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CAPÍTULO 4 – O PAPEL DA LINGUAGEM NA EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS

5.3 O contexto da escola e os participantes da pesquisa

A seguir, apresentamos algumas observações sobre a escola e a sala de aula investigada, que ajudam a contextualizar o nosso campo de pesquisa, descrevendo alguns pontos quanto à organização dos tempos e espaços escolares; constituição da turma; corpo docente; ensino de ciências e materiais.

Os saberes e tempos escolares são importantes, pois caracterizam o modo que o trabalho escolar é desenvolvido no contexto investigado. A instituição é organizada em ciclos sendo que o 1º abrange os três primeiros anos do ensino fundamental.34 A partir de 2011, a escola começou a funcionar em regime de tempo integral.

Geralmente, as carteiras da sala de aula eram dispostas em semicírculos ou em pequenos grupos. Essa organização das carteiras foi recorrente nas nossas aulas de Ciências. Percebemos que essa disposição contribuiu significativamente para o desenvolvimento das atividades, na medida em que proporcionou maior contato entre as crianças além de proporcionar contato mais próximo no espaço coletivo, diferente da disposição enfileirada, na

qual cada criança fica “atrás do outro”. A forma como o espaço da sala se organiza diz muito

sobre possibilidades de como os sujeitos vão interagir. Por exemplo, a organização das carteiras em semicírculo ou em pequenos grupos favorece maior proximidade entre as crianças facilitando a troca de ideias e de experiências.

A sala de aula geralmente possuía murais confeccionados pelas crianças ou pelas professoras, como ilustrado nas FIG. 1 e 2.

34 As crianças entram na escola por meio de sorteio, justificado por considerar a forma mais democrática. Geralmente, a entrada de alunos acontece no 1º ano do ensino fundamental.

FIGURA 1 – Mural contendo notícias e curiosidades

FIGURA 2 – Cartazes de aniversariantes e de títulos de livros

A turma era composta por 24 crianças, 13 meninas e 11 meninos, com idade de oito anos e tinha vários professores: a professora referência da turma, Luiza, concursada, que ministrava as aulas de Português; outros professores que ministravam Matemática, Educação Física e Artes, estagiárias, as quais acompanhavam o trabalho; e a professora Márcia, contratada, que ministrava as aulas de Tópicos Integrados (TI), referente às disciplinas Ciências, História e Geografia, quem participou presencialmente na sala de aula durante a pesquisa.

Nas disciplinas de Português, Matemática, Ciências, História e Geografia são adotados livros didáticos escolhidos pelas professoras, em consonância com o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD). Entretanto, foi observado que eles não eram muito utilizados pelas professoras, sendo mais recorrente a prática do xerox de atividades elaboradas pelas professoras. O planejamento do ciclo é elaborado coletivamente entre as professoras, e a proposta de avaliação é processual, em que os professores preenchem uma ficha avaliativa para cada criança.

Os conteúdos de ciências compõem a grade curricular como Tópicos Integrados (TI). Nessa disciplina, há a articulação dos conteúdos de Ciências, História, Geografia e Filosofia. Os Tópicos Integrados são ministrados durante 1h e 30min, duas vezes por semana. Esse dado é importante para refletir sobre o lugar em que o ensino de ciências ocupa no currículo da escola investigada e como isso é efetivado na prática. Como descrito no planejamento escolar:

Os conteúdos e as habilidades trabalhados na disciplina Tópicos Integrados serão desenvolvidos por meio de três grandes projetos de estudos: nossa cidade, nossa história; projeto convivência; corpo: eu e o outro no mundo. Em cada um dos trimestres privilegiaremos a temática de um dos projetos. Contudo, uma vez que a abordagem de Tópicos Integrados se faz de maneira integrada e interdisciplinar, aspectos e objetivos de todos os projetos podem ser antecipados de acordo com a demanda do estudo em sala (Trecho do planejamento de TI elaborado pelas professoras, 2012, p. 1).

Não podemos deixar de mencionar o uso, em sala de aula, dos instrumentos tecnológicos utilizados na pesquisa. As filmagens tiveram papel fundamental, pois, por meio delas, foi possível revisitar as aulas, identificando aspectos relevantes para a pesquisa. Entretanto, essa sala de aula, como muitas salas de aula com crianças no Brasil, tem uma dinâmica específica. Elas conversam constantemente entre si e com o professor e não necessariamente uma de cada vez. Assim, ao assistir aos vídeos, muitas vezes algumas partes se mostraram inaudíveis.

Algumas estratégias foram exploradas: algumas vezes, coloquei duas câmeras em sala, mas também não foi adequado, pois elas não conseguiam captar as múltiplas conversas.

Também tentei colocar um gravador em cada grupo, mas, muitas vezes, as crianças pegavam o instrumento e desligavam ou apagavam o que já havia gravado. O uso do gravador em grupo, de certa forma, tumultuou o ambiente da sala, pois as crianças, a todo o momento, discutiam quem seria o representante que ficaria com o gravador. Apesar de essa questão ser discutida no grupo anteriormente, a cada aula, as situações eram recorrentes. Ao ouvir o gravador, não foi possível identificar a sequência de falas, sendo que os dados não foram aproveitados para análise.

Quando iniciamos a sequência, na apresentação dos participantes da pesquisa, conversamos com as crianças sobre a nossa presença na sala e sobre os instrumentos que usaríamos na sala. Ao longo do trabalho, temos algumas evidências sobre como foi o uso da filmadora na sala. Em muitos momentos, as crianças utilizavam a filmadora e realizavam entrevistas entre elas, solicitando filmar a aula. Acreditamos que esse ponto influenciou as

análises, pois as crianças, ao usarem os instrumentos de coleta de dados, como por exemplo, a filmadora e a máquina fotográfica, interagiam, ocupando outros espaços e papéis na sala, inclusive, movimentando-se no espaço físico, como mostram as FIG. 3 e 4.

FIGURA 3 – Uso da filmadora pelas crianças no início da aula

FIGURA 4 – Uso da filmadora pelas crianças durante a aula

Em suma, reconstruir algumas situações de interação entre alunos foi difícil, tornando a construção dos dados desafiante. Entretanto, como a pesquisa sempre contava com colaboradores em sala, sempre havia algum membro do grupo de pesquisa, ajudando a registrar as observações no caderno de campo e na filmagem das aulas.

Neste tópico abordamos o contexto da pesquisa, enfatizando aqui a importância da participação das crianças e dos colaboradores da pesquisa, por exemplo, contribuindo na filmagem e nos registros diários. Também gostaríamos de reforçar o duplo papel assumido pela pesquisadora, diante da proposta da pesquisa foi compreender as práticas argumentativas e investigativas vivenciadas pelas crianças dos anos iniciais do ensino fundamental, analisando como as crianças foram inseridas na cultura científica, construindo e negociando diferentes significados nas interações sociais. Assim, abordar essas questões exigiu que eu, no papel de pesquisadora, também me colocasse no lugar de aprendiz, pois o pesquisador e o

pesquisado se ressignificam no campo, tendo a oportunidade de refletir e aprender, se constituindo no próprio processo de pesquisa (FREITAS, 2002, p. 26).