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Natureza jurídica dos direitos autorais

2. COMPREENSÃO DOGMÁTICA DO DIREITO AUTORAL

2.9 Natureza jurídica dos direitos autorais

Indicar a natureza jurídica dos direitos autorais é fundamental para a correta escolha, no caso concreto, das regras jurídicas que lhe serão aplicadas. O fim é prático, pelo menos no campo do direito258. Considerando que a natureza jurídica deve resultar da lei e manifestar-se no regime estabelecido, conforme ensinamentos de

256

Artigo 90 da LDA:

Art. 90. Tem o artista intérprete ou executante o direito exclusivo de, a título oneroso ou gratuito, autorizar ou proibir:

I - a fixação de suas interpretações ou execuções;

II - a reprodução, a execução pública e a locação das suas interpretações ou execuções fixadas; III - a radiodifusão das suas interpretações ou execuções, fixadas ou não;

IV - a colocação à disposição do público de suas interpretações ou execuções, de maneira que qualquer pessoa a elas possa ter acesso, no tempo e no lugar que individualmente escolherem; V - qualquer outra modalidade de utilização de suas interpretações ou execuções.

§ 1º Quando na interpretação ou na execução participarem vários artistas, seus direitos serão exercidos pelo diretor do conjunto.

§ 2º A proteção aos artistas intérpretes ou executantes estende-se à reprodução da voz e imagem, quando associadas às suas atuações.

257

Artigo 19 da Convenção de Roma:

Não obstante quaisquer outras disposições da presente Convenção, não será aplicável o artigo 7o quando um artista intérprete ou executante haja consentido na inclusão da sua execução numa fixação de imagens ou de imagens e sons.

258

77 Oliveira Ascensão, pode-se tentar apontar a natureza jurídica dos Direitos Autorais, ressaltando que esta matéria “representa um problema clássico”.259

Inicialmente, cumpre delimitar que o Direito Autoral é ramo jurídico compreendido no âmbito do denominado Direito Privado260, muito embora, nas palavras de Sérgio Branco:

(...) a disciplina jurídica do aproveitamento das obras intelectuais sempre foi resultado da escolha legislativa entre dois interesses contrapostos: (i) a utilização imediata pela coletividade das obras criadas, com a finalidade de promoção e desenvolvimento social e (ii) a manutenção, por parte do autor, da possibilidade de

aproveitamento econômico de sua obra261.

Diversas foram as posições doutrinárias acerca dessa matéria e a controvérsia parece não cessar, fazendo-se presente já na própria nomenclatura utilizada para designar esse direito: “propriedade literária, artística e científica”. De fato, no âmbito legislativo, há preferência pela designação “propriedade”, opção que não reflete necessariamente o entendimento da doutrina, na qual são frequentes qulificações como: direito especial e autônomo, direito fundamental do homem, monopólio temporário, relação jurídica de natureza pessoal-patrimonial262.

Costa Netto indica que as várias teorias acerca da natureza jurídica dos Direitos Autorais seriam variantes das cinco principais263, quais sejam: a) teoria da propriedade - a obra seria um bem móvel e o seu autor seria titular de um direito real sobre aquela264; b) teoria da personalidade – a obra é uma extensão da pessoa do autor,

259

ASCENSÃO, José de Oliveira, 2007, p. 598.

260

Por certo, não há como ignorar o entendimento de que a dicotomia público-privado estaria enfraquecida, em face da comunicação atual entre o público e privado – com a constitucionalização do Direito Privado e a privatização do Direito Público. Sobre o tema, vide LÔBO, Paulo Luiz Netto.

Constitucionalização do Direito Civil. In Revista de Informação Legislativa. Brasília, v. 141, pp. 99 a

110, jan./mar. 1999. Disponível em Disponível em http://direitofmc.xpg.uol.com.br/TGDC/texto01.pdf. Diante da utilidade didática e sistemática de tal divisão, mantém-se a nomenclatura.

261

JUNIOR, Sergio Vieira Branco. Direitos Autorais na Internet e o Uso de Obras Alheias. Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2007, p. 42.

262

NUNES, Simone Lahorgue, 2011, op. cit., p. 41.

263

NETTO, José Carlos Costa, 2008, op. cit., p. 47.

