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Marx (1985) afirma que as necessidades humanas são satisfeitas por meio das mercadorias e que estas são antes de tudo objetos externos ao ser humano, um objeto que é de consumo, independente da sua natureza. O consumo pode ser direto ou indireto, mas é a utilidade do objeto que definirá o seu valor de uso. Valor de uso que está relacionado às propriedades no corpo da mercadoria e ao trabalho humano aplicado na sua produção. Assim, a relação de troca de mercadorias se estabelece nas sociedades em tempos históricos de acordo com o modo de produção.

Heller (1986) conceitua necessidades com base nas análises que realizou sobre as obras de Marx e, assim, divide-as em dois grandes campos: necessidades existenciais – as que se referem à mera sustentação da vida humana, ontologicamente primária, estão baseadas nos instintos – e necessidades sociais – desejo, aspiração ou intenção dirigida a certo objeto e que motiva a ação. Considera que todos são produtos e atos sociais. Ao discutir as características das necessidades, a autora afirma que estas podem ser compreendidas em:

- Necessidades existenciais, naturais ou necessárias - aquelas que são para atender à manutenção da própria vida humana, para as necessidades vitais, para a autoconservação do ser humano. Sem a satisfação destas o indivíduo não pode viver. Estão relacionadas à vida normal de pessoas que pertencem a uma determinada classe social em um determinado tempo em uma determinada sociedade, são geradas mediante a produção material e, nesse sentido, são crescentes de acordo com a produção material de uma sociedade em determinado tempo. Em uma sociedade capitalista a distribuição dos bens para atendê-las está relacionada à inserção do indivíduo na produção.

- Necessidades radicais - são necessidades necessárias compreen- didas como aquelas que precisam ser satisfeitas para que os membros de uma sociedade ou classe social, em um determinado tempo histórico, tenham a sensação ou convicção de que suas vidas são 'normais';

- Necessidades livres - são necessidades necessárias que se contrapõem às necessidades materiais, são espirituais, morais. Não estão relacionadas à reprodução social, mas à liberdade do indivíduo;

- Necessidades sociais ou produzidas socialmente - diferem das necessidades naturais, pois são produzidas pela relação do indivíduo com a sociedade, no seu processo de socialização, no qual se destaca o processo de produção-consumo. São necessidades entendidas como totalidade, média ou tendência que determinam o desenvolvimento das necessidades individuais ou particulares. Estão acima das necessidades individuais ou pessoais, pois são gerais e mais elevadas que estas, assim as necessidades pessoais devem ser a elas subordinadas. As necessidades sociais ou produzidas socialmente são definidas por classes hegemônicas para que as outras classes sociais submetam as suas necessidades particulares às que foram definidas como sociais. A autora explica ainda que as necessidades das diferentes

classes passam a ser definidas por seus representantes. Logo, nesse caso, se compreende que as necessidades que serão 'reconhecidas' ou 'não reconhecidas' socialmente negam as necessidades próprias e efetivas de cada indivíduo.

- Necessidades de luxo, refinadas ou de ostentação - são

necessidades relacionadas à ostentação de bens de acordo com a acumulação de riqueza, expressas em determinadas classes sociais. São aquelas que estão fora da capacidade de consumo da classe operária, e assim não fazem parte dos costumes dessa classe. Segundo a lógica econômica, essas necessidades são necessárias para uma minoria de poder aquisitivo mais elevado. As necessidades de luxo podem ser convertidas em necessidades necessárias sem mudanças no seu aspecto qualitativo, ao contrário, este fenômeno se daria como consequência de crescente produ- tividade, assim como por mudanças na estrutura social.

