A necessidade de se praticar o planejamento no Banco do N or deste está intrinsecamente ligada aos fatores que motivaram a sua própria cri ação.
Até a metade deste século, conforme assinala SOUZA, o N ord este era uma região ignorada até pèlos próprios nordestinos: não se tinham estudos sistematizados sobre sua realidade — sua economia, seus recursos, problemas e potencialidades —, sendo visto por “falsos estereótipos” e “traços mais vigorosos de sua cultura nativa, traduzidos no folclore, cozinha, música e na literatura social regional” .1
A ocorrência das secas de 1951 e 1958, que causaram grande sofrimento às populações, trouxe um novo despertar para o fato de que esse fenômeno e o atraso econômico-social nordestino deveriam ser enfrentados com firmeza, de uma forma planejada, sistemática e compreensiva, e não atra vés de soluções defensivas e fragmentadas, como vinha acontecendo até en tão.
De acordo com essa nova perspectiva de ver a questão regional, urgia uma reformulação do aparelho estatal para cuidar da questão do desen volvimento de forma contínua e abrangente, congregando todos os setores da economia e todos os Estados, o que contemplava a necessidade de um plane jamento global, regional, que não só confirisse mais racionalidade na utiliza ção dos recursos destinados a promover o desenvolvimento regional, compa tibilizando os mecanismos de política econômica, dando-lhes consistência, como também sinalizasse ações que pudessem minimizar, pelo menos, os efeitos negativos sobre a região de políticas que, em nível nacional, se reve lem corretas e apropriadas.
1 SOUZA. João Gonçalves de. O Nordeste brasileiro: uma experiência de desenvolvimento regional. Fortaleza, CE: BNB, 1979, p. 95.
O Banco do Nordeste cresceu em meio a essas idéias, antecipan do-se até a alguns desses acontecimentos, representando um novo marco no tratamento dos problemas econômicos e sociais do Nordeste brasileiro. A propósito, SOUZA caracteriza o nascimento da organização como a mais im portante etapa de política governamental no tratamento dos problemas do Nordeste, que marca a ruptura com a idéia da seca como sendo o problema central de sua economia.
“A criação do BNB marca a preocupação com as deficiências econômico-financeiras da Região, com a necessidade de crédito fácil e pioneiro, para a implementação das atividades produtivas, e marca também a preocupação com estudos de caráter econô mico, capazes de fundamentar um posterior planejamento regio nal. Órgão criado para financiar projetos de desenvolvimento, ? segundo modelo até então desconhecido, o BNB representou novo marco no esforço para promover e dinamizar a economia do Nordeste. A fundação da SUDENE é o coroamento destas preocupações.”2
Promover o desenvolvimento econômico e social de uma região economicamente pobre e estagnada, gerindo recursos do Tesouro Nacional e dentro de uma visão prospectiva de longo prazo, são condições que tornam imperiosa a necessidade do planejamento, que, inclusive, se reflete na deter minação legal de que a organização deveria contar em sua estrutura com um escritório de estudos econômicos, com a função de “empreender estudos de base sobre a estrutura e a evolução conjuntural da economia nordestina, to r nando-se assim um auxiliar do órgão regular encarregado do planejamento e de execução direta ou não, da política federal no Polígono das Secas”3.
A idéia de o Banco do Nordeste contar em sua estrutura organi zacional com um escritório de estudos econômicos era conferir-lhe uma certa autonomia e dinamismo no desempenho de sua missão, até mesmo na falta de
um planejamento regional global em que deveria, em princípio, basear suas ações, como atestam as palavras de Rômulo Almeida:
“ A autonom ia do B anco: não se concebia que o B anco fosse um in s tru m ento autônom o em relação à p o lítica regional, m as um in stru m en to financeiro. M as, sim , concebia-se que o B anco deveria ser um o rganism o su ficientem ente capacitado para ter d inam ism o próprio, capacitado tecnicam ente, fin an c eiram e n te e m esm o p o liticam en te p ara te r o dinam ism o pró p rio , ou seja, se faltasse um a o rientação p o lítica , um plan ejam en to m ais geral, o B anco saberia fazer, porque ele m esm o seria um a das fontes desse p la n e ja m ento geral. A liás, pensava-se que o E TEN E seria o E scritó rio T écnico de um p la n e ja m ento reg io n al ou de um órgão de coordenação reg io n al, essa a id é ia .”4
A exigência de planejamento que norteasse as ações do Banco do Nordeste, expressa pelo seu primeiro presidente, fundava-se em quatro premissas: inexistência de informações sobre a região e o país; falta de qua dros técnicos capacitados; falta de consciência política que favorecesse o exercício do planejamento; e, finalmente, a existência de uma “estrutura cli- entelista”, relacionada com a própria condição de pobreza. Daí, portanto, a necessidade de uma organização dinâmica e autônoma e, dentro dela, de uma estrutura que desse sustentação a essa idéia — o Escritório de Estudos Eco- ’ nômicos-ETENE.
Entretanto, a necessidade do planejamento não era compartilha da pelos funcionários mais ligados às áreas de banco comercial e financeira. Em primeiro lugar, essas atividades normalmente lidam com operações de prazo curto, adotando, pois, uma postura mais oportunística em relação aos seus negócios. Seus mecanismos de controle, por sua vez, compõem-se de orçamentos (elaborados mais para cumprir exigências dos órgãos de fiscaliza ção do governo federal) e fluxos de caixa. Em segundo lugar, em períodos de inflação elevada, mudanças constantes de regras do jogo da economia, objeti vos de longo prazo são considerados irreais (por essas áreas), que acabam por transformar os planos inúteis, simples “cartas de intenção”, e o planejamento em um mero “exercício acadêmico” e perda de tempo.
, , 3 BRASIL. Mensagem 363.
4 ALMEIDA, Rômulo Barreto de. Entrevista concedida ao Banco do Nordeste do Brasil, p. 116. Fortaleza, CE, 26 de junho de 1979.