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VIÁRIA E SEUS EFEITOS

2.1.1.5 – MODELO DE ACIDENTES BASEADO NUM NÍVEL DE ACTIVIDADE CONSTANTE

B) MODELO BILATERAL DE ACIDENTES

No modelo bilateral o nível de cuidado adoptado tanto pelo ofensor como pela vítima afecta a probabilidade de que se produza um acidente, de modo que existem duas variáveis que são factores determinantes do custo social. No modelo unilateral as externalidades resultam apenas da actuação de uma parte51. Não obstante, a probabilidade de que se produza um acidente depende do nível de cuidado do condutor e das potenciais vítimas, peões ou outros condutores quando a colisão se produz entre dois ou mais veículos. Assim, em muitos casos as externalidades dos acidentes rodoviários têm uma causalidade dual52.

Neste modelo analisamos quatro regras de responsabilidade civil: (1) objectiva; (2) subjectiva; (3) objectiva com defesa da negligência do lesado; (4) negligência relativa.

51 Teoria Pigouviana. 52 Teoria de Ronald Coase.

Consideremos duas variáveis adicionais:

v : o nível de cuidado adoptado pela vítima (lesado).

P(x,y)D : os custos esperados do acidente, função do nível de cuidado desenvolvido pelas partes, dados x e v, pelo que a função social dos custos dos acidentes será,

Eq. n.º 2.1.1.5.4) L(x,y) = P(x,y) D + C(x) + B(v)

onde L’

x< 0, L’v< 0, L’’x> 0, L’’v>0 e L’xv>0.

As primeiras derivadas em relação aos níveis de cuidado do ofensor e do lesado, L’

x e L’v , são negativas, indicando que o nível de cuidado tem um efeito decrescente na probabilidade dos acidentes.

Sendo o objectivo a minimização dos custos sociais dos acidentes, os valores de x e v devem ser fi xados no ponto em que os custos marginais de cuidado equivalem aos benefícios marginais (refl ectidos na redução marginal dos custos esperados dos acidentes). Estes valores minimizam a Eq. n.º 2.1.1.5.4); em consequência, as condições de primeira ordem, que minimizam o custo social do acidente, o que implica um comportamento efi ciente em termos do nível de cuidado, são:

Eq. n.º 2.1.1.5.5) C´(x) + + P´ (x ,v) D = 0

com P’

x (x ,v) D <0, (segunda derivada negativa, refl ectindo que o aumento do nível de cuidado vai tendo um efeito decrescente na função dos custos totais dos acidentes).

Eq. n.º 2.1.1.5.6) B´(v)+

y(x, v )= 0 com P’’

y (x,v*) <0 (segunda derivada da equação dos custos totais negativa, refl ectindo que o aumento do nível de cuidado vai tendo um efeito decrescente na função dos custos totais dos acidentes). A equação 2.1.1.5.5) defi ne x (v), que representa uma situação em que o ofensor desenvolve um nível óptimo de cuidado, seja qual for o nível de cuidado escolhido pela vítima. Na Eq. nº 2.1.1.5.6), de modo similar, v (x) representa uma situação em que o lesado respeita o nível óptimo de cuidado sem ter em conta o nível de cuidado desenvolvido pelo ofensor.

1) No âmbito da responsabilidade civil pelo risco53 o condutor é responsável pelos danos que se verifi quem. A vítima escolherá o nível de cuidado v=0 sem ter em conta o nível de cuidado, x, escolhido pelo ofensor, dado que sempre será compensada pelos danos. O ofensor escolherá x (nível de cuidado óptimo), porque minimiza a equação n.º 2.1.1.5.5. O resultado não é socialmente efi ciente dado que o lesado tenderá a adoptar um nível de cuidado inferior ao óptimo, o que evidencia que o regime de responsabilidade civil objectiva estrita não é efi ciente.

2) Se for aplicável o regime de responsabilidade civil subjectiva – considerando que o nível de cuidado devido é igual ao nível óptimo de cuidado do ofensor, isto é, xd= x , – o causante será responsável se, e só se, actuar com negligência, se não desenvolve o nível de cuidado devido: x < xd. Este regime de responsabilidade civil subjectiva leva a que o potencial ofensor tenda a ter um comportamento efi ciente ao nível de cuidado (não ao nível da actividade). Por outro lado, este regime cria também incentivos para que o potencial lesado desenvolva um nível óptimo de cuidado, dado que terá em consideração que o potencial ofensor não será responsável pelos danos se a sua actuação não for negligente, ou seja, se tiver um nível de cuidado óptimo54.

