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Não cabe condenar por fatos distintos nem pessoas distintas das dispostas na

3.3 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DA IMPUTAÇÃO DISCIPLINAR E SUAS

3.3.2 Princípio acusatório

3.3.2.2 Não cabe condenar por fatos distintos nem pessoas distintas das dispostas na

A determinação do conteúdo da imputação não pode ficar nas mãos do julgador, pois

se colocaria em perigo sua imparcialidade ante os fatos e sujeitos que deve julgar.

210

Esse conceito-chave para a compreensão dessa exigência é o objeto do processo.

211

O

objeto do processo é constituído por fatos que se imputam a uma pessoa determinada, a

qualificação jurídica e a pena a ser imposta em razão daqueles.

Consideramos que a essência do princípio acusatório reside na necessária existência

prévia de uma imputação, cujo objeto, em seus elementos essenciais, permaneça invariável ao

longo de todo o processo, e não exclusivamente na separação de funções (acusador e julgador)

à que a jurisprudência e a doutrina tradicionalmente se referem.

212

São precisamente a

preexistência e o conhecimento dessa imputação que permitem ao sujeito preparar e traçar

uma estratégia de defesa para contraditar a imputação, o que possibilita o exercício do direito

à ampla defesa e do contraditório.

Isto congrega uma certa, mas não absoluta, correlação objetiva e subjetiva entre

imputação e decisão.

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210 Leciona Fernando da Costa Tourinho Filho que, "iniciada a ação, quer no cível, quer no penal, fixam-se os contornos da res in judicio deducta, de sorte que o Juiz deve pronunciar-se sobre aquilo que lhe foi pedido, que foi exposto na inicial pela parte. Daí se segue que ao Juiz não se permite pronunciar-se, senão sobre o pedido e nos limites do pedido do autor e sobre as exceções e nos limites das exceções deduzidas pelo réu. […] isto é, o Juiz não p ode dar mais do que foi pedido, não pode decidir sobre o que não foi solicitado". (TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. v. 1, 30. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 153.) 211 “Em el processo penal la vigência de los princípios de necessidade y oficialidade determinan que las partes no

tengan el monopólio sobre a configuración del objeto do processo. Si el processo penal se pone em marcha desde el momento em que consta la perpetración de unos hechos punibles por uma persona determinada, el objeto del processo penal no puede ser outro que el hecho criminal imputado y la persona a quien se imputa. Este Objeto se caracteriza por su inmutabilidad, pues no puede ser cambiado ni eliminado, es dicer, es indisponible para las partes tanto desde el punto de vista fáctio y jurídico. Los elementos essenciales del objeto del processo penal son, por tanto, el fato criminal imputado y la persona acusada”. (GÓMEZ COLOMER, Juan Luis. Constituición y Processo Penal. Madrid: Tecnos, 1996, p. 94.)

212 De acordo com Luigi Ferrajoli, entre todos os elementos constitutivos do modelo teórico acusatório, “o mais importante, por ser estrutural e logicamente pressuposto de todos os outros, indubitavelmente é a separação entre juiz e acusação”. (op. cit., p. 454.) Na mesma linha, afirma Gustavo Henrique Righi Ivahy Badaró que “o sistema acusatório relaciona-se à concepção de processo de partes, em que há uma nítida separação entre julgador e acusador, o qual se contrapõe ao acusado em igualdade de posições”. (BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Ônus da prova no processo penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p.102-103).

3.3.2.2.1 Correlação subjetiva

A decisão da autoridade instauradora só pode se referir ao sujeito ou sujeitos que

previamente tenham sido acusados,

213

ou, no caso do processo administrativo disciplinar

federal, que tenham sido acusados e indiciados.

214

O agente público submetido a um processo

não pode ser considerado um objeto daquele no sentido de recair sobre ele as investigações e

as provas, mas que atua no processo como um sujeito a quem assistem determinados direitos,

entre eles e fundamentalmente o direito de defesa.

3.3.2.2.2 Correlação objetiva

A decisão da autoridade instauradora só pode condenar ou absolver por aqueles fatos

que constam da imputação e do termo de indiciamento e não outros distintos, pois só deles

terá o acusado se defendido. É, portanto, necessário para a efetividade da defesa o

conhecimento dos fatos que conformam a imputação com todas as suas circunstâncias. O

julgador não pode adentrar a fatos que não estejam referidos na imputação, sobre os quais o

acusado não pôde se defender por sobre eles não ter conhecimento; o julgador não pode

condenar por fatos distintos daqueles que integraram a imputação.

