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LIÇÕES E EXPERIÊNCIAS DE UMA UTOPIA A SER ALCANÇADA

1) Heterogeneidades pessoais, a idade, sexo ou deficiência pressupõe diferenças para a realização de tarefas Por exemplo, uma pessoa doente,

3.4. Modelos para os estudos da qualidade de vida

A partir da abordagem de que ocorre interação entre os diferentes domínios particulares que compõem a qualidade de vida, os quais interferem no resultado da qualidade de vida global, foi apresentado no modelo desenvolvido por Campbell et al (1976)85, figura 24. Tal modelo é geral ainda mantem-se atual, serve de referência e é aperfeiçoado/adaptado para vários estudos da qualidade de vida86. Marans e Stimson, (2011, p.7) ressaltam que tal modelo serviu de embasamento para que estudos posteriores contemplassem as relações objetivo-subjetivo da qualidade de vida, como os de Lee e Marans (1980); Connerly e Marans (1985, 1988), Marans (2002), McCrea et al. (2006), McCrea (2007), nos quais, a qualidade de um local geográfico, em seus vários níveis de escala (cidade, bairro ou habitação) é na verdade um fenômeno subjetivo para cada pessoa de acordo com suas experiências passadas e aspirações.

Figura 24 - Modelo das relações entre satisfação nos domínios e satisfação com qualidade de vida.

Fonte: Campbell et al (1976) apud Marans e Stimson (2011). Adaptado por Alves (2015).

No modelo de Campbell et al (1976) são consideradas as relações entre os atributos objetivos, a percepção, avaliação e satisfação com relação a estes atributos, que por sua vez, podem ser influenciadas por uma série de características individuais [que podem modificar- se] e resultam na satisfação com a vida. Além disso, conforme destaca McCrea (2007, p.5) o modelo considera as inter-relações entre diferentes escalas urbanas, como habitação,

85O autor tomou como base o modelo de Marans e Rodgers (1975), que representa estas relações entre os diferentes domínios residenciais de ambientes urbanos e como esses domínios, em conjunto com outros domínios, contribuem para a satisfação, para a qualidade de vida. Estes trabalhos realizados em meados dos anos 70 são seminais para os estudos da qualidade de vida.

86 Dentre os modelos o Bottom-Up (avaliações mais específicas usadas para prever mais avaliações globais); Top-Down (satisfação com domínios e com a vida em geral a partir de características de personalidade); Mood Bias (a influencia do humor); Subjective Judgement, etc são citados por McCrea (2007).

Características pessoais Atributos objetivos Domínio 1 (Família) Domínio 2 (Saúde) Atributos objetivos Domínio 3

(Lugar) Atributos objetivos

Atributos percebidos Atributos percebidos Atributos percebidos Atributos avaliados Atributos avaliados Atributos avaliados Satisfação com o domínio 1 (Família) Satisfação com o domínio 2 (Saúde) Satisfação com o domínio 3 (Lugar) S ati sf aç ão com a vi da Enf re nt am ent o e com por ta m ent o a da pt ati vo

comunidade, bairro, cidade, o que está associado com as intensões de movimento. (MARANS; STIMSON, 2011, p.13).

Os 4 princípios básicos deste modelo são:

(A) As experiências pessoais são derivadas das interações com o ambiente. (B) As experiências subjetivas das pessoas são diferentes do ambiente objetivo. (C) As pessoas respondem às suas experiências com o meio ambiente. (D) O nível de satisfação em vários domínios da vida contribui para a qualidade de vida global; (MARANS; STIMSON, 2011, p.7, tradução nossa.

Segundo McCrea et al. (2011) esse modelo amplo incorpora padrões relacionados à partes do quadro conceitual, como a satisfação e julgamento das pessoas, que tem influencia dos modelos bottom-up e top-down. Ele também sugere que os atributos de um nível geográfico podem prever satisfação em outros níveis de domínio urbano e que os níveis de satisfação no domínio urbano podem se influenciar mutuamente. Sendo que a satisfação de vida global decorre da satisfação em domínios urbanos (incluindo satisfação regional), que por sua vez advém das avaliações subjetivas de atributos urbanos (figura 25).

