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Modo, Locus e Extensão

No documento Tratado de Teologia Adventista (páginas 69-93)

Peter M van Bemmelen

REVELAÇÃO E INSPIRAÇÃO A principal tarefa da consciência é nos esti­

C. Modo, Locus e Extensão

da Inspiração

Considerando os aspectos humanos e di­ vinos das Escrituras, alguém pode pergun­

tar como esses aspectos se inter-relacionam. Infelizmente, os escritores bíblicos não abor­ dam a questão de maneira direta. Encontra­ mos, porém, dispersas pelos livros da Bíblia, indicações e sugestões concernentes ao pro­ cesso de inspiração e a seus resultados. Com base nesses dados bíblicos, tentaremos ex­ trair algumas conclusões. Discutiremos o as­ sunto aqui no que diz respeito ao modo, locus e extensão da inspiração.

1. O Modo da Inspiração

Os autores bíblicos concordam a respei­ to do papel decisivo do Espírito Santo em impulsioná-los a escrever. A iniciativa é in­ teiramente do Espírito: E Ele quem chama, concede revelações, move ou inspira. Pedro declara isso sucintamente: "Porque nunca ja­ mais qualquer profecia foi dada por vontade humana” (2Pe 1:21). Até mesmo o relutan­ te profeta Balaão só podia anunciar aquilo que o Senhor lhe ordenasse (Nm 24:2-9, 13).

Embora reconhecendo que a inspiração é um fato, devemos examinar o modo como ela ocorre. Isso exige que estudemos o pro­ cesso pelo qual os autores bíblicos recebiam as revelações e as registravam.

Era por meio de sonhos e visões que Deus Se revelava comumente aos profetas (Nm 12:6). Depois, eles consignavam por escrito o que haviam visto e ouvido, imedia­ tamente ou posteriormente. A pergunta é: < na hora de escrever, os profetas agiam sozi­ nhos ou estavam sempre sob a orientação de Deus? A pergunta deve ser respondida indiretamente, pois os próprios profetas têm pouco a dizer sobre a questão.

A experiência de Jeremias nos ajuda a res­ ponder essa pergunta. O Senhor instruiu o profeta: “Toma um rolo, um livro, e escreve nele todas as palavras que Te falei contra Israel, contra Judã e contra todas as nações” (Jr 36:2). E difícil acreditar que, sem a ajuda do Espírito de Deus, Jeremias tivesse con­ seguido se lembrar e registrar o que Deus

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lhe havia revelado durante um período de muitos anos. A narrativa prossegue: "Então, Jeremias chamou a Baruque, que escreveu no rolo segundo o que ditou Jeremias, todas as palavras que a este o Senhor havia reve­ lado” (v. 4). Depois leu Baruque “naquele livro as palavras de Jeremias na casa do Senhor” (v. 10), mas essas palavras eram “as palavras do Senhor” (v. 8, 11).

Essa equiparação das palavras do pro­ feta com as palavras do Senhor fortemente sugere que o profeta foi inspirado, isto é, foi movido e dirigido pelo Espírito de Deus ao consignar as palavras divinas por escrito. Do mesmo modo, quando o profeta Miqueias, fazendo contraste entre sua mensagem e a dos falsos profetas, exclamou: “Eu, porém, estou cheio do poder do Espírito do Senhor [...] para declarar a Jacó a sua transgressão e a Israel, o seu pecado” (Mq 3:8), ele incluía tanto as palavras escritas como as faladas.

Quando o rei Jeoaquim desafiadoramen­ te queimou o rolo, “tomou, pois, Jeremias ou­ tro rolo e o deu a Baruque [...], o escrivão, o qual escreveu nele, ditado por Jeremias, to­ das as palavras do livro que Jeoaquim, rei de Judá, queimara; e ainda se lhes acrescenta­ ram muitas palavras semelhantes” (Jr 36:32). Essa foi a segunda edição ampliada do livro de Jeremias.

