• Nenhum resultado encontrado

O aerobarco – O aerobarco se comporta como uma embarcação co-

No documento Arte Naval - Fonseca - Vol 1 - 7ª Ed.- 2005 (páginas 165-169)

SEÇÃO D – AEROBARCOS E VEÍCULOS SOBRE COLCHÃO DE AR

3.29. O aerobarco – O aerobarco se comporta como uma embarcação co-

mum quando está parado ou navegando a baixas velocidades. Seu casco é, então, sustentado pela água. Com o acréscimo da velocidade, inicialmente aumentam a sustentação gerada pelos hidrofólios e a resistência ao avanço da embarcação. Quando a força de sustentação se iguala ao peso, ocorre a decolagem e o casco se eleva acima da superfície, reduzindo-se consideravelmente a resistência ao avanço. Mantida a potência de propulsão, o aerobarco acelera e, desde que provido de um sistema estável de hidrofólios, o casco se manterá sustentado fora d’água.

Existem três configurações básicas de hidrofólios, das quais depende a estabilidade do aerobarco quando viajando acima da superfície:

(1) hidrofólios com estabilização natural por proximidade da superfície;

Fig. 3-42 – Visão artística de um navio-doca (NDD) da Marinha norte-americana operando com duas embarcações sobre colchão de ar (EDCA). Os NDD podem transportar de duas a quatro EDCA, dependendo da classe, e podem desembarcá-las a mais de 20 milhas da costa. As EDCA vencem essa distância em cerca de meia hora e podem avançar sobre a terra firme. Cada EDCA norte-americana pode transportar 250 fuzileiros navais equipados, ou um tanque e uma viatura blindada leve, ou cinco viaturas leves, entre outros carregamentos possíveis.

(2) hidrofólios com estabilização natural por equilíbrio de área imersa; e (3) hidrofólios totalmente submersos, com estabilização por dispositivos de controle.

Os hidrofólios com estabilização natural por proximidade da superfície (shallow- draft submerged foils) somente funcionam em águas tranqüilas. Baseiam-se no fato de que os hidrofólios perdem sustentação dinâmica quando se aproximam da superfície da água, pois esta superfície se deforma, afetando a queda de pressão no dorso do hidrófilo. A simplicidade desse sistema possibilitou aos soviéticos o seu emprego numa infinidade de aerobarcos utilizados em lagos, rios e canais; lá, são extremamente úteis, constituindo um meio de transporte rápido, seguro e adequado para o ambiente em que são empregados (fig. 3-43).

Os hidrofólios com estabilização natural por equilíbrio de área imersa (surface piercing foils) são os utilizados nos aerobarcos conhecidos no Brasil. Com parte de seus hidrofólios acima da superfície da água, o aerobarco é naturalmente estável após a decolagem, pois, para cada velocidade, existe uma linha-d’água do arranjo de hidrofólios que possibilita equilibrar o peso da embarcação com a sustentação dinâmica provida pela área de hidrofólio que permanece submersa. Qualquer perturbação em altitude é também corrigida por variação natural desta área submersa. Infelizmente, os aerobarcos com arranjos de hidrofólios com estabilização natural por equilíbrio de área imersa se tornam extremamente desconfortáveis, quando existem ondas além de um certo tamanho relativo ao do aerobarco. Manter velocidade suficiente para a sustentação pelos hidrofólios, em certas situações de mar, leva a acelerações insuportáveis para as pessoas a bordo e à possibilidade de danos materiais. Nessas ocasiões, o aerobarco é obrigado a pousar na superfície da água e agüentar a tempestade como qualquer embarcação convencional.

A grande maioria dos aerobarcos operando no Ocidente utiliza esse sistema de estabilização. Tem sua eficácia comprovada em águas abrigadas de baías, lagos e rios, como meio de transporte para passageiros e algumas cargas especiais. Sob o ponto de vista militar, aerobarcos com esse sistema são utilizados com sucesso, como embarcações de patrulha, em águas restritas. Um exemplo é da Marinha da Fig. 3-43 – Durante as décadas de 1960 e 1970, cerca de 300 aerobarcos da classe Raketa, primeira a utilizar hidrofólios com estabilização natural por proximidade da superfície, foram empregados com grande sucesso como meio de transporte nos rios, lagos e canais da Rússia.

China, que emprega aerobarcos desse tipo, desde o final da década de 1960, che- gando a possuir, no início da década de 90, cerca de 150 unidades das classes Hu Chuan e Rena. Suportam atingir velocidades da ordem de 45 a 55 nós, com mar calmo. Outro exemplo é o da Marinha da Rússia, com diversos tipos e classes de aerobarcos para emprego militar.

