• Nenhum resultado encontrado

O controle da eficiência a partir dos instrumentos de planejamento

5 PARÂMETROS PARA O CONTROLE DE LEGITIMIDADE

5.3 O DEVER DE EFICIÊNCIA

5.3.6 O controle da eficiência a partir dos instrumentos de planejamento

Os agentes públicos são investidos de funções necessárias à realização do bem comum. Os poderes constituídos só existem em decorrência dos deveres que lhe são atribuídos. O “poder” somente faz sentido a partir do momento em que ele é o instrumento para o cumpri- mento de um dever, de maneira que não é possível falar em poder sem um dever correlato.547

O paradigma de uma separação rígida de poderes, originária da formulação racionalista a partir do pensamento do Barão de Montesquieu, cedeu espaço para uma noção de coorde-

546

AMARAL, op. cit., p. 208.

547

nação e cooperação entre poderes, com um objetivo único de realização do bem comum. O Estado, todo ele, como meio que é, tem como missão a satisfação dos interesses da sociedade e recebe diretamente da Constituição seus poderes-instrumentais para realização da missão que lhe foi dada também pela Carta Maior, nosso repositório de consensos a respeito dos fins do Estado.

A Carta Constitucional estabelece os objetivos a serem perseguidos, em especial aqueles previstos no art. 3º, de maneira a assegurar os direitos fundamentais do art. 5º, de modo que prevaleça a dignidade da pessoa humana, fundamento da República Federativa do Brasil, art. 1º. Fixa as fontes de recursos de que dispõe o Estado para a concretização do bem comum. Determina a maneira como se portar na gestão dos recursos arrecadados da sociedade, seja na elaboração de planos, seja na execução efetiva da despesa pública, devendo, por exemplo, o gestor público observar os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.

A Constituição irradia assim, seja através das regras seja através dos princípios, toda a sua força normativa sobre a gestão do gasto público e estabelece ainda as diversas formas do exercício do controle do gasto público: controle social, controle interno, controle externo (judicial, político, e técnico-administrativo).

Os Tribunais de Contas se inserem no âmbito do controle externo técnico-adminis- trativo, recebem diretamente da Constituição a atribuição para controlar a correta utilização dos recursos púbicos não só do ponto de vista formal, mas, principalmente, sob o critério de legitimidade dos atos de gestão, e estão autorizados, inclusive, a sancionar o gestor em virtude da prática de ato ilegítimo.

A Constituição prevê três níveis para a realização das opções de gasto público, por esses três níveis estão distribuídos quatro fases: formulação, planejamento, orçamentação e execução. O primeiro nível, onde ocorre a decisão de objetivos é a elaboração do planejamen- to, caracterizada por ser predominantemente político. No segundo nível, as opções realizadas vão receber a sua expressão orçamentária, mediante a dotação de recursos, que passa pelo Plano Plurianual (PPA), pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e pela Lei Orçamentária (LOA). Neste nível, se entrelaçam a formulação política e a administração. No terceiro nível, as opções que passaram a figurar nos programas de trabalho da Lei Orçamentária serão

executadas; aqui o predomínio é eminentemente administrativo.548

No nível político se discutem os objetivos que serão perseguidos. Explica Regis Fernandes de Oliveira que “a decisão de gastar é fundamentalmente uma decisão política”549

. No entanto, as opções, os objetivos a serem concretizados, estão elencadas na Carta Consti- tucional. Assim é que o legislador se vê, por exemplo, obrigado a reservar parcela do orça- mento para os gastos com saúde e educação. De maneira que, conquanto seja uma decisão política, tem-se apenas uma liberdade de escolha vinculada a realização do que foi acordado em nosso repositório de consensos. Ao concordamos em ceder parcela de nossos recursos, o fizemos na condição de que os objetivos perseguidos fossem aqueles assentados no texto constitucional.

No segundo nível, as opções políticas devem observar os critérios traçados pela Constituição para elaboração das leis de planejamento: o PPA, a LDO e a LOA.