[...] En los Grundisse Marx habla de la 'capacidad de consumo' como fuente de las necesidades de la sociedad capitalista y distingue las necesidades 'producidas por la sociedad' de las necesidades 'naturales'. Respecto al capitalismo escribe: 'En su aspiración incesante por la forma universal de la riqueza, el capital, empero, impulsa al trabajo más allá de los límites de su necesidad natural y crea así los elementos materiales para el desarrollo de la rica individualidad, tan multilateral en su producción como en su consumo, y cuyo trabajo, por ende tampoco se presenta ya como trabajo, sino como desarrollo pleno de la actividad misma, en la cual ha desaparecido la necesidad natural en su forma directa, porque una necesidad producida históricamente ha sustituido a la natural' y más adelante: 'El 'lujo' es la antítesis de lo 'naturalmente necesario'. Necesidades imprescindibles son las del individuo reducido él mismo a un sujeto natural. El desarrollo de la industria suprime esa necesidad natural, así como aquel lujo (en la sociedad burguesa, por cierto, sólo 'contradictoriamente', puesto que ella misma sólo contrapone al lujo determinada medida social como la necesaria)'. En el Capital la categoría de 'necesidades naturales' aparece a través de la determinación del valor de la fuerza de trabajo: 'Las necesidades naturales, el alimento, el vestido, la calefacción, la vivienda, etc., varían con arreglo a las condiciones del clima y a las demás condiciones naturales de cada país. Además, 'el volumen de las llamadas necesidades naturales', así como el modo de satisfacerlas, son de suyo un 'producto histórico' que depende, por lo tanto, en gran parte, del nivel de cultura de un país y, sobre todo, entre otras cosas, de las condiciones, los hábitos y las exigencias con que haya formado la clase de los obreros libres. A diferencia de las otras mercancías, la valoración de la fuerza de trabajo encierra, pues, un elemento histórico

moral'. Finalmente el valor de la fuerza de trabajo aparece definido del siguiente modo: 'El valor de la fuerza de trabajo se determina por el valor de los medios de vida consuetudinariamente necesarios para el sustento del obrero medio'. [...] (Heller, 1986, p.29-30, grifos da autora).

A construção e geração da necessidade se dão a partir da ordem individual ou micro (gênese) e a sua reprodução ocorre na ordem social ou macro (reprodução social). No cotidiano dos indivíduos e suas famílias encontram-se os processos básicos que estão relacionados aos fenótipos, necessidades fisiológicas e psicológicas, essas são atendidas de acordo com as possibilidades e os obstáculos que se têm para tal, em um espaço que é histórico e socialmente construído. Logo, é uma construção que ocorre em

[...] espaços sociais concretos, marcados nos condicionamentos econômicos, culturais e políticos (modos de vida típicos) que, em cada classe social e de acordo com as relações étnicas e de gênero que as caracterizam [...] (Samaja, 1993 apud Breilh, 2006, p.171).

As respostas às necessidades individuais estão diretamente relacionadas às formas de produção e circulação de bens que são determinadas pela estrutura coletiva. A satisfação das necessidades é por um movimento de opções individuais em um movimento determinante que é coletivo, por meio da produção de bens e da distribuição àqueles aos quais o Estado tem a responsabilidade de repartir. Para Boltivinik (1994) apud Breilh (2006), esse movimento, produção e distribuição de bens, que procura atender às necessidades dos indivíduos é estabelecido pela lógica dos interesses das classes hegemônicas. São as classes hegemônicas que, de acordo com suas conveniências, definem os elementos de satisfação das necessidades das outras classes, ou seja, daquelas que estão submetidas aos desejos dos que detêm o poder. Nesse mesmo contexto, refere o autor, também estão os valores que serão atribuídos aos serviços de saúde, sejam eles públicos ou privados.

Para Heller (1986), quanto mais se emprega força de trabalho humano na produção de um objeto, independente da natureza deste, mais este objeto se aproxima de um artigo de luxo, de ostentação. Neste caso, ele que só

poderá ser adquirido por classes socais com maior poder aquisitivo. Para Mendes-Gonçalves (1992) as necessidades sociais representam as necessidades de produção e reprodução do modo de produção, assim deixam de ser naturais, pois estão em uma sociedade que tem a distribuição e o consumo dos processos de trabalho desiguais.

