de um mesmo sistema s˜ao influenciados pela semelhan¸ca entre estes, dado o enorme alcance dessas situa¸c˜oes. Observando esse comportamento, Almeida M.L. et al propuseram

um modelo chamado “Modelo de Afinidade”, o qual gera redes sem escala t´ıpica a partir da inclus˜ao de um parˆametro na liga¸c˜ao preferencial do modelo de Bianconi-Barab´asi [23]. Este parˆametro considera a semelhan¸ca existente entre os v´ertices de uma rede, buscando descrever melhor as situa¸c˜oes existentes em sistemas reais. A propriedade associada com as intera¸c˜oes (preferencialmente) entre v´ertices semelhantes ´e chamada afinidade ou homofilia.

Neste modelo, a afinidade ´e representada pela proximidade entre as qualidades dos v´ertices. Ou seja, quanto mais pr´oximos sejam os valores das qualidades η de dois v´ertices quaisquer da rede, maior ser´a a probabilidade que estes estabele¸cam liga¸c˜oes. Portanto, essa afinidade resulta de uma mudan¸ca na regra da liga¸c˜ao preferencial do modelo de Bianconi- Barab´asi. Matematicamente, a afinidade ´e dada em termos do m´odulo da diferen¸ca existente entre as qualidade dos v´ertices, ou seja, Aij = |ηi − ηj|, com ηi representando as qualidades

dos v´ertices j´a existentes na rede e ηj representando a qualidade do v´ertice que est´a entrando

na rede. Pode-se perceber que neste modelo a liga¸c˜ao preferencial previlegia liga¸c˜oes entre v´ertices que possuem alta afinidade e alta conectividade (ver figura 3.17). A seguir est´a a listagem do algoritmo para constru¸c˜ao de uma rede do modelo de afinidade.

(1) Inicia-se a rede com N0 v´ertices conectados entre si, onde cada um deles possui um

parˆametro de qualidade ηi. Este parˆametro ´e escolhido aleatoriamente, respeitando uma

distribui¸c˜ao de qualidade uniforme no intervalo entre 0 e 1.

(2) A cada passo de tempo adiciona-se um novo v´ertice j `a rede, o qual possui o seu parˆametro de qualidade ηj. Este v´ertice possui um n´umero m´ınimo M0(< N0) de arestas, que co-

nectam o novo v´ertice a M0 v´ertices diferentes pr´e-existentes na rede. A probabilidade de

um v´ertice pr´e-existente i receber a liga¸c˜ao do v´ertice rec´em adicionado j ´e proporcional `

a conectividade ki e a afinidade entre o v´ertice j e o v´ertice i pr´e-existente na rede,

portanto, sendo dada por:

Y

i

= P[1 − (Aij)]ki

j[1 − (Aij)]kj

(3.33)

(3) Repete-se o passo anterior at´e o tamanho desejado do sistema. Depois de t passos de tempo este procedimento resulta em uma rede com N = N0 + t v´ertices e M0(M0 +

1)/2 + M0t liga¸c˜oes.

Atrav´es de simula¸c˜oes computacionais realizadas para este modelo podemos obter informa¸c˜oes sobre a topologia e a dinˆamica da rede. Almeida M.L. et al mostraram que a distribui¸c˜ao de conectividade segue uma lei de potˆencia P (k) ∼ k−γ com γ = 2.84 (ver figura 3.18). Note que o valor encontrado ´e maior do que o do modelo de Bianconi-Barab´asi (γ = 2.25) e menor do que o do modelo de Barab´asi e Albert (γ = 3). Podemos compreender esse resultado, observando os v´ertices mais conectados destas redes. Os polos da rede de BA correspondem somente aos primeiros v´ertices adicionados `a rede e isso se reflete na lei (equa¸c˜ao 3.6) que dita o crescimento da conectividade para esse modelo, a qual depende apenas do

Figura 3.17: Ilustra¸c˜ao da dinˆamica de crescimento de uma rede seguindo o modelo de afinidade com M0 = 1. No centro de cada v´ertice est´a indicado o seu parˆametro de qualidade η. Em

t = 0, inicia-se a rede com N0 v´ertices e a cada passo de tempo, adiciona-se um novo v´ertice

(vermelho), o qual podemos observar que ter´a preferˆencia de se conectar com aqueles que possuem alta afinidade e alta conectividade. Figura adaptada de [24].

momento (tempo) no qual cada v´ertice foi inclu´ıdo na rede. Por outro lado, no modelo de Bianconi-Barab´asi, os v´ertices com maior chance de se tornarem polos da rede s˜ao aqueles inseridos nos est´agios iniciais da rede e que, al´em disso, possuem um alto valor para o parˆametro de qualidade η. Estes v´ertices s˜ao os respons´aveis pelo valor do expoente da distribui¸c˜ao de conectividade deste modelo. Os polos existentes nessa rede s˜ao resultados de uma nova dinˆamica, a qual permite que v´ertices adicionados `a rede muito depois de seus est´agios iniciais possam se tornar mais atrativos para ganhar as pr´oximas liga¸c˜oes do que os v´ertices mais antigos. Isso ´e traduzido na lei (equa¸c˜ao 3.15) que dita o crescimento da conectividade, pois esta lei depende tanto do momento em que o v´ertice foi adicionado `a rede quanto da qualidade do v´ertice. Essas caracter´ısticas est˜ao expressas na evolu¸c˜ao temporal da conectividade dos v´ertices do modelo de afinidade, a qual segue uma lei de potˆencia k ∝ (t/t0)β. A princ´ıpio,

