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Questão 3: em que medida um Banco de Desenvolvimento vem incorporando os diversos conceitos de

2 DO DESENVOLVIMENTO PARA A GESTÃO PÚBLICA DO DESENVOLVIMENTO

2.2 O DESENVOLVIMENTO EM UMA CONCEPÇÃO “TRADICIONAL”

No modelo de desenvolvimento que aqui se caracteriza como “tradicional” observa-se uma ampliação da industrialização desenfreada, do consumo em massa e do crescimento econômico como a única medida do desenvolvimento. Neste modelo, o desenvolvimento ocorre de forma linear e única, como se todos tivessem a mesma meta, sem respeito à pluralidade e diversidade. Alguns autores na década de 1960 iniciaram até

mesmo um processo de evidenciar as etapas, períodos e processos para alcançar o desenvolvimento.

Sobre as etapas do desenvolvimento, classificou-se em cinco categorias: sociedade tradicional que era indiferente à manipulação do meio ambiente para o proveito econômico; precondições para o arranco onde se convertia a agricultura e indústria em um ambiente dinamizado pelos mercados mundiais; o arranco quando o desenvolvimento passa a ser a condição normal; a marcha para a maturidade após uns 60 anos do arranco e a era do consumo em massa (ROSTOW, 1966).

Torna-se evidente que quando se discute desenvolvimento e suas etapas, ao verificar o mundo “real” encontra-se uma miríade de elementos que escapam dessas classificações, sejam por questões geográficas, históricas, culturais etc. No modelo proposto, coloca-se a sociedade do consumo em massa como um modelo ideal para ser duramente buscado e atingido por todos os povos e regiões sem nenhum tipo de questionamento. Cabe destacar que a sociedade do consumo em massa pregada como um modelo ideal mostra-se como parte do problema contemporâneo diante da escassez dos recursos naturais. Esta sociedade do consumo torna-se uma meta alcançável por influência da nova forma de produção conhecida como Fordismo. O modelo de desenvolvimento tradicional envolve um modo de organização do trabalho, um regime de acumulação, um modo de regulação. Sobre o modo de organização impera a divisão do trabalho dentro de empresas, entre as organizações, territórios e países. Para o regime de acumulação, destacam-se as lógicas e leis macroeconômicas com variáveis como produtividade, mecanização, consumo familiar, investimentos, despesas governamentais e comércio exterior. Referentes aos modos de regulação observam-se institucionais e não institucionais envolvendo as regras do mercado, a legislação, o costume e a conformação (LIPIETZ, 1988; BIHR, 1999).

Adicionalmente, observa-se que o fordismo apresentou um olhar de sociedade alicerçado pelo chamado “compromisso fordista” que se preconiza em progresso técnico, tecnológico, social e do Estado com um pleno emprego e salários ascendentes. O compromisso fordista ultrapassou as barreiras organizacionais a provocou alterações sociais e culturais na sociedade civil contemporânea, pregando-se um mundo repleto de oportunidades (LIPIETZ, 1991).

O Fordismo influenciou o setor industrial em praticamente todos os segmentos com suas técnicas de produção facilitando a criação de uma sociedade do consumo pleno e irrestrito. Grandes indústrias, ostentando suas chaminés como um símbolo de desenvolvimento, marcaram a época em metrópoles norte- americanas e migraram também para boa parte do globo terrestre.

O Fordismo resulta em uma sociedade do consumo em massa que reflete o modelo tradicional de desenvolvimento relacionado diretamente com o crescimento econômico, sem o respeito aos aspectos sociais, e utilizando-se os recursos naturais apenas como um insumo. Ressalva-se que, ao utilizar os recursos naturais sem preocupação com esgotamento, este modelo de desenvolvimento torna-se destrutivo no longo prazo. O modelo capitalista de crescimento a todo custo apresenta-se saturado diante de problemas contemporâneos direcionando para uma crise de suas próprias premissas do desenvolvimento.

Em resumo, o fordismo como modelo de desenvolvimento (1945-1975), em uma perspectiva de desenvolvimento tradicional, caracteriza-se pelo produtivismo, consumismo, individualismo, competição social, identidade social pelo mercado de trabalho, “solidariedade administrativa”, sociedade burocrática e predomínio da racionalidade instrumental (LIPIETZ, 1988; BIHR, 1999).

