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A julgar pelos artigos histéricos reunidos em livro pelo senhor José Ramos Tinhorão – infelizmente o único a colocar o assunto música popular brasileira em discussão – somente a preservação do analfabetismo asseguraria a possibilidade de se fazer música no Brasil. Embora assim não esteja explícito em palavras no livro, a atuação dos artistas da classe média é (se levarmos até o im esse raciocínio) apenas um acidente nefasto: não houvesse ocorrido isso e o futuro nos asseguraria pobres autênticos cantando sambas autênticos, enquanto classe-médias estudiosos, como o senhor Tinhorão, aprenderiam os nomes das notas. Restando apenas saber para que aprendê-los.1

O texto acima é a frase de abertura de um artigo de Caetano Veloso, de polêmica com o livro Música popular: um tema em debate. O autor ressalta que a polêmica com o livro de Tinhorão estava motivada não apenas por ser ele o único livro, até aquele momento,

1 VELOSO, Caetano. Primeira feira de balanço. In: SALOMÃO, Waly. (Org.). Alegria, alegria. Rio de Janeiro: Pedra e Ronca, 1977. Texto publicado originalmente na revista Ângulos, da Faculdade de Direito da UFBA, 1966, p.1.

a colocar o tema em debate; partia também da certeza de que ele representava a sistematização de uma tendência equivocada da inteligência brasileira em relação à música popular. Caetano critica, ao longo do texto, o que considerava um discurso antimoderno em defesa da autenticidade. Argumenta que, se acompanharmos a evolução do samba até onde nos agrada ou interessa e o cristalizarmos num momento que nos pareça de initivo, podemos, por exemplo, nos ater ao samba de roda da Bahia e renegar até o mais primitivo partido-alto carioca.2 Nas discussões que se

desenvolveram nas décadas seguintes, e que ainda reverberam, essa seria uma linha de argumentação fundamental contra os discursos em defesa das ideias de “autenticidade” e de “raiz” cristalizadas no samba carioca da década de 1930.

Se esse artigo apareceu num veículo de circulação restrita, teve maior repercussão a participação de Caetano no debate promovido e publicado pela Revista de Civilização Brasileira em 1966, intitulado Que caminhos seguir na música popular brasileira?3

Na sua intervenção, Caetano Veloso apresenta a ideia da linha

evolutiva, que já estava esboçada em Primeira feira de balanço, como uma alternativa para se resistir ao tradicionalismo no estilo de Tinhorão sem cair em “uma modernidade de ideia ou de forma

2 VELOSO, 1977. Em entrevista a Luis Antônio Giron na revista Época, Caetano comenta a respeito desse texto: “Eu já tinha um lance pop tropicalista no próprio título, inspirado no anúncio de uma grande loja de departamentos em Salvador que liquidava para balanço. Foi uma utilização

ready-made. Eu estudava na Faculdade de Filoso ia quando alguém me pediu um artigo para a revista Ângulos, da Faculdade de Direito. A esquerda estava entusiasmada com o Tinhorão, que apoiava a xenofobia. Embora eu falasse naquele tempo mal do rock e da Jovem Guarda, o gérmen tropicalista estava ali”. GIRON, 2005.

3 Revista de Civilização Brasileira. Que caminho seguir na música popular brasileira? Ano I, nº 7, maio de 1966. Curiosamente, o debate é anunciado da seguinte maneira: “Em virtude da crise atual da música popular brasileira, a Revista de Civilização Brasileira reuniu músicos, compositores, intelectuais e estudiosos da música popular para um debate sobre os caminhos da música popular brasileira [...]”.

