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O depoimento como técnica e possibilidade de pesquisa

No documento MESTRADO EM SERVIÇO SOCIAL SÃO PAULO 2012 (páginas 108-111)

CAPÍTULO III TERRITÓRIOS, TRAJETÓRIAS URBANAS E

3.2 O depoimento como técnica e possibilidade de pesquisa

Escolhemos, dentro da metodologia da história oral, a técnica de depoimentos para operacionalizar e viabilizar a pesquisa, pois reconhecemos nessa técnica uma forma privilegiada de movimentar a troca com os sujeitos e suas experiências, buscando por via de seus relatos as significações da história vivida pelos sujeitos envolvidos na pesquisa.

Isso significa que o pesquisador terá um fio condutor que leve o sujeito a expressar-se oralmente sobre aquele ponto; para isso, o pesquisador deverá ter claro quais são os objetivos da pesquisa para poder tecer o diálogo com o sujeito pesquisado, enriquecendo a conversa com a temática que está trabalhando.

A metodologia da história oral, aqui especificada pela técnica dos depoimentos, objetiva ouvir, escutar, compreender os que estão subsumidos ao silêncio, aqueles que pouco aparecem na documentação escrita, que não estão postos na história dita oficial. Isto é, as camadas de baixa renda, os trabalhadores. É preciso saber sobre seus modos de vida, como pensam, sentem e significam os processos globais, como interpretam a história a partir dos lugares e territórios que ocupam na trama das relações sociais.

Os sujeitos, mostrando-se pela oralidade, revelam o cotidiano dos grupos, o tipo de relacionamento entre os indivíduos, as opiniões, valores, significados, possibilitando compreender o processo em curso, o tempo presente. É possível captar, por meio dos depoimentos, a história e seus sentidos, o modo pelo qual as classes sociais, os homens, as mulheres, crianças, adolescentes experimentam as mudanças sociais, quais as normas e valores aceitam e rejeitam em seus modos de vida.

Assim, os depoimentos enfatizam determinado tema para que o sujeito possa expressar seu pensamento, histórias, experiências, significados e memórias. Nesse processo não interessam as cronologias de tempo, a exatidão das datas, a equação linear sobre o tempo e espaço das narrativas, mas sim as memórias que os sujeitos conseguem atingir sobre o tema dialogado. É importante frisar que a metodologia da história oral não reduz os relatos e as experiências na busca por um tempo cronometrado, mas objetiva apreender os processos vivenciados e evidenciados pelas narrativas.

No diálogo com o sujeito, na escuta de seus depoimentos, cabe ao pesquisador apontar suas dúvidas e interesses sobre as falas e narrativas dos sujeitos. É importante atentar para como os sujeitos dizem, expressam suas narrativas; a memória pode significar muita coisa, mas a falha da memória pode ser reveladora de múltiplos significados, principalmente na forma como os sujeitos e seu grupo participaram e participam dos acontecimentos e contextos sociais.

É também pelo viés das narrativas que podemos visualizar e analisar os comportamentos escolhidos pelos sujeitos, o contexto individual e coletivo das experiências relatadas, confluindo os aspectos marcantes e inconfundíveis do indivíduo, mas objetivando captar o grupo e a sociedade de que o sujeito é parte, buscando encontrar nas linhas e entrelinhas das narrativas a genericidade das falas, posto que olhar somente o indivíduo e “psicologizá-lo”, retirando seu contexto de sujeito político, pode nos levar a consideráveis erros e graves falhas na análise e na compreensão da pesquisa.

O indivíduo, entendido como sujeito que vive e tece seu modo de vida em meio às tramas da realidade social, também é um fenômeno social e político. Aspectos importantes de seu grupo, de sua sociedade, os comportamentos, pensamentos, valores, técnicas, ideologias podem ser expressos pela história individual dos sujeitos.

O depoimento como fonte privilegiada de relato oral somente tem sentido quando escolhido como potencial para alcançar determinados objetivos, sinalizando que é um procedimento de ação específico, sistemático e consciente, obedecendo a normas éticas, políticas e aos objetivos da pesquisa.

O pesquisador é guiado por seu próprio interesse ao procurar um narrador, pois pretende conhecer mais de perto, ou então esclarecer algo que o preocupa, o narrador, por sua vez, quer transmitir sua

experiência, que considere digna de ser conservada e, ao fazê-lo, segue o pendor de sua própria valorização, independentemente de qualquer desejo de auxiliar o pesquisador. Procurará por todos os meios relatar, com detalhes e da forma que lhe parecer mais satisfatória, os fatos que respondem aos seus próprios intentos, e tudo isto pode convir ou não ao pesquisador, o qual tentará então trazer o narrador ao “bom caminho”, isto é, ao assunto que estuda (QUEIROZ, 1991, p.4).

Assim, a técnica de depoimentos movimenta-se como um conjunto de procedimentos que devem propiciar ao pesquisador e ao pesquisado um diálogo do tema estudado, deve seguir não um roteiro pronto e acabado, mas um esquema que permita a flexibilidade em torno das questões da pesquisa. Deve conter um direcionamento sobre o quê o pesquisador deseja que o sujeito fale e expresse; essa técnica deve estar fortemente costurada com as bases teóricas e metodológicas escolhidas pelo pesquisador.

É com essa intencionalidade que os sujeitos pesquisados expressaram suas experiências e achados sobre a cidade e suas formas de vida, sobre o que significa viver em uma cidade tão grande como a capital paulista, como pensam que se constituíram sujeitos nas teias de uma cidade que é tão grande e excludente.

Para que os pesquisados relatassem os sentidos da experiência urbana, vislumbramos que poderiam expressar suas considerações sobre a relação que existe entre o lugar em que vivem e sua identidade de sujeitos que movimentam a história no território que ocupam, vivem e se relacionam. Era importante que os sujeitos pudessem expressar suas formas de encontros com a coletividade, com o espaço vivido na comunidade, com a sociabilidade entre seus pares.

Os depoimentos orais evidenciam as marcas, hierarquias, estruturas, valores harmoniosos e conflitantes e o que existe no interior do grupo social do qual os sujeitos fazem parte, captando o que sucede na encruzilhada da vida individual e social. É na narrativa, no processo de verbalização da experiência, que o indivíduo revela-se sujeito, pois as palavras, a coerência e o contexto de cada relato passam forçosamente pela consciência, o que significa que cada narrativa exprime um caráter social e uma trama sociológica.

Para viabilizar a pesquisa e o processo dialético de captar as experiências dos sujeitos pesquisados, recorremos ao gravador de voz, como instrumento capaz de captar a totalidade dos relatos e das expressões. Compreendemos que esse recurso tem o potencial de armazenar as oralidades, as entonações, os momentos

de silêncio, as velocidades, os sons e ruídos da experiência produzida pelos homens.

Também apostamos no uso e na captação das imagens por meio de fotografias como procedimento e recurso que capta o momento dos depoimentos dos sujeitos envolvidos na pesquisa.

Consideramos que é um recurso a mais que pode contribuir no processo de registro e da interlocução entre o pesquisador e pesquisado. Esse recurso só tem sentido e somente poderá ser utilizado quando autorizado pelos pesquisados, se tiver sentido e coerência para eles. Também é importante afirmar que nos apoiamos no diário de campo, recurso que sintetiza as apreensões do pesquisador no momento da captação dos depoimentos orais.

No documento MESTRADO EM SERVIÇO SOCIAL SÃO PAULO 2012 (páginas 108-111)