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O processo de crescimento e Desenvolvimento Humano

CAPITULO III: CABO VERDE NO CONTEXTO INTERNACIONAL: O processo de

3.1. Relações Económicas Externas e o processo de desenvolvimento

3.1.1. O processo de crescimento e Desenvolvimento Humano

Desde sempre, viver no arquipélago não revelou ser fácil, dada a situação da carência de recursos internos, daí as preocupações quanto ao seu desenvolvimento desde os primeiros momentos fizeram-se sentir no seio dos governantes. Essa situação motivou a procura de soluções, seja através de cooperação a nível multilateral, regional e bilateral, como estratégia de minimizar seus efeitos.

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Nos primeiros anos pós independência as políticas governamentais orientaram-se para uma estratégia de planificação central da economia e o processo de desenvolvimento centrou-se na satisfação das necessidades básicas e na valorização dos recursos internos, sendo o período que o Estado assumiu como a fase da reconstrução nacional. Foi nesta linha, como vimos no capítulo anterior, que se desencadeou um intenso esforço diplomático que culminou na assinatura de vários Protocolos de cooperação, os quais procuraram angariar recursos externos e conceder proteção aos emigrantes cabo- verdianos nos países de acolhimento.

As mudanças na cena internacional foram determinantes para mudar o rumo do país quanto ao seu processo de desenvolvimento. Na verdade, a terceira vaga da democratização referida anteriormente, despertou em Cabo Verde a intenção e consciencialização de se harmonizar com as normas internacionais, isto é, aproximar-se e ajustar-se às medidas políticas defendidas por instituições e parceiros internacionais, através da abertura política e económica.

Com essa atitude, o país procurou estar em sintonia com a comunidade internacional e prosseguir com a política de inserção na economia mundial, objetivo esse assumido com a liberalização do comércio e com os distintos instrumentos de governação adotados. Assim, com a instauração da democracia de forma pacífica e ciente da necessidade de mudança, deu-se o primeiro passo em prol do objetivo de inserção internacional. A alteração da Constituição da República no início da década de 90 confirma essa passagem, na medida em que foram criadas condições favoráveis para as relações comerciais externas e abriram-se as portas para o investimento externo.

Com esse procedimento, o Estado deixou de ser ator principal do processo, enquanto o setor privado passa a assumir papel determinante, tornando-se um dos principais intervenientes do processo de desenvolvimento, por via do plano de privatizações de empresas estatais. Foi nesta perspetiva que as Grandes Opções do Plano (1997-2000)73

definiram as linhas orientadoras para impulsionar o desenvolvimento do país.

Assim, foram estabelecidas metas consideradas fundamentais para o desenvolvimento sustentável como “o desenvolvimento do mercado e da iniciativa privada; o aproveitamento das vantagens da regionalização e da globalização; a valorização dos recursos naturais; o desenvolvimento dos sistemas de transportes, comunicações e energético; a promoção do saneamento e a defesa do meio ambiente; a consolidação e desenvolvimento da democracia; a promoção do desenvolvimento humano e social” (Reis, 2000:127). Entende-se pois que o país tenha adotado um conjunto de princípios em conformidade com os critérios do desenvolvimento sustentável defendidos pelo PNUD.

73 Perspetivam a imagem do país a longo prazo como “um país aberto ao mundo, com um sistema

produtivo forte e dinâmico, assente na valorização do seu capital humano, capacitação tecnológica e na sua cultura. Uma sociedade solidária, de paz, justiça social, democrática, aberta e tolerante. Um país dotado de um desenvolvimento humano durável, com um desenvolvimento regional equilibrado, sentido estético e ambiental, baseado numa consciência ecológica desenvolvida” (Borges e Morais, 2012:6).

