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Novas tendências das políticas habitacionais

PARTE I – Enquadramento Teórico

Capitulo 1 Habitação e realojamento

1.5. Novas tendências das políticas habitacionais

Emergindo a urgência de mudanças nas políticas habitacionais, Guerra (2008) aponta algumas tendências de mudança que se têm verificado ao nível internacional, nos últimos tempos: a) A intervenção do Estado mais ao nível de regulação do que de provisão, ou seja, a combinação entre setor público e privado no investimento e cofinanciamento da habitação. Isto requer a procura de parceiros locais e de proximidade e uma maior diversidade de políticas, descentralização das questões habitacionais e maior atenção à sua gestão. b) A integração das políticas habitacionais nas políticas urbanas e da cidade e a aposta na reabilitação é também uma tendência da nova geração de políticas da habitação, a desaceleração da construção massiva, longe dos centros da cidade e desintegrada das

34 funcionalidades urbanas. c) Pelo contrário aposta-se na reabilitação do parque habitacional existente como resposta às necessidades habitacionais e integração no tecido urbano de agregados familiares mais desfavorecidos de uma forma dispersa, evitando a estigmatização dos espaços e proporcionando aos seus habitantes uma convivência favorável (Guerra, 2008, p. 51).

À semelhança do que ocorreu na Europa, nas últimas décadas, também em Portugal se verificaram alterações socias que estiveram na base da procura de novas soluções e respostas por parte do Estado: a) As alterações demográficas que seguiram as mesmas tendências que se verificam noutros países (envelhecimento da população, diminuição da taxa de natalidade e aumento de agregados constituídos por um só elemento). b) Alterações culturais, à estrutura familiar (divórcios, monoparentalidade), bem como exigências de localização. c) A presença de imigrantes económicos com características próprias na apropriação dos alojamentos. d) Por fim e de estrema importância, a instabilidade dos mercados que afeta os rendimentos das famílias (IHRU, 2007, p. 7)

Reconhecendo-se a existência de famílias que continuam a não ter acesso a uma habitação condigna começam a verificar-se mudanças no paradigma da habitação pública também em Portugal, acompanhando as tendências que se verificam na maioria dos restantes países europeus.

Nesse sentido, fundamentando-se no diagnóstico das necessidades previamente realizado e nas discussões envolvendo os principais atores de produção, gestão e apropriação das políticas públicas, o Plano Estratégico 2007-2013 propõe uma reorientação das políticas públicas sobre a habitação. Este plano surge no âmbito de um esforço de planeamento público, por parte do estado, no que respeita ao ordenamento do território. Para tal propõe uma revisão da definição de competências nesta área, sobretudo no que diz respeito à melhoria da articulação dos níveis centrais, regionais e locais. Evidencia uma proposta de aproximação às polícias da cidade e regeneração urbana: a) Mostrando um interesse maior pelas estratégias de longo prazo, que possam também ter a capacidade de antecipar necessidades de habitação, mas também de emprego e infraestruturas, mantendo o equilíbrio entre a oferta e a procura. b) Propõe a partilha de responsabilidades entre o setor público e privado no que se refere aos financiamentos para habitação. c) Propõe ainda um

35 crescimento urbano que não despenda demasiados recursos e não provoque um impacto negativo no contexto em que se irá inserir (IHRU, 2007, pp. 28-29).

Em 2015 foi aprovada em Conselho de Ministros a Estratégia Nacional para a Habitação, cujo teor assenta em três pilares: arrendamento habitacional, a reabilitação urbana e a qualificação dos alojamentos (Decreto do Presidente da República n.º 62/2015).

Em junho de 2017 foi criada a Secretaria de Estado da Habitação que logo de seguida apresentou um documento estratégico com o título: “Para uma Nova Geração de Políticas

de Habitação” aprovado em Resolução do Conselho de Ministros em 4 de outubro de 2017

para submissão e consulta pública. Esta nova geração de políticas pretende garantir o acesso de todos a uma habitação adequada e criar condições para que tanto a reabilitação do edificado, como urbana “passem de exceção a regra”. Estas políticas centram-se sobretudo na criação de medidas que possam garantir às populações o acesso não só a uma habitação, como também a uma habitação com condições de conforto e dimensões adequadas aos agregados que nelas habitam. As grandes inovações destas políticas revelam-se na criação das condições para que a reabilitação seja a principal forma de intervenção ao nível do edificado e do desenvolvimento urbano: durante as últimas décadas a tendência foi a construção nova, no entanto, estas novas políticas pretendem uma mudança nas tendências, dando maior enfase à reabilitação dos edifícios para que deixe de ser praticada em regimes excecionais como vinha acontecendo nos últimos tempos (Secretaria de Estado da Habitação, 2017, p. 20). Outra grande inovação, proposta neste documento, está na inclusão social e territorial e nas oportunidades de escolha habitacionais, este objetivo contraria as tendências de concentração de uma população com fracos recursos económicos, evitando a homogeneização social, estigmatização dos bairros e agravamento da exclusão social (p. 23).

Em resultado destas políticas e enquadrado no âmbito da concretização do primeiro objetivo estipulado no documento “Para uma Nova Geração de Políticas de Habitação”, foi realizado o Levantamento Nacional das Necessidades de Realojamento Habitacional (IHRU, 2018), um diagnóstico das carências habitacionais graves existentes no país (já referenciado no ponto 1.2. deste trabalho), o primeiro a incidir sobre todo o território nacional, com vista a servir de base e à preparação e implementação do 1º Direito – Programa de Apoio ao Direito à Habitação (IHRU, 2018, p. 1).

36 O 1º Direito – Programa de Apoio ao Direito à Habitação é um programa de apoio público à promoção de soluções habitacionais que visa garantir o acesso a uma habitação adequada às pessoas que vivem em condições indignas e que não dispõem de capacidade financeira para fazer face a essa necessidade (DL 37/2018). Para a sua viabilização e implementação realça-se o papel imprescindível dos municípios que, para além de efetuarem o diagnóstico das situações de carência habitacional no território, ficam ainda sujeitos à elaboração de uma estratégia local com enquadramento de todos os apoios financeiros a conceder nos seus territórios no âmbito deste programa (Portaria 230/2018).

As particularidades de implementação deste programa remetem para a descentralização de competências na área da habitação, não apenas ao nível da administração (central, regional e local), como também ao nível setorial (público, privado e cooperativo), como aliás, já vinha a ser proposto desde o Plano Estratégico de 2007-2013, no sentido de dar uma resposta direta às pessoas e paralelamente criar uma dinâmica promocional orientada para a reabilitação do parque habitacional existente, para o arrendamento e para as abordagens integradas e participativas que promovam a inclusão social e territorial (DL 37/2018). O que importa realmente destacar nestas políticas de habitação é a sua abordagem como parte integrante do sistema urbano onde se inserem, isto significa que, a resposta habitacional não passa apenas pela existência de uma habitação, mas também pela melhoria das condições gerais de vida das pessoas, no que respeita ao acesso a transportes, educação, emprego, ação social, saúde, entre outras, consideradas politicas urbanas.

Esta abordagem remete para o conceito de “direito à cidade” como descrito por Henri Lefebvre “como lugar de encontro” e “prioridade do valor de uso” em que a cidade não pode ser entendida como um simples lugar de visita, usada essencialmente pelos turistas e preservada como cidade tradicional, mas sim para uso racional, prático e quotidiano das pessoas que nela habitam, assente numa estratégia urbana renovada, com sentido

reformista, baseada na ciência da cidade com um suporte social e forças políticas para que

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