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O CONTEXTO HISTÓRICO DAS ―SAGRADAS‖ ESCRITURAS

1. BÍBLIA: O GRANDE CÓDIGO

1.2. O CONTEXTO HISTÓRICO DAS ―SAGRADAS‖ ESCRITURAS

Sendo a Bíblia uma obra bastante complexa, longa e envolta em muitas polêmicas acerca de questões sobre suas ideologias: sociais, políticas, históricas, religiosas e literárias, nos respaldamos em estudio- sos bíblicos para fundamentar nossas colocações, no entanto, quando lidamos com textos muito antigos e envoltos em muitos mistérios; opi- niões e pesquisas, frequentemente, apresentam bastante divergência. Portanto, visões sobre o assunto são bastante heterogêneas. Ressaltamos que nossa preocupação não reside na verdade dos fatos, mas sim, na polêmica das discussões, pois tais particularidades nos propiciam fazer nossas interpretações.

A veracidade dos fatos narrados tanto no Primeiro como no Se- gundo Testamento dificilmente terão comprovação, pois são textos mui- to antigos e cujos originais viraram pó há muito tempo, pois foram escri- tos em ―rolos de pele (pergaminhos) ou de tecido vegetal (papiro) sobre os quais escrevia-se com cálamo ou pena, que permitia estender a tinta sobre a superfície desigual‖ (ABADIA, 2000, p. 38). A crítica textual trabalha em cima dos manuscritos remanescentes, pois:

[...] os manuscritos originais deterioraram-se até serem inutilizáveis, e só sobreviveram as obras valoradas, porque continuaram sendo copiadas. Outra forma de influência histórico-social na lite- ratura bíblica!

No entanto, o processo de reprodução de um ma- nuscrito tinha seus riscos. O copista podia cometer erros de transição que alteravam a obra. Não só is- so, porém. Em algumas ocasiões, o copista acres-

centava algo ao texto original, por diversas razões. De fato, contamos com muitos exemplos na Bí- blia. Bastam só dois. O final do evangelho de Marcos (16, 9-20) foi acrescentado ao texto origi- nal no século II. Mas é admitido como pertencente ao cânon e, portanto, sua inspiração é reconheci- da. Por outro lado, no texto latino da primeira car- ta de João manteve-se durante séculos um acrés- cimo tardio, sem base nos manuscritos gregos mais antigos. A inserção não é canônica nem está inspirada (ABADIA, 2000, p. 38,39).

As colocações de José Pedro Tosaus Abadia20, nos mostram co- mo é delicado trabalhar-se com textos antigos buscando neles uma ver- dade histórica, pois como podemos constatar muitos sofreram alterações pelos copistas ao longo da história, tal verdade se torna bastante inopor- tuna para aqueles que procuram na Bíblia um sustentáculo para suas posições conservadoras.

As razões do porquê de as palavras, dos personagens e as histó- rias contidas nos textos bíblicos terem tanto poder sobre a civilização ocidental, tem sidoesquadrinhado por muitos estudiosos. Os autores Robert Alter21 e Frank Kermode22 no livro Guia Literário da Bíblia (1997), argumentam que:

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José Pedro Tosaus Abadia es licenciado en Ciencias Bíblicas por el Pontificio Instituto Bíblico de Roma y doctor en Filosofía y Letras por la Universidad Pontificia de Salamanca. Es miembro de la Asociación Bíblica Española y del Consejo de Redacción de la revista Reseña Bíblica. Tras enseñar durante años literatura bíblica en distintos centros, su actividad principal hoy es la traducción

de estudios bíblicos y teológicos. Disponível em:

http://www.verbodivino.es/autor/9070/tosaus-kermode,-jose-pedro – Acesso em 17. 11.15

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Professor Alter has written widely on the European novel from the eighteenth century to the present, on contemporary American fiction, and on modern He- brew literature. He has also written extensively on literary aspects of the Bible. His twenty-two published books include two prize-winning volumes on biblical narrative and poetry and award-winning translations of Genesis and of the Five Books of Moses. He has devoted book-length studies to Fielding, Stendhal, and the self-reflexive tradition in the novel. Books by him have been translated into

eight different languages. Disponível em:

http://nes.berkeley.edu/Web_Alter/Alter.html - Acesso em 15.07.15.