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Do registo de um crescimento robusto e das preocupações em investir no capital humano resultaram melhores condições de vida das populações. Ao longo dos tempos registou-se uma redução considerável da pobreza e o país alcançou uma das mais impressionantes performances socioeconómicas de África no período 1991-2008. Não obstante, registaram-se algumas discrepâncias em termos de desenvolvimento entre as ilhas e mesmo em relação às zonas rurais e urbanas (BAD, 2014).

O gráfico a seguir mostra a evolução do rendimento ao longo dos tempos.

Gráfico 1: Evolução do Rendimento Nacional Bruto de Cabo Verde

Fonte: Elaboração própria com base em dados do Banco Mundial

Deste modo, reconhecemos que o PIB registou um crescimento contínuo, embora menos robusto nos últimos anos, na sequência da crise económico-financeira que deflagrou em 2007. É notório que após uma evolução até 2010 o crescimento tem registado um ritmo menos acelerado.

O gráfico a seguir apresenta a dinâmica do crescimento do PIB em termos de capitação média pela população.

Gráfico 2: Evolução do PIB per capita (a preços correntes em dólares).

Fonte: Elaboração própria com base em dados do Banco Mundial

Pode-se verificar uma progressão muita significativa ao longo dos anos. Cremos que esse crescimento foi fruto de implementação de um conjunto de instrumentos estratégicos que estimulam o desenvolvimento e consequentemente se traduzem num bom desempenho económico, o qual segundo Borges e Morais (2012), foi um dos critérios mais decisivos para a elevação do país à categoria de PDM em 2008.

0,0 1000,0 2000,0 3000,0 4000,0 5000,0 6000,0 7000,0 1990 2000 2005 2010 2013 0,0 1000,0 2000,0 3000,0 4000,0 1990 2000 2005 2010 2013

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No que respeita à contribuição dos diferentes setores para o crescimento económico, entendemos ser útil apresentar a repartição setorial do PIB. Deste modo, mostramos a contribuição dos grandes setores de atividade económica em percentagem do PIB, conforme podemos verificar no gráfico que se segue.

Gráfico 3: Distribuição setorial do PIB em %.

Fonte: Elaboração própria com base em dados do Banco Mundial

Perante os dados, podemos constatar que o setor dos serviços tem vindo a registar uma dinâmica positiva no crescimento do PIB, representado nos últimos anos um valor superior a 70%. Este setor tem sido impulsionado pelo dinamismo do turismo, o qual tem gerado uma contribuição relevante para o crescimento económico (INE, 2015). Em sentido contrário, os setores primário e o secundário, onde a agricultura, a pecuária e a pesca são setores importantes para a alavancagem do crescimento, tendencialmente têm declinado e perdido peso na estrutura do PIB..

Deste modo a atestar o que referimos antes, verificamos que as receitas obtidas pelas atividades ligadas ao turismo têm apresentado uma evolução crescente significativa, sendo responsáveis por uma contribuição direta para o PIB superior a 20% ao logo dos últimos anos. Assim, tem havido impactos positivos sobre o emprego e sobre a entrada de divisas que se têm constituído como fatores de desenvolvimento da economia cabo- verdiana, embora esta situação torna a economia muito dependente de um único setor, tornando-a algo vulnerável às tendências gerais do turismo em termos mundiais.

Gráfico 4: Dinâmica da contribuição do turismo em % do PIB

Fonte: Elaboração própria com base em dados do Banco de Cabo Verde

0,0 10,0 20,0 30,0 40,0 50,0 60,0 70,0 80,0 1990 2000 2005 2010 2012 Agricultura (% PIB) Indústra (% PIB) Serviços (% PIB) 0,0 5,0 10,0 15,0 20,0 25,0 2002 2005 2008 2011 2014

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O turismo é importante para o país e tem resistido, não obstante oscilações no plano internacional com repercussões negativas no desempenho económico. Apesar dessas oscilações com interferências nefastas em alguns setores-chaves do desenvolvimento, o setor tem mantido uma dinâmica de crescimento positiva.

