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2.2 ASPECTOS DA TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO

2.2.3 Modelos de negócios na indústria de software

2.2.3.1 Fábrica de software

No caso das fábricas de software, o desempenho cada vez mais otimizado das fábricas industriais clássicas, a consolidação das técnicas de engenharia de software, juntamente com o refinamento dos ambientes de desenvolvimento e o surgimento de novos ambientes de projeto e suporte integrados, têm feito com que, cada vez mais, esforços sejam despendidos no sentido de implantar o conceito de Fábrica de Software (FERNSTROM et al, 1992). Segundo Medeiros et al (2004), esse conceito simboliza uma desejada mudança de paradigma da produção de software focada no trabalho intensivo, para um estilo mais focado no capital, onde investimentos substanciais podem ser feitos sob um nível de risco aceitável.

A fábrica clássica, onde as pessoas atuam como máquinas na realização de tarefas pré- determinadas, não é um modelo nem desejável, nem correto para fábrica de software. No contexto de software, a analogia com a fábrica pode ser aplicada apenas aos objetivos da produção baseada no estilo industrial, e não na sua implementação. A manufatura de software envolve pouca ou nenhuma produção tradicional: todo sistema é único. Apenas partes

individuais podem aparecer repetidamente em mais de um sistema (FERNSTROM et al, 1992).

Fernandes e Teixeira (2004) afirmam que uma fábrica de software pode ter vários domínios de atuação, desde um projeto de software completo, até um projeto físico ou a codificação de um programa de computador. Os autores listam que o importante para a caracterização de um modelo de negócio como fábrica de software está em seus atributos e não na área de atuação. São características de uma fábrica de software:

• Processos definidos para o desenvolvimento de software; • Alto poder de atendimento;

• Ordens de serviços padronizadas; • Estimativas de custo e prazo;

• Controle de perfis de recurso humanos;

• Processos de planejamento e controle da produção; • Controle de componentes ou itens de software;

• Produção de software baseada em métodos e técnicas padronizadas; • Treinamento de recursos humanos;

• Garantia da qualidade do produto; • Melhoria contínua do processo; • Controle da qualidade;

• Ambiente de software alinhado às necessidades do usuário.

Fernstrom et al (1992) definem uma fábrica de software como aquela que deve estar calcada na questão única do software. Afirmam ainda que as partes individuais de um software são repetidas em vários projetos. Na mesma linha, L’erário et al (2004) afirmam que a fábrica de software deve ser orientada ao produto e, consequentemente, ao processo. Deve focar alguns domínios do conhecimento e desenvolver produtos em alguns segmentos para se consolidar no mercado.

Humphrey (1991) deixa claro que a evolução do conceito de fábrica de software está embasada nas necessidades de aumento de produtividade que só é possível através da implementação do conceito de reuso de componentes, de modelos processuais e de estabelecimento de métricas quantitativas ligadas à produção, sendo, assim, possível alcançar economia de escala produtiva dentro do ambiente de produção de software. Segundo o mesmo autor, a implementação de tais premissas passa por princípios de gestão como, por exemplo:

administração de pessoal, metodologia de processo, suporte ao processo, controle de processo e melhoria contínua.

Outro conceito de fábrica de software é apresentado por Li et al (2001) e define que uma fábrica de software deve possuir um conjunto de ferramentas padronizadas para construção de software, bases históricas a serem utilizadas no gerenciamento de projetos e, principalmente, um alto grau de reuso de código no processo de produção de determinado software. No seu modelo, Li et al (2001) afirmam que é possível observar cinco componentes básicos para uma fabrica de software: técnicas, processos, atores envolvidos, especificação de gerenciamento, ativos de processo, ferramentas e componentes de códigos.

Na perspectiva operacional da fábrica de software, Basili et al (1992) apresenta o conceito de fábrica de componentes que tem o objetivo de produzir componentes hermeticamente fechados, que devem ser utilizados nas unidades de software montadas pela fábrica de software. Ressalta, ainda, a presença da base de componentes cuja finalidade é armazenar componentes desenvolvidos para uso e reuso futuro.