O valor de uso da mercadoria está relacionado à possibilidade de atender às necessidades humanas, seja ela de qualquer classe social. Assim, independente de qual seja a necessidade (fome ou um artigo de luxo) a sua satisfação representa condição sine qua non para o uso da mercadoria. Logo, não há valor de troca para a mercadoria se não houver valor de uso. Porém, pode haver valor de uso sem o valor de troca, desde que este seja para satisfazer a uma necessidade do indivíduo. Nessa perspectiva, o trabalhador que vende sua força de trabalho para o capitalista e recebe dele o valor referente (salário) terá as suas necessidades definidas na relação do valor que recebe e que possibilita a sua reprodução social, pois, na venda de sua força de trabalho, já estão definidos quais são os meios de que necessita para se reproduzir socialmente (Heller, 1986).

[...] Como sabemos, por definición el valor de uso satisface necesidades: las necesidades de la producción de plusvalía y por consiguiente de valorización del capital. (Si la fuerza de trabajo no produjese plusvalía y el capitalista no comprase de trabajo el sistema capitalista dejaría de existir) [...] y forzosamente tiene que ser así, en un régimen de producción en que el obrero existe para las necesidades de valoración de los valores creados, en vez de existir la riqueza material para las necesidades del desarrollo del obrero (Heller, 1986, p.22, grifo da autora).

Scherer (1997, p.159) analisa a Teoria das necessidades humanas defendida por Doyal e Gough (1991) e afirma que para os autores "[...] as necessidades sociais não podem ser reduzidas a desejos ou simples expectativas [...]", porque para esses autores as sociedades industriais têm, no seu processo de produção e consumo, uma significativa complexidade de espaços que se inter-relacionam e determinam a produção de necessidades nas famílias e nos pequenos grupos. Ao mesmo tempo este fenômeno, a complexidade de espaços que inter-relacionam, apresenta aos indivíduos "[...] o mercado como o mecanismo para a satisfação das necessidades

humanas; ou relacionada aos serviços públicos do Estado de Bem-Estar [...]". Contrapondo-se a esta lógica do mercado, os autores defendem que as sociedades devem ter objetivos comprometidos com seus cidadãos e que deveriam considerar o atendimento às necessidades como um pré-requisito à autonomia dos indivíduos para que eles tenham vidas livres emancipadas, não atreladas ou definidas por um mercado utilitarista definidor de desejos e preferências.

[...] há um confronto entre duas 'grandes correntes' a propósito do tema da definição da necessidade: a) a necessidade humana como um valor relativo, que depende de opções individuais e das possibilidades de cada pessoa e sua família para adquiri-las no mercado (corrente liberal); b) a necessidade como um processo determinante da vida, cuja realização constitui, por isso mesmo, um direito humano inalienável, ao qual se deve aceder através de uma distribuição eqüitativa e segura por parte de todos os membros de uma sociedade, a qual deve construir-se solidariamente em prol do máximo bem comum (corrente solidária). [...] (Breilh, 2006, p.169-70).

Reconhecer os indivíduos, usuários dos serviços de saúde, como portadores de necessidades é reconhecer o mundo das necessidades, assim como suas diversidades de representações e constituições nesses sujeitos. Neste caso, as representações podem ser na maneira como este indivíduo consagra a saúde, podendo compreendê-la como um "[...] direito social a ser satisfeito pelo poder público [...]" (Merhy, 2003, p.78).

A escuta que é realizada nos serviços de saúde pode levar a um efetivo atendimento e intervenção sobre as necessidades expressas pelos usuários. Essas intervenções podem ser para promoção da saúde, proteção específica a um adoecimento ou mesmo para a recuperação do quadro apresentado por um sujeito de algum agravo que desenvolveu. Para Merhy (2003, p.91),

[...] os usuários procuram, ao consumir produtos do trabalho em saúde, pelo menos serem acolhidos nesse processo, a ponto de que na dinâmica do mesmo haja um momento em que se possa 'escutá-los' nas suas manifestações-necessidades [...].

Chiesa (1999) afirma que as necessidades em saúde serão percebidas pelos indivíduos, usuários de serviços, segundo os momentos históricos e contextos sociais em que vivem. Esta percepção será definidora dos projetos e dos modelos de intervenção em saúde. O modelo de intervenção em saúde é definido por Mendes (1999) como a maneira que a sociedade, em determinado tempo histórico, tem de organizar seus conhecimentos para intervir no processo saúde-doença a fim de promover qualidade de vida, para o indivíduo ou para a população.

