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Jornal de Aprendizagem 2 O CUIDADOR INFORMAL

1. O CUIDADOR INFORMAL

O segundo Jornal de Aprendizagem é referente ao período de 9 a 13 de outubro de 2017. Apesar desta terceira reflexão crítica se encontrar inserida dentro do referido espaço temporal é uma temática transversal a toda e qualquer prática de Cuidados Especializados em Enfermagem de Reabilitação (CEER).

A reflexão será baseada em evidência científica e incidirá na importância da capacitação do cuidador informal, da pessoa com défice funcional, para a excelência do exercício profissional como Enfermeira Especialista em Enfermagem de Reabilitação (EEER) e eficácia da implementação dos CEER. Esta capacitação prende-se com a educação e prescrição de técnicas específicas de reabilitação, que têm como objetivo “assegurar manutenção das capacidades funcionais dos clientes, prevenir complicações (…), melhorar as funções residuais, manter ou recuperar a independência nas atividades de vida, e minimizar o impacto das incapacidades instaladas (…)” (p. 1), pressupostos do Regulamento das Competências Específicas do Enfermeiro (Ordem dos Enfermeiros [OE], 2011a).

Quando analiso os planos de intervenção individual de Enfermagem de Reabilitação (ER) estabelecidos pela Equipa de Cuidados Continuados Integrados (ECCI), onde estou a realizar o Estágio, constato que logicamente um dos diagnósticos, que arrisco em dizer obrigatório, prende-se com o ensino, capacitação e avaliação da pessoa que presta cuidados diariamente ao utente: o cuidador informal.

A ECCI integra pessoas em situação de dependência funcional transitória ou prolongada, que não carecem de internamento, mas dentro do processo de doença estão impossibilitadas de se deslocar de forma autónoma (OE, 2009). Impõe-se desta forma a necessidade da existência de pelo menos um prestador de cuidados, que pode assumir diferentes tipologias, tais como cuidador formal ou cuidador informal.

O cuidador informal é um elemento da família da pessoa em situação de dependência que assegura a prestação de cuidados sem aferir remuneração. Estes encontram-se na respetiva rede de familiares e amigos, que contrastam com o exercício técnico dos profissionais de saúde, os catalogados cuidadores formais. (Martins, Pais, Ribeiro & Carolina Garrett, 2003, Mistério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social [MTSS] & Ministério da Saúde [MS], 2016)

Mais, de acordo o referencial teórico para o constructo dos meus planos de CEER, para Orem (1995) o cuidador informar é o agente do cuidar dependente, pessoa ou pessoas que satisfazem ou promovem o autocuidado decorrente das limitações apresentas.

3 A situação chave para esta mobilização de pensamento crítico prendeu-se com a visita domiciliária a uma utente com 79 anos, Sr.ª A., que após internamento por Acidente Vascular Cerebral (AVC) do hemisfério esquerdo a nível da artéria cerebral média e do cerebelo, de etologia não estabelecida, encontra-se a residir com o filho que é o seu cuidador informal.

O filho encontra-se atualmente desempregado sendo o prestador de cuidados durante as 24 horas, com apoio para os cuidados de higiene banho uma vez por dia.

Após o AVC ficou dependente nas Atividades de Vida Diárias (AVD) com uma avaliação funcional classificada como grave no índice de Barthel (DGS, 2011). Tem como manifestações clínicas afasia global, hemiplegia e hipoestesia contra lateral com força muscular de 1/5 a nível de todos os segmentos corporais, avaliada através da Medical Research Council Muscle Scale (OE, 2016a).

Importa ainda referir que a nível do hemicorpo menos afetado (esquerdo) apresenta força muscular de 3/5 na Medical Research Council Muscle Scale e tónus muscular de 1+ na Escala de Modifica de Ashworth (OE, 2016a) a nível da coxofemoral, joelho e tibiotársica, pelo que apresenta disbasia.

A utente quando sentada apresenta apenas equilíbrio estático.

O plano de intervenção individual estabelecido pelo EEER gestor do caso, de acordo com Menoita (2012) e Marques-Viera & Sousa (2016), teve os seguintes objetivos: capacitar e treinar o cuidador informal (filho) para a satisfação do autocuidado, evitar a instalação da espasticidade, aumentar o tónus muscular, prevenir complicações musculares e articulares, manter a integridade das estruturas articulares e conservar amplitude dos movimentos.

