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2 QUE RELAÇÃO HÁ ENTRE EXPERIÊNCIA E CONHECIMENTO?

2.6 NA EXPERIÊNCIA, RELAÇÕES COM IMAGENS E PERGUNTAS

As imagens, as perguntas e a criação de movimentos de dança, na experiência artístico-pedagógica, tanto evidenciam a corponectividade já existente como desencadeiam outras possibilidades de corponexões entre corpos, temas, imagens, perguntas e dança. Esses elementos da experiência, em referência a Manen (2003), têm uma importância hermenêutica, sensível e interpeladora nos entrecruzamentos pressupostos, propostos e realizados com esta pesquisa.

As imagens-artefatos na pesquisa não são meras ilustrações, mas outras formas de perceber e pensar sobre os conceitos e a experiência. Não são textos para serem lidos, são imagens, ideias materializadas em um suporte para serem vistas/percebidas que, junto do texto, formam a pesquisa/dissertação sendo outras formas de interpretação não pautadas apenas em frases, sentenças, gramática e sintaxe. A imagem é uma forma plana que possibilita pensar sobre determinada questão que não é dita nos termos da linguagem verbal, mas que pode, com esses, acionar propícias construções conceituais.

Na experiência artístico-pedagógica o processo instaurado pelas imagens não proporcionou certezas imediatas no estudo da História da Dança. Ao invés disso, elas, as imagens, operam como dados perceptivos que não transmitem uma visão fechada sobre determinado fato ou momento histórico. A imagem já é uma interpretação de determinada situação vivida, percebida, produzida, recordada ou imaginada. Sendo assim, uma característica da imagem pode ser a de causar espanto ao corpo, a começar pelos olhos – sempre corponectados aos demais órgãos do sentido – auxiliados e movidos pela teia de percepções. A imagem está em gerar indagações para que se mobilizem interpretações, construção de sentidos e significados por meio da relação corponectiva que se estabelece com ela.

Os registros imagéticos (fotografias) feitos pelo pesquisador, do andamento das aulas e das coreografias criadas e apresentadas pelos educandos, são imagens já criadas com o filtro da interpretação. O educador/coreógrafo/pesquisador corponectado à situação, ao participar/orientar o processo artístico-educativo e registrá-lo em imagens (fotos), faz-se um espectador/agente que, com suas causas afetivas, estéticas, conceituais, entre outras, percebe, olha, escolhe, seleciona, recorta e registra o momento/movimento que considera oportuno em forma de imagem. Isso já se caracteriza como uma forma de interpretação da experiência, que não é mais idêntica a ela, mas uma outra experiência de descrição acerca da experiência original. Tais imagens operam, então, como descrições interpretativas da experiência artístico-pedagógica e buscam suscitar análises e proporcionar outras interpretações.

Não menos que as imagens, as perguntas também deflagraram importantes aspectos do processo no sentido de que, ao desencadear outras formas de se relacionar com os temas e de construir os conhecimentos, interpelam modos tradicionais de construção de conhecimento, criação de dança e ensino/aprendizagem. A pergunta é uma interpelação instaurada que promove um movimento reflexivo no corpo. Movimento tanto de (re)flexão – de se voltar sobre experiências já vividas, conceitos já conhecidos – como de (ex)tensão – de se lançar, se estender sobre outras possibilidades cognoscíveis. Perguntar move, desinstala, desestabiliza.

Nesta pesquisa, a pergunta evidencia possíveis relações e confluências entre dança, filosofia e educação. A bricolagem reflexiva aproxima: o procedimento de

criação de dança de Pina Bausch, onde a coreógrafa, ao invés de ditar a coreografia pronta, com perguntas remetia os dançarinos às suas experiências para, com essas, criarem movimentos de dança; a proposta de Freire e Faundez (2008) de uma pedagogia da pergunta, com a qual, mais que dar respostas se ensina a perguntar; a conhecida característica indagadora e especuladora da filosofia, interessada mais em fazer perguntas e sugerir questões do que obter respostas, vinculada à proposição de Lakoff e Johnson (1999), quando interpelam a filosofia analítica de tradição ocidental no sentido desta ser formada por meio de metáforas populares experimentadas pelo corpo no cotidiano. Com referência em estudos das ciências cognitivas eles afirmam que os procedimentos sensório- motores e conceitual-abstratos do corpo estruturam tanto os pensamentos quanto as experiências humanas. Dizem também, que a razão está amplamente ligada à experiência, à percepção e ao movimento corporal. Com isso, eles propõem a possibilidade de uma filosofia mais perto do osso, ou seja, uma filosofia na carne.

Ainda com essas vinculações, Katz (2005) propõe que o trajeto percorrido pelos neurônios no corpo para formar um pensamento é semelhante ao trajeto que os neurônios também percorrem para a instauração de um movimento no corpo. Dessa semelhança ela propõe a dança como pensamento do corpo. Noutro escrito, Katz (2003) propõe que a dança contemporânea é a dança que pergunta, ou seja, que instiga o espectador a perguntar: Por que o corpo faz o que faz enquanto dança? Neste sentido, Pina Bausch, além das perguntas para a criação da dança, priorizava também que, na apresentação da sua dança, o público visse perguntas em aberto.

A pergunta, enquanto conceito e procedimento permeia toda a pesquisa, constituindo, entre outros elementos, o filosofazer. A detecção e a solução de problemas, a exemplo do fazer-pensar do artífice, vão, constantemente, tecendo a reflexão, retomando proposições já feitas e evidenciando a corponectividade em seu conjunto de imagens-ideias, imagens-ações e imagens-artefatos.

Imagem 6 – Corpos dançando na aula de História da Dança I, Escola de Dança - FUNCEB (2010).

Foto de Odailso Berté.

Perguntas e imagens correlacionadas podem engendrar: outros modos de se relacionar com temas e construir conhecimento; modos não dualistas de nos entendermos enquanto corpos pensantes, seres corponectivos; relações educativas dialógicas; possibilidades de criar e compartilhar opiniões na voz e no gesto; formas de compor dança com as experiências vividas. E, considerando as criações de dança, feitas pelos educandos nas aulas de História da Dança, outras compreensões acerca de dança e de corpo em termos artístico-científicos (Imagem 6).

Com essas compreensões, experiências, procedimentos, perguntas e problemática, esta bricolagem reflexiva, em seu filosofazer, prossegue com sua rede de reflexões, relações e articulações de nexos de sentido. As descrições, entrecruzamentos, corponexões, interpretações e análises que seguem são tecidas não como determinações que estabelecem verdades em torno do que se quer conhecer. Mas, como possibilidades de organização, movimento, (re)flexões, (ex)tensões, articulações e relações em torno das provocações e interpelações instauradas pelas perguntas que estruturam a problemática da investigação. Com essas possibilidades, o conhecimento é construído como uma rede de corponexões que emergem com a vinculação já existente entre conceitos e experiências e com

os entrecruzamentos que a pesquisa articula entre corpos, perguntas, imagens, experiências e proposições conceituais.