Dessa forma, durante a concepção de uma fábrica de software, atividades relacionadas à forma de organizar a estrutura geral de uma fábrica de software são consideradas, tendo em vista os objetivos já mencionados. As principais decisões tomadas na definição do modelo de negócio devem ser feitas em função do contexto e do ambiente que se pretende criar. Fazem parte das decisões a definição, por exemplo, dos perfis funcionais e as respectivas atividades a serem desempenhadas; da metodologia de desenvolvimento de software a ser utilizada incluindo artefatos e métricas; do plano de processos descrevendo as atividades e relacionando-as com os artefatos e perfis funcionais responsáveis pela execução das mesmas; e do material de instrumentação necessário (MEDEIROS et al, 2004).

Segundo Cusumano (1991), o sucesso das fábricas de software do Japão e dos Estados Unidos se deve à inclusão de um alto grau de reusabilidade de código, aumento da qualidade e da eficiência operacional. As fábricas de software, com a simplificação dos processos, integridade conceitual dos modelos, aderência aos padrões e automação seletiva no processo de desenvolvimento, vêm obtendo resultados expressivos.

No Brasil, ainda estão em fase de desenvolvimento, a cultura e a prática do uso de métricas que permitam avaliações quantitativas dos diferentes produtos gerados durante o processo de desenvolvimento. Essa relativa falta de métricas torna extremamente complexa a avaliação comparativa de qualidade dos softwares construídos, bem como as avaliações de custos e prazos de execução das diferentes fases desse processo.

Enfim, uma fábrica de software deve ser vista como uma unidade de produção especializada nas atividades de construção de software que se caracteriza por modelo semelhante a um processo industrial, visando principalmente a qualidade e a produtividade. É na proposta de trabalho de uma fábrica de software que a tecnologia da informação (TI) transforma-se num processo de produção efetivo.

Dentre muitos modelos, pode-se citar três em destaque: o modelo japonês, com foco em alta produtividade e qualidade; o modelo europeu, com foco na integração de ambientes de desenvolvimento de software; e o modelo norte-americano, com as abordagens baseadas na experiência e na maturidade da organização (AAEN, 1997). A abordagem japonesa para o conceito de fábrica se baseia na junção de idéias, técnicas e ferramentas, todas alinhadas sob a tecnologia e a organização. Nesse modelo, o foco principal da organização é tornar a rotina de trabalho simples e repetitiva, e padronizar os processos de trabalho.

As diferentes experiências das organizações japonesas culminaram no levantamento de nove elementos básicos comuns às organizações de desenvolvimento de software (CUSUMANO, 2004):

• Comprometimento com a melhoria de processos; • Segmentação e foco em produto-processo; • Análise e controle da qualidade e do processo

• Processo centralizado de pesquisa e desenvolvimento • Nivelamento e padronização do conhecimento

• Padronização dinâmica • Reusabilidade sistemática

• Integração de ferramentas CASE ao ambiente de fábrica • Melhoria dos processos de maneira incremental

Já o modelo europeu foca na criação de uma arquitetura e um framework para o ambiente integrado de desenvolvimento, através da criação de um modelo genérico de fábrica de software, constituído de ferramentas, componentes e ambientes que suportem diversas áreas de negócio (AAEN, 1997). Dessa forma, é possível instanciar um ambiente de fábrica a partir do modelo genérico e adaptá-lo à organização para apoiar a execução de um determinado projeto.

No entanto, a busca pela generalização envolve o desafio de manter um processo de trabalho dentro de uma organização montada a partir de um modelo genérico, onde, independente dos componentes utilizados para montar um ambiente de fábrica, o processo

deve fluir com sucesso entre estes componentes. Para tal, o modelo genérico busca embutir o processo de software nas ferramentas de suporte ao ambiente de fábrica, de modo a automatizar a padronização do trabalho. Usando como base os nove elementos descritos anteriormente, esta abordagem trata apenas poucos elementos: o foco em produto e em processo, pesquisa e desenvolvimento centralizados de processos, reusabilidade sistemática e integração de ferramentas computadorizadas ao ambiente de fábrica.

Já a abordagem norte-americana baseada em experiências, também conhecida por Fábrica de Experiências, é suportada pelo paradigma de melhoria da qualidade (BASILI, 1992). Nesta abordagem, o foco é o aprendizado através das experiências, onde é possível errar, desde que sejam extraídas lições para as próximas etapas. A partir desse aprendizado, torna-se possível o entendimento das relações entre aspectos qualitativos de produtos e características dos processos aplicados na fábrica, o que facilita a tomada de ações para novas melhorias na organização.

