• Nenhum resultado encontrado

O Contributo da Lei de Bases do Sistema Educativo

Capítulo I – A Escola de Hoje como Organização Educativa

1. O Contributo da Lei de Bases do Sistema Educativo

Com a publicação da Lei de Bases do Sistema Educativo (LBSE), surge uma nova escola básica, completamente diferente da escola básica tradicional caraterizada, segundo Pires (1987) cit. por Torrão (1993), por ser uma organização burocrática, rígida, uniforme e com estruturas desarticuladas e justapostas, socialmente discriminatória, seletiva, reprodutora das condições sociais e condicionadora do sucesso escolar. A escola tinha uma função instrutiva, que se limitava a transmitir um saber académico e historicamente sedimentado. O currículo era uniforme, centralmente definido e muitas vezes desadaptado do contexto dos alunos e do meio; era centrado nos conteúdos, no professor e no ensino. O professor era um mero transmissor de saber, conformado, dependente, autoritário e fechado, “social e profissionalmente estratificado” (p. 28). O aluno era conformado, dependente, apático, passivo e obediente. No que respeita à autonomia, era uma escola dependente (do poder central), não responsável, passiva, fechada e socialmente isolada.

A LBSE, de 14 de outubro de 1986, estabeleceu assim, um novo quadro de princípios do sistema educativo, dando início à Reforma Educativa.

Assistimos assim, como refere Formosinho (1997), à reconfiguração de novas funções na escola básica relacionadas com o acesso, segurança escolar e prevenção social, com o apoio pessoal aos alunos, com a colaboração da família e com os apoios à instrução e aos professores. Estas novas funções pressupõem novas tarefas, nomeadamente em relação aos novos alunos e aos pais e famílias, criando mecanismos formais de cooperação escola-família e outro tipo de apoios. Por outro lado e relativamente aos professores, assistimos a tarefas como a formação contínua e especializada em conhecimentos transdisciplinares no âmbito dos novos conteúdos a lecionar como a Educação Pessoal, Multicultural, Educação para a Saúde, Educação Sexual e Educação para a Participação e no conhecimento de novas metodologias e tecnologias, colocando à escola novos desafios pedagógicos e didáticos. No âmbito das novas tarefas salientamos ainda as relacionadas com o contexto administrativo e da relação da escola com o contexto local.

No que respeita aos “novos alunos” (Formosinho, 1997, p. 14), salientámos a referência às novas funções/tarefas em que se inclui a educação de alunos com NEE, o apoio aos alunos com dificuldades de aprendizagem, o apoio psicológico, a orientação educativa e a orientação vocacional. Neste sentido, verificámos a referência específica a esta população na LBSE que, segundo Correia (1999), processa transformações na

33

conceção da “Educação Integrada” relacionando-se “com a noção de escola como espaço educativo aberto, diversificado e individualizado, em que cada criança possa encontrar resposta à sua individualidade, à sua diferença” (p. 19). Desta forma, segundo o autor, consagra como princípios da educação especial o direito à educação, à igualdade de oportunidades e à participação na sociedade e define modelos diversificados de integração em estabelecimentos regulares de ensino.

Reforçando esta perspetiva podemos fazer alusão aos princípios gerais da LBSE em que no art.º 2 se menciona que “todos os portugueses têm direito à educação e à cultura, nos termos da constituição da república” e que “é da especial responsabilidade do Estado promover a democratização do ensino, o direito a uma justa e efectiva igualdade de oportunidade no acesso e sucesso escolares”.

No que respeita aos princípios organizativos, no art.º 3º refere-se “d) Assegurar o direito à diferença mercê do respeito pelas personalidades e pelos projectos individuais da existência, bem como da consideração e valorização dos diferentes saberes e culturas”.

No art.º 5º faz-se referência a “h) Proceder à despistagem de inadaptações, deficiências ou precocidades e promover a melhor orientação e encaminhamento da criança” e no art.º 7º, no âmbito do ensino básico, pode ler-se “j) Assegurar às crianças com necessidades educativas específicas, devidas, designadamente, a deficiências físicas e mentais, condições adequadas ao seu desenvolvimento e pleno aproveitamento das suas capacidades”.

Podemos ainda verificar que nos art.º 16º, 17º e 18º, no âmbito da educação especial, reporta para a “recuperação e integração sócio-educativas dos indivíduos com necessidades educativas específicas devidas a deficiências físicas e mentais”, nomeadamente referindo como modalidade especial de educação escolar a educação especial (art.º 16º), referindo-se aos objetivos da educação especial (art.º 17º) e definindo a organização da educação especial (art.º 18º).

