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1. BREVE ANÁLISE DO ENSINO JURÍDICO-PENAL NO BRASIL

1.3 O ADVENTO DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 E O ENSINO JURÍDICO

Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, o país buscava a concretização dos valores democráticos e a superação de um passado imerso em autoritarismo e violações de direitos individuais e coletivos. A “Constituição Cidadã”, portanto, representava o ideal de transformação social e no âmbito educacional estabeleceu a educação no capítulo dos Direitos Sociais, direcionando-a a todos, sendo dever do Estado e da família a sua promoção, com a colaboração da sociedade, visando o pleno desenvolvimento da pessoa, para o exercício da cidadania e a qualificação para o trabalho73.

A Constituição Federal apresentou mais uma importante mudança em relação às IES, ao estabelecer que as Universidades deveriam obedecer ao princípio da indissociabilidade entre o ensino, a pesquisa e a extensão74, demonstrando com isso que não se pode mais admitir uma formação restrita a sala de aula, sem o aprofundamento do conhecimento científico por meio da pesquisa e o diálogo interativo com a sociedade através da extensão universitária.

Na tentativa de se adequar a concepção educacional proposta pela CF/88, a Ordem dos Advogados do Brasil – OAB, com o objetivo de analisar o ensino jurídico, desenvolveu um estudo nacional em 1992, para avaliar as condições dos cursos de Direito no País e dessa forma perceber quais os principais problemas enfrentados e quais poderiam ser as alternativas para superá-los. Como produto dessa análise foi editada a Portaria nº 1.886/94 do Ministério da Educação – MEC, que revogou a antiga Resolução CFE nº 03/72, passando a instituir as diretrizes e o currículo mínimo para os cursos de Direito.

Assim, a Portaria nº 1.886/94 do MEC estabelecia que o Curso de Direito teria que desenvolver atividades de ensino, pesquisa e extensão interligadas e obrigatórias para atender a necessidade de formação fundamental, sociopolítica, técnico-jurídica e prática dos bacharéis em Direito, demonstrando que o interesse não deveria mais ser apenas o de formar profissionais, como outrora, mas desenvolver a pesquisa científica e o diálogo com a comunidade extramuros, de modo a realizar uma formação humanista dos graduandos.

1.3.1 Novas Diretrizes e Bases da Educação Nacional e Resolução nº 9/2004 do MEC

73 BRASIL. Presidência da República. Constituição Federal. Art. 6º e 205. 74 BRASIL. Presidência da República. Constituição Federal. Art. 207.

Por sua vez, alguns anos mais tarde, foi publicada a Lei nº 9.394 de 20 de dezembro de 1996, que apresentava as Novas Diretrizes e Bases da Educação Nacional, e, no âmbito dos cursos superiores, apresentou, em linhas gerais, que a finalidade de um curso superior deveria ser o de estimular o ensino critico reflexivo e socialmente responsável, a pesquisa científica e a extensão universitária, visando compreender de forma efetiva os problemas sociais, através da manutenção constante do diálogo horizontal com a comunidade externa ao ambiente universitário.

Posteriormente, a Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação, edita a Resolução nº 9 de 29 de setembro de 2004, que instituiu as diretrizes curriculares do curso de graduação em Direito, inclusive, com revogação da Portaria nº 1.886/94 do MEC. A Resolução, portanto, estabelecia como um dos pontos mais relevantes, a obrigatoriedade do Projeto Pedagógico Institucional para a organização dos cursos jurídicos75 brasileiros, devendo- se ater ao perfil do estudante, as competências e aos componentes curriculares e, diversas questões relacionadas a organização institucional e metodológica dos cursos.

Além de prever a obrigatoriedade do Projeto Pedagógico Institucional, a Resolução supracitada também estabelecia que o curso de Direito deveria proporcionar diversas capacidades ao estudante, como uma sólida formação geral e humanística aliada a uma postura reflexiva e de visão crítica76. Dessa forma, demostrava a necessidade de uma formação menos linear e dogmática nos cursos jurídicos, que não se voltasse apenas à capacitação para o ingresso no mercado de trabalho, sem a mínima compreensão dos problemas sociais circunscritos ao ambiente acadêmico.

No que tange ao currículo jurídico, a Resolução nº 9/2004 determinava em seu art. 5º, que o Projeto Pedagógico Institucional e a organização curricular das Faculdades de Direito deveriam contemplar um eixo de formação fundamental, no qual o estudante seria integrado a um conhecimento mais amplo, no sentido de estabelecer relações entre o Direito e outros campos do saber, sobretudo, por meio de conteúdos relacionados à matérias propedêuticas. Estabeleceu, também, um eixo de formação profissional que deveria compreender, além do estudo dogmático, o conhecimento e a aplicação dos diversos ramos do Direito, observados através de um contexto socialmente referenciado das necessidades, mudanças culturais e políticas do país. Por fim, um eixo de formação prática, objetivando interligar os conhecimentos teóricos obtidos à aplicação prática por parte dos estudantes.

75 MAGALHÃES, Daniella Santos. op. cit., p. 72.

Assim se percebe que a Resolução nº 9/2004 do MEC tentou adequar os cursos de graduação em Direito às novas demandas trazidas pela Constituição Federal de 1988, defendendo a necessidade de integração entre ensino, pesquisa e extensão e a relação próxima entre a teoria e a prática, no sentido de dotar seus estudantes de uma formação humanista, voltada para a análise crítico-reflexiva das legislações e das questões sociais que circundam as Faculdades de Direito.

Contudo, mesmo com os méritos alcançados pela referida Resolução, alguns problemas persistiram na formação jurídica, vez que os cursos continuaram reproduzindo um modelo de ensino de tradições imperiais advindas da Universidade de Coimbra, com aulas magistrais e análise de códigos, o que dificulta o diálogo entre os campos de saberes e não contribui para uma reflexão crítica emancipatória e socialmente referenciada, como se os estudantes fossem verdadeiros repositórios de doutrinas77. Isso faz com que com que o principal desafio do ensino jurídico deste tempo seja a necessidade de mudança realizada de dentro para fora, ou seja, nas Universidades e, sobretudo, na sala de aula78.

Após esse percurso histórico do ensino jurídico no Brasil é necessário concentrar-se na formação jurídico-penal da Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia, para compreender de que maneira esta formação está sendo pensada e realizada e qual a posição da interdisciplinaridade no processo de ensino-aprendizagem, através da análise do Projeto Político Pedagógico do curso, das ementas e da compreensão dos estudantes, como atores envolvidos nesse processo.

77 SÁ e SILVA, Fábio Costa Morais de. Ensino Jurídico, um Tesouro a Descobrir. A Construção de

Alternativas Pedagógicas e Metodológicas a partir da Reforma do Ensino Jurídico (e Jurídico-Penal). 215 p. Dissertação (Mestrado em Direito) – Direito, Estado e Constituição, Universidade de Brasília, Brasília 2007. p. 147.

78 MORAES, Patrícia Regina de; SOUZA, Indira Coelho de; PINTO, Denise Almada de. Oliveira;

ESTEVAM, Sebastião José; LIMA, Alessandra da Silva. O Ensino Jurídico no Brasil. Revista Eletrônica – Direito em Foco – UNISEPE, Brasil: 2014.

2. A PERCEPÇÃO DOS DISCENTES E A COMPREENSÃO CRÍTICA DO ENSINO