Considerando que o nível de cuidado desenvolvido pela potencial vítima (v) é igual ao nível de cuidado óptimo (v*), v = v*, o objectivo do ofensor é minimizar os custos totais esperados do acidente, dados pela equação seguinte:

Eq. n.º 2.1.1.5.7) A(x)+ P(x,v ) D

53 O Código Civil português refere-se à responsabilidade por o risco no Artº 503º (Acidentes causados por veículos):

“1. Aquele que tiver a direcção efectiva de qualquer veículo de circulação terrestre e o utilizar em seu próprio interesse, ainda que por intermédio de comissário, responde pelos danos provenientes dos riscos próprios do veículo mesmo que este não se encontre em circulação.

2. As pessoas não imputáveis respondem nos termos do artigo 489º.

3. Aquele que conduzir o veículo por conta de outrem responde pelos danos que causar, salvo se provar que não houve culpa da sua parte; se, porém, o conduzir fora do exercício das suas funções comissário, responde nos temos do n.º 1. “

54 O nível de cuidado óptimo está ligado ao conceito jurídico de bom pai de família, previsto no artigo 487º/2, do Código Civil.

A solução desta equação é x (v ) = x . com x = x ; a vítima será responsável e assumirá os custos do acidente se actua de forma negligente (comportamento inefi ciente), pelo que tenderá a ter um comportamento que minimize os custos esperados do acidente, B(v) + P(x , v) D, o que acontecerá quando v (x ) = v . Deste modo, o resultado será efi ciente, em termos do nível de cuidado (não em termos do nível de actividade).

3) No caso da responsabilidade civil pelo risco, com defesa da negligencia do lesado e se o comportamento da vítima for negligente, isto é, se a vítima tiver desenvolvido um nível de cuidado inferior ao nível de cuidado devido, v < vd, o ofensor fi ca exonerado da responsabilidade civil. Considerando que o nível de cuidado desenvolvido pelo potencial ofensor é igual ao nível de cuidado devido e igual ao nível de cuidado óptimo, x = xd =x , o problema da potencial vítima é similar ao do ofensor no caso do modelo unilateral. De facto, a potencial vítima pode afastar a sua responsabilidade escolhendo o nível de cuidado devido, v = vd ; se v = vd = v*, os custos esperados dos acidentes [P(x , v) D] são minimizados, sendo efi ciente o comportamento da vítima. Se tiver um comportamento com um nível de cuidado inferior ao devido será considerada negligente, sendo responsável pelos custos (danos) do acidente55. Neste regime de responsabilidade civil (pelo risco) o resultado, em termos do nível de cuidado, tende a ser efi ciente no que concerne a ambas as partes. No sistema de responsabilidade civil português, o artigo 503º Código Civil prevê a responsabilidade civil objectiva estrita, e o artigo 505º do mesmo código56 permite que essa responsabilidade pelo risco seja afastada do ofensor quando haja negligência da vítima57.

4) Negligência relativa: Neste caso, o ofensor será responsável por uma percentagem dos danos externos do acidente se o nível de cuidado observado (x) for inferior ao nível de cuidado devido (xd) e se o nível de

55 No regime de responsabilidade civil objectiva, com a contribuição da negligência da vítima – caso em que a vítima desenvolve um nível de cuidado inferior ao nível de cuidado devido –, o nível óptimo de precaução é a estratégia dominante da vítima, o que signifi ca que este regime tende a levar a potencial vítima a desenvolver um nível óptimo de cuidado, tendo, em consequência, um comportamento efi ciente.

56 “Artº 505º – (Exclusão da responsabilidade) – Sem prejuízo do disposto no artigo 570º, a responsabilidade fi xada no artigo 503º só é excluída quando o acidente for imputável ao próprio lesado ou a terceiro, ou quando seja provocado por causa de força maior, estranha ao funcionamento do veículo.”

57 Se as duas partes desenvolvem um nível óptimo de cuidado e se tomada em consideração na negligência da vítima, o regime de RCS incide nos custos do acidente para o lesado, enquanto que o regime de RCO afecta os custos do acidente ao ofensor (condutor).

cuidado do lesado (v) for menor que o nível de cuidado devido, v <vd.Deste modo, ambas as partes serão consideradas negligentes, suportando, na proporção do seu grau de negligência determinado, os custos do acidente. Seja β (x,v) a fracção de danos causados pela negligência do ofensor, com 0< β <1, se x<xd. Esta forma de responsabilidade civil tende a um resultado efi ciente. Supondo que a vítima escolhe um nível de cuidado óptimo, v=v , o problema do ofensor consistirá em minimizar A(x) + β (xv ) P(x, v )D, pelo que escolherá também um nível de cuidado óptimo, x = x . A vítima também tenderá a escolher o nível óptimo de cuidado porque, deste modo, afastará a responsabilidade. Esta forma de responsabilidade relativa está prevista no art. 570º do Código Civil português58, que também contempla a responsabilidade pelo agravamento dos danos por parte do lesado, antes ou depois da ocorrência do acidente59.