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Movimento comparativo da análise dos aspetos linguístico-discursivos

IV. ANÁLISE TEXTUAL E COMPARATIVA

1. As quatro etapas de análise

1.3. Análise dos aspetos linguístico-discursivos

1.3.3. Movimento comparativo da análise dos aspetos linguístico-discursivos

enunciativas que marcam a presença do agente de produção tendem a enfraquecê-la, predominando escolhas que traduzem um discurso menos implicado.

No ponto seguinte, reúno os dados aqui evidenciados e, em perspetiva comparativa, apresento os resultados que permitem aferir o modo como mulheres e homens se implicam no processo textual e que escolhas (agentivas) traduzem um discurso implicado.

Figura 37. Caracterização formal dos textos de mulheres

No que respeita aos textos de homens, evidenciam, na sua globalidade, uma extensão de 14.571 palavras, integrando 277 parágrafos e 513 segmentos:

Figura 38. Caracterização formal dos textos de homens

Os dados identificados revelam que os homens tendem a produzir discursos mais longos que as mulheres, não comportando nenhum menos que a fronteira das 1000 palavras e excedendo, o maior, as 3000 palavras. A acompanhar essa tendência, observo que os textos de homens comportam mais parágrafos (277 contra 262) e mais segmentos textuais (513 contra 444). Nos textos de mulheres, o mais extenso é o TM3 e o menos extenso o TM6; e, nos textos de homens, o TH1 é o texto mais pequeno e o TH5 é o mais longo. Em suma, atesto que não há uma relação constitutiva entre os grupos de textos e a sua extensão e compartimentação, pelo que infiro decorrer de escolhas agentivas, que não afetam a configuração genológica dos textos, nem a sua caracterização como intervenções públicas, nem, ainda, parece relacionar-se com a finalidade comunicativa dos distintos grupos de textos.

Para além disso, verifico que o número de parágrafos não determina a maior ou menor ocorrência de segmentos, no entanto, quanto maior for o número de palavras (extensão), maior é, também, o número de segmentos.

Caracterização formal dos TMs

TM1 TM2 TM3 TM4 TM5 TM6 Total

Extensão 2260 978 2865 1887 2140 852 10.982

Paragrafação 44 26 49 58 56 29 262

Segmentação 81 44 109 68 99 43 444

Caracterização formal dos THs

TH1 TH2 TH3 TH4 TH5 TH6 Total

Extensão 1350 1654 2619 2442 3876 2630 14.571

Paragrafação 25 24 28 51 87 62 277

Segmentação 42 48 72 83 155 113 513

Caracterização formal dos TMs

TM1 TM2 TM3 TM4 TM5 TM6 Total

Extensão 2260 978 2865 1887 2140 852 10.982

Paragrafação 44 26 49 58 56 29 262

Segmentação 81 44 109 68 99 43 444

Caracterização formal dos THs

TH1 TH2 TH3 TH4 TH5 TH6 Total

Extensão 1350 1654 2619 2442 3876 2630 14.571

Paragrafação 25 24 28 51 87 62 277

Segmentação 42 48 72 83 155 113 513

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Relativamente aos segmentos textuais, onde procedi à identificação e ao levantamento das marcas linguísticas e enunciativas em ocorrência, tal como referi anteriormente, verifico que nos textos de mulheres ocorrem 448 tipos de discurso e, nos textos de homens, ocorrem 518. De um modo geral, nos textos de mulheres e de homens são mobilizados os tipos de discurso discurso interativo, relato interativo, misto interativo-teórico, discurso teórico e narração. No entanto, a sua incidência no processo de produção textual é distinta, privilegiando mulheres e homens tipos de discurso em detrimento de outros. No que respeita às mulheres, verifiquei que das 448 ocorrências, 245 são de discurso interativo, 148 de discurso teórico, 38 de misto interativo-teórico, 11 de relato interativo e 6 de narração. Assim, considerando os tipos de discurso do eixo da implicação os discurso interativo, o relato interativo e o misto interativo-teórico, nos textos de mulheres mobilizam-se 294 segmentos com implicação. Em contrapartida, considerando no eixo da autonomia (sem implicação) os tipos discursivos discurso teórico e narração, contabilizei 154 ocorrências. Nos textos de homens, observei que das 518 ocorrências, 271 são de discurso teórico, 188 de discurso interativo, 34 de relato interativo, 16 de misto interativo-teórico e 9 de narração. Dessa forma, nos textos de homens, atestei a presença de 238 segmentos que traduzem a implicação do agente de produção no texto e 280 segmentos em que o agente de produção opta por se distanciar (não implicação).

