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O Conceito de ‘Public Engagement with Science and Technology’ (PEST)

Capítulo 2: A Comunicação e a Ciência

2.6 Modelos de Comunicação de Ciência

2.6.2 O Conceito de ‘Public Engagement with Science and Technology’ (PEST)

ciência’ e ‘envolvimento público na ciência e tecnologia’, sendo que o primeiro tem como objetivo ensinar e explicar os conteúdos científicos aos cidadãos, enquanto que o último procura “mobilizar os cidadãos e os cientistas envolvendo-os numa conversação democrática” (p. 18).

Segundo Oliveira e Carvalho (2015), o conceito de Public Engagement with Science and Technology (PEST) ou ‘Compromisso público com a Ciência e a Tecnologia’ surgiu devido à procura de “novas formas de negociação social das políticas científico-tecnológicas” (p. 156). O termo “envolve o compromisso entre sociedade e ciência, através do diálogo, em particular através de uma discussão aberta e de igual para igual que possibilite aos leigos tornarem-se os protagonistas nas decisões científicas com impacto social (Pitrelli, 2003)” (Oliveira & Carvalho, 2015, p. 156).

Segundo Granado e Malheiros (2015), “o envolvimento do público na ciência era defendido como a solução para uma crise de confiança do mesmo na ciência e nos cientistas” (p. 18), que se afirmou devido a uma série de escândalos, tais como a doença das vacas loucas que surgiu no Reino Unido. Ainda sobre a origem do engagement, McCallie et al. (2009) destacam que “a abordagem do PES para os públicos e para a ciência surgiu inicialmente daqueles que criticavam o PUS” (p. 23), como sendo “principalmente uma questão de educar o público sobre a ciência” (p. 23).

O engagement é um movimento que teve início na Europa, nos anos 90, e é “também muitas vezes denominado de ‘participação pública’” (Oliveira & Carvalho, 2015, p. 157), pois requer a inclusão do público na ciência. No entanto, esta variante comunicacional surgiu ainda no âmbito do paradigma da ‘compreensão pública de ciência’, “mas partilhando já os ideais do modelo de participação” (Oliveira & Carvalho, 2015, p. 159).

Para Magalhães e Ruão (2018), o public engagement é um conceito que “exprime o entendimento de que mais do que conhecer o trabalho da ciência, se deve procurar que o público seja capaz de se envolver com esse trabalho” (p. 197). Já Bauer e Jensen (2011) assumem um definição de public engagement, ou ‘envolvimento público’, “ampla e genérica, e que inclui todas as formas de comunicação com audiências não científicas” (p. 3).

A noção de engagement está associada a uma tentativa de ouvir as opiniões da comunidade não científica na produção do conhecimento científico e na sua aplicação, com o objetivo de redefinir a investigação, dando destaque às preocupações manifestadas pelos cidadãos e o modo como se posicionam face a um determinado tema (Oliveira & Carvalho, 2015, p. 159). Assim, a ênfase não

está na difusão do conhecimento, mas “na sua integração com outros saberes e na sua utilização na tomada de decisão, através de um processo de contribuição mútua e de legitimação pública para o desenvolvimento de uma ciência mais humanizada” (Oliveira & Carvalho, 2015, p. 156). Deste modo, é reconhecido o valor dos conhecimentos das comunidades locais e é estabelecida uma comunicação bidirecional, numa via de duplo sentido, “o conhecimento público da ciência e o conhecimento da comunidade científica sobre o público” (Oliveira & Carvalho, 2015, p. 156).