A experiência de Jeremias demonstra que os profetas não escreviam seus livros na condição de meros copistas. Embora fos­ sem movidos e guiados pelo Espírito enquan­ to escreviam, envolviam-se de corpo e alma na tarefa. Pode-se dizer o mesmo dos escri­ tores bíblicos não referidos especificamente como profetas. Salomão, o autor de muitos provérbios e cânticos, diz-nos que “ensinou ao povo o conhecimento; e, atentando e es­ quadrinhando, compôs muitos provérbios”. Ele também “procurou [...] achar palavras agradáveis, e escreveu com retidão palavras de verdade” (Ec 12:9, 10, ARG). Lucas, autor de Atos e do evangelho que leva seu nomè,

conta-nos que lhe pareceu bem, “depois de acurada investigação de tudo desde sua ori­ gem”, escrever uma “exposição em ordem” (Lc 1:3). Como se vê, a pesquisa histórica cuidadosa e a avaliação literária foram impor­ tantes para a composição dos livros escritos por Salomão e Lucas. Há boas razões para se acreditar que outros escritores tenham ado­ tado processo semelhante na composição de outros livros da Bíblia, mesmo que não te­ nham afirmado isso explicitamente.

Não está inteiramente claro se os men­ sageiros humanos estavam sempre conscien­ tes da influência do Espírito Santo enquanto falavam ou escreviam. Encontramos, porém, com frequência, indicações dessa consciência com relação aos nomes dos profetas e apósto­ los. Um estudo cuidadoso dos dados bíblicos sugere que tanto as pessoas inspiradas como seus ouvintes e leitores reconheciam nas comunicações essa especial influência do divino Espírito (Moisés, Nm 12:7, S; Josué, Dt 34:9; Samuel, ISm 3:19; Davi, 2Sm 23:2; Ezequiel, Ez 2:2; Daniel, Dn 9:22; 10:9-11; Miqueias, Mq 3:8; Pedro, At 11:12; Paulo, lCo 7:40; João, Ap 1:10).

As observações de Paulo em 1 Coríntios 7 levaram alguns a concluir que o apóstolo faz diferença entre as coisas que ele disse sob inspiração e outras que não passam de opinião pessoal. Diz ele no verso 10: “Aos casados, ordeno, não eu, mas o Senhor”, Gontudo, no verso 25, afirma: "Com res­ peito às virgens, não tenho mandamento do Senhor; porém dou minha opinião, como tendo recebido do Senhor a misericórdia de ser fiel.” Esses textos, na verdade, não tratam da questão da inspiração. O contraste tra­ çado por Paulo nos versos 10 e 12 é que num caso ele pode se referir a uma ordem explí­ cita do Senhor (Mt 5:32; 19:1-6), enquanto no outro não pode. Isso não significa que o conselho dado no verso 25 não seja inspi­ rado, já que Paulo, na conclusão desse dis­ curso sobre questões matrimoniais, declara 44

REVELAÇÃO E INSPIRAÇÃO enfaticamente: "Penso que também eu tenho

o Espírito de Deus” (lCo 7:40). A Bíblia tal­ vez não explique detalhadamente o processo pelo qual o Espírito Santo moveu e guiou os escritores dos diferentes livros da Escritura, mas um fato é claro: esses escritores agi­ ram plenamente como seres humanos, com o envolvimento de sua personalidade total. 2. O Locus da Inspiração

O locus da inspiração diz respeito à per­ gunta: Quem ou o que é inspirado? O locus específico no qual atuou a inspiração foram os indivíduos escolhidos por Deus como pro­ fetas e apóstolos, ou foram as mensagens que eles apresentaram na forma oral ou escrita (as Escrituras), ou foi ainda a comunidade de fé na qual as Escrituras se originaram? As duas primeiras opções foram, durante mui­ to tempo, motivo de debate; a terceira op­ ção passou a ser mais conhecida somente em anos recentes.

