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2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.5 O USUÁRIO MÓVEL

2.5.1 O comportamento do usuário móvel

Os usuários móveis possuem comportamentos diferentes dos usuários de desktops, pois são usuários que processam e usam informação em movimento. Ruídos e problemas de conexão fazem parte da rotina desse usuário. Nesse uso destacam-se alguns comportamentos, ações numa busca incessante por recompensas de informação, onde se destacam dois comportamentos chave: o multitarefa e o de checagem. São comportamentos intimamente ligados às interações sociais e à ubiquidade exercida pelos usuários.

A ubiquidade é grandemente responsável por alguns comportamentos anômalos. Segundo Mantovani e Moura (2012, p. 68) as “interações ubíquas” acontecem no contexto sócio cognitivo do “comportamento multitarefa” e da “atenção parcial contínua”. Para as autoras, esses comportamentos compõem as demandas cognitivas dos usuários e podem levar ao “reposicionamento” sem fim de “prioridades”. O comportamento multitarefa tem implicações na atenção e concentração, pode impactar o ensino, trabalho, vida pessoal, sejam os usuários móveis ou não.

Mas será possível realizar muitas tarefas ao mesmo tempo com eficácia? Usuários podem se iludir sobre o poder de realizar muitas tarefas ao mesmo tempo, afinal, o cérebro humano funciona serialmente, ou seja, faz uma coisa de cada vez. (MANTOVANI; MOURA, 2012, p. 71). Como realizar uma atividade com atenção sobre um dispositivo emanador de mensagens ininterruptas? Como concentrar-se exercendo a ubiquidade? Segundo Powers (2012, p. 17) perde-se “algo de grande valor” que está ligado às formas de “pensar e de se mover pelo tempo”, a “profundidade”. Esvai-se a sagacidade das relações e também das reflexões, leituras, atenção e concentração, que podem ser prejudicadas pelo uso de DM.

Mas o que é o comportamento multitarefa? Zhong (2013, p. 1744) indica que esse comportamento é também conhecido como “media multitasking” e se caracteriza como “execução de múltiplas tarefas em rede durante certo período de tempo”. Segundo o autor esse comportamento se tornou banal para os usuários móveis. O comportamento multitarefa é o exercício de mais de uma atividade ao mesmo tempo, por exemplo, enquanto faz trabalhos acadêmicos o estudante dialoga via aplicativo e acessa redes sociais, acessa correio eletrônico, responde mensagens. Baron (2007, p. 13) afirma que o comportamento multitarefa pode “reduzir o desempenho cognitivo” e

prejudicar as interações sociais ao diminuir o nível de “envolvimento interpessoal”.

Language users magnify the affordances of ICT when they engage in multitasking behavior. Multitasking (that is, involvement in more than one activity at a time) takes many forms – from simultaneously talking on the phone and reading email to participating in multiple IM conversations. Multitasking is widespread in contemporary society, especially when using ICTs. (BARON, 2007, p. 2).

O comportamento multitarefa possui características distintivas. O uso de DM mistura comunicação e tarefas e é justamente isso que caracteriza o comportamento multitarefa; tarefas simples do cotidiano, mas demandadoras de dedicação (física e mental); resulta da falta e tempo ou estado emocional (solidão, enfado); as tarefas novas (que o usuário não possui experiência) são as mais prejudicadas; pode ocorrer na dimensão social (presencialmente) enquanto lê ou responde mensagens instantâneas, mas também na dimensão cognitiva (quando todas as tarefas são de natureza cognitiva), por exemplo, enquanto usuário lê e assiste a uma aula. (BARON, 2007, p. 7-8).

Pode acontecer em desktops, mas são os DM os grandes vetores. Essencialmente esse tipo de comportamento tira a concentração dos usuários, corrói o desempenho cognitivo e apesar das tentativas de realizar uma atividade de cada vez, as distrações advindas das tecnologias de informação são constantes: ligações, mensagens, redes sociais; mas ainda assim é possível reduzir prejuízos com treinamento e experiência, afinal, o cérebro humano é plástico e se adapta a todas as situações. (BARON, 2007, p. 9-10).

