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Formação de Professores: anos finais do século XX e a aurora do

4.2 Movimento dos educadores e a educação a distância

A Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação – ANFOPE (1998) defendia de forma intransigente a necessidade dos órgãos oficiais, em particular o MEC e as Secretarias Estaduais de Educação, de uma definição dos princípios basilares de uma política educacional global que contemplasse a formação e profissionalização do magistério. As alternativas inovadoras que se desenhavam no cenário educacional exigiam novas propostas de redimensionamento da Universidade Brasileira.

Era preciso (Idem, ibidem, 1998) que se estabelecesse uma política nacional pública para delimitar e garantir a implantação de programas de educação inicial e/ou continuada nesta modalidade de EaD. A entidade reafirmava a posição de fortalecer as Faculdades e Centros de Educação como espaços privilegiados para a formação dos profissionais de educação, alertando para a importância da formação continuada dos docentes, aproveitando oportunidades para reflexões sobre a ação profissional e os novos meios para desenvolver o trabalho pedagógico.

A ANFOPE chamava a atenção para um aspecto fundamental, a par da questão do financiamento, que é o redimensionamento da Universidade. Era preciso redimensionar a Universidade? Por quê? Ora, a EaD redimensiona a relação professor/aluno, a relação de tempo e de espaço e os processos de gestão e administração pedagógicas. Cria o papel do professor tutor ou orientador acadêmico. Privilegia a construção de material didático que mediatiza o diálogo entre os (re) construtores do conhecimento. Isso tudo demanda toda uma logística tanto na sede central (coordenação) quanto nos pólos (centros associados) e uma infraestrutura tecnológica para o processo pedagógico, portanto, já é suficiente para

outras áreas nas quais sejam previstos conhecimentos pedagógicos. Artigo 14 – A Licenciatura em Pedagogia, nos termos dos Pareceres CNE/CP n.º5/2005 e 3/2006 e desta Resolução, assegura a formação de

determinar uma nova concepção de gestão e organização do trabalho acadêmico frente à EaD.

A participação das Faculdades e/ou Centros de Educação em todos os programas de educação a distância é importante porque está dentro de sua área epistemológica, por outro lado, é fundamental a parceria e o diálogo daquelas com as outras áreas do conhecimento (comunicação, administração, informática, designers etc.) que vêm contribuindo com o desenvolvimento de cursos e programas de EaD. As relações inter e multidisciplinar são uma das características epistemológicas que proporcionam qualidade acadêmica a essa modalidade educativa. Sem essa mudança ou postura político-pedagógica frente aos programas de EaD, corre-se o risco de se transplantar o modelo presencial, tradicional para uma modalidade que se instala e se sustenta sob novo paradigma.

Os paradigmas emergentes (MORAES, 1997, 2002, 2003, 2004, 2005a, 2005b, 2006; MORAES & LA TORRE, 2004, 2006; OLIVEIRA, 2003; BEHRENS, 1999, 2003, 2006) que surgem com o desenvolvimento científico e tecnológico, com o aprimoramento das tecnologias de comunicação e informação e com o processo de globalização política, cultural e econômica são fatores multidimensionais e nodais que devem ser profundamente estudados e incorporados, criticamente, aos processos educativos presenciais e/ou não presenciais.

No encontro de 200296 (ANFOPE, 2002), os educadores sinalizaram que a EaD necessitava de uma infraestrutura básica, consistente tecnologicamente, além de profissionais capazes de elaborar o material impresso ou eletrônico que chegaria até aos alunos. Assim, bibliotecas, computadores, salas de multimeios, diferentes softwares seriam algumas exigências fundamentais para cursos de EaD. Os tutores ou monitores deveriam ser professores que dominassem a metodologia e os conteúdos para que estabelecessem uma mediação competente junto aos alunos. A EaD exige dos educadores uma nova postura diante das complexas e interdependentes multidimensionalidades existentes no real.

Para a ANFOPE (2004) a obrigatoriedade em atender às disposições transitórias da LDB (art.87, parágrafo 4.º) para que todos os profissionais da educação que atuam na Educação Básica tenham formação em nível superior, tem forçado-os a se submeterem,

profissionais da educação prevista no artigo 64, em conformidade com o inciso VIII do artigo 3º da Lei n.º 9.394/96 (LDB).

após a jornada de trabalho, a estudos à noite, fins de semana e até durante as férias97 para obterem o diploma de graduação em nível superior. Para a entidade, esses cursos de formação em serviço apresentam qualidade duvidosa e são, em grande parte, pagos pelos próprios professores. São cursos demandados pelas prefeituras que os terceirizam ou “contratam as IES”.

Embora haja pertinência na afirmação de que muitas vezes os cursos são pagos pelos professores, por outro lado, há décadas se argumenta a respeito da ampliação de vagas em nível superior, mas a realidade tem mostrado que a demanda pelo nível superior não acompanha o aumento de vagas. A demanda, hoje, não é apenas daqueles que estão terminando o Ensino Médio, mas daqueles que estão em serviço e precisam continuar sua qualificação/formação.