Diz Fernando da Costa Tourinho filho que,

[...] iniciada a ação, quer no cível, quer no penal, fixam-se os contornos da res in

judicio deducta, de sorte que o Juiz deve pronunciar-se sobre aquilo que lhe foi pedido, que foi exposto na inicial pela parte. Daí se segue que ao Juiz não se permite pronunciar-se, senão sobre o pedido e nos limites do pedido do autor e sobre as exceções e nos limites das exceções deduzidas pelo réu. [...] isto é, o Juiz não pode dar mais do que foi pedido, não pode decidir sobre o que não foi solicitado.215

Júlio Fabbrini Mirabete, por seu turno, esclarece que

[...] não pode haver julgamento extra ou ultra petita (ne procedat judex ultra petitum

et extra petitum). A acusação determina a amplitude e conteúdo da prestação

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213

“Nadie puede ser condenado sin haber sido previamente acusado”. SENDRA, Vicente Gimeno. Derecho Procesal Penal. Madrid: Colex, 1996.

214 Lei nº 8.112, de 1990: “Art. 161. Tipificada a infração disciplinar, será formulada a indicação do servidor,

com a especificação dos fatos a ele imputados e das respectivas provas. § 1o O indiciado será citado por

mandado expedido pelo presidente da comissão para apresentar defesa escrita, no prazo de 10 (dez) dias, assegurando-se lhe vista do processo na repartição”.

215 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. v. 1, 30. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 165.

jurisdicional, pelo que o juiz criminal não pode decidir além e fora do pedido em que o órgão da acusação deduz a pretensão punitiva. Os fatos descritos na denúncia ou queixa delimitam o campo de atuação do poder jurisdicional.216

A imparcialidade e o princípio acusatório impossibilitam ao julgador determinar por si

mesmo os fatos que se imputam e o sujeito ao qual se imputa. O que pode, isto sim, segundo a

doutrina e jurisprudência

217

, do que discordamos, é dar nova qualificação jurídica aos fatos e

impor pena diversa daquela sugerida pela comissão processante.

Para nós, a vinculação do julgador é dupla: por um lado, quantitativa, já que não pode

impor pena mais grave do que a sugerida pela comissão processante, mas apenas reduzi-la,

pois defendemos que a capitulação jurídica e a possível pena aplicada devem integrar a

notificação inicial, sobre ela incidindo a dilação probatória; de outro, encontra-se ante uma

vinculação qualitativa referida ao fato determinado sobre o que recaíram toda a atividade

probatória e a defesa.

A solução que mais se coaduna com a ampla defesa, o contraditório e o próprio

princípio acusatório é – caso entenda o julgador que a comissão processante incidiu em erro

no que concerne aos fatos e à qualificação jurídica, desde que fundamente

218

adequadamente

sua decisão – anular os trabalhos realizados e determinar que uma nova comissão refaça o

processo.

219

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216 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Processo Penal. 10. ed. São Paulo: Atlas, 1999, p. 81.

217 Superior Tribunal de Justiça: “O indiciado se defende dos fatos que lhe são imputados e não de sua classificação legal, de sorte que a posterior alteração da capitulação legal da conduta não tem o condão de inquinar de nulidade o processo”. Precedentes: (MS 14.045/DF, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Terceira Seção, DJe 29.4.2010; MS 10.128/DF, Rel. Min. Og Fernandes, Terceira Seção, DJe 22.2.2010; MS 12.386/DF, Rel. Min. Felix Fischer, Terceira Seção, DJ 24.9.2007, p. 244” (STJ, MS 12.677/DF, 1ª Turma, DJE, de 20/04/12.

Supremo Tribunal Federal: “Possível alteração da capitulação legal, pois o acusado se defende dos fatos, e não da classificação jurídica. Basta que os fatos sejam minuciosamente descritos na indiciação, de molde a permitir o exercício do direito de defesa pelo acusado. Não é necessária a abertura de novo prazo para a defesa no caso de reenquadramento típico pela autoridade julgadora”. Recurso em Mando de Segurança nº 24526.