A evidência bíblica apresentada anteríor- mente neste artigo aponta para indivíduos específicos, escolhidos por Deus, como o locus primário da operação do Espírito Santo. Diz a Bíblia: “homens santos falaram da parte de Deus, movidos pelo Espírito Santo” (2Pe 1:21); “O Espírito do Senhor fala por meu intermédio, e a Sua palavra está na minha lín­ gua (2Sm 23:2); "Eu, porém, estou cheio do poder do Espírito do Senhor” (Mq 3:8).

Se devemos atribuir a Inspiração aos escritores bíblicos ou aos textos por eles escritos é em grande parte um dilema des­ necessário. E claro que o locus primário da inspiração está nas pessoas. O Espírito Santo moveu pessoas a falar ou a escrever; contudo, o que elas falaram ou escreveram foi a inspirada palavra de Deus. Nas pala­ vras de Paulo a Timóteo: “Toda a Escritura

é inspirada por Deus” (2Tm 3:16). Pedro reconheceu as cartas de Paulo como parte das Escrituras, escritas de acordo com "a sabedoria que Deus lhe deu” (2Pe 3:15,

NIV), Ao escrever suas epístolas, Paulo foi inspirado ou movido pelo Espírito Santo, e as cartas que ele produziu se tornaram parte das Escrituras divinamente inspira­ das. A inspiração exerceu influência sobre Paulo, e, sob essa influência, ele escreveu cartas inspiradas. O locus primário da ins­ piração é o apóstolo; o resultado daquela inspiração é a Escritura Sagrada.

A terceira opção para o locus da inspira­ ção - a comunidade da fé na qual a Escritura teve sua origem — dificilmente merece ser mencionada como alternativa viável. O conceito se baseia, em grande medida, em um método específico de estudo da Bíblia. Por meio de um estudo crítico-histórico-lite- rário da Bíblia, os eruditos chegaram à con­ clusão de que muitos livros bíblicos são o produto final de um longo processo, no qual estiveram envolvidos escritores, editores e redatores desconhecidos. Com base nesse fenômeno, nega-se a concepção de que os livros da Bíblia tiveram autores específicos. Em vez de esses autores terem sido inspira­ dos, a comunidade na qual os escritos atin­ giram sua forma final é que foi inspirada a reconhecer a validade e autoridade da men­ sagem bíblica. (Ver Interpretação IV.F,G.)

Embora haja evidência de editoração, po­ de-se atribuir a maior parte dela aos próprios autores inspirados, aos seus assistentes ime­ diatos, ou provavelmente até mesmo a escrito­ res inspirados posteriores. Josué, por exemplo, talvez tenha — sob inspiração divina - editado os livros de Moisés e feito acréscimos a eles, como os últimos versos de Deuteronômio. Seja como for, considerando a falta de evidência que situe o locus da inspiração em uma comu­ nidade em vez de em um autor bíblico, cum­ pre permanecer com as declarações bíblicas. O locus da inspiração está no autor inspirado. 3. A Extensão da Inspiração

A “extensão da inspiração” tem que ver com a questão de quanto da Bíblia é

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inspirado. São as próprias palavras da Bíblia inspiradas? Ou o são apenas os pensamen­ tos por detrás das palavras? Existem partes da Bíblia mais inspiradas do que outras? São algumas partes inteiramente destituídas de inspiração? E a Bíblia inspirada em sua to­ talidade ou apenas parcialmente?

Ao discutirmos sobre revelação especial e inspiração (III.B e IV.B), ficou evidente que o processo revelação-inspiração encerra muitos aspectos e que a informação disponível não responde a todas as nossas perguntas. Resta, contudo, pouca dúvida de que tanto os pen­ samentos quanto as palavras se acham en­ volvidos nesse processo. Por meio de sonhos, visões ou impressões do Espírito Santo, pes­ soas inspiradas receberam pensamentos em forma visual e verbal. Elas os comunicaram depois, de maneira fiel e verdadeira, confor­ me haviam recebido. Às vezes, elas parecem expressar suas mensagens usando as mesmas palavras que lhes foram dadas pelo Espírito.