imposta como melhoramento qualitativo”.4 A proposta da “retomada

da linha evolutiva” era a de, partindo da compreensão do que foi a música popular brasileira até aquele momento, estabelecer “uma possibilidade seletiva como base de criação”.5 Nesse entendimento,

para se fazer algo novo dentro da tradição, dar um passo à frente, era necessário conhecê-la e senti-la. Assim, a proposta não era de ruptura com a tradição, mas de continuidade evolutiva: como João Gilberto era, nesse entendimento, quem melhor tinha utilizado a informação da modernidade na recriação e na renovação musical, a retomada da linha evolutiva deveria se dar a partir de sua obra. Esta ideia de linha evolutiva da música popular brasileira tornou- se tanto uma proposta de atuação artística, com desdobramentos práticos imediatos na tropicália, como uma leitura do que tinha sido até então a corrente principal da música popular urbana no Brasil. Essa proposição tem de ser entendida no contexto das discussões estéticas em curso e, como tal, um argumento a favor da modernização e incorporação de novas informações na música brasileira popular como uma continuidade da tradição. Naturalmente implica numa visão evolutiva e em certa seleção do repertório numa linhagem da tradição, que deve ser submetida à crítica, especialmente se essa proposição for tomada como referência para se pensar a história da música popular. Ou seja, ainda que tenha servido de argumentação para se contrapor às correntes mais conservadoras que refutavam qualquer alteração na linguagem, a proposição da linha evolutiva caminha no sentido da construção de uma linhagem oriunda do samba como sendo a

música popular brasileira, questão que estará em foco em diversos momentos deste trabalho.6

4 Revista de Civilização Brasileira. 1966, p.378. 5 Revista de Civilização Brasileira. 1966, p.378.

6 A proposição da linha evolutiva motivou debates no plano das ideias, com manifestações no próprio campo de produção. Em As Aventuras de

Raul Seixas na cidade de Thor, do LP Gita, 1974, Raul Seixas coloca-se, de maneira bem humorada, fora da linha evolutiva: “Acredite que eu não tenho

O mais in luente dos textos em defesa da incorporação de novas informações em nossa música popular e contra as ideias nacionalistas de autenticidade foi o livro O Balanço da Bossa, organizado por Augusto de Campos. Lançado em 1968, o volume reunia artigos do musicólogo Brasil Rocha Brito (o mais antigo, publicado em 1960 no jornal Correio Paulistano), do maestro Júlio Medaglia e do compositor Gilberto Mendes além dos textos do próprio Augusto de Campos. Todos esses autores pertencentes ao campo de produção erudito, mas entusiastas da música popular, “interessados numa visão evolutiva da música popular, especialmente voltados para os caminhos imprevisíveis da invenção”,7 como podemos ler na introdução. Augusto de Campos,

seu irmão Haroldo de Campos e Décio Pignatari formavam o grupo de poetas concretistas, que, com intelectuais de outras áreas, especialmente músicos como Rogério Duprat, Júlio Medaglia e Gilberto Mendes, tinham a perspectiva de uma produção artística de vanguarda cujo alcance rompesse o círculo restrito da arte no Brasil. Estavam sintonizados com a produção da vanguarda internacional na música e na literatura, bem como pensavam as novas questões colocadas pelo desenvolvimento da comunicação massiva. A interação de jovens músicos paulistas interessados nas linguagens da vanguarda musical – que conheceram diretamente nos festivais de Darmstadt – com as proposições dos poetas concretistas esteve nas origens das concepções estéticas e da poética musical do grupo Música Nova, um dos marcos da renovação da linguagem musical no Brasil.8

nada a ver com a linha evolutiva da música popular brasileira / A única linha que eu conheço é a linha de empinar uma bandeira”.

7 CAMPOS, Augusto de. Balanço da bossa. 5.ed. 1ª reimpressão. São Paulo: Perspectiva, 2003, p.14.

8 O grupo Música Nova constituiu-se em 1961 após a VI Bienal de Arte de São Paulo, quando os compositores Gilberto Mendes, Willy Corrêa de Oliveira, Rogério Duprat e Damiano Cozzela tiveram suas obras executadas no mesmo concerto. O grupo formaliza sua existência com um manifesto

Por volta de 1968, quando o Balanço da Bossa foi publicado, os irmãos Campos já tinham reconhecimento internacional, haviam publicado poemas, escritos teóricos e traduções de Ezra Pound e Vladimir Maiakovski, além do Panorama do Finnegans Wake,9

tradução de 16 fragmentos do livro de James Joyce e estudos sobre a obra considerada um marco da literatura moderna, um trabalho muito útil para uma primeira abordagem de um livro extremamente di ícil de ser lido e compreendido. Um exemplo dessa sintonia com as questões teóricas colocadas pela arte de vanguarda é o fato de Haroldo de Campos ter antecipado, num artigo de 1958, questões que seriam estudadas por Umberto Eco em seu aclamado livro Obra

