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CAPITULO III: CABO VERDE NO CONTEXTO INTERNACIONAL: O processo de

3.2. As relações de Cooperação de Cabo Verde

3.2.1. Relações de Cabo Verde no plano bilateral

3.2.1.2. Relação com Estados Unidos da América

As ambições de Cabo Verde no que diz respeito ao desenvolvimento e inserção internacional fazem com que o sucesso democrático e a transparência na governação sejam fios de ligação com países que garantem condições para tal. De entre estes, no âmbito das relações bilaterais que são determinantes para tais ambições, os EUA têm sido uma das grandes alavancas do país desde os primórdios da independência. Comparticipam com ajudas de vária ordem, como no acolhimento de boa parte da diáspora cabo-verdiana.

As relações entre as duas partes vêm de longa data, designadamente na altura em que ainda o arquipélago não figurava na lista de países independentes. De acordo com Amado (2014), por um lado, pode-se considerar que os primeiros passos nessa direção aconteceram nos primeiros anos do século XIX. Isso deve-se ao facto de em 1818 abrir uma representação consular no arquipélago de forma a facilitar o abastecimento de alguns produtos oriundos das ilhas, nomeadamente peles de cabra, situação que permitiu reforçar o comércio e diplomacia representativa entre ambos.

Cardoso (2014), por outro lado, considera que o início das relações entre os dois povos datam do século XVIII, aquando da pesca da baleia. Contudo, o aprofundamento das relações nessa altura foi importante para o país na medida em que, para além do recrutamento de trabalhadores para a atividade piscatória, o país beneficiou de ajudas humanitárias privadas em situações de fome que se faziam sentir nesse período. Ademais num período mais recente, os esforços feitos pelo PAIGC na procura de apoio junto de Associações e entidades aquando da luta de libertação referidos anteriormente, comprovam as relações das ilhas para com aqueles territórios. Denota- se no entanto que o arquipélago desde cedo começou a cimentar as bases para um bom relacionamento com aquele país independentemente do seu reconhecimento como Estado soberano.

Porém, falar de relações oficiais entre Estados, de acordo com a perspetiva realista, pressupõe o estatuto e reconhecimento de independência de um dado território. Assim, enquanto país independente, no ato de reconhecimento da independência nacional, os EUA comprometeram-se em estender a ajuda humanitária e a assistência técnica, além de deixarem claros a possibilidade e oportunidade das duas nações trabalharem em conjunto em prol da paz, da liberdade e do bem-estar da humanidade (Cardoso, 2014). Deste modo nos primeiros anos, ou seja, da independência até a abertura ao pluripartidarismo, as ajudas concedidas ao país passaram exclusivamente pela ajuda alimentar e a gestão de projetos, sendo este ao encargo da USAID81, agência que

coordena e executa a ajuda externa dos EUA. Destaca-se também o papel determinante dos EUA em aproximar o arquipélago a outras paragens, como é o caso do Japão e a Correia do Sul.

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O posicionamento externo do país perante a bipolaridade que prevalecia na altura da independência foi determinante. Cabo Verde teve que travar uma ação diplomática forte a fim de poder convencer os EUA do seu posicionamento perante situações beligerantes e conseguir cativar ações de solidariedade de lá provenientes. Argumenta- se que os EUA, ciente do valor estratégico do arquipélago, disponibilizaram ajudas como forma de impedi-lo de um possível alinhamento com a URSS, a qual o país manifestava certa simpatia. Justifica-se essa tese pelo facto de seus programas de ajudas deixarem de vigorar logo após o fim da disputa bipolar. Ao mesmo tempo, entende-se essa posição na medida em que as modalidades de cooperação tiveram de ser adaptadas à nova realidade no contexto das relações internacionais.

Com a transição democrática no país, houve uma reativação dos programas do Corpo da Paz82, estabelecendo uma nova abordagem nas relações entre as duas partes. No

entanto, com a intensificação das medidas de segurança após os atentados de 11 de Setembro de 200183, a conceção de ajudas mudou de configuração. Com o reacender da

importância da África, desta feita por razões de segurança face à luta contra o terrorismo organizado, surgiram vários programas de assistência, entre os quais ao Millennium Challenge Account (MCA), que exige dos países um conjunto de requisitos para poderem ser beneficiários.