218 Neste sentido, a lição de Léo da Silva Alves: “Ademais, por ser um ato de julgamento, equipara-se o administrador público, neste particular, ao magistrado a quem a Constituição Federal deu o dever de motivar os seus julgados”. (ALVES, Léo da Silva. Curso de Processo Disciplinar. Brasília: Cebrad, 2008, p. 257.

219 Neste sentido a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal: “Não é possível falar-se em vício procedimental ou violação do direito de defesa quando o julgamento final da autoridade competente atribui peso maior ou menor aos fatos comprovados pela investigação. Refiro-me aos seguintes precedentes, entre outros: MS 21.635, rel. min. Carlos Velloso, Pleno, DJ 20.04.1995; MS 22.791, rel. min. Cezar Peluso, Pleno, DJ 19.12.2003; RMS 24.536, rel. min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, DJ 05.03.2004; RMS 25.105, rel. min. Joaquim Barbosa, Segunda Turma, DJ 20.10.2006”. (RMS 25.910, 2ª Turma, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJe de 25/05/12.)

3.3.2.3 Imparcialidade do julgador

A garantia da imparcialidade do julgador se pretende conseguir, junto com as

exigências já analisadas, mediante a distinção entre as funções de instrução ou investigação e

de julgamento, que recaem necessariamente em pessoas ou órgãos distintos.

220

Uma vez estabelecidas as notas definidoras deste princípio, cremos conveniente

realizar algumas considerações que podem servir para clarificar a confusão que às vezes se

faz entre este princípio e os do contraditório e da ampla defesa. Podemos considerar que, se

decide e aplica sanção com base em um elemento essencial do objeto do processo distinto ao

colocado na imputação, o julgador está violando o princípio acusatório, e não o do

contraditório, independentemente de as partes deles terem tido efetiva oportunidade de se

defender ou de a defesa deles ter servido tanto a um como a outro. Por outro lado, quando o

julgador se desvincula dos elementos que não são essenciais ao objeto do processo, não

vulnera o princípio acusatório, mas pode vulnerar o princípio do contraditório, desde que não

outorgue às partes possibilidade de manifestar-se e defender-se a respeito de ditos elementos.

Desde o momento em que nos deparamos diante de fatos nos quais pode haver

violação de um desses princípios – deixando totalmente a salvo o outro –, podemos afirmar

que estamos ante postulados diferentes que atendem a necessidade e finalidade diversas, se

bem que a conexão entre eles, como garantia do devido processo, é evidente.

Com efeito, o princípio acusatório tem validade se partirmos da premissa de que

aquele atende a atuação do órgão julgador mediante a parte (imparcialidade) e o objeto do

processo (vinculação a seus elementos essenciais). O princípio do contraditório se refere, por

seu turno, à intervenção das partes no processo, garantindo que conheçam a imputação que

pesa sobre elas, sejam efetivamente ouvidas durante a instrução processual e se lhes dê a

oportunidade de se defenderem a respeito de todas as matérias de fato e de direito que possam

influir na decisão do julgador.

221

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220 Ao apreciar o “caso De Cubber” (26 de outrubro de 1984), anotou o Tribunal Europeu de Direitos Humanos que “La atividade instructora, em cuanto pone al que la lleva a cabo em contacto direto com el acusado y com los hechos y datos que deben servir para averiguar el delito y sus posible responsables, puede provocar em el ánimo del instructor, incluso a pesar de us mejores deseos, prejuicios o impressiones a favor o em contra del acusado, que influyan a la hora de sentenciar. Incluso aunque ello no suceda, es difícil evitar la impresión de que el Juez no acomete la función de juzgar sin la plena imparcilaidad que le es exigible”.

221 A imparcialidade do juiz ou julgador administrativo para conhecer de um caso foi definido pela Corte Interamericana de Direitos Humanos com maior claridade ao apreciar o caso Apitz Barbera e Outros vs Venezuela, como aquele critério que “exige que el juez que interviene en una contienda particular se aproxime

a los hechos de la causa careciendo, de manera subjetiva, de todo prejuicio y, asimismo, ofreciendo garantías suficientes de índole objetiva que permitan desterrar toda duda que el justiciable o la comunidade puedan

A noção de “imparcialidade” é ínsita à ideia de “justiça”, de modo que sua presença se

faz indispensável sempre que houver algum tipo de atividade judicante em qualquer área do

Poder Público. O fato de o comandante do batalhão ter apurado a alegada infração disciplinar

cometida por seu subordinado e, com base nisso, aplicado a sanção prevista no regulamento,

mesmo havendo entre ambos anteriores e sérias divergências, é motivo suficiente para que tal

procedimento revele-se comprometido desde o início.

