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O contexto internacional e a situação socioeconómica pós-

CAPITULO II: A POLÍTICA EXTERNA DE CABO VERDE E A SUA ORIENTAÇÃO PARA O

2.1. Uma retrospetiva histórica e a génese da nação

2.1.2. O contexto internacional e a situação socioeconómica pós-

Alcançado o estatuto de independente com a população estimada em 280 mil habitantes, o objetivo primordial era delinear estratégias de governação do país. Contudo, a conjuntura internacional no momento histórico da independência nacional

43 Referimos sobretudo ao movimento claridoso surgida em 1936, que incentivou o movimento cultural e

literário no arquipélago. Segundo se afirma, a iniciativa visava refutar a situação vivida nas ilhas e é considerado a primeira independência do país (Lopes, 2002).

44 Segundo Fernandes (2007), a notícia da revolução começou a fazer sentir no país através do jornal o

arquipélago, no suplemento de 27 de Abril. No dia 30 desse mês, o povo despertou a gritar independência sem a real consciência do que se tratava.

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não era muito favorável. Para além de situações adversas impostas pela natureza e situação social e económica precárias, vivia-se a Guerra-Fria nas suas fases mais ativas, tendo todos os PALOP a tenderem para o lado soviético, embora a Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe com menos influência. Acrescido dessas situações, vivia-se a crise financeira mundial devido ao choque petrolífero e, a nível regional, a África que saíra do regime do colonialismo, enfrentava situações de conflito interno. Esses condicionalismos fizeram com que muitos considerassem não haver motivos de festejo da independência, alegando que tal facto era uma aventura arriscada se não, um ato de loucura, de modo que muitos nacionais preferiram ficar do lado dos portugueses. Na verdade, nessa altura sentia-se com maior ímpeto o fluxo da interdependência dos Estados e os novos acontecimentos tiveram impactos diretos na economia e inflação mundial. O neoliberalismo impôs reformas na economia, contestando a política económica keynesiana que vinha sendo adotada pela ONU, algo que trouxe consequências para as políticas de desenvolvimento e relações exteriores. O neorrealismo por seu turno trouxe novas evidências, desmentindo algumas premissas realistas, na medida em que defende que a estrutura determina os padrões que influenciam as tomadas de decisões dos agentes. Ou seja, que a conjuntura internacional limita e molda o comportamento dos sujeitos de decisão, evitando-o ou induzindo-o a certas atitudes. No campo da política externa e do seu instrumento pacífico de condução, concretamente a diplomacia, dava indícios de maior ligação à economia, dando indícios da terceira fase da diplomacia económica. Deste modo, o país não podia ficar indiferente, embora algumas atitudes não fossem ao encontro dessas visões.

Doravante, face aos acontecimentos pouco abonatórios, a certeza era que a luta surtiu efeito e que um dos primeiros passos passaria pela criação de condições que possibilitassem a implementação de políticas como Estado soberano, afirmação no plano internacional, garantia do sustento da população e a viabilidade do Estado. Deste modo, era necessário uma investida diplomática prudente e eficaz, capaz de traduzir em resultados favoráveis, que permitiriam a sobrevivência da nação. Porém, alguns especialistas ao analisarem a situação económica do país, chegaram a concluir que não havia condições para o país aguentar seis meses como Estado independente.

Na verdade, a situação herdada do então império era motivo de preocupação por parte dos novos dirigentes. O país era sufocado pela carência e grande parte da população se encontrava do limiar da pobreza. Economicamente o país encontrava-se totalmente devastada. As ligações entre as ilhas eram muito deficientes e ao encargo dos pequenos veleiros, o que não respondiam a todas as demandas em termos de abastecimento das ilhas, contribuindo deste modo para assimetrias regionais em termos de desenvolvimento. A agricultura, além de ser subsidiária vinha sendo fustigada pela seca ao longo dos últimos oito anos e o setor da transformação era quase nulo. Do reduzido número de indústrias que existia, não apresentavam boas condições, resumindo-se em menos de meia dezena de padarias, uma fábrica de tabacos e duas de conservação de

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pescado45. O setor da saúde também manifestava grandes lacunas. Com o 25 de Abril,

registou-se a saída dos poucos médicos que existiam, chegando à independência apenas 15 para o total da população. A nível da educação, além de desnutrição no seio dos alunos, havia cerca de 74 por cento de analfabetismo motivados pelo abandono e reprovações sucessivas e em algumas áreas chegava a rondar 90 por cento no sexo feminino. O corpo docente era composto por 1400 professores, sendo que menos de trinta deles possuíam qualificação vocacionada para ensino.