Aberta. Escreveu Eco na introdução à edição brasileira:

É mesmo curioso que, alguns anos antes de eu escrever Obra Aberta, Haroldo de Campos, num pequeno artigo, lhe antecipasse os temas de modo assombroso, como se ele tivesse resenhado o livro que eu ainda não tinha escrito, e que iria escrever sem ter lido seu artigo. Mas isso signi ica que certos problemas se manifestam de maneira imperiosa num dado momento histórico, deduzem-se quase que automaticamente do estado das pesquisas em curso.10

publicado em 1963, assinado pelos quatro compositores citados mais Régis Duprat, Júlio Medaglia, Sandino Hohagen e Alexandre Pascoal. O Música Nova foi um importante marco na renovação da linguagem musical no Brasil, até então hegemonizada pela estética do nacionalismo. As proposições dos poetas concretistas in luenciaram diretamente a formação do tropicalismo, no qual Rogério Duprat e Júlio Medaglia tiveram importante participação como arranjadores. Sobre o grupo Música Nova. Cf. NEVES, José Maria. Música contemporânea brasileira. São Paulo: Ricordi Brasiliera, 1981; ZERON, Carlos Alberto de Moura Ribeiro. Fundamentos

histórico-políticos da música nova e da música engajada no Brasil a partir de 1962: o salto do tigre de papel. Tese (Doutorado em História) – Faculdade de Filoso ia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1991.

9 CAMPOS, Augusto de; CAMPOS, Haroldo de. Panorama do Finnegans Wake. 4.ed. São Paulo: Perspectiva, 2001.

Também as questões da relação com o mercado eram enfrentadas pelos poetas concretistas. Décio Pignatari cunhou a expressão produssumo para designar uma arte ao mesmo tempo de produção e de consumo. Os concretistas procuraram in iltrar sua produção no mundo da comunicação de massa por meio de processos visuais, ligados às técnicas contemporâneas de publicidade, das manchetes de jornal às histórias em quadrinhos. A incursão desses autores no universo da moderna música urbana não apenas emprestava legitimidade ao objeto, ao inserir no debate um grupo de artistas eruditos, mas também colocava a discussão sobre a música popular num patamar mais elevado do que aquele por ela até então ocupado. Entretanto, assim como os livros de Tinhorão, o

Balanço da Bossa era assumidamente uma peça de intervenção.

Estou consciente de que o resultado é um livro parcial, de partido, polêmico. Contra. De initivamente contra a Tradicional Família Musical. Contra o nacionalismo-nacionalóide em música. O nacionalismo em escala regional ou hemisférica, sempre alienante. Por uma música nacional universal. Não contra a Velha Guarda. Noel Rosa e Mário Reis estão mais próximos de João Gilberto do que supõe a TFM. Contra os velhaguardiões de túmulos e tabus, idólatras dos tempos idos.11

O artigo de Brasil Rocha Brito, o primeiro dos “balanços da bossa nova”, escrito em 1960, em pleno curso dos acontecimentos,

11 CAMPOS, 2003, p.14-15. Aqui há um jogo de palavras com a sigla TFP, da Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade. Essa instituição representava um setor conservador e de direita da ortodoxia católica, tinha sido atuante em campanhas contra as reformas de base do governo João Goulart e se incluía entre os apoiadores do golpe militar de 1964. Correntes derivadas da TFP existem até hoje, mas perderam a visibilidade social conquistada nos anos 1960 pelo seu radicalismo após divisões motivadas por diferenças acerca de como se reposicionar perante as mudanças de orientação da Igreja Católica a partir do ponti icado de João Paulo II.

