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3.2 Acessibilidade e sua aplicabilidade prática

3.2.2 O caso da UFFS

A Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) é uma instituição de ensino superior multicampi, criada pela Lei nº 12.029, de 15 de setembro de 2009, abrangendo mais de 400 municípios da Mesorregião Grande Fronteira Mercosul – Sudoeste do Paraná, Oeste de Santa Catarina e Noroeste do Rio Grande do Sul. Dentro do processo de expansão do ensino público superior, veio atender aos anseios dos movimentos sociais e da sociedade civil organizada,

numa região historicamente desassistida pelo poder público, especialmente com relação ao ensino superior.

A UFFS desenvolve uma política de ingresso que privilegia as escolas de ensino médio público, com reserva em torno de 90% das vagas na graduação para estudantes que cursaram o ensino médio exclusivamente em escola pública. Dessa forma, caminha na direção da igualdade e oportuniza uma graduação gratuita e de qualidade, oferecendo bolsas e auxílios para que os alunos possam se dedicar aos estudos e permanecer na Universidade até o fim do curso (Site da Universidade).

O Decreto Nº 7.611/2011, que dispõe sobre a educação especial e o atendimento educacional especializado, prevê, no Artigo 5º, § 2º, a estruturação de núcleos de acessibilidade nas instituições federais de educação superior, os quais visam eliminar barreiras físicas, de comunicação e de informação que restringem a participação e o desenvolvimento acadêmico e social de estudantes com deficiência.

A UFFS, no ano de 2015, instituiu a Política de Acesso e Permanência das Pessoas com Deficiência, considerando os referenciais de acessibilidade na educação superior e a avaliação in loco do sistema nacional de avaliação da educação superior (SINAES, 2013).

No Campus Cerro Largo, o Núcleo de Acessibilidade acompanha as atividades de três alunos com deficiência, com oferta de apoio pedagógico e acompanhamento psicológico realizado pela Assessoria de Assuntos Estudantis. Em relação aos docentes, durante o transcurso de cada semestre o núcleo oferece auxílio nos processos pedagógicos e na resolução de problemas de ensino/aprendizagem. Além disso, o núcleo se encarrega de realizar atividades para discutir e debater a inclusão das pessoas com deficiência, como seminários, palestras e oficinas.

Quanto aos recursos pedagógicos para atender os alunos com deficiência, o Campus dispõe de serviços assistivos como scanner com áudio, computadores com programas especiais, materiais produzidos pelos professores para as aulas de laboratórios, como os de silicone para o aluno cego “ver com o tato” o formato das células e micoorganismos, entre outros.

No caso do aluno cego, o Campus disponibiliza atendimento especializado, com uma bolsista para dar suporte à aprendizagem, cabendo a ela preparar o material a ser utilizado em sala de aula, transformar textos escritos em áudio, acompanhar o acadêmico em atividades que necessitam de auxílio, como viagens e práticas de laboratório, além da aplicação de

instrumentos de avaliação, como trabalhos acadêmicos, testes e provas. No início de cada semestre é ofertada uma oficina aos docentes dos CCRs nos quais o aluno está matriculado.

O referido acadêmico pode relatar a sua experiência de inclusão no I Seminário de Práticas Inclusivas, realizado em 2015 pelo Núcleo de Apoio Pedagógico e pelo Núcleo de Acessibilidade do Campus Cerro Largo. Segundo matéria veiculada sobre o evento:

Ele tem 22 anos, cursa Agronomia na Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) - Campus Cerro Largo e está aprendendo a ler e a escrever. Não a língua portuguesa, da qual já é conhecedor, mas uma língua nova para ele, o sistema linguístico chamado Braille. Douglas Luis Utzig é cego há pouco mais de um ano, após um acidente, e, mesmo com todas as dificuldades encontradas, não desistiu de estudar. “Fiquei afastado da Universidade por seis meses. Quando retornei, os professores me perguntavam quais seriam as dificuldades que eu teria para estudar, mas como eu era novo nesse 'ramo', nem eu sabia”, brinca o estudante. Não tardou em descobri-las, mas com as adversidades também vieram algumas soluções: Douglas instalou em seu computador um software que oraliza as informações do sistema operacional e lê os textos passados pelos professores; a UFFS criou uma bolsa para um monitor que pudesse acompanhá-lo em suas tarefas acadêmicas dentro e fora da sala de aula e, por meio da professora Cleusa Inês Ziesmann, foi proposto um curso de extensão em Braille. Além de aprender a leitura e escrita ortográfica em Braille, o sistema tem recursos que permite ler cálculos. “Isso vai reduzir muito as dificuldades com as disciplinas que envolvem cálculos, porque exigem muito de mim e também dos professores, ao tentar me ensinar”, conta. O curso é frequentado por estudantes de outros cursos do Campus, servidores técnico-administrativos, pelo monitor de Douglas, Ismael Skalinski, e por sua irmã, Katieli Utzig. A professora Cleusa, que ministra o curso, explica que a presença de Douglas enriquece o aprendizado dos demais, já que há diferença no ensino de Braile para quem é cego em relação a quem é vidente. “Para os videntes é bem mais fácil, enxergamos a combinação de pontos, fazemos a leitura do braile através da nossa visão. Para o cego, o braille é aprendido a partir do tato dele, de suas mãos. O ensino é diferente: o cego precisa memorizar e decorar os pontos, criando essa aptidão”, ensina a professora. “Vimos os dois processos: acompanhamos o Douglas aprendendo e pudemos observar como a Cleusa o orienta, que é diferente da forma como ela nos ensina. Se um dia tivermos um aluno que precise de nosso apoio, nós vamos saber como trabalhar, porque vimos as dificuldades que o Douglas passou”, relatou a estudante do curso de Letras, Cláudia Espíndola. (Por Ana Elisa Bobrzyk, jornalista do Campus Cerro Largo/Site da UFFS)

Segundo a pedagoga do Campus, que preside o Núcleo de Acessibilidade, ainda há demandas a serem supridas, com vistas à acessibilidade plena, como sinalização tátil nas portas, carteiras escolares adaptadas, placas indicativas e telefone adaptado para surdos. No entanto, ela manifesta em seu depoimento que o maior obstáculo é cultural, pois percebe que “a maioria das pessoas ainda considera a pessoa com deficiência como alguém incapaz”.

O relato dessa experiência educacional demonstra a relevância das políticas educacionais de acesso e permanência dos alunos com deficiência, pois junto com o aumento de vagas no ensino superior, faz-se necessária a busca por uma inclusão efetiva desses estudantes, garantida por políticas pedagógicas de permanência, cujos reflexos serão sentidos na mudança de vida dos sujeitos na sua inclusão social.

No dia 15 de dezembro de 2016, ocorreu a primeira defesa de um Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) de uma estudante surda da Instituição: a aluna do curso de Administração do Campus Chapecó, Suzana Bock. A acadêmica de Administração escolheu como tema do TCC “Inserção no mercado de trabalho dos sujeitos surdos: uma perspectiva com os membros da Associação de Surdos em Chapecó”. O Núcleo de Acessibilidade do Campus Chapecó prestou auxílio para a realização do estudo, e os intérpretes de Libras ajudaram na transcrição dos relatos. Segundo depoimento da aluna, o TCC e o curso de Administração foram desafios superados na sua trajetória acadêmica (Site da UFFS).