Impróprios para utilização em mar agitado, os tipos mencionados até aqui têm emprego militar restrito. As tentativas de obtenção de aerobarcos de emprego oceânico se concretizaram ao final da década de 1960 nos Estados Unidos da América, com o desenvolvimento do sistema de hidrofólios totalmente submersos, com estabilização por dispositivos de controle (fully submerged foiIs). Construíram- se então dois protótipos de embarcação de patrulha, o Tucumcari e o FIagstaff.

O sistema totalmente submerso depende de dispositivos de controle para prover sua estabilização. Esse controle se assemelha, em complexidade, aos pilotos automáticos de aeronaves.É necessário prever as ondas com certa antecedência e comandar automaticamente superfícies móveis (tipo flap) que controlam o movimento no plano vertical do aerobarco. É possível, assim, obter uma plataforma quase totalmente estável, até um certo limite de mar. Pode-se também, a partir desse limite, com ondas maiores, obter-se comportamentos em que o aerobarco tem seu movimento amortecido em relação ao mar, ou acompanha as grandes ondas, descendo nos cavados e galgando as cristas (fig. 3-44).

A complexidade do sistema de controle e a necessidade de utilizar ligas metálicas leves e resistentes na estrutura desses aerobarcos fizeram com que fossem projetados e construídos pela indústria aeronáutica. O Tucumcari era produto da Boeing, e o Flagstaff , da Grumman. Os custos tenderam, conseqüentemente, a ficar mais próximos dos de aeronaves do que de navios.

Os resultados obtidos com esses protótipos, considerados satisfatórios, levaram, na década de 80, à construção de classes de aerobarcos de oceano em diversas marinhas de guerra. Como exemplos, podemos citar:

(1) classe Pegasus, da Marinha americana, velocidade 40 a 50 nós, armados com canhão de 76 mm e mísseis Harpoon (fig. 3-45);

(2) classe Shimrit, da Marinha israelense, velocidade 35 a 48 nós, com canhões de 80 mm, mísseis Gabriel e Harpoon, e

(3) classe Sparviero, da Marinha italiana, velocidade 38 a 50 nós, com canhão de 76 mm, mísseis Ottomat.

Sem dúvida, o comportamento no mar dos hidrofólios totalmente submersos, a pequena vulnerabilidade a minas e torpedos e a possibilidade de obter uma plataforma estabilizada a alta velocidade os tornam atraentes. As vantagens, no entanto, são contrabalançadas por um custo elevado, que cresce exageradamente com o aumento de porte. Limitações de porte, por sua vez, trazem restrições de peso e raio de ação, que fazem com que as missões que os aerobarcos possam desempenhar, com vantagem em eficácia, se limitem a uma pequena faixa das possíveis missões de patrulhamento oceânico, sendo suplantados fora dela por navios-patrulha e aeronaves baseadas em terra. Seu emprego ainda é muito limitado.

A dificuldade em alcançar, com aerobarcos, velocidades superiores a aproxi- madamente uns 60 nós é a cavitação nos hidrofólios. A ocorrência de cavitação depende de diversas variáveis e se trata do mesmo fenômeno conhecido em hélices, cujas pás nada mais são do que hidrofólios rotativos. Ela se manifesta nas altas velocidades em relação ao fluido, em grandes ângulos de ataque dos hidrofólios, nas regiões de baixa pressão ou onde exista separação da camada-limite do escoa- mento. Pequenas bolhas de gás existentes na água se expandem ao encontrarem as regiões de baixa pressão do escoamento, para onde foram aceleradas. Quando o fluxo as leva, expandidas, para uma região onde são desaceleradas, podem colapsar, tão repentinamente, que a implosão causa ondas de choque que podem atingir pressões e temperaturas locais muito elevadas. Quando essa implosão ocorre próximo à superfície do hidrofólio, ela se torna altamente indesejável, pois as ondas de choque podem erodir o material da superfície, causando-lhe crateramento. As implosões que ocorrem na esteira produzem apenas ruído.

A solução para atingir, com aerobarcos, velocidades superiores a 60 nós e alcançar até uns 100 nós é desenvolver hidrofólios supercavitantes que funcionem em condições de cavitação inteiramente desenvolvida. Isto, na prática, não é facilmente alcançável e muita experimentação foi realizada, principalmente pela Marinha americana. Existem muitas dificuldades a serem superadas, se é que serão algum dia, para tornar possível a utilização de aerobarcos, em alto-mar, em velocidades superiores às alcançadas atualmente (50 a 60 nós).

No documento Arte Naval - Fonseca - Vol 1 - 7ª Ed.- 2005 (páginas 165-169)