apresenta, num pequeno ensaio, muitas pistas para uma abordagem musicológica da música popular. Após breve menção às in luências e aos precursores, o autor faz uma análise da concepção musical da bossa nova na qual aborda a posição estética e as características gerais da estruturação do material musical e da interpretação. O autor ainda se ocupa das inovações no texto literário. O resultado é um trabalho de análise muito clarividente para um fenômeno ainda em curso, mais equilibrado do que análises impressionistas posteriores que enfatizam a “complexidade harmônica”. Também os artigos de Júlio Medaglia e de Gilberto Mendes oferecem contribuições à análise musicológica, como as transcrições das inovações rítmicas. Mendes transcreve para a notação musical a “batida” de violão de João Gilberto e apresenta variações correntes, ressaltando a preponderância de dimensões ternárias contra a divisão binária em frases de dois compassos com dezesseis pulsos ou de um compasso com oito pulsos. Interessante a observação de que muitos confundiam esse tratamento rítmico com rumba, que caminha na direção da existência de uma matriz comum para a música popular surgida nas Américas. É possível fazer um paralelo entre essas transcrições e os time-lines da música africana que seriam utilizados para se pensar a rítmica na música brasileira nas pesquisas de Kazadi Wa Mukuna12 e Carlos Sandroni,13 dentre

outros. As pistas para estudos musicológicos da música popular, oferecidas nesses textos, não tiveram continuidade, e a área de Música só iria abraçar o objeto a partir dos anos 1990.

Os textos de Augusto de Campos assumem a defesa da produção tropicalista e a ideia da retomada da linha evolutiva proposta por Caetano Veloso. No artigo mais teórico e analítico

12 MUKUNA, Kazadi Wa. O contato musical transatlântico: contribuição Bantu na música popular brasileira. Tese (Doutorado em Sociologia) – Faculdade de Filoso ia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1977.

13 SANDRONI, Carlos. Feitiço decente: transformações no samba no Rio de Janeiro (1917-1933). Rio de Janeiro: Zahar, 2001.

da obra, Informação e redundância na música popular, o autor traça um panorama das inovações musicais desde a bossa nova até o momento da redação. Segundo Campos, o be-bop e a bossa nova foram revoluções musicais que, pela própria natureza de suas inovações, só sensibilizaram um auditório restrito: foram os Beatles que conseguiram um salto qualitativo na questão da informação nova em música popular em estreita relação com o consumo. No Brasil, na visão de Campos, teria havido um momento de desorientação após o sucesso da bossa nova, agravado pela situação política pós-1964, com uma onda de protesto e de Nordeste nas canções. Esse teria sido um período de estagnação do ponto de vista da sintaxe musical, mas de enriquecimento semântico, na medida em que a temática amor-dor- lor do primeiro momento bossa-novista estava esgotada. O advento da jovem guarda desloca temporariamente o debate entre velha guarda e bossa nova para outro debate, entre jovem guarda e música popular brasileira. Os

nacionalóides, no dizer de Campos, perdida a primeira batalha, encontraram nos adeptos do então chamado iê-iê-iê “um prato mais suculento”, pois se tratava de adversário desvinculado da tradição da música brasileira. E Chico Buarque, “na sua indecisão entre Noel e João Gilberto”, pagou o seu “tributo à redundância”, comemorado precipitadamente pelo que ele chamava ironicamente de TFM. Esse seria, no olhar de Augusto de Campos, o cenário do momento em que se daria “a retomada da linha evolutiva” da música popular brasileira a partir de João Gilberto. Caetano Veloso, Gilberto Gil e o grupo baiano estariam travando uma batalha por “uma ‘abertura’ na música popular brasileira”, pondo “em xeque e em confronto, criticamente, o legado da bossa nova” e a “contribuição renovadora dos Beatles”, operando “uma revolução nas leis da redundância” vigentes na música popular.14

Os autores dos artigos presentes no Balanço da Bossa apresentam nuanças na interpretação dos eventos em curso,

por exemplo, em relação ao papel da jovem guarda. Os textos de Augusto de Campos têm uma visão mais positiva do iê-iê-iê à brasileira do que os de Gilberto Mendes e Júlio Medaglia, talvez ainda in luenciados pelos parâmetros de sua formação musical erudita. Medaglia chega a a irmar que a sensibilidade popular europeia é pesada e que “lá só triunfam as manifestações musicais que se baseiam no estardalhaço, no grito, nas letras, nas melodias, nas harmonias, nos ritmos mais primitivos”, bem como “os ídolos da juventude, que têm nos Beatles sua expressão máxima, atiram- se no chão com guitarras e microfones, emitem os mais incríveis ruídos, deixam crescer os cabelos e promovem outros e semelhantes escândalos para se fazerem perceber pela massa”.15