A figura abaixo dá conta destes dados, em perspetiva comparativa:

Figura 39. Estudo comparativo da ocorrência dos tipos de discurso ESTUDO COMPARATIVO: TIPOS DE DISCURSO

TMs THs

Tipos de discurso

Discurso interativo 245 188

Implicação

Modo de implicão

Relato interativo Misto interativo-teórico

11 38

34 16

Total segmentos de implicação 294 238

Discurso teórico 148 271

Narração 6 9 Não implicação

Total segmentos de autonomia 154 280

ESTUDO COMPARATIVO: IMPLICAÇÃO

TMs THs

Tipos de discurso Discurso interativo 245 188

Implicação

Grau de implicão

Relato interativo 11 34

Total 256 222

Marcas de implicação

1ª PS 261 129 forte

1ª PPl 141 205 atenuada

Em suma, constatei que dos tipos de discurso em ocorrência, o discurso interativo e o discurso teórico são os constituintes que prevalecem em ambos os grupos de textos (mulheres e homens). No entanto, nos textos de mulheres predominam os segmentos de discurso interativo e, ainda os segmentos que traduzem a implicação do agente de produção face aos segmentos em que não se implica. Já nos textos de autoria masculina, destaca-se o tipo de discurso teórico e, ainda, o conjunto dos tipos de discurso que traduzem a não implicação no texto.

Estas evidências permitem, num primeiro momento, projetar algumas conclusões promissoras: na configuração linguística da enunciação de mulheres e homens em posição de liderança, as mulheres tendem a optar por mecanismos linguísticos e enunciativos que mobilizam segmentos da ordem da implicação, semiotizando, com maior ênfase, o expor implicado (discurso interativo). Por seu turno, os homens dão preferência a uma enunciação que se pauta por escolhas que mobilizam segmentos da ordem da autonomia, semiotizando, sobretudo, o expor autónomo (discurso teórico). Apesar de estes dados ainda não serem suficientes para demonstrar como mulheres e homens se implicam nos textos que produzem, adiantam algumas hipóteses: mulheres e homens enunciam-se de forma substancialmente diferente, observando-se que os modos de representação das instâncias produtoras femininas apresentam pontos de contacto que os colocam em oposição às configurações discursivas encontradas nos textos de homens. Tal sugere, portanto, que as regularidades observadas nestes textos, num e noutro caso, traduzem uma tendência que parece constitutiva e representativa de uma configuração linguística própria, ou pelo menos comum, de instâncias produtoras femininas de um lado; e, do outro, de instâncias produtoras masculinas.

Para mostrar como as mulheres e os homens se implicam nos textos que produzem, procedi à identificação e destaque, nos segmentos de discurso interativo e relativo interativo (eixo da implicação), as marcas linguísticas e enunciativas que configuram as marcas de implicação, nomeadamente os nomes, as formas pronominais pessoais e possessivas, os determinantes possessivos e as desinências número-pessoais das formas verbais, de 1ª PS e de 1ª PPl.

Das análises a todos os textos do corpus resultaram as seguintes evidências: nos processos de implicação do agente de produção, verifiquei a coexistência de duas origens enunciativas, em que o agente de produção marca linguisticamente a sua presença com recurso a formas deíticas de 1ª PS ou a marcas deíticas de 1ª PPl. As marcas deíticas singulares pontuam uma responsabilização total do eu no dictum textual, em que o agir é

captado e representado de forma individual; e as marcas coletivas (pluralizadas) assinalam a diluição do agente de produção numa voz coletiva, em que a responsabilidade do dizer não decorre de uma ação individual, antes o agir é captado de modo coletivo e, portanto, atenuando o envolvimento do agente de produção no texto. Os valores das estratégias enunciativas de 1ª PS e de 1ª PPl marcam posicionamentos diferentes no processo de produção textual, ou seja, diferentes modos de implicação, que variam em grau: a implicação é forte nas formas de dizer eu e enfraquecida quando a instância se imbui num coletivo (nós) que integra e/ou que representa.

Para mostrar como mulheres e homens se implicam nos textos, baseei-me, nos textos de mulheres, nos dados linguístico-discursivos extraídos de 256 segmentos (245 de discurso interativo e 11 de relato interativo) e, nos textos de homens, de 222 segmentos (188 de discurso interativo e 34 de relato interativo). Nos textos de mulheres, contabilizei a ocorrência de 402 marcas de implicação, correspondendo 261 a marcas deíticas de 1ª PS e 141 a marcas de 1ª PPl. Nos textos de homens, atestei a presença de 334 marcas de implicação, sendo que 129 conformam marcas deíticas de 1ª PS e 205 de 1ª PPl.