Bertolozzi e Fracolli (2004, p.16) afirmam que "[...] os modelos de assistência não estão isentos dos interesses e da vontade dos sujeitos sociais e não são universais [...]". Logo, a exclusão destes interesses e vontades torna a intervenção em saúde estéril às questões vividas pelos sujeitos envolvidos. Segundo as autoras, no desenvolvimento da assistência à saúde devem ser consideradas as intermediações entre os aspectos técnicos e políticos da ação. Para a descrição da realidade observada deve-se ter a participação dos técnicos e usuários no sentido de identificar a sua determinação e, assim, definir quais ações em saúde serão desenvolvidas na intervenção. Portanto, as práticas sanitárias deverão ter combinações tecnológicas distintas para enfrentar as questões de saúde em um determinado território e, logo, organizar o processo de trabalho em saúde.

Laurell (1983), Egry (1996) e Mendes-Gonçalves (1992) afirmam que o processo saúde-doença é determinado pelo modo como o ser humano se relaciona com a natureza a qual se dá por sua inserção no trabalho, sendo este determinado pelo desenvolvimento das forças produtivas e das relações sociais de produção, segundo o modelo econômico vigente naquela sociedade, num determinado tempo histórico. Para Egry (1996), Bertolozzi e Fracolli (2004) e Breilh (2006), a determinação do processo saúde-doença está relacionada a três dimensões: estrutural ou geral; particular e singular. Nesse sentido, afirmam que os desgastes serão representados no coletivo pelas diferentes expressões da epidemiologia e percebidos no corpo do indivíduo pelas expressões de desgastes por meio de queixas, sinais e sintomas.

A saúde não é primordialmente 'individual-subjetiva-contingente', nem tampouco é primordialmente 'coletiva-objetiva-determinada'; ela é, sempre e simultaneamente, o movimento de gênese e reprodução possibilitado pelo concurso de processos individuais e coletivos, que se articulam e se determinam mutuamente. Ela tampouco é primeiro individual e depois coletiva, como produto da combinação de realidades individuais. Em suma, o olhar dialético nos permite ver que essa discussão não tem sentido, porque livre arbítrio e determinação coletiva não são termos excludentes, mas interdependentes (Breilh, 2006, p.45).

A intervenção resolutiva em saúde tem que estabelecer critérios e ferramentas para nortear e estruturar a identificação das necessidades em saúde. Nessa perspectiva, Cowley e Houston (2004) destacam que o contato entre os profissionais e usuários para um levantamento real das necessidades em saúde deve ser fundamentado em referenciais que permitam o desen- volvimento de ações com critérios e, para tal, as ferramentas devem ser preestabelecidas para identificar famílias e grupos que necessitam de suporte dos profissionais. Para as autoras, a intervenção em saúde por meio da visita domiciliária é uma possibilidade para se identificar as necessidades em saúde dos usuários. Destacam que esta atividade possibilita o "encontro" entre o conhecimento científico e a realidade social.

Em estudo para compreender a mudança no discurso dos visitadores na avaliação de necessidades em saúde nas visitas domiciliárias, as pesquisadoras Cowley, Mitcheson e Houston (2004) perceberam que, ao invés de utilizar os instrumentos para identificar as necessidades dos usuários, os profissionais seguiam o enfoque da epidemiologia associado a fatores de risco e avaliação de riscos previamente definidos. Para as autoras, os usuários seguiam o mesmo enfoque atendendo ao que o serviço esperava deles. Logo, a visita domiciliária perdia seu potencial para identificar indivíduos vulneráveis, mas atendia aos propósitos estabelecidos pela organização dos serviços. Reconheceram este fenômeno como a medicalização da visita domiciliária.