Neste modelo, o esforço para a implementação da melhoria dos processos através da experiência é intenso, pois exige da fábrica um controle mais preciso sobre a execução de suas atividades, através da utilização de métricas. Partindo desta abordagem, surge o modelo de uma organização madura, cujo objetivo é atingir um processo de desenvolvimento previsível, confiável, e passível de evoluções, capaz de suportar a produção de softwares de alta qualidade (PAULK et al, 1993).

Outro ponto importante associado a este modelo e que o mesmo pressupõe a existência de um sponsor, ou seja, um patrocinador para o desenvolvimento do software e serviços de tecnologia. No início dos tempos, os maiores patrocinadores da indústria foram o governo americano, através de empresas públicas e forças armadas, e empresas de porte muito grande. Com o sucesso, o modelo foi sendo aperfeiçoado chegando ao que é conhecido hoje como investimento em capital de risco e participação na bolsa de valores de empresas de tecnologia. As empresas americanas se financiam destas duas formas, tendo sido reduzido o papel do

sponsor público.

Ademais, pode-se apresentar o modelo indiano que se tornou referência em terceirização de serviços de desenvolvimento e manutenção de software. Neste modelo pode- se evidenciar alta proporção no quadro de pessoal, em que a parcela de profissionais dedicados exclusivamente à codificação de programas é alta, comparada a outros países em que se apostou na oferta de terceirização de sistemas. De fato, observa-se que a Índia reúne o custo mais baixo com a melhor qualificação de pessoas, o que permite a existência de

enormes vantagens comparativas nos custos do trabalho. É consensual na literatura o papel fundamental dos custos salariais para a “decolagem” desta indústria.

Em geral as exportações e a produção de software indianas são condicionadas por uma divisão internacional do trabalho, sendo que a maioria dos contratos envolve apenas estágios menos qualificados de codificação e testes para os trabalhadores indianos. Isso significa que os indianos são programadores, trabalhando em acordo com requisitos e especificações determinados por desenvolvedores estrangeiros, e não analistas de sistemas ou designers. (HEEKS, 1998).

Este modelo privilegia a criação de um contingente de profissionais altamente especializados formando um centro de excelência para o desenvolvimento de software. Neste caso o modelo privilegia a competência para desenvolver tecnologia e não o produto final. O governo tem participação fundamental no modelo através de forte política de isenção fiscal, promoções do conceito e facilidades para a capacitação dos profissionais no exterior. O resultado é a imagem de excelência a custo baixo. A indústria não é reconhecida pelo produto final, mas pela competência no Desenvolvimento (ASSESPRO, 2004).

2.2.3.2 Empresas de bases tecnológicas

Por outro lado, existem as empresas desenvolvedoras de software cujos modelos de negócios são aqueles caracterizados por empresas de base tecnológica, ou seja, possuem estratégias e estrutura que primam pela inovação e pela flexibilidade. Segundo Oliva et al (2005), essas empresas aplicam, em seu processo produtivo, alta densidade de conhecimento e são, por natureza, geradoras e dependentes da inovação.

Entende-se como empresa de base tecnológica aquelas empresas industriais com menos de 100 empregados, ou empresas de serviço com menos de 50 empregados, que estão comprometidas com novos produtos ou processos, caracterizando-se, ainda, como empresas que usam tecnologias inovadoras (MACHADO et al, 2001).

Segundo o Ministério de Ciência e Tecnologia (2010), as empresas de base tecnológica podem ser compreendidas como um empreendimento que fundamenta sua atividade produtiva no desenvolvimento de novos produtos ou processos, baseado na aplicação sistemática de conhecimentos científicos e tecnológicos e utilização de técnicas avançadas ou pioneiras.

Valério Netto (2006) compreende que as empresas de base tecnológica atuam como agentes de mudanças, introduzindo inovações na estrutura industrial a partir de conhecimentos científicos e se estruturam com base em novas ideias de produtos e serviços. Segundo Pinho (2007), há muitas definições de base tecnológica, mas neste trabalho é adotada a utilizada por Machado et al (2001) que afirmam que empresas de base tecnológica são empresas industriais que estão comprometidas com o projeto, desenvolvimento e produção de novos produtos/processos. Caracterizam-se, ainda, pela aplicação sistemática de conhecimento técnico-científico. Estas empresas usam tecnologia inovadora; têm uma alta proporção de gastos com pesquisa e desenvolvimento; empregam pessoal técnico-científico e de engenharia; e servem a mercados específicos.