A figura que apresento ilustra a ocorrência das marcas de implicação nos textos de mulheres e de homens, em perspetiva comparativa:

Figura 40. Estudo comparativo da ocorrência das marcas de implicação

De um modo geral, nos textos de mulheres aferi o recurso, com maior ênfase, às formas de 1ª PS, em detrimento das formas de 1ª PPl, revelando que as mulheres tendem a optar por estratégias linguísticas e enunciativas que traduzem uma implicação forte do eu no

ESTUDO COMPARATIVO: TIPOS DE DISCURSO

TMs THs

Tipos de discurso

Discurso interativo 245 188

Implicação

Modo de implicão

Relato interativo

Misto interativo-teórico 11

38 34

19

Total segmentos de implicação 294 241

Discurso teórico 148 271

Narração 6 9 Não implicação

Total segmentos de autonomia 154 280

ESTUDO COMPARATIVO: IMPLICAÇÃO

TMs THs

Tipos de discurso Discurso interativo 245 188

Implicação

Grau de implicão

Relato interativo 11 34

Total 256 222

Marcas de implicação

1ª PS 261 129 forte

1ª PPl 141 205 atenuada

Total 402 334

texto. Já os homens, para além de privilegiarem o recurso a segmentos de não implicação, nos segmentos em que se implicam, tendem a enunciar-se com recurso à forma deítica pluralizada (1ª PPl), com valor dilatado, traduzindo uma implicação atenuada no processo de produção textual. A adicionar a esta observação, sublinhando-a, constato que, apesar de os textos dos homens serem mais extensos, com um número de palavras relativamente maior face aos textos de autoria feminina, os textos de mulheres mobilizam mais marcas de implicação que os textos de homens.

Em suma, a partir dos dados coletados referentes às ocorrências dos tipos de discurso e das marcas de implicação nos textos de mulheres e nos textos de homens, concluo que, em conjunto, essas estratégias linguísticas e enunciativas permitem atestar como se configura linguisticamente a enunciação de mulheres e homens em posição de liderança e, ainda, como se implicam nos discursos que produzem. De forma geral, mulheres e homens recorrem a dois modos de se enunciarem: com implicação e sem implicação. Estes dois modos de enunciação evidenciam, ainda, outra especificidade – o grau de implicação. Nas situações discursivas em que não há implicação, o grau de implicação é nulo. Nas situações discursivas em que se indicia a presença do agente de produção, o recurso a formas deíticas de 1ª PS evidencia um grau de implicação forte no texto, e o recurso às marcas de 1ª PPl, um grau de implicação atenuada.

De forma específica, no que respeita à configuração linguístico-discursiva da enunciação de mulheres e homens em posição de liderança, verifico que nos textos de mulheres predominam regularidades materializadas por marcas de implicação que traduzem a tendência para um forte envolvimento da instância produtora feminina no processo de produção textual. Assim, admito que a maior parte da enunciação das autoras visadas mobiliza segmentos de discurso interativo, assinalando a equivalência entre a instância produtora do texto e o autor (e ator) dos processos evocados. Posso, assim, adiantar que as mulheres se representam, prevalentemente, no mundo do expor, numa relação de conjunção entre as coordenadas que organizam o conteúdo temático e as da ação de linguagem; e de implicação, numa relação que se estabelece entre as instâncias de agentividade e os parâmetros da ação de linguagem. Pelo contrário, e embora as instâncias produtoras masculinas mobilizem processos discursivos da ordem do expor implicado, observo o predomínio de segmentos da ordem da autonomia, em que a relação entre as instâncias de agentividade e os parâmetros da ação de

linguagem não é explicitada, mobilizando, com maior predomínio, o discurso teórico, e evidenciando, ainda, uma implicação nula do eu no texto.

Quanto à implicação de mulheres e homens em posição de liderança, apesar da evidente presença de indícios linguístico-enunciativos que remetem para a representação do agir do agente de produção, quer de forma individual (marcas de 1ª PS), quer coletiva (marcas 1ª PPl), nos textos de homens atesta-se o predomínio das formas deíticas de 1ª PPl e, nos textos de mulheres, pelo contrário, as formas pluralizadas são categoricamente ultrapassadas pelo privilégio de “dizer eu”. A forte presença do eu, como forma dominante, traduz uma clara tendência para a mulher se enunciar de forma implicada e assumir-se como ator dos processos verbalizados.

Com efeito, tendo sido atestados diferentes posicionamentos enunciativos, que reiteram a hipótese, avançada por Maria de Lourdes Pintasilgo, de que mulheres e homens falam de forma diferente, o facto de se observarem valores altos relativamente às formas de implicação das mulheres faz prever a possibilidade de se confirmar a tendência para as mulheres se implicarem, mais do que os homens, nos textos que produzem.

Subsequentemente, equaciono a possibilidade de essa materialidade linguística/discursiva configurar uma atitude (específica/efetiva) de liderança. Assim, no ponto seguinte, a partir da análise evidenciada nesta secção em articulação com a identificação das figuras de ação, dou conta do modo como a representação do agir de mulheres e homens é marcada discursivamente.