222

A Constituição Federal não enunciou expressamente o direito ao julgador imparcial,

mas a doutrina assevera que a ideia de imparcialidade integra o conceito de “juiz

natural”.

223

Vários tratados internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil

consagraram expressamente este direito. O direito a um “tribunal imparcial” é assegurado

pelo Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (art. 14.1).

224

De forma semelhante, a

Convenção Americana sobre Direitos Humanos garante o direito a “um juiz ou tribunal

imparcial” (art. 8.1).

225

A Corte Interamericana de Direitos Humanos, ao apreciar o caso Apitz Barbera e

outros versus Venezuela, definiu a imparcialidade do juiz como aquele critério que exige

daquele que intervém no processo que se aproxime dos fatos da causa carecendo, de maneira

subjetiva, de todo prejulgamento e, assim mesmo, oferecendo garantias suficientes de índole

objetiva que permitam desterrar toda dúvida que o jurisdicionado ou a comunidade possam

albergar a respeito da ausência de imparcialidade.

226

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albergar respecto de la ausencia de imparcialidade”. (Caso Apitz Barbera y otros vs. Venezuela. Excepción

Preliminar, Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia del 5 de agosto de 2008, párrafo 56.)

Em outro caso a Comissão Interamericana observou o aspecto objetivo da imparcialidade de um Tribunal no Caso William Andrews vs. Estados Unidos, anotando que: “el señor Andrews no fue escuchado con imparcialidad porque se manifesto una cierta “predisposición racial” entre algunos de los membros del jurado y porque al omitir el juez de primera instancia el interrogatório de los miembros del jurado se inficionó el juicio, dando como resultado la condena, la sentencia a muerte y la ejecución del acusado.” (Caso 11. 139, William Andrews vs. Estados Unidos, del 6 de diciembre de 1996, p. 165).

222 Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Recurso em Sentido Estrito nº 2004.71.03.003370-4/RS, decisão de 26.07.2005, DJU de 10.08.2005, p. 823, Relatora a Desembargadora federal Maria de Fátima Freitas Labarrére. 223

MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 529. Para nós, o princípio da imparcialidade previsto no art. 37 da Constituição Federal já é suficiente para garantirum julgamento imparcial pela Administração Pública.

224 “1. Todas as pessoas são iguais perante os tribunais e as cortes de justiça. Toda pessoa terá o direito de ser ouvida publicamente e com as devidas garantias por um tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido por lei, na apuração de qualquer acusação de caráter penal formulada contra ela ou na determinação de seus direitos e obrigações de caráter civil”.

225 “1. Toda pessoa terá o direito de ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou Tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou na determinação de seus direitos e obrigações de caráter civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza.”

226 “Exige que el juez que interviene en una contienda particular se aproxime a los hechos de la causa

Nesta mesma toada, segue a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

O Processo Administrativo Disciplinar se sujeita a rigorosas exigências legais e se rege por princípios jurídicos de Direito Processual, que condicionam a sua validade, dentre as quais a da isenção dos Servidores Públicos que nele tem atuação; tanto é assim que a Lei 9.784/99 veda, nos seus arts. 18 e 19 que participe do PAD quem, por ostentar vínculos com o objeto da investigação, não reveste as indispensáveis qualidades de neutralidade e de isenção.227

Com efeito, está garantida a todos, em processos judiciais e administrativos, a

imparcialidade do julgador.

3.3.3 Princípio do contraditório

Este princípio

228

é uma das mais importantes garantias, quando não a mais importante,

que o Estado de Direito concede à pessoa submetida a um processo, já que se não responde às

exigências da contradição não pode ser qualificado como tal,

229

até o ponto de poder ser

considerado como um princípio geral de Direito tendente a alcançar a harmonia da justiça

penal e administrativa.

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objetiva que permitan desterrar toda duda que el justiciable o la comunidad puedan albergar respecto de la ausencia de imparcialidade”. (Cf. ONU. Comité de Derechos Humanos. González del Río vs. Perú. Comunicación N.o 263/1987. Decisión del 6 de noviembre de 1980). No mesmo sentido: Wlliam Andrews vs.