Figura 25 - Estrutura ampla para avaliação subjetiva de determinantes da satisfação com o ambiente residencial.

Fonte: McCrea R. et al. (2007). Adaptado por Alves (2015).

Esta relação é verificada por pesquisadores da Universidade de Michigan, por exemplo, citados por Patrick e Erickson (1993), e por Lora (2010, p. 25) apud (Gallup, 2008), ao destacar que as pessoas que estão satisfeitas com a sua casa são 19% mais propensas a

Domínios urbanos Características pessoais Características objetivas Percepções subjetivas Avaliações subjetivas Satisfação com comunidade Satisfação com bairro Satisfação com habitação Atributos da comunidade Atributos do bairro Atributos da comunidade Atributos da comunidade Atributos do

bairro Atributos do bairro

Sa tis fa çã o ge ra l c om a vi da Satisfação em outros domínios Atributos da

habitação Atributos da habitação

Atributos da habitação

dizer que estão satisfeitas com sua cidade, em comparação com aquelas que não estão satisfeitas com sua casa.

O modelo reflexivo indireto de Edwards e Bagozzi (2000) apud Sawatzky (2007) na mesma perspectiva, assegura que as medidas relacionadas com cada um dos domínios da vida co-variam de modo consistente em relação a uma causa comum, ou seja, uma alteração em qualquer um dos domínios de vida vai coincidir com alterações correspondentes em todos os outros domínios da vida.

A partir da proposição de que as avaliações subjetivas decorrem dos atributos objetivos, presente no modelo de Campbell et al (1976), em seu estudo McCrea (2007) aborda a qualidade de vida subjetiva utilizando indicadores objetivos. O autor partiu do pressuposto de que as características objetivas dão origem à satisfação, via avaliações subjetivas da qualidade de vida, as quais são tidas como variáveis mediadoras (MCCREA, 2007, p.70).

Entretanto, o autor concluiu que as relações entre as dimensões objetivas e subjetivas são simplesmente fracas ou indiretas, provavelmente em função de aspectos de natureza psicológica, de diferenças entre grupos sociais e individuais, comportamentos, etc. o que implica em pouco apoio para o modelo da qualidade de vida mediada e demanda de modelos, por vezes, elaborados a partir de Campbell et al (1976), que contemplem aqueles aspectos subjetivos de julgamento e de adaptação psicológica.

Acerca dos modelos de adaptação psicológica87, eles têm em comum o fato de as avaliações subjetivas tenderem a não ser tão variáveis ao longo do tempo em função das mudanças nas circunstâncias da vida, por adquirem um nível de equilíbrio estável, portanto não foram tão elucidativos. Para os aspectos subjetivos de julgamento, têm-se as diferenças individuais e grupais, físicas e sociais, onde se destacam a homofilia psicológica (atração) e a estrutural (estabelecimento de laços densos entre indivíduos com certas semelhanças). Como base nos tipos de homofilia psicológica propostos por Lazarsfeld e Merton (1954), que podem ser social (homofilia social ou 'homofilia status') e/ou de valor (homofilia de valor), sendo esta possivelmente mais importante do que aquela, nas avaliações subjetivas. E por fim, ao considerar que, por vezes, os indivíduos se mudam para ajustar suas necessidades e aspirações, em resposta à insatisfação com o seu ambiente residencial, sobretudo em relação ao ambiente físico, tem-se o processo de mudança residencial, para explicar a fraca correlação entre dimensões objetivas e avaliações subjetivas. O autor concluiu que é nos processos

87 Os modelos são: os que envolvem metas e padrões - Esteira hedônica ea esteira satisfação (Kahneman, 1999); Os ajustes de metas e padrões - teoria da homeostase da Cummins (2000); a personalidade rege certo grau de equilíbrio - Equilibrio dinâmico (Headey e Wearing, 1989), para saber mais ver McCrea (2007, p.109-110).

subjetivos de julgamento que reside uma explicação plausível para esta fraca e indireta correlação entre os aspectos objetivos e as avaliações subjetivas e propôs certas modificações no modelo de Campbell et al (1976) (MCCREA, 2007), figura 26.