Independentemente da maneira como re­ ceberam os pensamentos, os escritores bí­ blicos deixam claro que suas palavras são as palavras de Deus. Moisés cita Deus dizen­ do que poria Suas palavras na boca dos pro­ fetas (Dt 18:18; cf. jr 1:9). Referindo-se às Escrituras, Jesus declarou, citando Deute- ronômio 8:3, que “não só de pão viverá o ho­ mem, mas de toda palavra que procede da boca de Deus* (Mt 4:4).

As palavras escritas pelos autores bíbli­ cos real mente são palavras humanas. E por isso que eles podem introduzir seus livros usando expressões como estas: “as palavras de Jeremias” (Jr 1:1), ou “provérbios de Salo­ mão” (Pv 1:1). Os pensamentos — e por vezes as palavras — foram transmitidos por Deus para serem expressos pelos autores humanos em palavras que fossem familiares a eles e a seus leitores imediatos.

Não há dúvida de que as Escrituras são plenamente humanas e plenamente divi­ nas. Qualquer ideia de que algumas partes

da Bíblia são meramente humanas, ao pas­ so que outras são divinamente inspiradas, contradiz a forma pela qual os escritores bí­ blicos apresentam o assunto. O depoimento de Paulo, de que “toda a Escritura é inspi­ rada por Deus" (2Tm 3:16), não dã margem para nenhum conceito de inspiração parcial. Tampouco existe na Escritura nada que su­ gira graus de inspiração. E verdade que al­ gumas porções podem ser mais importantes que outras (Jesus fala em Mateus 23:23 so­ bre "o que há de mais importante na lei"), mas isso não significa que são mais inspira­ das. Todo cristão faria bem em receber as palavras da Escritura da maneira como os crentes de Tessalônica acolheram as palavras de Paulo: “não como palavra de homens, e sim como, em verdade é, a palavra de Deus” (lTs 2:13).

D. Efeitos da Inspiração

Que resultados produz a inspiração? Quais os efeitos da influência especial exer­ cida pelo Espírito Santo sobre os escritores inspirados? Comunica essa influência aos escritos qualidades que tornam a Bíblia di­ ferente de qualquer outro livro do mundo? Através dos séculos, a maioria dos cristãos tem respondido a essas perguntas afirma­ tivamente, embora divirjam quanto às pro­ priedades, atributos ou efeitos sem paralelo da inspiração. Algumas dessas divergências e os conflitos delas resultantes serão discuti­ dos no resumo histórico no fim deste artigo.

O propósito principal aqui é considerar as quatro características da Escritura: a Es­ critura como a viva voz de Deus, a autorida­ de da Escritura, a veracidade da Escritura e a suficiência da Escritura. Embora seja apro­ priado examinar cada um desses efeitos da inspiração separadamente, os atributos bí­ blicos jamais devem ser vistos separados uns dos outros. Constituem os diferentes matizes de um espectro de cores formado pela bri­ lhante luz da Palavra de Deus.

REVELAÇÃO E INSPIRAÇÃO 1. Escritura: a Viva Voz de Deus

São diversas as maneiras pelas quais os escritores bíblicos enfatizam que as pala­ vras da Escritura são a voz de Deus falando a seres humanos, numa realidade dinâmica sempre presente. O “Assim diz o Senhor” dos profetas fala tão certamente aos seres humanos do século 21 como o fez no 8° ou no século 15 antes de Gristo. Quando os saduceus tentaram armar uma cilada para Jesus perguntando-Lhe sobre a ressurrei­ ção, Ele lhes respondeu sem rodeios: "Er­ rais, não conhecendo as Escrituras nem o poder de Deus” (Mt 22:29). A seguir, per­ guntou-lhes: “Não tendes lido o que Deus vos declarou: Eu sou o Deus de Abraão, o Deus de Isaque e o Deus deJacó? Ele não é Deus de mortos, e sim de vivos” (Mt 22:31, 32). Jesus citou as palavras proferidas por Deus a Moisés, registradas havia mais de mil anos, como sendo ainda aplicáveis a Seus interpeladores, ou seja, “o que Deus vos declarou”,