Segundo Stotz (1991), reduzir as necessidades em saúde do indivíduo ao que é expresso biologicamente pelo desgaste no corpo tem sido a prática do sistema institucionalizado de saúde. Dessa forma, o sistema referenda a não conscientização dos sujeitos sobre os processos de desgastes, determinantes do processo saúde-doença, a que estão submetidos. Isso ocorre pelo papel

desenvolvido pelo Estado em normatizar para intervir em saúde no sentido de manter as forças de trabalho mediante a avaliação dos riscos para adoecimentos

Na organização das intervenções a serem desenvolvidas pelos serviços, o autor acima citado aponta que as necessidades são tecnicamente definidas por gestores e profissionais do setor e por meio dessas definições se conformarão às demandas atendidas nos serviços, pois aí se encontra excluída parte das necessidades expressas pelos indivíduos, já que são deixadas fora do atendimento aquelas que não são consideradas possíveis de intervenção nos parâmetros previamente estabelecidos e desejados. Assim, as necessidades em saúde que serão satisfeitas nos serviços estão relacionadas aos padrões previamente estabelecidos que valorizam as demandas.

Para a leitura do processo saúde-doença, das vulnerabilidades2 e das necessidades em saúde, na perspectiva coletiva, Nakamura et al. (2009) defendem o uso de instrumento previamente elaborado que consiga coletar dados permitam a análise da realidade para instrumentalizar as intervenções a serem desenvolvidas pelos profissionais de saúde em suas práticas sanitárias transformadoras. O processo discutido pelas autoras se inicia na graduação de Enfermagem com o objetivo de preparar os futuros profissionais com base teórica da Saúde Coletiva.

Chaves (2000, p.81) afirma que "[...] a prática sanitária desenvolvida nos serviços de saúde tem sido ineficaz aos problemas apresentados [...]". Nesta relação entre serviço e usuários, ocorrem o descrédito dos serviços de saúde e as resistências dos usuários para aceitarem intervenção que poderá promover a saúde, prevenir e curar doenças. Assim, os usuários, primeiramente, esgotam medidas que não foram institucionalizadas e posteriormente seguem as medidas orientadas, pois possuem dúvidas por não terem sido "[...] convencidos pelos técnicos das razões científicas para as intervenções propostas e realizadas institucionalmente [...]".

2 Nakamura et al. (2009) referendam o conceito de vulnerabilidade social como sendo uma

dimensão tanto dos processos de exclusão, discriminação ou enfraquecimento dos grupos sociais, quanto da capacidade de enfrentamento dessas condições. Esta não é restrita a suscetibilidades individuais, mas ao plano coletivo, histórica e socialmente determinado.

Mendes-Gonçalves (1992) ao discutir a intervenção em saúde analisa que o nascimento da medicina social esteve, desde o início, ligado ao projeto de transformação do desviante para atender ao interesse de determinada classe social e organizar as outras classes para atender aos interesses daqueles que detinham o poder. O conceito de classe social, para o autor, apresenta-se além das relações econômicas e de poder, definindo a realidade e o direito à cidadania. Neste caso, reflete-se sobre a proposta de intervir segundo as necessidades percebidas na realidade, pois existe significativa distância entre a necessidade em saúde, expressa individual ou coletivamente, e a implementação de ações para o seu atendimento. Este fenômeno é uma das questões que o Sistema Único de Saúde tenta superar quando define como princípios a universalidade, equidade, integralidade e busca organizar os serviços por meio da descentralização, regionalização, hierarquização das ações com a participação social na definição das Políticas Públicas de saúde. Nessa perspectiva, diversas contradições podem ser percebidas nas práticas sanitárias preconizadas pelo SUS por meio dos programas e protocolos adotados, uma vez que aumentam coberturas e mantêm o enfoque nas doenças, ficando distantes de considerar os usuários como indivíduos portadores de necessidades e com possibilidades de discutirem o processo de assistência à saúde. Assim, os usuários se submetem ao que lhes é oferecido, pois não têm como buscar atendimento para as suas necessidades.

A hegemonia requerida pela ordem social dominante também se constrói e se reproduz na saúde, e se forjam ilusões que procuram bloquear a coletivização da alma popular e visam à dissolução de seus recursos de organização coletiva. Procura-se impedir que os integrantes das coletividades subalternas se reconheçam como parte de uma classe dominada, ou como um povo (étnico) dominado ou um gênero dominado; busca-se criar barreiras materiais e obstáculos