Figura 26 - Quadro conceitual modificado.

Fonte: McCrea R. et al. (2007). Adaptado por: Alves (2015).

No modelo adaptado foram inseridos o processo de mudança residencial e o viés de humor; a noção da diferença entre as percepções e as normas foi colocada de forma explicita, contudo usando chave para enfatizar a natureza indireta; enquanto que foram excluídas a influência das características pessoais em percepções subjetivas e as setas mostrando efeitos diretos de características pessoais em avaliações subjetivas do ambiente urbano (MCCREA, 2007, 175-177).

O modelo de julgamento de Schwarz e Strack (1999) apud McCrea (2007), figura 27, é destacado por sua relevância para explicar relações fracas entre circunstâncias objetivas e julgamentos subjetivos de satisfação.

Neste modelo há a possibilidade de utilização de dois modelos psicológicos, um para domínios gerais, mais passíveis de serem afetadas pelo humor e outro para os específicos, nos quais o humor teria uma influência menor.

Figura 27 - Modelo de julgamento para analisar o bem-estar subjetivo.

Fonte: Schwarz e Strack (1999) apud McCrea (2007). Adaptado por: Alves (2015).

Na perspectiva bio-psico-social da saúde, destaca-se o modelo proposto por Marans e Mohai (1991), com base no modelo de Campbell et al. (1976), figura 28, que sugere como a saúde pode estar ligada a um número de condições objetivas do meio, como: recursos de lazer, de recreação, culturais e ambientais. Sendo que a partir da percepção é avaliado o grau de bem-estar físico, psíquico e social, considerando a cultura, os valores, as expectativas e as caraterísticas individuais. (MARANS; STIMSON, 2011).

Figura 28 - Uma visão geral da qualidade de vida urbana.

Fonte: Marans e Mohai (1991) apud Marans e Stimson (2011). Adaptado por Alves (2015). Julgamento do

bem-estar global

Tarefa Julgamento de

domínio específico

Estado afetivo informado? Recuperar informação relevante

Usar informação de humor

Não Sim

Construir representação do objetivo e padrão Aspectos sociais podem

ser considerados? Considerar julgamento pessoal Relatório Não Sim Avaliar

Tuesca-Molina eAmed-Salazar (2014, p.8) destacam a importância das relações entre os fatores sociodemográficos e a percepção de saúde, os autores destacam a partir de um estudo recente na Colombia, a importância do ―papel del ingreso, edad, género, nivel educativo, práctica de ejercicio físico, el sistema de salud, las regiones del país y la ubicación del las viviendas en zonas urbanas o rurales‖ na saúde. Ponto de vista semelhante ao de Marans (2002) que associam a qualidade do ar no nível do bairro a saúde da família (por exemplo, a incidência de asma) com as apreciações das condições do local.

Para Campbell et al. (1976) a utilização da "Satisfação" na análise subjetiva foi vista como sendo o julgamento mais definível da experiência cognitiva. Segundo o autor esta era um reflexo da percepção dos povos e das avaliações dos muitos atributos de cada domínio e que estes, por sua vez, foram influenciadas pelas propriedades objetivas. Por exemplo, a satisfação no trabalho foi observada como a avaliação de uma pessoa em função de muitos atributos de um emprego, tais como o grau de autonomia, relacionamento com os colegas de trabalho, salários e assim por diante. Da mesma forma, a satisfação com uma habitação era associada com uma medida objetiva (tal como o número de pessoas por quarto ou outra medida de densidade habitacional) (MARANS; STIMSON, 2011).

Marans e Rodgers (1975) desenvolveram um modelo, que representa as relações para diferentes domínios residenciais urbanos e como esses domínios, em conjunto com outros domínios, contribuem para a qualidade de vida. Sendo que, os pressupostos desse modelo são que a qualidade da localização geográfica ou ambiental (a região da cidade, o bairro ou a habitação): não pode ser capturada por uma única medida, mas vários atributos combinados, assim como é um fenômeno subjetivo reflete as experiências de vida dos sujeitos. Um reflexo do significado das condições objetivas para os sujeitos (MARANS; STIMSON, 2011).