O cenário envolve várias situações. Aqueles que precisam entrar no mercado de trabalho, ou que já estão e procuram melhorar sua qualificação para competir no mercado de trabalho excludente, e aqueles que já estão, mas que sem um aperfeiçoamento na graduação ou na pós-graduação, também correm o risco de estarem fora do mercado.

Esta situação obrigaria ao Estado a definição e a implantação de uma política de ampliação de vagas e de atendimento a um contingente de profissionais da educação que estão em serviço e precisam de qualificação/formação. Uma política educacional não se instala em apenas um governo porque não pode e não deve ser uma política de partido e sim de Estado (MELLO, 1990, 1993, 2004; VIEIRA, 2001; HÖFLING, 2001; SA, 2004).

Uma política educacional voltada para o nível superior que atenda às necessidades dos profissionais da educação terá que levar em conta a realidade econômica e social desses trabalhadores, porque não basta apenas abrir vagas, facilitar o acesso, se o professor não tiver condições de permanecer num curso, por exemplo, presencial.

A entidade ainda faz, genericamente, severas críticas à maioria dos cursos de formação na modalidade de EAD, dizendo que eles se apresentam como [...] uma forma de aligeirar e baratear a formação “[...] A educação a distância, no Brasil, por isso mesmo, tende a ser pensada mais como um política compensatória que visa suprir a ausência de oferta de cursos regulares” (ANFOPE, 2004, p.28).

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Em verdade a crítica é pertinente, mas parcial, porque não identifica as iniciativas aligeiradas e de qualidade duvidosa, daquelas experiências sérias e exitosas que existem desde a década de noventa, em termos de graduação em nível superior na área de formação de professores.

Evidentemente que a EaD pode sofrer todo o tipo de precarização, de desconfiguração dos objetivos educacionais como vem sofrendo a dita educação presencial. Pode-se ter qualidade tanto na educação presencial quanto na EaD; pode-se ter aligeiramento tanto na educação presencial quanto na EaD; o professor pode estar distante tanto na presencial quanto na EaD.

O importante é estudar e avaliar as experiências existentes há mais de uma década em relação à formação de professores na EaD no Brasil e fazer dessas experiências um arcabouço que se possa fundamentar e colaborar no aperfeiçoamento dessa modalidade educativa alternativa para os profissionais da educação, sobretudo, para aqueles que precisam estudar e se qualificar a fim de conquistar formas dignas de trabalho e cidadania.

Barreto (2004) refletindo sobre a incorporação das tecnologias da informação e da comunicação à EaD critica as políticas governamentais entendendo que são frutos de acordos internacionais para a concessão de créditos aos países do terceiro mundo. Para essa pesquisadora as propostas oficiais de EaD expressam o esvaziamento da formação de professores no Brasil, deslocando da formação inicial presencial, para a capacitação em serviço e para a reciclagem utilizando-se intensamente da EaD, via Internet.

É inegável a hegemonia do movimento de virtualização do ensino, na perspectiva de e-learning, cuja tradução mais comum tem sido ‘educação via Internet’: uma forma de aprendizagem em que a mediação tecnológica é destacada, nos mais diversos ‘ambientes de aprendizagem’ ” (Idem, ibidem, p.1196).

A unidade ensino-aprendizagem é fracionada, supondo que o ensino é “assumido” pelos materiais que suportam as alternativas do e-learning. O professor, segundo Barreto (2004), sofre um deslocamento em relação ao papel que ocupava até então como mediador entre o ensino e a aprendizagem.

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Assim, por exemplo, em iniciativas que pretendem potencializar os processos presenciais pelo recurso às TIC, como nos cursos chamados ‘semi-presenciais’, não há um redimensionamento da carga horária e da remuneração dos professores para incluir o tempo despendido na leitura dos textos dos alunos nos fóruns ou em listas de discussão, na resposta a e-mails etc. O que o recurso às TIC, na perspectiva da substituição tecnológica, viabiliza é justamente o oposto: processo de subcontratação, de trabalho em tempo parcial e de terceirização (Idem, ibidem, p.1192).

Embora não se possa desconhecer as implicações políticas e econômicas que capitaneiam as definições das ordenações jurídicas do Estado, bem como das relações entre os Estados nacionais na alta modernidade globalizada, é preciso reconhecer o papel inexorável e presente que as tecnologias de informação e da comunicação tem na vida do cidadão contemporâneo. O tempo é uma flecha que não retorna ao passado e, portanto, os processos de formação humana que se diversificam para além do modelo fabril de escola, concebidos na modernidade, precisam como no caso da EaD, ser criticamente incorporados, mas não podem mais ser negados.

É preciso encontrar mecanismos de valorização do professor, mas é preciso que esse profissional não se furte a dialogar e a analisar as possibilidades que, contraditoriamente, as tecnologias da informação e da comunicação trazem enquanto ferramentas, meios de potencializar a formação e a qualificação profissional.

A Internet apresenta uma concepção social de aprendizagem que se realiza na interação entre os sujeitos. “Instaura-se uma nova relação professor-aluno centrada no diálogo, na ação compartilhada, na aprendizagem colaborativa na qual o professor é um mediador” (FREITAS, 2006, p.196).

