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2. Organizações no Agronegócio de Base Econômica Familiar

2.5. Mudança nos Valores e no Olhar dos Gestores

Para Wheatley (2006), os sistemas que se auto-organizam apresentam as seguintes características:

• Capacidade de responder continuamente à mudança; • Estruturas e soluções temporárias;

• Recursos e pessoas se juntando para criar novas iniciativas e para responder a novos regulamentos e alterar processos;

• Surgimento de líderes, conforme a necessidade de cada momento; • Poucos níveis hierárquicos de administração;

• Experimentação como norma;

• Processo permanente de auto-organização.

Embora sejam características atualmente desejadas pelos gestores, segundo Agostinho (2003), a Administração Clássica usa grande parte de seus esforços de gestão para restringir a auto-organização, seja por controle burocrático ou pela limitação dos canais de comunicação. A disciplina da Administração, Relações Humanas, preconiza que as redes informais devem ser consideradas como algo a ser controlado – já que não podem ser extintas.

Os administradores com tendência mecanicista costumam aferrar-se à crença de que poderão controlar a organização se compreenderam de que modo todas as partes se juntam. O fato de cotidianamente as pessoas contradizerem essa crença os leva a estudar de modo ainda

mais detalhado os mecanismos administrativos a fim de ser capazes de controlar as pessoas. Neste ponto, é fundamental registrar que as máquinas podem ser controladas, mas, de acordo com a compreensão sistêmica da vida, o sistema vivo só pode ser perturbado. As organizações não podem ser controladas por meio de intervenções diretas, mas podem ser influenciadas por impulsos, não por instruções (CAPRA, 2005).

Nessa idéia está o cerne de uma profunda mudança no estilo de gestão, pois exige uma revisão de mundo. Porém, quando ocorre traz consigo grandes avanços. Quando se trabalha com os processos intrínsecos dos sistemas vivos, não há necessidade de despender um excesso de energia para pôr a organização em movimento, empurrá-la, puxá-la ou forçá-la a mudar. O ponto central não é a força ou a energia: é o significado. Perturbações significativas podem chamar a atenção da organização e desencadear mudanças estruturais (CAPRA, 2005). A diferença fundamental entre os dois modelos está em como se dá a coordenação de ações. No comando e controle, os pedidos ocorrem sem discussão da aceitação ou não da tarefa e de suas condições de satisfação, enquanto por outro lado pela “perturbação” existe uma negociação entres as partes e uma compreensão do significado do pedido. Isso pode gerar um círculo virtuoso uma textura de confiança fundamentada fatos verificáveis e não em vagas percepções. Um ambiente de confiança como esse é a base para surgimento de relacionamentos, para que as informações sejam trocadas livremente e que o propósito seja buscado de maneira criativa. Em outras palavras, esse é o ambiente propício para que surja a auto-organização.

Além disso, é importante destacar que pessoas inteligentes e atentas quase nunca executam ao pé da letra as instruções recebidas. Sempre as modificam e reinterpretam, ignoram algumas partes e acrescentam outras. Isso muitas vezes pode ser considerado como sabotagem, porém, são reações criativas a perturbação, pois é nisso que reside a vida. Com suas respostas criativas, as redes vivas dentro das organizações geram comunicação de significados e afirmam sua liberdade de recriar-se continuamente. Essa condição colaborativa é especialmente importante para as atuais organizações voltadas para o conhecimento.

Reconhecer a organização como sistema complexo implica gerencialmente não em controlá-los, mas em promover condições adequadas para que o fenômeno da auto- organização ocorra. Isso consiste em: delegar autonomia de decisão aos indivíduos e às equipes; criar condições e manter o surgimento de relações colaborativas baseadas em autêntica confiança mútua; gerenciar os agregados ou subgrupos para que contribuam de maneira sinérgica para os “resultados”.

Finalmente, usar os domínios identidade, informação e relações para o surgimento e manutenção da auto-organização faz com que o sistema complexo alcance tanto os objetivos individuais como globais.

Segundo Agostinho (2003), não é necessário o abandono da idéia de projetos, planejamentos ou lideranças, mas o reconhecimento da existência de forças auto-organizativas que influenciam a eficácia das ações gerenciais, e, por conseguinte, podem alterar os resultados esperados.

Wheatley (2006) afirma que a auto-organização não é novidade, ela sempre existiu, mas precisamos de um novo olhar para vê-la. No entanto, a atenção dos gestores está voltada para o aperfeiçoamento de controles e mecanismos que supostamente fariam as empresas alcançarem seus resultados. Elas de alguma forma estão usando as informações, as relações e a identidade como forma de chegar ao resultado. Trabalha-se com quaisquer relações que o sistema permita, contornando-o para fazer as conexões que podem aumentar a eficácia. Ao fazerem o trabalho e tomarem decisões, os funcionários têm como referência a identidade organizacional.

Echeverría (2005) corrobora essa idéia. Ele define uma empresa como uma rede estável de conversações, esse enfoque mostra que as organizações são fenômenos lingüísticos: unidades construídas a partir de conversações específicas, baseadas na capacidade de os seres humanos efetuarem compromissos mútuos quando se comunicam entre si. A organização tem uma identidade que transcende os indivíduos que a compõem, pois ela é o relacionamento desses indivíduos interna e externamente. Essa identidade lhe dá vida própria e capacidade de agir e ser responsável pelos efeitos desta ação.

Quando os erros ou problemas surgem, o verdadeiro trabalho é examinar os domínios de auto-organização e determinar o que está acontecendo nesse nível subterrâneo. Na administração clássica das organizações, o entendimento é que os problemas se revelam em comportamentos, processos e estruturas. O diagnóstico, portanto, é substituir os elementos problemáticos por novos comportamentos, processos ou estrutura. Isso, no entanto, raramente funciona, pois os problemas são artefatos de dinâmicas mais profundas que ocorrem nos domínios da informação, das relações e da identidade. Ao investigar esse nível mais profundo, o coração dinâmico da organização, tanto o problema quanto a solução, serão localizados. Se a auto-organização já existe nas organizações – se as pessoas estão naturalmente tentando se auto-organizar – então cabe aos gestores criar condições que favoreçam mais efetivamente essa capacidade (WHEATLEY, 2006).

A auto-organização nos remete a diferentes idéias e formas de organizar. De que outra maneira se poderia criar organizações resilientes, inteligentes, rápidas e flexíveis? Como conseguir se auto-organizar com sucesso, no ritmo acelerado que o tempo atual exige, a não ser admitindo que as organizações funcionam como seres vivos? Esse é um processo que já se iniciou e ruma para uma nova compreensão de maneira insistente e irrecusável.

O capítulo a seguir mostra como as redes das organizações funcionam também de forma sistêmica, e apresenta a disciplina Análise de Redes Sociais, que foi utilizada para a criação de um modelo de diagnóstico das relações de organizações sob o enfoque da auto- organização e confiança.