Nas Escrituras, Deus fala a todas as gera­ ções, Fazendo alusão a determinados juízos que sobrevieram ao antigo Israel por causa de sua incredulidade, Paulo recorda aos cris­ tãos de Corinto que "estas coisas lhes sobre­ vieram como exemplos e foram escritas para advertência nossa, de nós outros sobre quem os fins dos séculos têm chegado” (lGo 10:11). Falando sobre as revelações comunicadas pelo Espírito aos profetas, a respeito dos so­ frimentos e da glória de Cristo, Pedro disse a seus irmãos na fé que esses profetas "estavam ministrando, não para si próprios, mas para vocês” (lPe 1:12, NVI). A Palavra de Deus transmitida por meio de profetas, salmistas, historiadores sacros e apóstolos é uma pala­ vra viva, que fala diretamente àqueles que a leem ou a ouvem, Hebreus 4:12 expressa isso de forma bem incisiva: "Porque a pala­ vra de Deus é viva, e eficaz, e mais cortan­ te do que qualquer espada de dois gumes, e penetra até ao ponto de dividir alma e espí­

rito, juntas e medulas, e é apta para discer­ nir os pensamentos e propósitos do coração.”

O Espírito de Deus, que moveu os auto­ res humanos da Bíblia a escrever, é o mes­ mo Espírito que Se dirige a cada geração nas palavras escritas e por intermédio delas. E por isso que os escritores do NT citam as palavras do AT como proferidas pelo Espí­ rito Santo (Hb 3:7-11; 10:15-17). É por isso que João, o profeta apocalíptico, conclui cada uma de suas cartas às sete igrejas com o ur­ gente conselho: “Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas” (Ap 2:7, 11, 17, 29; 3:6, 13, 22). Há, portanto, íntima rela­ ção entre “palavra” e “Espírito”. O apóstolo Paulo se refere à Palavra de Deus como “a espada do Espírito” (Ef 6:17). E o Espírito de Deus que concede eficácia e poder à Pa­ lavra de Deus. O novo nascimento ou rege­ neração é atribuído tanto ao Espírito como à Palavra. Jesus disse a Nicodemos que lhe era necessário nascer do Espírito (Jo 3:5-7), ao passo que Pedro escreveu aos crentes dis­ persos, lembrando-lhes que eles haviam sido regenerados "mediante a palavra de Deus, a qual vive e é permanente” (lPe 1:23).

2. Escritura: sua Autoridade

Do Gênesis ao Apocalipse, a Bíblia atri­ bui suprema autoridade a Deus, o Criador do céu e da Terra. Foi assim que Ele Se re­ velou aos patriarcas (Gn 17:1; 35:11; 48:3) e a Moisés (Êx 3:13-15; 6:2, 3). Davi reco­ nhecia o Senhor como chefe sobre todos, a quem pertencia a grandeza, o poder e a ma­ jestade (lCr 29:10-13). Daniel, assim como

Nabucodonosor e Dario, atribuía ao Deus do Céu a suprema sabedoria e o domínio eterno (Dn 2:20-22; 4:34, 35; 6:26, 27).

Contudo, a autoridade de Deus se baseia principalmente não em Seu poder e conhe­ cimento infinitos, mas em Seu caráter. Deus Se revelou a Moisés como o “Senhor Deus compassivo, clemente e Iongânimo e gran­ de em misericórdia e fidelidade” (Êx 34:6).

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Por conseguinte, o Senhor não exerce Sua autoridade como fazem os governantes hu­ manos. A autoridade absoluta de Deus é uma autoridade de amor e paz, expressa em humildade, serviço e abnegação. Essa autoridade se manifesta supremamente na encarnação, morte e ressurreição de Jesus Cristo, que, apesar de ser “o cabeça de todo principado e potestade” (G1 2:10), entregou a vida por Seu próprio poder e autoridade (Jo 10:17-18).