Desta forma, para Furtado (1994) a superação do subdesenvolvimento implica em responder a questões sociais e de mundialização de tecnologia sem deslizar na autonomia para um desenvolvimento. Neste contexto, podem-se assumir três modelos: a coletivização dos meios de produção, a priorização da satisfação das necessidades básicas e o ganho de autonomia externa; onde o ponto de partida é a crítica da forma atual. Todavia, como obstáculos, ressalvam-se as estruturas de poder com alto grau de concentração, a falta de um sistema de incentivo ao desenvolvimento econômico e a fraqueza das estruturas sociais (FURTADO, 1994).

A negligência das dimensões sociais, ambientais e políticas no modelo de desenvolvimento tradicional, mensurado principalmente pelo crescimento econômico de forma linear e única não resultou em continuidade. Assim, ao questionar o modelo de desenvolvimento não necessariamente se propõe algo novo, mas apenas verifica-se a ineficiência do mesmo.

Contudo, apenas neste processo já se considera um avanço no sentido que se coloca “aberto” para novas respostas, construindo desta forma uma janela de oportunidade.

Neste ambiente, no estudo do desenvolvimento, encontram-se temas latentes de pesquisa: o enfoque que emerge do âmago da pobreza em situações extremas; a penetração de novas técnicas produtivas e seus reflexos sociais, inclusive nas formas pluralistas de poder; os mecanismos de aperfeiçoamento do fator humano com parcela substancial para o desenvolvimento; o paradoxo dos níveis tecnológicos que operam em paralelo; a função reguladora do Estado para o desenvolvimento; reflete-se, com isso, que somente um projeto político com conhecimento social pode romper a lógica perversa do subdesenvolvimento (FURTADO, 1994).

Diante da crise do modelo tradicional de desenvolvimento, torna-se possível que não se evidencie apenas um novo modelo, mas vários modelos à espera da escolha de seus atores. Portanto, ao estudar a crise do modelo tradicional do desenvolvimento ressalta-se para o cuidado de não repetir os equívocos de um modelo míope que negligencia outras dimensões além da econômica. Diante do exposto, torna-se relevante o estudo cauteloso dos elementos resultantes dessa crise e quais os efeitos colaterais causados.

2.3 CRISE DO MODELO TRADICIONAL DE

DESENVOLVIMENTO

A crise do modelo tradicional de desenvolvimento não resulta de uma resposta única e simples, pelo contrário, em virtude de uma complexa relação de fatores e ações do mercado, do Estado e principalmente da sociedade. Entre estes pontos, encontra-se a transformação do mundo do trabalho e do perfil do trabalhador moderno, pois, em uma sociedade do conhecimento, o taylorismo tradicional teve que se adaptar e se modificar. Outro ponto reside na emergência da questão ambiental, negligenciada no modelo tradicional, neste momento histórico torna-se um elemento chave para a continuidade da espécie humana. Contudo, o próprio conceito do desenvolvimento tradicional não se evidencia perene em longo prazo por falta da sustentabilidade

social e ambiental, além da insuficiência de recursos ambientais para difundir a sociedade de consumo em massa para todos.

Diversos governantes utilizam a expressão desenvolvimento há mais de meio quarto de século, defendendo que todos têm direito a se desenvolver, muitos teóricos e práticos chegaram a fazer do desenvolvimento seu meio de vida. Do debate muitas questões e concepções podem-se revelar e vários locais ficam para trás, como se não fossem capazes de acompanhar a marcha. Contudo, diferentes tipos de desenvolvimento são legítimos e mesmo desejáveis, não sendo interessante uma monopolização de um modelo de desenvolvimento (WOLFE, 1976).

Assim, como o desenvolvimento torna-se um vocábulo polissêmico, em cada indivíduo pode existir um modelo de desenvolvimento, muitas vezes difuso, nebuloso e confuso. Um governante desenvolvimentista comumente está associado a vultosas obras, mas como se pode imaginar um governante desenvolvimentista sustentável ainda apresenta-se como uma questão em aberto. Desta forma, a concepção tradicional de desenvolvimento entra em crise em conjunto com as suas bases, inclusive o modelo fordista de produção em massa.