No cômputo geral, não obstante as fragilidades do país e o contexto internacional algo instável, ao longo dos tempos registou-se uma gradual tendência de melhoria das condições de vida da população e isso está refletido nos progressos contínuos da performance do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH).

Este Índice, produzido no âmbito do PNUD, conforme vimos anteriormente, considera que o desenvolvimento humano é determinado por várias dimensões, as quais são sintetizadas em três pilares fundamentais, designadamente: educação, saúde e rendimento per capita. Assim, é entendido que o IDH expressa as dinâmicas dos países em termos de capacidade das suas populações acederem ao conhecimento, progredirem no seu nível de vida e na sua longevidade.

Os dados disponibilizados apontam para uma melhoria desses indicadores no que respeita a Cabo Verde, tendo levado o país à posição 123ª no plano das classificações. O quadro seguinte indica-nos a evolução registada ao nível das componentes do IDH.

Quadro 1: Evolução temporal das componentes do IDH em Cabo Verde

Esperança de vida á nascença Anos de escolaridade esperados Média de anos de escolaridade RNB per capita (2011 PPP $) Valor do IDH 1980 60.3 11.6 1,770 1990 66.1 11.6 2,453 2000 69.8 11.7 3.5 3,914 0.573 2005 72.1 11.7 3.5 4,570 0.589 2010 74.1 12.8 3.5 5,712 0.622 2013 75.1 13.2 3.5 6,365 0.636

Fonte: Reforma do Estado/CV – RDH (2014)

Atestando a progressão revelada, apuramos que Cabo Verde tem registado valores médios superiores aos verificados para o conjunto dos países da África Subsariana em termos do IDH nos últimos anos. De facto, os elementos referentes a Cabo Verde, disponíveis a partir do ano 2000, certificam essa dinâmica, conforme expressa o gráfico que de seguida apresentamos.

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Gráfico 5: Evolução do IDH de Cabo Verde e da África Subsariana.

Fonte: Elaboração própria com base em dados do Banco Mundial

É de referir ainda que Cabo Verde aceitou em 2003 o desafio lançado pela ONU no início da década no que diz respeito a implementação de medidas políticas denominadas “Objetivos do Desenvolvimento do Milénio” (ODM)74 para serem realizadas até ano

2015. Nesta perspetiva, após a iniciação da campanha em 2003 e apresentação do primeiro relatório em 2004, procedeu-se à realização de um conjunto de investimentos no âmbito das infraestruturas, transportes, agricultura, ambiente, educação, juventude, segurança, saúde, entre outros, com vista à melhoria das condições de vida das populações, assim como dar resposta aos desafios.

Assim, de acordo com a ONU/Cabo Verde, o país atingiu o objetivo nº 5, concretamente os cuidados da saúde materna75 e está a bom ritmo de conseguir os outros. Entretanto,

pese embora a vulnerabilidade estrutural da economia e as diferenças regionais que persistem com impactos diretos na vida das populações, os vários indicadores de desenvolvimento do país constituem-se como exceções positivas na região (MIREX, 2012).

Contudo, o desenvolvimento harmonioso em Cabo Verde não se tem processado sem a colaboração de parceiros externos que contribuíram com ajudas ao desenvolvimento e também das remessas de emigrantes. A quase totalidade dos investimentos públicos no país tem dependido do financiamento externo sob forma de Ajuda Pública ao Desenvolvimento em mais de 90% (Nações Unidas/CV:2012).

Os maiores doadores bilaterais de APD a Cabo Verde são Portugal, Luxemburgo, Estados Unidos, Espanha, Holanda e França, sem contar ainda com outros importantes que não incluem nas estatísticas do CAD/OCDE, nomeadamente o Brasil, a Cuba e a China e que a cooperação entre ambos tem vindo a intensificar (IPAD;MIREX:2012). Em termos

74 1-Erradicar a extrema pobreza e a fome; 2- Alcançar a educação primária universal; 3- Promover a

igualdade de gênero e empoderamento da mulher; 4- Reduzir a mortalidade infantil; 5- Melhorar a saúde materna; 6- Combater o HIV/SIDA, malária e outras doenças; 7- Garantir a sustentabilidade ambiental; 8- Desenvolver Parceria Global para o Desenvolvimento.