Mais recente, o modelo de Marans (2002) figura 29, mostra as relações que podem explicar a satisfação das pessoas com seu bairro, o que poderia servir de instrumento, especialmente aos planejadores e gestores, para analisarem as dimensões que têm mais relações com o aumento da satisfação.

Figura 29 - Modelo mostrando relações entre condições objetivas, respostas subjetivas e satisfação com o bairro.

Fonte: Marans (2002). Adaptado por Alves (2015).

No âmbito da Geografia destaca-se o modelo de Pacione (2003), onde além das dimensões objetivas e subjetivas, são consideradas outras três. É proposta uma estrutura de cinco partes que integra as várias dimensões da qualidade de vida: objetiva/subjetiva, tempo, especificidade de domínio, escala geográfica, e as dimensões do grupo social, conforme a figura 30.

Figura 30 - Estrutura de cinco dimensões para a qualidade de vida.

Na estrutura de Da Pacione (2003) as dimensões objetivas e subjetivas estão presentes em todos os momentos, cada uma apresenta outras duas dimensões: os níveis de especificidade e a escala geográfica, bem como podem variar por grupos sociais.

Em relação à especificidade do domínio (por exemplo, os domínios e subdomínios da vida) como sugere Da Pacione (2003) a qualidade de vida pode ser conceituada como satisfação com a vida em geral e/ou satisfação nos vários domínios da vida, incluindo os domínios e subdomínios urbanos. Neste caso, a qualidade de vida geral decorre da soma ponderada da satisfação em cada domínio que, por sua vez, decorre da satisfação em cada subdomínio.

Os estudos acerca da satisfação nos diferentes domínios da vida são comuns,

[...] For example, satisfaction with work (e.g., Hart, 1999; Heller, Judge, & Watson, 2002); relationships (e.g., Acock & Hurlbert, 1993; D. Evans, Pellizzari, Culbert, & Metzen, 1993; Foroughi, Misajon, & Cummins, 2001); health (e.g., John, 2004; Michalos, Hubley, Zumbo, & Hemingway, 2001); as well as satisfaction with housing, neighbourhood, community, and region (e.g., Cook, 1988; Marans & Rodgers, 1975; McCrea, Stimson, & Western, 2005; Parkes, Kearns, & Atkinson, 2002; Sirgy & Cornwell, 2001, 2002; Turksever & Atalik, 2001).( MCCREA, 2007, p.22-23).

Com relação à escala geográfica, os estudos sobre a qualidade de vida abarcam desde as escalas regionais, contemplando grandes áreas como aqueles desenvolvidos na UE, ou mesmo áreas menores como o estudo da região metropolitana de Detroit nos EUA; perpassando pela escala do município até chegar à escala local, ao lugar onde as pessoas vivem. Sendo que, conforme destacam McCrea, et al. (2011) as escalas mais pesquisadas são: habitação, bairro e comunidade, e menos frequente a região.

Estas escalas, da habitação até a região, encontram-se interligadas. McCrea (2007); Marans e Stimson (2011), com base em estudos anteriores, destacam as inter-relações entre estas escalas e os domínios considerados, na avaliação subjetiva da qualidade de vida, os quais de acordo com os autores são:

A) Na avaliação da habitação seriam consideradas suas caraterísticas, como: idade, tamanho, estrutura e estabilidade (Campbell et al. 1.976; Lu, 1999). Além das características circundantes, ou seja, o entorno, como: vizinhos, a área local e tamanho da comunidade (Campbell et al. 1976 ; Lu, 1999; Parkes et al. 2002) e até mesmo características regionais, como: localização geográfica dentro da região metropolitana (MARANS; STIMSON, 2011).

(B) Na avaliação da vizinhança uma vasta variedade de características físicas, econômicas e sociais dos bairros influenciam na satisfação com a habitação. Sendo que, a satisfação com vizinhos e características sociais do bairro têm reflexos na satisfação com a