O comportamento multitarefa compõe os hábitos de uso do DM. A formação de hábitos entre estudantes universitários mostra a praxe de acesso à informação em DM se transformando pela conexão constante (ubiquidade) e pelos aplicativos, basta observar que os padrões de uso mais fortes são correio eletrônico, redes sociais e notícias. (OULASVIRTA et al., 2011). Outros autores corroboram essa afirmação e apontam que as praxes mais usuais estão ligadas ao envio de mensagens de texto, e-mails, redes sociais e notícias. (LAPOINTE; BOUDREAU-PINSONNEAULT; VAGHEFI, 2013, 1064-1065).

investigar suas motivações. São hábitos novos entendidos como “comportamentos automáticos” ou involuntários, com gatilhos e motivações específicas sustentam Oulasvirta et al. (2011). Para os autores, são desencadeados por estímulos externos e podem reduzir o autocontrole dos usuários, ou seja, os DM são vetores de dependência.

Contudo, existem outros comportamentos além do multitarefa. Oulasvirta et al. (2011) destacam o “hábito de checagem”, comportamento automático em busca de recompensas informacionais ou “informational value”. A checagem consiste no uso rápido do DM para verificar novidades (ou recompensa informacional), podem ser motivados por muitos estímulos (externos e internos); esse tipo de comportamento é característica fundamental do uso de DM e se constitui em grande parte do uso do aparelho. (OULASVIRTA et al., 2011).

The diary study users spontaneously bring up the issue of repeatedly checking their phones. Some users considered it an annoyance. Many positive experiences of repetitive uses were mentioned as well, mostly relating to entertainment, time- killing, and diversion. (OULASVIRTA et al., 2011).

E o que são recompensas informacionais? Usuários de redes sociais conhecem bem esse tipo de recompensas: sinais, sons, luzes que apontam ‘curtidas’ e ‘novas amizades’ e mensagens em geral. Já não são apenas as novas mensagens de correio eletrônico, mas a rede em conjunto com todas as redes sociais atuando como um grande disseminador e gerador de recompensas de informação. Essas recompensas exercem papel importante no mercado em rede ao fidelizar os usuários. Desenvolvedores exploram com maestria esse recurso: mesmo que o usuário não possua nem mesmo um único ‘amigo’ no Facebook, notificações não lhe faltarão.

As recompensas podem ser classificadas em três tipos básicos: informativas (atualização dinâmica das redes sociais, e que o usuário não interfere na informação), interacionais (permitem ação e envolvimento do usuário, tais como atualizações de status, notificações, interações) e de conhecimento, um tipo de valor diferenciado. (OULASVIRTA et al., 2011). Essas recompensas fomentam os comportamentos (usual ou dependente) e podem produzir fadiga social, menos autocontrole e conduta viciante. (DEURSEN et al., 2015, p. 417).

Awareness reward value is a specialized form of information value. Whereas informational value corresponds to the user learning something they did not know before, or confirming something they did know about, awareness value corresponds to the goal of maintaining a representation of the dynamically changing external reality; for example, a user might refresh their e-mail inbox to see whether any new messages have arrived—and often no new messages have arrived, providing awareness value. Or a user might check Facebook to see whether a certain person has logged in in order to directly communicate with him/her. (OULASVIRTA et al., 2011).

A busca incessante por recompensas informacionais pode prejudicar os usuários. Quando o comportamento dos usuários móveis se torna muito orientado por fatores externos, torna-se mais penoso atingir objetivos e metas pessoais, especialmente quando se trata de vícios ligados ao acesso à internet, como redes sociais e verificação de correio eletrônico. (OULASVIRTA et al., 2011). Os DM criam formas alternativas de acesso e interação com a informação, mas para descobrir se o acesso ilimitado (ou a ubiquidade) pode influenciar as atitudes informacionais dos usuários, é preciso de mais pesquisas. (BURFORD; PARK, 2014, p. 622-623).