Os CEER definidos operacionalizam-se através da reeducação do mecanismo do reflexo postural, programa de mobilizações articulares passivas, posicionamento em padrão anti- espástico, exercícios de fortalecimento muscular e readaptação do domicílio à situação de incapacidade funcional atual através da seleção, prescrição e ensino de produtos de apoio (Menoita, 2012; Marques-Viera & Sousa, 2016).

Objetivamente considero que o plano de ER só terá os ganhos definidos se for inteiramente desenvolvido em conjunto com o cuidador informal. Implicará deste modo que consiga fazer a discussão, análise e capacitação, de e com o filho, de todas as intervenções que integram o plano de CEER, que se prendem com a redução do risco complicações e melhoria das funções residuais da Sr.ª A..

Seguindo a linha de pensamento descrita, no início da vista domiciliária avalio, utilizando a terminologia de diagnósticos de enfermagem segundo a Classificação Internacional

4 para a Prática de Enfermagem 2 (CIPE 2) (OE, 2014), que já tem conhecimentos adquiridos acerca de dispositivo auxiliar de higiene, vestuário e comunicação. Tem capacidade para executar a técnica de equilíbrio corporal e de transferência para o sofá e necessita de reforço nos conhecimentos sobre técnicas de exercício muscular e articular e técnica de posicionamento em padrão inibitório de espasticidade.

Dados os défices de conhecimento identificados durante o contacto ensinei, dirigi e orientei o filho acerca da técnica de mobilização articular passiva e exercício de fortalecimento muscular de todos seguimentos articulares. As ações terapêuticas vão de encontro aos objetivos previamente identificados, bem como visam a promoção da saúde, bem-estar, com redução do risco de alterações nos restantes níveis, tal como é exigido pelas competências do EEER (OE, 2010a).

Durante todo o processo de prestação dos cuidados para além do ensino da técnica em si instrui o cuidador principal acerca dos efeitos terapêuticos da mesma, pois considero que uma atitude meramente demostrativa não será merecedora de sedimentação dos conhecimentos.

De acordo com a Ordem que nos rege (OE, 2010b) existe atualmente um crescimento da necessidade de prestadores de cuidados em Portugal devido ao aumento da esperança medida de vida com consequente envelhecimento populacional, do qual resulta um maior nível de dependência.

Ainda segundo os Censos de 2011 “aproximadamente 40,5% das pessoas entre os 15 e os 64 anos tinham pelo menos um problema de saúde ou doença prolongados e 17,4% tinham pelo menos uma dificuldade na realização de atividades básicas, em 2011.”. (Instituto Nacional de Estatística [INE], 2012).

A Assembleia do Colégio de Especialidade de Reabilitação (OE, 2016b) afirma assim que o aumento dos níveis de dependência reflete-se na necessidade de “mais e melhores cuidados de Enfermagem de Reabilitação. (…) Posicionando os EEER na linha da frente do SNS para ajudar as pessoas em situação de doença aguda, crónica e com necessidades especiais, no sentido de capacitar a pessoa com deficiência, limitação da atividade e/ou restrição da participação para a sua reinserção e exercício da cidadania.” (p.4).

Segundo Hoeman (2011) o EEER deve assumir como dever a educação eficaz ao cuidador informal que irá permitir à pessoa “aprender a viver (…) no seu próprio ambiente, de maneira mais independente possível.” (p. 61). Esta intervenção irá ainda aumentar a qualidade de vida e reduzir o risco ou evitar as complicações decorrentes da incapacidade presente (OE, 2010a).

5 Os indicadores de saúde descritos pela OE (OE, 2014), no documento Core de Indicadores por categoria de enunciados descritos dos Padrões de Qualidade dos Cuidados Especializados em Enfermagem de Reabilitação (PQCEER), permitem evidenciar os reais contributos dos CEER à população a quem o EEER presta cuidados. Neste documento a importância da implicação direta do cuidador informal é bastante explícita, uma vez que faz parte do descritivo dos indicadores enunciados.