Numa perspetiva integrada da reforma e “abrindo-lhe caminhos”, Torrão (1993) refere que a Comissão de Reforma do Sistema Educativo (CRSE), criada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 8/86, “foi organizando as suas propostas de maneira a constituir um conjunto coerente, articulado e global e produzindo documentos de conteúdo essencial para a sua concretização” (p. 11), de que são exemplo o Decreto-Lei n.º 139- A/90, de 28 de abril, relativamente ao regime de autonomia; o Decreto-Lei n.º 43/89, de 3 de fevereiro relativo ao Estatuto da Carreira Docente; o Decreto-Lei n.º 172/91, de 10 de maio, relativo ao ordenamento jurídico da direção, administração e gestão da escola; o

34

Decreto-Lei n.º 249/92, de 9 de novembro, relativo à formação contínua de professores; o Decreto-Lei n.º 286/89, de 29 de agosto, relativamente aos novos planos curriculares dos ensinos básico e secundário e o Despacho Normativo n.º 98-A/92, de 19 de junho, definindo o regime de avaliação dos alunos do ensino básico, entre outros.

No entanto, acrescenta ainda Torrão (1993), “não basta alterar os princípios, o quadro jurídico ordenador, as finalidades e os conteúdos de que a escola é encarregada. É necessário criar também as condições organizacionais, físicas e humanas que lhe garantam viabilidade” (p. 11), uma vez que, segundo Formosinho (1997) se assiste a “pressões da sociedade para uma intervenção política activa no sistema escolar” (p. 11).

Podemos assim considerar que com a LBSE (com as alterações introduzidas pela Lei n.º 115/ 97, de 17 de setembro - alteração da redação dos art.º s 12º,13º, 31º e 33º) e pela Lei n.º 49/05, de 30 de agosto - alteração da redação dos art.º s 11º,12º,13º 31º e 59º), onde sãoconsignados, entre outros, o direito à educação e à cultura para todas as crianças, o alargamento do período da escolaridade obrigatória para 9 anos, a formação de todos os jovens para a vida ativa, o direito a uma justa e efetiva igualdade de oportunidades, a liberdade de aprender e ensinar, a formação de jovens e adultos que abandonaram o sistema e a melhoria educativa de toda a população, são dados passos significativos para reparar problemas estruturais do sistema educativo e para ultrapassar atrasos e estrangulamentos que remontam ao século XIX.

Na base da Reforma Educativa que se foi construindo, refere Torrão (1993), estão os princípios organizacionais presentes na Constituição da República e da LBSE e que se articulam “com as novas finalidades do ensino básico (…)” (p. 22). Estes princípios, refere o autor, pressupõem a criação de uma nova mentalidade entre os vários atores envolvidos no ato educativo e no desenvolvimento da organização escolar com base na relação dialética “entre as mudanças organizacionais e ambientais e o importante papel que a cultura organizacional nelas desempenha” (p. 22).

Neste contexto, passamos a ter uma escola que se prevê autónoma, responsável, criativa, empreendedora, participativa e aberta, com uma organização flexível, adaptada, diversificada e com “estruturas coerentes e congruentes” (p. 22). Transforma-se numa escola “atenuadora” das diferenças sociais, promotora de condições de igualdade de acesso e sucesso escolar, que orienta os alunos para a vida ativa e para a continuação de estudos assumindo, assim, uma função “socializadora, personalizadora e de tutela” (p.22), construtora e valorizadora de vários tipos de saber.

35

O currículo apresenta-se agora com alguma diversificação, com componentes locais e adaptado ao contexto; transforma-se num currículo centrado no aluno e nos processos de ensino-aprendizagem.

O professor assume um papel de “coordenador e criador” (p. 22) de situações e atividades diversificadas de ensino-aprendizagem, é criativo, crítico, dinâmico e aberto que tem como missão contribuir para a igualização de oportunidades, empenhando-se na formação de cidadãos livres, responsáveis, participantes, criativos e aptos a entrar em esquemas de formação profissional, que lhes permitam a inserção na vida ativa ou a prosseguir estudos numa escola que passa a ter, refere Torrão (1993), “de conscientemente educar e socializar na cultura nacional as crianças, os adolescentes e os jovens, recusando a massificação e assumir-se, na sua plenitude, como uma escola de massas” (p. 22).

Por sua vez, o tipo de aluno é participante e ativo e caracteriza-se pela responsabilidade, autonomia, criatividade e abertura.