75 Noticia de 04 de Maio de 2015, disponível em http://www.un.cv/arquivo-donativosaude.php

0,300 0,350 0,400 0,450 0,500 0,550 0,600 0,650 2000 2005 2010 2013 África Sub-Sariana Cabo Verde

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multilaterais, a União Europeia (UE) afigura-se como o principal doador na última década, seguido pelo Banco Mundial e pelo Banco Africano de Desenvolvimento. Os dados disponíveis e representados em gráficos a seguir mostram a evolução da APD em dólares desde a década de 1990 a 2013 e o seu respetivo valor em percentagem do PIB.

Gráfico nº 6: Evolução da APD (preços correntes em dólares)

Fonte: Elaboração própria com base em dados do Banco Mundial

Constata-se assim que o montante das ajudas tem tido uma tendência crescente, atingindo o pico em 2010 em mais de 300 milhões de dólares, sendo que a partir daí tem sido notório algum abrandamento do ritmo dos apoios. Deste modo, também a contribuição da APD para o PIB tem registado oscilações, perdendo peso gradualmente desde a década de 90, sendo este decréscimo mais pronunciado a partir de 2010, conforme sugere o gráfico que se segue.

Gráfico nº 7: Volume da APD em % PIB

Fonte: Elaboração própria com base em dados do Banco Mundial

Como sugere Carvalho (2013), a diminuição que se tem registado nesta modalidade de financiamento pode estar associada ao processo transição do país para a categoria de

0,0 50000000,0 100000000,0 150000000,0 200000000,0 250000000,0 300000000,0 350000000,0 1990 2000 2005 2010 2013 0,0 5,0 10,0 15,0 20,0 25,0 30,0 35,0 1990 2000 2005 2010 2013

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PDM e às novas modalidades de parcerias que o país vem estabelecendo nomeadamente, a ajuda orçamental e os empréstimos concessionais76.

De igual modo, as remessas dos emigrantes têm sido importantes no processo de desenvolvimento do país, embora o cenário evidencia uma desaceleração continua no setor, dando sinais de recuperação desde o início da última década em análise.

Como importante fator de equilíbrio da balança de pagamentos, os dados do Banco Mundial expressos no gráfico a seguir mostram-nos como é que as remessas têm atuado na formação do PIB ao longo dos últimos anos.

Gráfico nº 8: Remessas de Emigrantes em % do PIB

Fonte: elaboração própria com base nos dados do Banco Mundial

Atestando uma redução contínua desde o início da década de 2000 e com maior intensidade em 2005, pode-se verificar que a partir de 2010 a tendência tem sido de crescimento, passando de valor aproximado de 8% para mais de 9% em 2013.

Em relação aos diferentes países de origem, as remessas têm mantido nos últimos anos uma dinâmica continua conforme podemos ver no gráfico seguinte.

Gráfico nº 9: Remessas de Emigrantes por país de origem (milhões de escudos)

Fonte: elaboração própria com base nos dados do Banco de Cabo Verde

Os dados mostram o domínio dos países de Europa no envio de remessas e não obstante algumas oscilações, a dinâmica tem sido positiva estando Portugal como maior emissor,

76 Taxas de juros mais baixos e período de amortização de dívidas mais alargados.

-1,0 1,0 3,0 5,0 7,0 9,0 11,0 13,0 15,0 17,0 2000 2005 2010 2013 0,00 500,00 1 000,00 1 500,00 2 000,00 2 500,00 3 000,00 3 500,00 4 000,00 4 500,00 2000 2005 2010 2013 Estados Unidos França Portugal Suiça Angola

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seguido da França. Fora do continente europeu, os EUA apresentam uma tendência crescente na última década, depois de ter estado em declínio desde o ano 2000.