Nesta perspetiva, “o conhecimento científico não é mais o único conhecimento válido, existindo outros saberes que podem ter a mesma relevância para a resolução de um problema específico” (Oliveira & Carvalho, 2015, p. 160). Desta forma, pretende-se dizer que o conhecimento relevante não é produzido apenas pela comunidade científica, uma vez que a sua produção implica um diálogo e uma aprendizagem mútua entre os cientistas e os cidadãos comuns (Oliveira & Carvalho, 2015, p. 160). A este propósito, o engagement reconhece não só a falta de conhecimento científico por parte do público, mas também “a igual falta de conhecimento por parte dos especialistas” (Granado & Malheiros, 2015, p. 18) sobre os cidadãos, considerando então a importância da “necessidade de envolver toda a sociedade nas discussões e nas decisões que afetam a sua vida” (p. 18). Assim, podemos afirmar que “a comunicação não é linear mas complexa e envolve diversos interlocutores” (Oliveira & Carvalho, 2015, p. 160).

No engagement, ao contrário do que acontece no modelo do défice, “os públicos mais do que simples observadores, experimentadores da ciência e meros espectadores são participantes ativos na discussão e análise dos temas e problemas” (Oliveira & Carvalho, 2015, p. 161). Neste sentido, pretende-se que os cidadãos se envolvam ativamente na ciência, colocando questões e partilhando ideias, conhecimentos e experiências (p. 161). O objetivo é que estes possam assumir “as questões ao mesmo nível que a comunidade científica” (p. 161), passando a ser um ator fundamental para a produção do conhecimento científico, que resulta assim de uma interação entre especialistas e leigos.

O conceito de engagement diferencia-se de todas as outras formas de divulgação da ciência e de relação com o público por considerar a comunicação “numa relação entre cidadãos iguais, cujos saberes e vontades possuem dignidades iguais, cujas opiniões têm todas de ser respeitadas, e num verdadeiro diálogo entre especialistas e leigos em vez de uma lição onde uns falam e outros ouvem” (Granado & Malheiros, 2015, p. 18). Assim, o engagement “tem um significado específico que é caracterizado pela aprendizagem mútua entre públicos e cientistas” (McCallie et al., 2009, p. 12), que “contrasta com a transmissão unidirecional de conhecimento dos ‘especialistas’ para os públicos” (McCallie et al., 2009, p. 12).

No entender de Oliveira e Carvalho (2015), esta aprendizagem recíproca quer para os públicos não especialistas quer para a comunidade científica pode “contribuir para o desenvolvimento social e económico por meio da democratização dos processos de resolução de questões neste campo” (p. 162). Contudo, “o foco deve estar nas valiosas perspectivas e conhecimento que os públicos trazem das suas vidas e que melhoram as discussões sobre ciência” (McCallie et al., 2009, p. 24).

De acordo com a Comissão Europeia, o public engagement “contribui para a construção de uma sociedade cientificamente mais literata, capaz de participar ativamente e de apoiar os processos democráticos e os desenvolvimentos científicos e tecnológicos” (Magalhães & Ruão, 2018, p. 197). Além disso, “a participação dos cidadãos permite e facilita uma melhor aceitação de novas aplicações e tecnologias, concorrendo para a construção de uma maior confiança nos cientistas e nas instituições onde as mesmas são geradas” (Oliveira & Carvalho, 2015, p. 162).

Em jeito de resumo, o PES é visto como “um modelo de ‘diálogo’ ou ‘participação’, no qual tanto os públicos como cientistas beneficiam ao ouvirem e aprenderem uns com os outros” (McCallie et al., 2009, p. 23), como uma ‘aprendizagem mútua’. Este modelo é baseado na ideia de que tanto os públicos como os cientistas possuem perspetivas e conhecimentos valiosos que contribuem para o desenvolvimento da ciência e a sua aplicação na sociedade (McCallie et al., 2009, p. 23). Mais do que isso, Brossard e Lewenstein (2009) dizem que o modelo do envolvimento público preocupa-se em promover “atividades destinadas a aumentar a participação pública na política científica” (p. 16), criando mecanismos para envolver os cidadãos na ciência. Essas atividades são, muitas vezes, “impulsionadas pelo compromisso de ‘democratizar’ a ciência - assumir o controlo da ciência dos cientistas e políticos de elite e oferecê-lo aos grupos públicos através de algumas formas de empowerment e envolvimento político” (Brossard & Lewenstein, 2009, p. 16).