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Sir (John) Frank Kermode, (born Nov. 29, 1919, Douglas, Isle of Man, Eng.—died Aug. 17, 2010, Cambridge, Eng.), British critic and educator who bridged the divide between literary criticism and reading for pleasure through

Pode-se, por certo, argumentar que a centrali- dade da Bíblia na formação de nossa cultura é resultado de um acidente histórico. Essa é uma

concepção à qual dois séculos de modernos estu- dos bíblicos, intencionalmente, ou não, deram bastante apoio. Os motivos dos estudiosos, cris- tãos, judeus e seculares, são compreensíveis: um pequeno corpo de escritos, primeiro em hebraico, depois em grego, produzidos numa estreita faixa do litoral leste do Mediterrâneo durante um perío- do de mais ou menos uma dúzia de séculos, conti- nuou a ter consequências do maior alcance porque esses escritos foram aceitos como verdade revela- da; e no interesse da verdade histórica tornou-se obrigatório tentar compreender o processo pelo qual essa literatura emergiu de sua situação origi- nal. Falando de maneira geral, a crítica literária foi de pequena importância nesse empreendimento, que tratou os textos bíblicos como relíquias, pro- vavelmente distorcidas na transmissão, de um passado que era preciso recuperar o mais exata- mente possível (ALTER; KERMODE, 1997, p. 11,12, negrito nosso, itálico dos autores). Quando falamos em Bíblia, para os católicos é natural se pensar nos dois testamentos, lembremos que para os judeus os textos bíblicos compõem-se apenas do Primeiro Testamento com 39 livros, sendo que a Bíblia Católica é composta de 46 livros no Primeiro Testamento, mais 27 livros do Segundo Testamento, totalizando 73 livros. A Bíblia usada pelos Protestantes contém 39 no Primeiro Testamento e 27 livros no Novo Testamento, totalizando 66 livros.

Independentemente do número de livros do Primeiro Testamento, vários segmentos religiosos foram afetados pelo que foi exposto acima. Sendo assim, devido o conteúdo das ―Sagradas‖ Escrituras terem sido aceitos como verdade revelada, a grande maioria da população dos paí- ses ocidentais acabou, ao longo do tempo, elegendo a Bíblia como seu

more than 50 books and scores of essays. His numerous articles for such publi-

cations as The London Review of Books, which he cofounded in 1979, were aimed at more leisurely readers, but as the editor of works ranging from The Oxford Anthology of English Literature (1973) to the Modern Masters series, he promoted both traditional literature and modern theory. Disponível em:

http://global.britannica.com/biography/John-Frank-Kermode - Acesso em

guia espiritual e o Deus de Israel, não representável por imagem, como o ser supremo do universo. Os países mais poderosos da Europa, como Portugal e Espanha, na época dos descobrimentos, principalmente du- rantes os séculos XV e XVI, foram impondo sua fé à suas colônias, desta forma, expandindo cada vez mais as mensagens contidas na Bíblia e o poder do Deus nela contido, mesmo que para isso tivessem que usar da violência.

As ―Sagradas‖ Escrituras nem sempre fizeram parte da história da humanidade, pois o mundo nem sempre conheceu o YHWH, ademais, o processo da escrita da Bíblia foi muito lento:

Enquanto o Primeiro Testamento levou uns mil anos para ser escrito, o Segundo foi escrito no pe- ríodo de uns cem anos apenas. Geralmente, o pro- cesso é o seguinte: o fato acontece, é transmitido de boca em boca por tradição oral, espalha-se por vários grupos em lugares diversos, é celebrado e só depois é fixado por escrito.

Esse processo, abreviado no Segundo Testamento, foi muito longo no Primeiro. Por exemplo, a histó- ria de Abraão, tal como a lemos na Bíblia, foi es- crita vários séculos depois de sua vida e após pas- sar por várias etapas de redação em épocas dife- rentes. Abraão deve ter vivido mais ou menos uns 1500 anos antes de Cristo, e o livro do Gênesis, onde está narrada a sua memória, teve o início de sua redação ao redor de 950 a.C. e sua redação fi- nal por volta de 400 a.C. (GASS, 2002, p.20). À vista das colocações do autor, nos questionamos sobre a vali- dade das ―Sagradas‖ Escrituras como livro inspirado por Deus e muitos se indagam sobre a veracidade das histórias contidas dentro desses tex- tos, pois esses intervalos seculares entre as narrativas orais e as inúme- ras reescritas dos acontecimentos até os dias atuais, com base em tradu- ções, provavelmente afetaram drasticamente seus conteúdos.