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ESQUEMA DE LIGAÇÃO

2.8 MODELOS CULTURAIS

Uma importante questão para essa análise diz respeito aos modelos culturais e, nesse sentido, assumiremos a concepção adotada por D’Andrade (1992).

Segundo ele, modelos culturais “consistem de um conjunto inter-relacionado de elementos que se ajustam para representar algo” (p. 151)55; já uma teoria cultural “consiste de

um conjunto inter-relacionado de proposições que descrevem a natureza de algum fenômeno

geral”. (p. 172)56. Mas, para que possamos compreender o que D’Andrade propõe, é

necessário que os conceitos de esquemas culturais e motivos sejam esclarecidos.

Para D’Andrade (1992), a ligação entre cultura e ação é decorrente da motivação, tratando-se, assim, de uma abordagem antropológica. Contudo, o autor chama atenção para o fato de que não se deve referir a ação como sendo culturalmente constituída de forma simplificada, pois se corre o risco de incorrer em alguns equívocos como, por exemplo, estabelecer uma relação causal desprovida de mecanismos ou processos de conexão. Além disso, não se pode ignorar que nem tudo em uma cultura é internalizado em uma pessoa e que, muitas vezes, indivíduos diferentes internalizam de formas diferentes partes de uma mesma cultura. Acrescenta, ainda, que a emoção e a ação são influenciadas por outros fatores, tais como a constituição do corpo, o funcionamento do cérebro, interesses pessoais, além de variáveis sociais e econômicas.

D’Andrade (1992) destaca a importância do exame de como a cultura conecta-se com a motivação, uma vez que a motivação é experienciada como um desejo, “seguido por um sentimento de satisfação se o desejo é preenchido, ou por um sentido de frustração se ele não é.” (p. 23)57.

Essa questão da motivação, abordada por D’Andrade, é norteada pelo conceito de esquemas que, para ele, devem ser entendidos como processos e não como objetos, ou seja, “esquema é uma interpretação que é freqüente, bem organizada, memorizável, que pode ser construída a partir de pistas mínimas, que contém uma ou mais instanciações prototípicas, é resistente a mudanças, etc.” (p. 29)58. Para ele, saber quais são os objetivos que levam as

pessoas a agir do modo como agem propicia que se possa entendê-las melhor.

56 “[…] consists of an interrelated set of propositions which describe the nature of some general phenomena.” (p.

172).

57 “[…] followed by a feeling of satisfaction if the desire is fulfilled or a sense of frustration if it is not.” (p. 23). 58 “[…] schema is an interpretation which is frequent, well organized, memorable, which can be made from

Para a Antropologia Cognitiva, a Psicologia Cognitiva, bem como para a Lingüística Cognitiva o conceito de esquema é fundamental.

Por outro lado, Quinn (1997) afirma que modelos culturais são compartilhados, mas possuem graus diferentes de compartilhamento e de força motivacional. Para a autora, modelos culturais podem ser chamados de esquemas culturais aproximando-se, dessa forma, à abordagem defendida por Lakoff (e Johnson) baseada no experiencialismo, a partir de experiências compartilhadas.

Quinn, contudo, contesta que a metáfora, presente nos estudos de Lakoff e Johnson, entre outros lingüistas, seja o único recurso dos falantes empregado cotidianamente, fazendo, dessa forma, uma crítica teórico-metodológica a esses trabalhos.

Trata-se, de acordo com Feltes (2007), de uma leitura tendenciosa da teoria de Lakoff e seus colaboradores, uma vez que, na proposta desses autores, não se nega a existência de esquemas culturais subjacentes. As metáforas, então, servem como extensões a partir do que os falantes constroem domínios da experiência, como é o caso das estruturas radiais de natureza proposicional.

Cultura, em Antropologia Cognitiva, conforme Strauss & Quinn (1997), “consiste de ocorrências regulares no mundo humanamente criado, nos esquemas que as pessoas compartilham como decorrência dessas [ocorrências], e nas interações entre esses esquemas e o mundo” (p. 7).59 Como afirma Feltes (2007) a Lingüística Cognitiva não

oferece uma definição explícita de cultura, mas, do modo como opera em suas linhas de investigação, essa definição de cultura ajusta-se muito bem – com relativa consistência, pertinência e adequação – aos seus empreendimentos e resultados.

Com relação ao conceito de cultura, diz Geertz (1989):

[...] o conceito de cultura ao qual me atenho não possui referentes múltiplos nem qualquer ambigüidade fora do comum, segundo me parece: ele denota um padrão de

59 “[The cultural theory] “consists of regular occurrences in the humanly created world, in the schemas people

significados transmitidos historicamente, incorporado em símbolos, um sistema de concepções herdadas expressas em formas simbólicas por meio das quais os homens comunicam, perpetuam e desenvolvem seus conhecimento e suas atividades em relação à vida (p. 103).

Geertz (1989), ao abordar a questão da religião como sistema cultural, afirma que os símbolos sagrados funcionam para sintetizar o ethos de um povo – representando o caráter e a qualidade de vida, além de seu estilo e disposições morais e estéticos. De acordo com ele, a religião ajusta as noções humanas a uma ordem cósmica imaginada.

Com relação aos símbolos sagrados, diz Geertz que em lugares e épocas diferentes, esses são capazes de induzir desde a exaltação até a melancolia, da autoconfiança à autopiedade, pois que não se pode falar de uma motivação apenas religiosa, da mesma forma que não pode haver um tipo de inclinação que possa ser chamada de devoção. Sendo assim, o homem demonstra ter uma dependência direta de símbolos e sistemas simbólicos.

Geertz aborda também a questão do que significa a crença em um contexto religioso, tema, segundo ele, dos mais inquietantes para uma análise antropológica da religião. O caminho mais adequado para tal compreensão passaria, por exemplo, pelo paradoxo moral e pela dor, que são algumas das coisas que impulsionam o homem para a crença, não representando a base das crenças, mas sim seu campo de aplicação mais importante.

Neste capítulo, abordou-se o quadro teórico que fundamenta esta dissertação e que é aplicado na análise do corpus, o qual é objeto do capítulo 3. Sabe-se que a teoria aqui apresentada não abarca todo o potencial teórico da Semântica Cognitiva. Contudo, procurou- se enfocar os aspectos da teoria que atendessem de forma suficiente os objetivos propostos nesta dissertação.

No próximo capítulo, serão abordadas questões concernentes à pesquisa qualitativa, à metodologia, à estrutura radial hipotética elaborada, à formação e categorização do corpus. Após, será realizada a análise da categoria RELIGIÃO a partir da TMCI.

3 A RADIALIDADE DA CATEGORIA RELIGIÃO PELA TEORIA DOS MODELOS