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PARTE I – ENQUADRAMENTO TEÓRICO

CAPÍTULO 1: A SOCIEDADE DO CONHECIMENTO

2. A Sociedade do Conhecimento

2.3. O acesso ao conhecimento

Como já vimos, esta sociedade em construção, cuja maior riqueza é, cada vez mais, o conhecimento, depende da criação desse conhecimento, da sua transmissão, disseminação e utilização.

Sabemos que o conhecimento se constrói individualmente e que a informação não tem sentido nem valor para uma pessoa, se essa pessoa não estiver predisposta a processá-la e a integrá-la na sua própria rede de experiências cognitivas.

Essa predisposição é muito importante na distinção dos conceitos de ensino e aprendizagem, já que este último se define por uma característica-chave: é uma actividade intencional. E esta intencionalidade deve conduzir à autonomia de aprendizagem, que se pode definir como a capacidade que cada um possui para escolher e para utilizar por si mesmo os recursos postos à sua disposição, com o fim de definir o seu projecto, de traçar o seu itinerário, de se apropriar do saber e do saber-fazer e de avaliar os conhecimentos adquiridos (cf. Fontcuberta: 2003).

Neste contexto da emergência de uma Sociedade do Conhecimento, o construtivismo, enquanto teoria sobre o conhecimento e sobre a aprendizagem, reveste-se de particular importância.

Como nos diz Ana Amélia Carvalho (1998, 6), «A abordagem construtivista, para a qual contribuíram os trabalhos de Jean Piaget, David Ausubel, Lev Vygotsky, Gaston Bachelard, Jerome Bruner, Howard Gardner, Nelson Goodman, entre outros, tem dominado a investigação nos últimos anos.»

O construtivismo descreve o conhecimento como temporário, não objectivo, construído internamente e mediatizado social e culturalmente e a aprendizagem como um processo auto-regulador do conflito entre o conhecimento pessoal do mundo e as novas perspectivas com que o indivíduo se vai deparando. A aprendizagem progride devido à construção de novas representações e de modelos da realidade e à negociação do novo saber com os outros, através do diálogo.

Os construtivistas interessam-se por processos de desenvolvimento e por mudanças a longo prazo, mais do que por micro-mudanças geradas experimentalmente, debruçando-se sobre a aquisição de conhecimentos complexos. Propõem uma abordagem em que as unidades de informação não surjam descontextualizadas, reconhecendo que factos ou componentes em contexto são muito mais significativos do que a soma das características de cada uma das suas componentes (cf. Carvalho: 1998, 8-9).

Os sistemas de Ensino Superior têm um papel único e decisivo na produção do conhecimento (cf. Delors: 1996, 23). Estes mesmos sistemas têm também um papel importante na transmissão e disseminação deste conhecimento.

Contudo, nesta missão, podem contar com a colaboração de todos os outros subsistemas de educação e formação, bem como de todos os órgãos de informação e comunicação, que têm ao seu dispor poderosas tecnologias.

Finalmente, a indústria procura utilizar esse conhecimento em novos produtos e serviços que pretende comercializar.

Temos assim uma sociedade que se move dentro do círculo do conhecimento, que vai desde a produção, passa pela transmissão e disseminação, para chegar à utilização.

Perante a quantidade cada vez maior de informação e de conhecimento que são produzidos, a sociedade criou e passou a utilizar um número maior de meios para aceder a essa informação e a esse conhecimento: os computadores, os espaços multimédia, a

Internet, as redes de TV por cabo, as “redes sem fios”, as redes de centros de investigação, etc.

Em Portugal, a criação da Biblioteca Online do Conhecimento (B-on), em 2004, permitindo o acesso a mais de 3500 publicações científicas, bem como a disseminação das “redes sem fios” nas Universidades, nos Institutos Politécnicos e nas Escolas Básicas e Secundárias, são exemplos bem esclarecedores da disponibilidade de informação que caracteriza a sociedade nos primórdios do século XXI.

Estas estruturas foram criadas e desenvolvidas pela Unidade Missão, Inovação e Conhecimento, entidade governamental responsável pela dinamização, em Portugal, de acções destinadas ao desenvolvimento da Sociedade da Informação até 2004. Nesse ano, passou a Agência para a Sociedade do Conhecimento.

Estes dois organismos são, no nosso país, os pilares fundamentais para que se constitua e se desenvolva de forma harmoniosa a Sociedade do Conhecimento.

A par destas iniciativas de âmbito governamental, surgem ainda iniciativas promovidas por outras entidades, também com forte impacto na sociedade.

Por exemplo, em 2004, a Universidade de Aveiro lançou um motor de pesquisa de livros e documentos na Internet (COLCAT), destinado a fazer a pesquisa simultânea em várias bibliotecas: «Para além da Biblioteca da UA, o sistema faculta ao utilizador uma busca nas bibliotecas das universidades de Lisboa, Minho, Católica, Coimbra e das faculdades de Letras, Economia, Engenharia e de Medicina da Universidade do Porto, na Biblioteca Nacional (Porbase) e Assembleia da República (Parlamento) e na Califórnia Digital Libray (Melvyl), entre outras instituições estrangeiras.» (Público/Lusa, 2004, 52).