Entretanto, as preocupações e dúvidas em como garantir meios de subsistência à população enquanto país independente e colmatar as dificuldades registadas, surgiram no dia seguinte ao festejo da independência em São Vicente a 8 de Julho, manifestadas pelo presidente Aristides Pereira, que confessa sentir grandes responsabilidades e certo receio em responder às necessidades do povo, sobretudo quando chegou a vez de fazer as contas para se apurar o que havia em termos de meios. A constatação é de que não havia recursos nenhuns e que era fundamental a ajuda de outros países para poderem dominar a situação (Lopes, 2002).

Esta realidade despertou a necessidade de contactos a diferentes paragens, sobretudo em África e as relações travadas com diferentes Estados aquando da luta foram importantes nessa fase. Foi reconhecida assim, a pertinência de incrementar uma política que fosse ao encontro da realidade atual, isto é, a fraqueza económica e social e, fragilidades externas. Assim, ficou patente a necessidade de conjugação das dimensões interna e externa, dando alusão ao carácter co-constitutivo da política externa, isto é, que esta não processa de forma isolada em matéria da defesa dos interesses do Estado. Foi nessa corrente que o programa de governo apresentado, tido como “Salvação Nacional”, procurou lançar as bases para a reconstrução nacional. No entanto, durante os primeiros anos o país mantinha firme o propósito de unidade com a Guiné-Bissau46, focando a sua ação diplomática no processo de desenvolvimento

e captação de ajudas. Terminada a unidade política aquando do golpe de Estado perpetuado naquele país47 a 14 de novembro de 1980, houve modificações na política

económica do país. A Naguicave criada em 1977, o mais significativo projeto de facilitação de trocas comerciais existentes entre as duas partes desmoronou-se. O país privilegiou outras ancoragens, com vista a impulsionar mais o processo de desenvolvimento, tendo em mira sempre uma política externa prudente, isenta e que espelha credibilidade no seio de parceiros internacionais. Contudo, as relações entre ambos só foram reatadas em Junho de 1982, já num segundo momento da política externa cabo-verdiana.

45 As unidades, Congel em São Vicente e Ultra na Boa Vista já estavam em estado de falência.

46 Segundo Pereira (2013), houve vozes que se levantaram contra o princípio de unidade entre os dois

Estados, alegando ser uma decisão unilateral, de iniciativa dos deputados guineenses, ainda sem que Cabo Verde fosse independente, considerando ainda, que a ideia da unidade ia em contramão com as normas do Direito Internacional, uma vez que, pretendia-se anexar o arquipélago à Guiné-Bissau.

47 Acusando a ala cabo-verdiana de ser colonialista e hegemonista, João Bernardo (Nino) Vieira, insurgiu-

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O Estado centrava todo processo de desenvolvimento, tendo decretado exclusividade no campo económico, tanto na exploração da zona económica exclusiva, na organização económica e social do país, no controlo do comércio externo, entre outros, defendidos legalmente nos artigos 9º a 12º da primeira Constituição. Denota-se a presença da diplomacia económica, mesmo de forma tímida, sobretudo no disposto do ponto 3, artigo 12º, estabelecendo que “o Estado pode autorizar o investimento de capital estrangeiro desde que seja útil ao desenvolvimento económico e social do país”. No entanto, esse aspeto tornou a base da política do desenvolvimento do país após a instauração do regime democrático na década de 1990.

Salienta-se que sob os auspícios de Partido único e com tendências ideológicas, o período da independência até a abertura política multipartidária, foi determinante para a consolidação do Estado e para o desenvolvimento da própria sociedade. Na vigência desse período, os primeiros anos, isto é até 1980, o país não tinha uma Constituição da República propriamente dita. Pese embora este facto que limita a averiguação quanto a constitucionalidade de certos atos, considera-se que as ações levadas a cabo foram satisfatórios, uma vez que, direcionou o país aos níveis de desenvolvimento.

Sempre atento à constelação internacional, criou-se condições para a democratização do país em 1990 e, a partir de então focou o processo de desenvolvimento na liberalização do mercado, privilegiando a diplomacia económica. Com essa iniciativa, o país tornou um dos primeiros da África a pautar pela democracia e abertura ao mundo, enfrentando os novos desafios que emergiram num contexto internacional diferente mas, encarrada sem grandes sobressaltos. Essa foi devido uma política externa bem orientada, focado para os quatro cantos do planeta, independentemente da ideologia dominante, respeitando a cada momento histórico nacional e internacional, de modo que tornou-se merecedor do respeito e credibilidade internacional nos tempos atuais.