Saliento os elementos do indicador Satisfação do Cliente que afirma a necessidade do envolvimento das pessoas significativas no processo de cuidados de Enfermagem de Reabilitação (OE, 2010b), o indicador Bem-estar e Autocuidado e Readaptação Funcional que descreve entre outros ser necessário “o ensino, instrução e treino do cliente e pessoas significativas sobre técnicas que promovam o autocuidado (…)” (OE, 2014, p.8) e envolvimento das “pessoas significativas no processo de cuidados, ensinando e treinando, tendo em conta os recursos existentes no domicilio.” (OE, 2014, p. 13).

No contexto Plano de Desenvolvimento da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI) 2016-2019 (MTSS & MS, 2016) foi proposto desenvolver o Estatuto do Cuidador Informal, assim como a Resolução da Assembleia da Republica nº 134, 135 e 136 de 2016 (Decreto-Lei nº 137/2016, de 19 de junho), acrescenta ainda a recomendação da tomada de medidas de apoio a cuidadores informais das pessoas integradas há mais de 3 meses na RNCCI e na Rede Nacional de Cuidados Paliativos. Os objetivos de ambos prendem-se com a melhoria dos apoios dados ao cuidador informal da sua formação, remuneração efetiva pelos cuidados prestados e apoios no âmbito da saúde. Permitiram assim a melhoria da sua qualidade de vida, bem-estar mental e reconhecimento do seu papel.

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BIBLIOGRAFIA

Decreto-Lei nº 21/2018, de 19 de Junho de 2016. Resolução da Assembleia da República nº 134/2016, 135/2016, 136/2016. Diário da República – I Série, Nº 137 – 6 Junho de 2016 (13/5/2016) 2307-2308.

Direção-Geral da Saúde (2011). Acidente Vascular Cerebral: Prescrição de Medicina Física e de Reabilitação. Lisboa: Direção-Geral da Saúde.

Hoeman, S.P. (2011). Enfermagem de reabilitação: Prevenção, intervenção e resultados esperados (4ª ed). Loures: Lusodidacta.

Instituto Nacional de Estatística (2012). Saúde e Incapacidades em Portugal 2011. Lisboa: Instituto Nacional de Estatística, IP.

Marques-Vieira, C. & Sousa, L. (2016). Cuidados de Enfermagem de Reabilitação à pessoa ao longo da vida. Loures: Lusodidacta.

Martins, T., Ribeiro, J. P. & Garrett, C. (2013). Estudo de validação do questionário de avaliação da sobrecarga para cuidadores informais. Psicologia, Saúde & Doenças, 4 (1), 131-148.

Menoita, E.C. (Coord.) (2012). Reabilitar a pessoa idosa com AVC: Contributos para um envelhecer resiliente. Loures: Lusociência

Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social & Ministério da Saúde (2016). Plano de Desenvolvimento da RNCCI 2016-2019.

Ordem dos Enfermeiros (2009). Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados: Referencial do Enfermeiro. Lisboa: Ordem dos Enfermeiros.

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Especializados em Enfermagem de Reabilitação. Lisboa: Ordem dos Enfermeiros. Ordem dos Enfermeiros (2014). Padrão documental dos Cuidados de Enfermagem na

Especialidade de Enfermagem de Reabilitação. Porto: Ordem dos Enfermeiros- Assembleia do Colégio da Especialidade de Enfermagem de Reabilitação.

7 Ordem dos Enfermeiros (2016a). Enfermagem de Reabilitação: Instrumento de recolha de dados para a documentação dos Cuidados Especializados em Enfermagem de Reabilitação. Lisboa: Ordem dos Enfermeiros-Mesa do Colégio da Especialidade de Enfermagem de Reabilitação.

Ordem dos Enfermeiros (2016b). Plano de Atividades a Desenvolver em 2016. Lisboa: Ordem dos Enfermeiros-Mesa do Colégio da Especialidade de Enfermagem de Reabilitação. Orem, D.E. (1995). Nursing conceps of practice (5nd ed.). St. Louis: Mosby.

Mestrado em Enfermagem

Área de Especialização de Enfermagem de Reabilitação

Unidade Curricular Estágio com Relatório