A autoridade da Escritura como a Palavra de Deus escrita exibe todas as mesmas ca­ racterísticas da autoridade divina. Sua autori­ dade é expressa em imperativos absolutos de obediência (Ex 20:1-17), em apelos compassi­ vos de amor (Is 1:18; Mt 11:28), em promes­ sas de perdão e bênçãos (Mt 5:3-12; IJo 1:9) e em severas advertências de juízo (Jr 6:1-8).

Deus dotou Seus mensageiros escolhidos de Sua própria autoridade quando eles fala­ ram ou escreveram sob o impulso do Espírito Santo. Essa é a razão por que os escritos dos profetas e apóstolos falam com autoridade divina a cada geração, ainda que os autores humanos desses escritos não estejam entre nós há muito tempo. E por isso que Paulo pôde afirmar que a igreja é edíficada "sobre o fundamento dos apóstolos e profetas, sen- ► do Ele mesmo, Cristo Jesus, a pedra angular”

(Ef 2:20). Pela mesma razão, Pedro adver­ te os crentes de que se recordem "das pala­ vras que, anteriormente, foram ditas pelos santos profetas, bem como do mandamento do Senhor e Salvador, ensinado pelos vossos apóstolos” (2Pe 3:2). A autoridade dos pro­ fetas e apóstolos se baseava no fato de Deus havê-los chamado e feito deles recipientes e testemunhas da revelação divina (Jo 15:16; At 9:15, 16; 2Pe 1:18; IJo 1:1-4).

Por diversas vezes, Jesus confirmou a autoridade das Escrituras. Resistiu à tenta­ ção do diabo com um decisivo “está escrito” (Mt 4:4, 7, 10). Refutou as acusações de Seus oponentes citando-lhes textos específicos

que lhes expunham seu equívoco e interpre­ tação errada da Palavra de Deus (Mt 12:1-7). Quando os judeus O acusaram de blasfê­ mia, Ele citou o Salmo 82:6 e ratificou a autoridade da palavra de Deus com a afirma­ ção categórica de que "a Escritura não pode falhar” (Jo 10:33-35). Silenciou por fim aque­ les que O interrogavam perguntando-lhes como era possível o Messias ser ao mesmo tempo tanto Filho e Senhor de Davi, con­ forme as Escrituras (Mt 22:41-46).

Jesus e os apóstolos apelaram para a Escritura a fim de mostrar que em Cristo seus tipos e profecias haviam encontrado cumpri­ mento. A maneira como Jesus foi concebido e a forma como nasceu cumpriu "o que fora dito pelo Senhor por intermédio do profeta” (Mt 1:22,23); o lugar de Seu nascimento fora predito “por intermédio do profeta” (Mt 2:5). Depois de ler a profecia messiânica regis­ trada em Isaías 61:1 e 2, Jesus declarou sole­ nemente àqueles que O ouviam: “Hoje, se cumpriu a Escritura que acabais de ouvir” (Lc 4:21). Anunciando Sua morte iminente, explicou ser necessário cumprir-se o que dEIe estava escrito em Isaías 53:12 (Lc 22:37). Depois de ressuscitar, mostrou aos discípu­ los que "importava se cumprisse tudo o que de Mim está escrito na Lei de Moisés, nos Profetas e nos Salmos” (Lc 24:44).

O apóstolo Paulo se refere ao AT como "Sagradas Escrituras” (Rm 1:2), “oráculos de Deus” (Rm 3:2) e “sagradas letras” (2Tm 3:15), títulos expressivos de sua ori­ gem e autoridade divinas.

Jesus e os apóstolos usavam a palavra “Escritura” ou “Escrituras” para se refe­ rir somente a um conjunto de escritos bem conhecidos e firmemente estabeleci­ dos. Quando Jesus disse aos líderes judeus: "Examinais as Escrituras” (Jo 5:39), ou quando Paulo arrazoou com os judeus em Tessalônica “acerca das Escrituras” (At 17:2), eles se referiam às Escrituras hebraicas — a lei, os profetas e os escritos.

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