O estudante que adere de forma veemente ao exercício desses comportamentos pode ter os resultados acadêmicos grandemente prejudicados, da mesma forma, os instrumentos usados pelos usuários em DM podem influenciar seus resultados. Os aplicativos, por exemplo, segundo Burford e Park (2014, p. 635), enquanto mediadores da informação são restritos informacionalmente, pois criam rotas pré- definidas à informação, buscas “limitadas, finitas e discretas”, assim, o uso de aplicativos, a informação limitada ou “visões finitas de informação” se imiscuem com a capacidade dos usuários pesquisarem com qualidade explorando o poder da rede de forma adequada. Mas também existem aplicativos para uso dos motores de busca comerciais em rede, a exemplo do Google. Acessar os motores de busca para ampliação dos repertórios de informação faz a pesquisa dos usuários móveis se transformar em algo entre a navegação em rede e o uso de aplicativos ou de buscas mais abrangentes. (BURFORD; PARK, 2014, p. 635).

Claramente os DM impactam no comportamento informacional dos usuários móveis e fazem mais amplo e indefinido o contexto de acesso e uso de informação; o uso de aplicativos cria visões personalizadas do universo de informação existente em rede, além de interfaces personalizadas para atender suas necessidades de informação pessoal. (BURFORD; PARK, 2014, p. 636). É preciso questionar: sob a ótica do ensino e da pesquisa, até que ponto é benéfico o uso de aplicativos?

O usuário móvel está sujeito às benesses e as consequências negativas do uso de DM no ensino, trabalho e vida pessoal. Se por um lado, o acesso à informação é facilitado, por outro, a tecnologia e o perfil dos usuários podem anular os benefícios oferecidos pelos DM. Um usuário atormentado pelo excesso de informação, interação excessiva, estresse da ubiquidade, comportamento multitarefa, pode perder o discernimento para identificar com clareza o que é informação de qualidade. Esse usuário que sofre com o excesso de informação pode se tornar passivo e indiferente. (SENNETT, 2008, p. 156).

Pesquisas em todo mundo estudam esses comportamentos anômalos. Na Holanda estudo verifica diferenças no uso do aparelho entre gêneros e distingue o vício/dependência entre DM e internet. (DEURSEN et al., 2015, p. 411). Os comportamentos normal e dependente estão relacionados a alguns fatores: formas de uso, tipos de práticas sociais, inteligência emotiva, nível de fadiga social e autocontrole; e ambos os comportamentos - normal e dependente - estão inter-relacionados. O comportamento normal pode conduzir aos comportamentos automáticos ativados pelos impulsos de checagem, notificações, todos ativadores de experiências prazerosas; são recompensas informacionais que somadas às práticas sociais interferem grandemente no uso do DM e pode levar o usuário a conduta dependente que caracteriza o vício. (DEURSEN et al., 2015, p. 414).

Os comportamentos quanto ao uso de DM apresentam diferenças de gênero significativas. As mulheres dedicam mais tempo sobre os DM. (ZHONG, 2013, p. 1747). Os homens usam o DM menos para fins sociais e sofrem menos estresse e fadiga social que as mulheres, ou seja, são menos propensos a desenvolver condutas dependentes pelo uso do DM. (DEURSEN et al., 2015, p. 417). Ainda que as mulheres sejam mais suscetíveis à dependência em DM as consequências são realidade para todos os gêneros, etnias e faixas etárias.

Estudantes de todos os níveis e perfis estão sujeitos às implicações físicas e psíquicas do uso de DM mesmo em diferentes

níveis. Algumas consequências, com foco no usuário móvel, serão exploradas na seção seguinte.