no caso do modelo de afinidade, esse expoente deveria ser fun¸c˜ao da afinidade entre o v´ertice que est´a na rede e o v´ertice que est´a sendo adicionado. Por´em, os resultados das simula¸c˜oes (ver figura 3.19(a)) mostram que β depende apenas da qualidade do v´ertice que est´a na rede recebendo as conex˜oes. Para o modelo de afinidade, o fato de um v´ertice se tornar um polo depende mais do momento em que ele foi adicionado `a rede do que do seu parˆametro de qualidade (η). Como a probabilidade de um v´ertice j´a existente na rede ganhar a conex˜ao de um novo v´ertice depende da diferen¸ca entre as qualidades dos dois, isto significa que o v´ertice com maior qualidade n˜ao ´e mais atrativo do que o v´ertice de menor qualidade, se ambos tˆem mesma conectividade. Portanto, os polos do modelo de afinidade tendem a se parecer mais com os polos do modelo BA do que com os polos do modelo de Bianconi.

´

E importante notar que devido `a qualidade dos v´ertices serem obtidas a partir de uma distribu¸c˜ao de qualidade uniforme no intervalo [0,1], todos os valores das qualidades possuem probabilidades iguais de serem sorteados. Entretanto, v´ertices que possuem o valor do parˆametro de qualidade η ≈ 0.5 apresentam uma certa simetria em rela¸c˜ao aos demais valores de η, por terem afinidade com v´ertices tanto com η > 0.5 quanto η < 0.5. Em raz˜ao disso, os v´ertices com η ≈ 0.5 adquirem, em m´edia, mais conex˜oes, fazendo com que estes

Figura 3.18: Distribui¸c˜ao de conectividade para o modelo de afinidade. Simula¸c˜ao realizada para M0 = 1, N = 105 e 3000 amostras. Figura retirada de [24].

provavelmente se tornem polos da rede (ver figura 3.19(b)).

Almeida M.L. et al constataram que o modelo de afinidade apresenta o comportamento de mundo pequeno, pois sua distˆancia m´edia cresce proporcionalmente a log(N ). Entretanto, o valor da distˆancia m´edia ´e maior do que o encontrado para o modelo de Bianconi-Barab´asi (considerando redes com tamanhos iguais). Esse comportamento pode ser entendido ao lem- brarmos que nas redes de Bianconi-Barab´asi temos a presen¸ca de polos ainda mais conectados do que aqueles gerados pelo modelo de afinidade, os quais fazem com que o comprimento do caminho existente entre os v´ertices diminua. Outra propriedade estudada foi o coeficiente de agrega¸c˜ao da rede, sendo observado que este diminui lentamente com o aumento da rede, seguindo uma lei de potˆencia. Analogamente aos outros modelos citados antes, observou-se que a distˆancia m´edia diminui quando o valor de M0 aumenta, sendo isso uma consequˆencia

do surgimento de novos caminhos na rede. Observe que, enquanto a distˆancia m´edia diminui, o coeficiente de agrega¸c˜ao aumenta quando o valor de M0 cresce. Isso ocorre porque quanto

maior M0, mais vizinhos cada v´ertice tem, fazendo com que aumente a possibilidade de cami-

nhos mais curtos entre dois v´ertices quaisquer, ao mesmo tempo em que aumenta as chances dos vizinhos de um determinado v´ertice estarem conectados entre si (ver figura 3.20).

Ao longo desta se¸c˜ao, descrevemos as principais propriedades do modelo de afinidade e discutimos sua importˆancia para o estudo de redes em que os v´ertices tendem a se conectar devido `as suas semelhan¸cas. Estudos similares foram e continuam sendo propostos em outras ´areas, devido `a relevˆancia desse tipo de comportamento em sistemas reais. Por exemplo, na ´area da economia foi proposto um modelo (veja [31]) que levava em conta a afinidade em redes sociais.

Figura 3.19: (a) Comportamento da evolu¸c˜ao temporal da conectividade dos v´ertices para o modelo de afinidade. Pode-se observar que a inclina¸c˜ao cresce linearmente com η at´e η = 0.5. Ap´os este valor, a inclina¸c˜ao decresce. Simula¸c˜ao realizada para M0 = 1 e N = 105.(b)

Dependˆencia do expoente dinˆamico β(η) com o parˆametro de qualidade η. Mostrando que os v´ertices com η ≈ 0.5 tˆem mais chances de se tornarem polos (β ´e m´aximo). Simula¸c˜ao realizada para M0 = 1, N = 105 e 1000 amostras. Figura retirada de [24].

Figura 3.20: (a) Distˆancia m´edia versus o tamanho da rede para o modelo de afinidade. (b) Coeficiente de agrega¸c˜ao versus o tamanho da rede para o modelo de afinidade. Foram considerados diferentes valores de m = M0. Figura retirada de [24].