Estados Unidos, no qual se indicou que “el seño Andrews no fue escuchado con imparcialidad porque se

manifestó una cierta “predisposición racial” entre algunos de los miembros del jurado se inficionó el juicio, dando como resultado la condena, la sentencia a muerte y la ejecución del acusado».87 Así también, un caso parecido se presentó ante la Comsión para la Eliminación de la Discriminación Racial, Caso Narrainen vs. Noruega, en el que también se concluyó cierta predisposiciónracial de parte del tribunal.” (Caso William Andrews vs. Estados Unidos, de 6 de dezembro de 1996, p. 165.)

227

Mandado de Segurança nº 14.233. Relator Napoleão Maia Nunes Filho, julgado em 23.06.2010. No mesmo sentido, confira-se a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo português: “O princípio da

imparcialidade está conexionado com o princípio da igualdade, exigindo aos titulares dos poderes públicos que assumam uma posição isenta e equidistante em relação a todos os particulares, assegurando a «igualdade de tratamento dos interesses dos cidadãos através de um critério uniforme de prossecução do interesse público», ocorrendo a sua violação quando a atuação daqueles titulares não seja ditada pela prossecução daquele interesse, mas influenciada pela intenção de favorecer ou prejudicar interesse privados. A violação deveres impostos pelo princípio da imparcialidade não está dependente da prova de concretas atuações parciais, verificando-se sempre que um determinado procedimento faz perigar as garantias de isenção, de transparência e de imparcialidade, pois visa-se com ele evitar a prática de certas condutas que possam ser tidas como suscetíves de afetar a imagem pública de imparcialidade.” (Processo nº 0551/09, julgado em 27.01.2010).

228 O princípio do contraditório ou audiência é expressado tradicionalmente por meio do brocardo latino “audiatur et altera pars e nem inaudititus dammari potest, ou seja, ninguém pode ser condenado sem ser ouvido em juízo.

229 CALAMANDREI Piero. Processo y democracia. Buenos Aires: Editoriales Jurídicas Europa-América, 1960, p. 147. Qualificado como princípio fundamental do processo, sua força motriz, sua garantia suprema.

Sua importância é evidente, não só quando considerado elemento necessário de todo

processo próprio de um Estado de Direito, mas também por sua íntima relação com outros

princípios ou garantias como o direito de defesa,

230

do qual é pressuposto de efetividade, e do

princípio da igualdade de armas (extraído da denominação alemã Waffengleichhit), que é o

seu complemento necessário.

231

Leciona Eugenio Pacceli de Oliveira, ao tratar do processo penal – mas em tudo

aplicável ao processo disciplinar –, que

O contraditório, portanto, junto ao princípio da ampla defesa, institui-se como a pedra fundamental de todo processo e, particularmente, do processo penal. E assim é porque, como cláusula de garantia instituída para a proteção do cidadão diante do aparato persecutório penal, encontra-se solidamente encastelado no interesse público da realização de um processo justo e equitativo, único caminho para a imposição da sanção de natureza penal.232

O contraditório não supõe só a possibilidade de intervir na conformação e no

desenvolvimento do processo, mas deve ser feito em condições de igualdade. O contraditório

só tem sentido quando se concede às partes os mesmos direitos e possibilidades, sem

privilegiar um ou outro.

No Direito brasileiro, o princípio do contraditório está proclamado no artigo 5º, LV

233

da Constituição Federal e em diversas leis ordinárias, como na Lei Federal nº 9784, de 1999,

em seu art. 2º.

234

Leciona Vicente Greco Filho que

[...] o contraditório se efetiva assegurando-se os seguintes elementos: a) o conhecimento da demanda por meio de ato formal de citação; b) a oportunidade, em prazo razoável, de se contrariar o pedido inicial; c) a oportunidade de produzir prova e se manifestar sobre a prova produzida pelo adversário; d) a oportunidade de estar

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230 São muitas as conexões que apresenta o princípio do contraditório com outros princípios do ordenamento jurídico, tanto sem sentido geral como processual, porém sua analise excede obviamente os limites deste trabalho. A doutrina Alemã, partindo da Lei Fundamental de Bonn, de 23 de março de 1949, analisou com