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Novas formas de atuação na carta rogatória e no pedido de auxílio direto: rogatória participativa; produção direta da prova; videoconferência.

3 Fatores de eficiência da cooperação jurídica internacional em matéria penal: aplicação do princípio da confiança

3.4 Procedimentos da cooperação jurídica internacional em matéria penal: novas formas de comunicação e atuação

3.4.1 Novas formas de atuação na carta rogatória e no pedido de auxílio direto: rogatória participativa; produção direta da prova; videoconferência.

Na Parte I do estudo ficou assentado que os procedimentos de cooperação jurídica internacional para a produção de prova são: a carta rogatória e o pedido de auxílio direto. Em ambos os casos, como regra, há a intervenção de um órgão estatal que atua como intermediário na formalização e articulação das solicitações.

No caso em que o Brasil figura como Estado requerente, a intervenção estatal ocorre no âmbito do Ministério das Relações Exteriores ou do Ministério da Justiça, por intermédio do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional, designado como autoridade central nos acordos bilaterais de cooperação em matéria penal. Na hipótese em que o Brasil figura como Estado requerido, a intervenção estatal ocorre no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, da Justiça Federal de 1ª instância, ou da autoridade central designada nos acordos bilaterais, que é o Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional.

Sem dúvida alguma, o pedido de auxílio direto constituiu um importante avanço na tentativa de evitar os inconvenientes burocráticos que qualificam a carta rogatória tradicional, na medida em que a iniciativa da solicitação no Estado requerido é da autoridade local, que encampa a necessidade manifestada pelo Estado requerente. No entanto, acredita-se que esse procedimento possa ser mais dinâmico, a partir da revisão da forma como as partes interessadas atuam no processamento e execução da assistência.

Há três formas de atuação ou participação mais direta das partes interessadas: a rogatória participativa, a produção direta da prova e o recurso à videoconferência.

A rogatória participativa277 consiste na hipótese em que a autoridade do

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Estado requerente participa na atividade de aquisição da prova no Estado requerido. Essa participação pode se manifestar de forma passiva, simplesmente assistindo a execução do ato, ou de forma ativa, em que se intervém no ato, fazendo perguntas ou sugerindo perguntas, por exemplo.

Já a produção direta da prova278 consiste na hipótese em que a própria

autoridade do Estado do processo produz a prova no Estado requerido, na presença ou com a participação de uma autoridade deste último.

Quando se fala em produção direta da prova pretende-se referir àquela forma de assistência, que pressupõe um papel meramente passivo por parte do Estado requerido, ainda que limitado a exprimir o consentimento. A obrigação de consentir a presença de uma autoridade do Estado requerente resulta de acordo entre os Estados envolvidos, em regra através de um instrumento jurídico formal ou mesmo por mera promessa de reciprocidade.

É importante considerar que a possibilidade de cumprimento da atividade de instrução em sentido estrito, em particular a oitiva de testemunha, por parte da autoridade procedente no território do Estado requerido, não encontra, em regra, uma disciplina expressa nas convenções internacionais de assistência jurídica. Também não está em contraste com a afirmação de que mesmo nessa hipótese as regras relativas à execução da solicitação poderão funcionar como normas de designação do direito aplicável279.

Do ponto de vista do Estado do processo, não há duvida de que a assunção direta constitui uma hipótese de execução extraterritorial dos atos processuais por parte das próprias autoridades280.

A possibilidade de participação direta das autoridades do Estado do processo não altera a discussão quanto à lei a ser aplicada na execução do pedido de assistência, até

278 CIAMPI, Annalisa. L´assunzione di prove all ´estero in matéria penale. Verona: CEDAM, 2003. p.

514. A autora, ao analisar a rogatória participativa e a produção direta da prova, vale-se do argumento de que não há nenhuma vedação no Direito Internacional a impedir ambas as formas de atuação. Sustenta, ainda, que a mesma faculdade que autoriza a delegação a partir de um pedido de assistência, autoriza igualmente o poder de exercício direto da jurisdição. É evidente que o pressuposto básico sempre será o consentimento do Estado requerido.

279 RESOLUTION of the Congresses of the International Association of Penal Law (1926-2004). Nouvelles

Études Pénales, n. 21, p.127, 2009. A possibilidade de participação direta foi sugerida no XIII Congresso

Internacional de Direito Penal.

280 Nestas duas hipóteses o ganho é duplo, na medida em que não somente a cooperação mostra-se mais

eficiente, como a própria eficácia da prova, no sentido do resultado, de demonstrar a veracidade ou a falsidade de uma afirmação. Importante consignar, que podem comparecer ao ato que será praticado no Estado requerido, também as pessoas que participam do procedimento e os seus respectivos defensores.

porque a presença da autoridade do Estado do processo visa exatamente resguardar a presteza do ato, tanto do ponto de vista do conteúdo como da legalidade.

Aliás, no caso da rogatória participativa e, sobretudo, na produção direta da prova, a aplicação da lex loci constitui uma questão de caráter residual. A razão principal do recurso a uma ou outra está na possibilidade de seguir, para o cumprimento dos atos solicitados, as formas previstas na lei do Estado do processo.

Por fim, o recurso à videoconferência. A produção de prova no exterior, notadamente a prova pessoal, pode ser realizada através do recurso à videoconferência. Trata-se rogatória de terceiro tipo, à distância281.

O recurso à tecnologia não elimina, por óbvio, a necessidade de instrumentalização do pedido de cooperação.

As vantagens que decorrem do uso da tecnologia são a redução do tempo para o cumprimento da assistência, a possibilidade de efetiva participação na atividade probatória da autoridade judicial e principalmente das partes.

Inclusive, no que se refere à participação das partes, a defesa é a grande beneficiada, na medida em que o réu, em regra, não possui condições econômicas para suportar os custos do deslocamento ao exterior.

No entanto, para que seja possível o recurso à videoconferência, é fundamental que haja o entendimento entre os Estados interessados, por meio de um acordo bilateral ou multilateral, ou mesmo através da promessa de reciprocidade. Pressuposto indispensável para a utilização da tecnologia é a impossibilidade ou não oportunidade de comparecimento pessoal ao processo no Estado requerente, que deve ser demonstrada no pedido de assistência internacional282.

Na hipótese do Brasil, o recurso à videoconferência será legítimo, se respeitados os requisitos exigidos no Código de Processo Penal tanto para o interrogatório do acusado como para a oitiva de testemunhas, vítimas e peritos à distância notadamente. Necessária a existência de decisão judicial fundamentada, a excepcionalidade da medida

281 PISANI, Mario. Rogatorie internazionali e videoconferenze. Rivista di Diritto Processuale, CEDAM,

v. 57, n. 4. ott.-dic. 2002. p. 983. O autor denomina esta modalidade como “videoconferência transnacional”.

282 CIAMPI, Annalisa. L´assunzione di prove all ´estero in matéria penale. Verona: CEDAM, 2003.

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diante da impossibilidade de comparecimento da testemunha ou perito, e a proporcionalidade, sem prejuízo de outras condições previstas em acordo internacional283.

Nesse sentido, a Corte Constitucional da Itália considera fundamental que a disciplina do uso da videoconferência seja compatível com as garantias previstas na Convenção Européia de Direitos Humanos, e mais especificamente, desde que assegurada, a efetiva possibilidade do imputado e do seu defensor de exercerem os seus respectivos direitos284.

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