Doravante, ficou então delineado um novo modelo de cooperação e assistência aos países em desenvolvimento por parte dos EUA, defendendo que a forma de combater o terrorismo passava pelo apoio ao desenvolvimento. Deste ponto de vista ficam explícitas duas prioridades fundamentais da política norte-americana, designadamente: o incentivo aos países em desenvolvimento em envolver em questões como a segurança coletiva e o compromisso assumido em apoiar o desenvolvimento (Costa, 2011). Cabo Verde em particular, as suas limitações e dependência despertam-lhe a consciência de que sobreviver no mundo globalizado e interdependente cujas mutações são constantes, é fundamental uma diplomacia hábil e ciente da partilha de princípios globalmente defendidos. Torna-se então crucial aprofundar a defesa de princípios que lhe permitem aproveitar das janelas de oportunidades que surgem no plano internacional e prosseguir o processo de desenvolvimento.

Salienta-se que Cabo Verde pelo facto de cumprir com os requisitos exigidos foi um dos oito países Africanos que beneficiaram pela primeira vez em 2005, e novamente contemplado pela segunda vez com os fundos desse Programa em Novembro de 2012, tendo conseguido um valor aproximado de 170 milhões de dólares nos dois programas. O país tem sabido gerir bem os fundos disponibilizados, de modo que é avaliado positivamente pelo Millenium Challenge Corporation (MCC), instituição norte- americana que gere os fundos do MCA.

82 Programa dos EUA, criado pelo Presidente Kennedy em 1961, em que cidadãos em regime de

voluntariado destinam-se ao serviço de comunidades nos países recetores. Este Programa terminou no país em 2012 (Amado, 2014).

83 Esse fenómeno despertou uma maior interação dos países ricos na luta contra a pobreza no mundo

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As trocas comerciais entre ambos, conforme podemos ver, têm pouca intensidade em relação a outros parceiros. Da reduzida capacidade de exportação do país, a African Growth and Opportunities Act (AGOA84) permite-lhe a isenção de taxas e quotas

alfandegárias nas exportações para aqueles territórios. Esse programa, para além de outros Acordos, constituem estímulos ao aumento da capacidade produtiva e consequentemente da exportação (AIP, 2014).

Outro ângulo de cooperação entre os EUA e Cabo Verde tem sido a assistência militar. Iniciada em 1984, o país vem contando com a parceria dos EUA, através do acesso aos seus programas de treinamento e acesso às escolas militares. Para além disso, houve apoio em outros programas como o Financiamento Militar Estrangeiro em que o país teve acesso aos equipamentos daquela potência. Com o reacender da importância geoestratégica do país, a envolvência em assuntos militares ganhou mais enfase. O arquipélago passou a envolver mais nas questões de segurança internacional, sobretudo no controlo de fronteiras e combate à criminalidade organizada. Houve contrapartidas em outros programas no âmbito da segurança, nomeadamente combate ao narcotráfico e controlo das águas territoriais, disponibilizadas pelos EUA (Amado, 2014). Destacam- se operações de patrulhamento marítimo em conjunto no âmbito da AFRICOM, o Comando dos EUA para África, assim como investimentos no âmbito de aeroportos. Em suma, as relações bilaterais Cabo Verde – Estados Unidos, trouxeram vantagens ao arquipélago, tendo em conta os objetivos de ancoragem em relações estáveis que favorecem a prossecução do desenvolvimento. As sucessivas avaliações positivas ao país quanto à sua envolvência em assuntos ligados à segurança e defesa internacionais, à democracia e boa gestão, entre outros, têm contribuído para aumentar o prestígio e o seu bom nome, para além de ser os critérios para beneficiar dos fundos do MCA. O acesso a esses fundos, segundo Câmara de Comércio Industria e Turismo (PT/CV) traduzem em resultados visíveis que contribuem para o desenvolvimento do país, uma vez que são aplicados em setores-chave como remodelação de portos, agricultura, mobilização de água, entre outros.

No cômputo geral, os EUA desde os primeiros momentos têm sido um parceiro inquestionável de Cabo Verde, que no âmbito das relações têm trazido algumas contrapartidas que imputam novas responsabilidades e desafios ao país e, consequentemente requerem cada vez mais um exercício de diplomacia eficaz. A esse respeito, queremos realçar a intenção de inserção da economia do país no mercado internacional como estratégia de desenvolvimento e a envolvência em questões de interesse global, como é o caso da segurança.

Deste modo, os Acordos de cooperação comercial no âmbito da AGOA atrás referido e Acordos no âmbito da segurança, nomeadamente, no âmbito do programa Safe Skies, conferem ao país possibilidades que condizem com os seus objetivos. O melhoramento das condições de segurança e do turismo, o lucro direto na economia que o país teve na

84 Programa assinado em 2000 no quadro do Programa Trade and Development Act of 2000 em que

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sequência do programa atrás mencionado e a envolvência dos EUA no processo de adesão do país à OMC através de assistência técnica (Embaixada dos EUA/CV), faz-nos acreditar que as relações entre ambos revelam ser benéficas para Cabo Verde.