A utilização das tecnologias da informação e da comunicação aos processos de formação e qualificação exige novas práticas educativas que induzem alterações na organização curricular. Isso exige a redefinição do papel do professor. Estudantes e docentes podem desenvolver suas atividades em diferentes horários e lugares. A sala de aula se amplia. Com isso também amplia-se o contingente de pessoas que podem ser incluídas nesses ambientes virtuais (Internet) como os deficientes físicos, os hospitalizados, os detentos, as pessoas idosas etc., permitindo que participem, que interajam num processo de aprendizagem colaborativa.

Mas a atuação qualificada do professor estará relacionada à: “[...] reorganização estrutural da carreira docente e da melhoria significativa da sua formação, adaptando-a às novas exigências sociais e oferecendo-lhes condições de permanente aperfeiçoamento e constante atualização” (KENSKY, 2003, p.94)

No âmbito das entidades representativas dos profissionais da educação no Brasil, a ANFOPE (Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação), em seu documento Políticas Públicas de Formação de Profissionais da Educação tem manifestado suas críticas em relação à utilização indiscriminada da modalidade de educação a distância, ressaltando que a formação de professores, sempre que possível, deve ser presencial, além de estar vinculada a instituições que tenham experiência comprovada em formação inicial de professores. Segundo a entidade a maioria dos cursos de formação na modalidade de EAD, no Brasil, contraria os requisitos de qualidade e apresenta-se com formatação que possibilita uma aceleração e um barateamento da formação (ANFOPE, 2004, p.27-28).

Embora se possa concordar com a preocupação da entidade de que haja uma aceleração, um barateamento e uma indústria da certificação, entende-se que não é singularidade da EAD esse tipo de distorção, mas que se pode encontrar muito nachamada educação presencial em todos os níveis de ensino98. Cabe ao Estado, à Sociedade Civil organizada, às Instituições de Ensino Superior e às entidades como a ANFOPE zelarem pela qualidade da educação em geral. Cabe aos Conselhos Nacional, Estadual e Municipal de Educação a devida aplicação dos indicadores de qualidade e da legislação que normatizam a EaD no Brasil para garantir a qualidade do ensino e da aprendizagem nesta modalidade educativa.

Ao longo dos anos noventa do século passado, o Estado empreendeu uma política de privatização dos serviços públicos, entre os quais a educação (NEVES, 2000, 2002;

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Historicamente, as práticas de EAD foram, e ainda são alvo de inúmeras críticas e preconceitos em relação à modalidade de educação presencial por não permitir o contato de uma relação face a face, na qual, ‘em tese’, é possível promover a interação, a troca de saberes, conhecimentos, experiências entre sujeitos e objetos do conhecimento. Destaco a expressão ‘em tese’, devido à não-garantia de relações interativas apenas pelo motivo do encontro face a face, uma vez que encontramos nas diversas análises e críticas feitas ao currículo disciplinas e tradicional, organizado para uma comunicação unilateral, centrada na retórica do professor que, muitas vezes difunde as informações encontradas em significantes – livros didáticos, vídeos etc. - não contextualizados e, muito menos , produzidos pelos sujeitos cognoscentes. Atitudes como essas provocam distâncias de variada natureza, mesmo estando os sujeitos geograficamente próximos. A distância geográfica exige interfaces que permitam uma comunicação efetiva entre os sujeitos no processo de trabalho, logo de aprendizagem (SANTOS, 2002, P.116).

FREITAS, 2002; CURY, 2002; PERONI, 2003; BRZEZINSKI, 1997). Isto contribuiu para que o mercado abarcasse e absorvesse os recursos metodológicos disponibilizados pela educação a distância com fins de garantir a expansão dos seus serviços educacionais.

Por outro lado não quer dizer que a educação a distância não possa trazer contribuições significativas para a expansão e aperfeiçoamento qualitativo dos sistemas de ensino, sobretudo para o ensino superior, incorporando as diversas mídias existentes, convergindo num sistema de educação a distância que possibilite condições diferenciadas de aprendizagem e acesso ao conhecimento científico e tecnológico.

É preciso pensar que o Estado onipresente não existe dentro do atual contexto globalizado e globalizante, o que torna necessário o estabelecimento de parcerias com instâncias da sociedade civil (KENSKI, 2003; MELLO, 1990, 1993). O próprio desenvolvimento científico e tecnológico exige uma interface constante entre o Estado enquanto formulador de políticas públicas nacionais, e a dinâmica complexa e contraditória do mercado.

A Universidade Federal do Paraná, ao final dos anos 90 e início do século XXI, criou o Núcleo de Educação a Distância que passou a ofertar em nível de pós-graduação um curso de aperfeiçoamento e outro de especialização, bem como, implantou também um curso de graduação na área de formação de professores na modalidade de EaD (objeto deste trabalho) desenvolvido por meio de convênios (FORGRAD, 2002, p.22) de cooperação técnica, celebrados com instituições públicas e com organizações privadas (POLAK et al. 1998).

Cursos de formação de professores em nível superior na modalidade de