O PPA deve estabelecer, para um período de quatro anos, de forma regionalizada, as diretrizes (orientações gerais), objetivos (resultados) e metas (quantificação física ou finan- ceira dos objetivos) da administração pública federal para as despesas de capital e outras despesas correntes derivadas das despesas de capital e para as relativas aos programas de duração continuada.550 Nenhum investimento cuja execução ultrapasse um exercício finan- ceiro poderá ser iniciado sem prévia inclusão no plano plurianual, ou sem lei que autorize a inclusão, sob pena de crime de responsabilidade.551

O PPA está estruturado na forma de Programa. “Com a finalidade de criar condições para que o PPA estabeleça relações mais adequadas com todos os insumos necessários à viabilização das políticas, os Programas Temáticos do PPA 2012-2015 estão organizados em Objetivos que, por sua vez, são detalhados em Metas e Iniciativas.”552

A LDO compreenderá as metas e prioridades da administração pública federal, incluin- do as despesas de capital para o exercício financeiro subsequente, orientará a elaboração da lei orçamentária anual, disporá sobre as alterações na legislação tributária e estabelecerá a políti-

548

MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Quatro paradigmas do direito administrativo pós-moderno: legitimidade:

finalidade: eficiência: resultados. Belo Horizonte: Fórum, 2008, p. 124-125. 549 OLIVEIRA, Curso de direito financeiro..., op. cit., p. 126.

550

Constituição Federal, art. 165, §1º.

551

Constituição Federal, art. 167, §1º.

552

BRASIL. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. O modelo de planejamento governamental. PPA 2012-2015. Disponível em http://www.planejamento.gov.br/ministerio.asp?index=10&ler=s1086 Acesso em: 25/2/2015.

ca de aplicação das agências financeiras oficiais de fomento.553

A LDO faz a ligação entre o PPA e a LOA, destacando para o exercício seguinte quais programas e metas serão executados.

A LOA, por sua vez fixa a despesa e estima a receita para o exercício.554 A Lei orçamentária é estruturada com base em Programas de Trabalhos, onde devem estar respon- didas de forma objetiva as seguintes questões:

[...] quem é o responsável por fazer? Em que áreas de despesa a ação governamental será realizada? Qual o tema da Política Pública? O que se pretende alcançar com a implementação da Política Pública? O que será entregue pela Política Pública? O que será desenvolvido para alcançar o objetivo do programa? O que é feito? Para que é feito? Como é feito? O que será produzido ou prestado? Como é mensurado? Onde é feito? Onde está o beneficiário do gasto?555

No terceiro nível, o nível administrativo, os gestores se acham vinculados ao que foi traçado nas leis de planejamento.

Se no nível político é questionável a atuação dos Tribunais de Contas para verificação das prioridades eleitas, no nível administrativo não paira esta dúvida. Assim, no bojo dos programas de trabalho que serão realizados, os Tribunais de Contas, a fim de verificar a legitimidade do gasto, devem proceder a um exame do programa isoladamente, verificando a eficiência e eficácia na gestão daquele programa no sentido do atingimento das metas propos- tas, procurando aferir os benefícios efetivos para a sociedade.

Deve também proceder a um exame comparativo entre os diversos programas de trabalho, questionado o porquê de se priorizar um programa em detrimento de outro. Por exemplo, suponhamos que o orçamento municipal contemple verbas em programa de trabalho na área cultural, tendo como objetivo a contratação de banda para realização de festejos juni- nos, e contemple um outro programa de trabalho com o objetivo de saneamento básico. Não precisaria de muito esforço hermenêutico para se chegar à conclusão de que do ponto de vista dos objetivos previstos na Constituição, o direito ao saneamento básico, que envolve direito à saúde, que, por sua vez é o direito à vida, tem prioridade sobre festejos juninos. Caso o programa de saneamento seja preterido em suas metas, do ponto de vista da eficiência do gasto público, no sentido de priorizar e maximizar os objetivos Constitucionais, teremos um

553

Constituição Federal, art. 165, §2º.

554

Constituição Federal, art. 165, §5º e 8º.

555

BRASIL. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Secretaria de Orçamento Federal. Manual técnico de orçamento MTO. Edição 2015. Brasília, 2014, p. 29.

ato de gestão ilegítimo.556

Não se pode haver entrever o estudo à luz do resultado, mas também, em sua transcendência constitucional, isto é, se o gasto foi eficiente, mas em relação ao todo da população. Não Basta, apenas, que tenha sido importante em determinada área do país, do estado ou do município. Deve ser analisado, também, o destinatário do recurso. Assim, por exemplo, se a administração pública despende grande parte de seus recursos para o atendimento de áreas mais favorecidas da cidade, ou seja, em bairros nobres, não se pode dizer que o princípio foi atendido.557

A análise a partir dos programas de trabalhos permite uma avaliação isolada do programa, bem como sua avaliação no conjunto de programas orçamentários, verificando se foi dada a devida prioridade às diretrizes constitucionais e, portanto, do ponto de vista da eficiência, não se convertera em um ato de gestão ilegítimo.