Diante do exposto, a visão de mundo alicerçada pelo compromisso fordista apoia-se em um progresso técnico, tecnológico, social e do Estado com um pleno emprego e salários ascendentes. Contudo, o compromisso fordista começa a evidenciar fissuras no fim dos anos 1960 devido a uma série de fatores, incrementado consideravelmente na década de 1970. A razão mais profunda encontra-se na própria fragilidade dos princípios do modelo que resultaram em inúmeras revoltas e mesmo micro conflitos no ambiente do trabalho (LIPIETZ, 1991).

Assim sendo, com a burocratização e padronização do universo do trabalho não se conseguiu trazer a satisfação esperada ao trabalhador, como consequência derivou em frustrações e desmotivação. Adicionalmente, crises econômicas foram “terceirizadas” pelas organizações, transferindo-se o ônus para as classes trabalhadoras, subjugadas de sua relevância. Deste conjunto, ocorre um incremento das forças de esquerda dentro dos países capitalistas e dos movimentos sociais, eclodindo uma série de revoltas. Assim, inicia-se a discussão da questão ambiental em organismos internacionais, onde se

principia o relacionamento de forma mais direta do desenvolvimento com o meio ambiente.

Começa a surgir na década de 1970 uma reflexão maior sobre o processo de desenvolvimento em conjunto com a conscientização da pressão exercida pela antroposfera na ecosfera e os problemas causados por um padrão de vida incompatível com a regeneração do meio ambiente. Se por um lado, aumentou a tecnologia e a expectativa de vida dos seres humanos, em outra vertente, incrementou-se a sua capacidade de autodestruição. Entre os anos 1960 e 1980, apresenta-se uma série de desastres ecológicos que contribuíram para a conscientização sobre os problemas ambientais, porém os danos de eventos esporádicos podem ser diminutos proporcionalmente aos dados cumulativos que o homem causa ao meio ambiente (VAN BELLEN, 2002).

Entretanto, os desastres ecológicos possuem uma virtude de mobilização da sociedade e muitas vezes causam a irritação de uma localidade com determinada empresa ou grupo empresarial, ofertando um aspecto educativo à sociedade e punitivo ao responsável pelo evento. Ao invés disso, uma degradação ambiental gradativa pode destruir uma região em médio e longo prazo, mas torna-se mais aceitável pela população local como o “ônus do desenvolvimento” ou o “custo do progresso”. Neste ambiente, ao tomar-se conhecimento do impacto que a degradação ocasiona normalmente já foi afetado consideravelmente e por vezes apresenta-se irreversível a situação causada.

Adicionalmente, observa-se que, após alguns anos de sucesso e uma adoção parcial do modelo, a visão ilusória do processo de produção e consumo da industrialização de países ditos desenvolvidos para os países subdesenvolvidos torna-se uma miragem. Isso aconteceu por uma série de fatores como a não transferência de recursos tecnológicos, o pequeno mercado interno, comércio internacional restrito a recursos naturais e a ausência da questão social. Com a dependência dos países subdesenvolvidos em tecnologia e recursos financeiros dos países centrais, transformou-se o modelo de desenvolvimento em um fordismo incompleto (LIPIETZ, 1988).

Neste contexto, em uma perspectiva crítica, o prometido “milagre do desenvolvimento” mostra-se como uma falácia, não ultrapassando de uma miragem para uma série de países que

buscam internalizar o modelo de desenvolvimento dos países centrais. O compromisso fordista do consumo em massa não se objetiva aplicar em todo globo terrestre, visto a inviabilidade ambiental do projeto. Contudo, limitar a poucos privilegiados o prazer do consumo irrestrito e “ratear a conta” com todos os povos transparece falta de justiça e equidade.

Em suma, relata-se que o modelo de desenvolvimento tradicional encontra-se em crise por uma gama de fatores, desde a mudança da concepção de trabalho e gestão do conhecimento como um ativo estratégico, até a emergência da questão ambiental negligenciada no modelo tradicional. A aplicação irrestrita, sem respeito aos aspectos culturais e individuais das localidades, resultou em sérios problemas sociais e ambientais de difícil resolução.

2.4 DIMENSÃO SOCIOPOLÍTICA DO DESENVOLVIMENTO