264

Nas palavras de Rodrigo Moraes: “A teoria do direito de propriedade merece críticas por também desconsiderar o outro componente estruturante do direito de autor: o aspecto pessoal, ou seja, os direitos morais. Mostrou-se equivocada e insustentável por reduzir o Direito Autoral a uma ótica meramente patrimonial. A concepção materialista, portanto, não passa de reducionismo, já que esse direito não recai somente sobre a obra (como acontece nos direitos reais), mas também sobre a pessoa do criador intelectual” (MORAES, Rodrigo, op. cit., p. 47). Além disso, não podem originar um direito de propriedade, uma vez que, por natureza, a obra literária ou artística não é suscetível de apropriação

78 cuja personalidade não pode ser dissociada do produto da sua inteligência265; c) teoria dos bens jurídicos imateriais – reconhece ao autor um direito absoluto sui generis sobre sua obra, de natureza real, existindo ainda o direito de personalidade, independente, que consiste na relação jurídica de natureza pessoal entre o autor e sua obra; d) teoria dos direitos sobre bens intelectuais – o direito das coisas incorpóreas (obras literárias, artísticas e científicas, patentes de invenção e marcas de comércio) 266; e) teoria dualista – um único bem coexistiriam dois direitos integrados, os patrimoniais e os morais.

Muito embora a solução defendida pela teoria dualista não seja pacífica, é a que tem sido melhor aceita no Brasil. Carlos Alberto Bittar preceitua que:

Exatamente porque se bipartem nos dois citados feixes de direitos - mas que, em análise de fundo, estão, por sua natureza e sua finalidade, intimamente ligados, em conjunto incindível - não podem os direitos autorais se enquadrar nesta ou naquela das categorias citadas, mas constituem nova modalidade de direitos privados267.

Antonio Chaves também leciona que:

O direito de autor representa relação jurídica de natureza pessoal- patrimonial, sem cair em qualquer contradição lógica, porque traduz uma fórmula sintética aquilo que resulta da natureza especial da obra da inteligência e do regulamento determinado por esta natureza especial268.

exclusiva, diferentemente dos demais bens de natureza real (ASCENSÃO, José de Oliveira, 2007, op. cit., p. 604).

265

Por seu turno, esta teoria desconsidera os direitos patrimoniais, frutos da exploração econômica da obra. “Oliveira Ascensão assevera ainda que “as faculdades ligadas à personalidade extinguem-se por morte, mas o direito de autor continua para além disso: é quanto basta para não poder ser considerado um direito da personalidade” (ASCENSÃO, José de Oliveira, 2007, op. cit., p. 602).

266

Posição intermediária em relação às duas primeiras teorias apresentadas, mas a ideia é passível das críticas feitas à teoria da propriedade, por se tratar de bens incorpóreos e insuscetíveis de apropriação exclusiva. Além disso, os direitos morais, embora não ausentes, ficam menosprezados (MORAES, Rodrigo, op. cit., p. 47).

267

BITTAR, Carlos Alberto, 2008, op. cit., p. 11.

268

79 Importante acentuar a teoria defendida por Oliveira Ascensão, que caracteriza dos Direitos Autorais como direitos de exclusivo ou de monopólio269, posição pouco defendida no Brasil270. Segundo o autoralista, certas atividades relativas às obras - objeto imediato do Direito Autoral - são reservadas por lei à atuação exclusiva do autor. “Este exclusivo refere-se, como qualquer outro, a uma atividade que a todos se proíbe, a um campo reservado de atuação”271.

E acrescenta:

Este exclusivo (ao contrário do constitutivo da patente, por exemplo) está ligado indubitavelmente a certos laivos pessoais. Na estrutura que atribuímos ao direito de autor há mesmo um direito pessoal que é atribuído ao criador intelectual. Mas isso não impede que possamos considerar em separado o aspecto patrimonial272.

269

ASCENSÃO, José de Oliveira, 2007, op. cit., pp. 599 a 617.

270

Simone Nunes indica que não parece fazer sentido a atribuição de um monopólio ao Direito Autoral a partir do momento em que se considera que a criação nasce com o autor ((ainda que seja posteriormente reconhecida pelo direito), enquanto que a posição de monopólio é conquistada ou atribuída por lei que garante à determinada pessoa a exclusividade de exploração de um bem já existente no mercado (NUNES, Simone Lahorgue, 2011, op. cit., p. 46.

271

ASCENSÃO, José de Oliveira, 2007, op. cit., p. 611.

272

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