Mas Medaglia foi mais condescendente com a versão brasileira mais bem comportada do iê-iê-iê e, assim como Augusto de Campos no ensaio Da Jovem Guarda a João Gilberto, afirma que as interpretações de Roberto Carlos aproximavam-se mais de João Gilberto “do que os gorjeios dos que se pretendem sucessores do ‘bossanovismo’”.16

O artigo de Medaglia intitulado Balanço da Bossa Nova é o mais abrangente e eclético de todos como a irma Campos na Introdução. O autor principia com uma tipologia da música popular que, em linhas gerais, poderia ser dividida em três tipos preponderantes: a folclórica e a urbana subdividida em dois tipos: aquela que tem raízes na imaginação popular e é aproveitada e divulgada pelos meios de comunicação e aquela que já surge na indústria. O autor trabalhava com uma concepção de música popular como manifestação musical não erudita, daí a inclusão da música folclórica em sua tipologia, de inindo-a da seguinte maneira: “liga-se mais diretamente a determinadas situações sociológicas, históricas e geográ icas, congregando em sua estrutura uma série de elementos básicos que a tornam característica de uma época,

15 CAMPOS, 2003, p.105. 16 CAMPOS, 2003, p.120.

uma região e até mesmo de uma maneira de viver”.17 Está claro

o que o autor quis dizer, mas, curiosamente, depois de anos de pesquisas nos quais muitos eventos musicais e socioculturais se sucederam, os pesquisadores da música popular urbana estão chegando a um entendimento acerca das características de seu objeto no qual se poderia tranquilamente incluir esses elementos utilizados por Medaglia para a de inição de música folclórica. Por outro lado, sabemos também ser problemática essa divisão feita entre as músicas urbanas que nascem de raízes populares e as que nascem na indústria, embora certamente essa tese tenha ainda muitos apoiadores. De toda forma, essa tipologia é ilustrativa de um momento de formatação de um objeto de estudo.

Apesar dessas nuanças, estes textos, além de estarem a inados por uma perspectiva “evolutiva e de invenção” na música popular, têm, em geral, as mesmas referências teóricas. De uma maneira geral, todos trabalham com as elaborações da Teoria da Informação, então em voga. Campos cita, como referência, uma análise de Abraham Moles acerca da contribuição das máquinas eletrônicas e eletroacústicas à sensibilidade musical, estudo da relação entre informação e redundância na mensagem artística. Outra referência importante são os trabalhos de Umberto Eco, especialmente o livro Obra Aberta, já mencionado. Também são citados Marshall McLuhan e Ezra Pound. Desse último, tem destaque a famosa classi icação dos poetas e escritores em seis categorias, muitas vezes, utilizada para a classi icação dos artistas em geral: inventores, mestres, diluidores, bons escritores sem maiores qualidades, beletristas e lançadores de moda.18 Para a 17 CAMPOS, 2003, p.67.

18 Em ABC da Literatura, Ezra Pound classi icou os escritores em seis categorias assim sumariadas por Augusto de Campos: “1. Inventores. Homens que descobriram um novo processo ou cuja obra nos dá o primeiro exemplo conhecido de um processo; 2. Mestres. Homens que combinaram um certo número de tais processos e que os usaram tão bem ou melhor que os inventores; 3. Diluidores. Homens que vieram depois das duas

discussão em questão, são utilizadas apenas as categorias de inventores e mestres. Observe-se que esses autores estão entre os principais referenciais das primeiras pesquisas acadêmicas, especialmente aquelas que buscavam alternativas a Adorno, que sequer é mencionado no Balanço. Podemos especular que alguns desses primeiros pesquisadores teriam sido remetidos para esses referenciais pela leitura do Balanço da Bossa.

Os primeiros livros de Tinhorão e o Balanço da Bossa, textos de polêmica e de intervenção escritos no curso dos acontecimentos, já apresentavam em linhas gerais as duas principais vertentes de pensamento que se desenvolveriam nas primeiras pesquisas