Graças a iniciativas deste género, professores, investigadores, alunos e população em geral têm disponível um leque bastante variado de fontes de informação, a que podem aceder de forma cada vez mais rápida e eficaz.

Contudo, o livro, no seu suporte tradicional, continua a ter um espaço próprio, como meio de cultura, de informação, de comunicação e de conhecimento. Podemos, por isso, esperar uma alteração do estatuto do livro, mas não o seu desaparecimento.

Por outro lado, a generalização do uso do correio electrónico e da Internet na vida quotidiana permite-nos concluir que «estamos de regresso à galáxia de Gutenberg» (Antão: 2000, 8-9). Com efeito, a escrita, a reprodução da escrita e a leitura estão obrigatoriamente implicadas nestes novos meios de comunicação.

Também os meios de comunicação hoje não só são veículos fundamentais de acesso à informação, como também contêm uma boa parte da base do conhecimento que se caracteriza pela sua vinculação à actualidade e pela sua transmissão através de diferentes códigos, linguagens e suportes.

Encontramo-nos numa sociedade em que o acesso ao conhecimento se pode encontrar em todo o lado, facto que nem sempre foi assumido pelo sistema educativo.

Por conseguinte, este acesso ao conhecimento torna-se uma questão muito importante para todos, atendendo às implicações que tem, quer para os indivíduos, quer para as sociedades.

Quanto mais a Sociedade do Conhecimento evolui, maiores necessidades apresenta o Homem. Para aceder à grande quantidade de conhecimento que a sociedade lhe exige, precisa de estar preparado, ou então fica cada vez mais afastado dessa mesma sociedade.

Como nos diz Maria de Lourdes Dionísio (2000, 25), «na maioria das sociedades contemporâneas, os indivíduos, no decurso das suas actividades profissionais e quotidianas – de lazer e prazer, de aquisição e utilização de conhecimentos, de convívio social e interacção – são confrontados com situações que geram necessidades de processamento da informação escrita cada vez mais sofisticadas.».

Para termos cidadãos capazes de usufruir plenamente das vantagens da Sociedade do Conhecimento, é necessário que estes estejam dotados de competências que lhes permitam processar a informação que é posta à sua disposição.

A importância desta questão e o seu reconhecimento pelo sistema de ensino português são evidentes na apresentação das competências gerais a alcançar no final do Ensino Básico, definidas pelo Ministério da Educação, no documento Currículo Nacional do Ensino Básico. Competências essenciais., de acordo com os princípios do Decreto-Lei 6/2001. Entre dez competências gerais, encontra-se uma directamente relacionada com esta questão: «Pesquisar, seleccionar e organizar a informação para a transformar em conhecimento mobilizável.» (Ministério da Educação: 2001a, 15).

No que diz respeito à operacionalização desta competência geral, que deverá ter um carácter transversal (cf. Ministério da Educação: 2001a, 16), é explicitado um conjunto de acções «que se reconhecem essenciais para o adequado desenvolvimento dessa competência nas diferentes áreas e dimensões do currículo da educação básica.» (Ministério da Educação: 2001a, 16). Essas acções são as seguintes: «Organizar o ensino

prevendo a pesquisa, selecção e tratamento de informação; Promover intencionalmente, na sala de aula e fora dela, actividades dirigidas a pesquisa, selecção, organização e interpretação de informação; Organizar o ensino prevendo a utilização de fontes de informação diversas e das tecnologias da informação e comunicação; Promover actividades integradoras dos conhecimentos, nomeadamente a realização de projectos.» (Ministério da Educação: 2001a, 22).

Vemos, assim, que o tratamento da informação é claramente considerado como «uma competência transversal, essencial na formação de futuros cidadãos de uma sociedade democrática» (Félix: 1998, 78).

Mas, de igual modo, outras competências gerais visam dar resposta às exigências da sociedade em relação a um sofisticado processamento de informação e conhecimento: «(1) Mobilizar saberes culturais, científicos e tecnológicos para compreender a realidade e para abordar situações e problemas do quotidiano»; «(5) Adoptar metodologias personalizadas de trabalho e de aprendizagem adequadas a objectivos visados»; «(7) Adoptar estratégias adequadas à resolução de problemas e à tomada de decisões». (Ministério da Educação: 2001a, 15). Estas três competências gerais pressupõem o acesso a saberes, a metodologias e a estratégias, pressupõem a sua selecção e a sua organização em função dos objectivos visados.

Dado que o desenvolvimento destas competências implica a totalidade das áreas curriculares, podemos constatar, assim, a relevância concedida, na reforma curricular do sistema educativo português, ao processamento da informação.