Independente da definição, pode-se perceber que a inovação é elemento basilar da empresas de base tecnológica, uma vez que estas empresas buscam, através da aplicação de seus recursos, o desenvolvimento de algo novo. Para Schumpeter (1955), a inovação é representada pela atividade de transformação de um elemento já inventado em um elemento comercialmente útil, que venha a ser aceito em um sistema social.

Como já apresentado anteriormente, inovar é romper com modelos pré-estabelecidos. Portanto, pode-se concluir que o processo de inovação é, em sua raiz, caracterizado pela incerteza e decorrente não apenas de fatores tecnológicos, mas também porque o comportamento do ambiente de seleção não pode ser completamente deduzido (DOSI, 1998).

Uma inovação pode ser um novo produto ou um novo processo, uso de novas matérias primas ou uma nova forma de organização. A distinção entre renovar ou melhorar um produto ou serviço já existente e introduzir algo efetivamente novo no mercado é um dos debates na literatura sobre inovação.

A inovação incremental explora o potencial dos padrões existentes e, muitas vezes, reforça a dominância das empresas já estabelecidas. Já a inovação radical geralmente abre novos mercados e aplicações potenciais. Ela usualmente cria dificuldades para as empresas já estabelecidas e pode ser a base do sucesso para as empresas emergentes (HENDERSON; CLARK, 1990).

No Brasil, este segmento de empresa tem surgido principalmente através das incubadoras tecnológicas, na qual proveem as condições mínimas para sua operacionalização buscando estimular as atividades empreendedoras, promover o desenvolvimento tecnológico e o crescimento regional, diversificar as economias regionais e a geração de empregos.

Assim, para conseguir o nível de inovação que caracteriza as empresas de base tecnológica, as mesmas assumem características específicas. As características das empresas

de base tecnológica, destacadas por Soares (1994) e Machado et al (2001) que envolvem o contexto de negócio das mesmas são apresentadas abaixo:

• Informação, conhecimentos científicos e tecnológicos como insumo intensivo; • Produção flexível;

• Estrutura horizontal; • Áreas integradas;

• Rotatividade de funções;

• Constante troca de informações entre funcionários; • Gestão da qualidade total;

• Mão de obra altamente qualificada;

• Desenvolvimento de projetos, novos produtos ou processos com tecnologias bem específicas e ainda não padronizadas;

• Atendem a mercados pequenos e específicos;

• Produtos de alto valor agregado, preferencialmente, bens de capital, componentes e sistemas industriais;

• Tecnologias preponderantes baseadas principalmente na eletrônica e informática. Valério Netto (2006) complementa, apresentando as seguintes características: • Poucos níveis hierárquicos;

• Ausência de vários departamentos; • Proximidade com os clientes;

• Integração e relacionamento entre os funcionários; • Comunicação mais eficaz entre as pessoas da instituição.

A FINEP (2006), agência do governo federal que apóia projetos tecnológicos no Brasil, tem trabalhado com a seguinte caracterização para empresa de base tecnológica:

São empresas de qualquer porte ou setor que tenham, na inovação tecnológica, os fundamentos de sua estratégia competitiva. Desenvolvem produtos ou processos tecnologicamente novos ou melhorias tecnológicas significativas em produtos ou processos existentes. Obtêm parte significativa de seu faturamento de produtos novos e/ou protegidos por patentes ou direitos do autor. Encontram-se em fase pré-operacional e destinam pelo menos 30% de suas despesas operacionais para as atividades de pesquisa e desenvolvimento. E empregam mão de obra extremamente qualificada (nível superior, mestrado e doutorado).

É possível perceber que, na definição do modelo de negócio das empresas, existem características estruturais e opções estratégicas associadas ao produto, ao processo e às

pessoas que fazem parte da organização. É importante destacar que é com base nestas características que esta pesquisa irá retratar o modelo de negócio das organizações investigadas, situando as mesmas em um continuum em cujos extremos estão os modelos definidos como fábrica de software e empresas de base tecnológica.