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O ESPAÇO PÚBLICO E A CAMINHABILIDADE

No documento Desfazendo barreiras (páginas 55-59)

CAPÍTULO II. ESTADO DO CONHECIMENTO

2.4 O ESPAÇO PÚBLICO E A CAMINHABILIDADE

É um dos desafios de governabilidade local encontrar bons compromissos entre as diversas funções das ruas, residenciais, de trânsito e de acolhimento de actividades. A rua é igualmente o espaço público principal da cidade. Cristaliza, portanto, desafios múltiplos. E merece uma atenção e deferências especiais pela parte dos urbanistas.

(François Ascher, 2012, pp.161) O espaço público assegura o bom funcionamento de uma cidade e tende a servi-la, com actividades diversas, desde o comércio, os serviços, os espaços de lazer. No entanto, o factor de tráfego automóvel tornou-se dominante. Com o crescimento das cidades e da sua população, o espaço público e a sua concepção constituem uma lógica de organização muito marcada, no entanto, podem não ser suficientes e acessíveis a toda a população.

A estrutura rodoviária e a massificação do tráfego geram grandes problemas urbanos e sociais que podem ser resolvidos parcialmente com ruas pedonais. Porquê? A falta de diversidade de usos e de espaços de fruição pública acabaram por afastar a população, ou seja, existem barreiras nos equipamentos, nas zonas comerciais, nas zonas de habitação. Sendo que, cada caso é um caso e deve-se optar por uma solução própria e adequada ao sítio, é necessário devolver ao espaço público uma panóplia de hipóteses com variedade, mistura, imprevistos, surpresas, tornando-o o espetáculo em que se torna quando é habitado.

O espaço público é um espaço social de multifuncionalidade pois é nele que nos encontramos e confrontamos com o próximo. Representa o material e imaterial da ideia de cidade e, creio mesmo, da ideia

de cidadania. (João Nunes, 2009, in Costa, 2015, pp. 105)

No nosso quotidiano, 60% das viagens são realizadas em transporte individual e apenas 16% em transporte público. São vários os factores que nos levam a utilizar o transporte individual em vez de optarmos pelo transporte público.7

Introduzir o factor de caminhabilidade nas cidades de modo a tornar a cidade, do ponto de vista da mobilidade sustentável, consolidada, é determinante para a saúde pública assim como para o seu desenvolvimento.

Alguns dos exemplos que podemos enumerar são Helsínquia, Copenhaga, Zurique, Hamburgo, Amesterdão, estas são algumas cidades que apostaram no desenvolvimento das cidades a partir do conceito de mobilidade.

A caminhabilidade depende de vários factores que estimulam, ou não, a mobilidade. Caminhar, não é apenas caminhar mas sim, deslocarmo-nos a pé na cidade apropriando-nos do espaço que nos envolve, é pertencer ao ambiente urbano.

Muitas das nossas cidades, não possuem infraestruturas que facilitem ou estimulem a acessibilidade a pé e acabam por ser determinantes nas escolhas individuais de deslocação da população.

A acessibilidade na cidade influencia directamente a predisposição que o individuo tem para caminhar. Relativamente ao urbanismo que se tem desenvolvido nos dias de hoje, há que pensar a forma de como nos deslocamos, desde as possibilidades de chegar às diversas áreas da cidade como as suas condições

24 (Tempo, facilidade, segurança, pavimentação) sendo que, a nossa predisposição para caminhar altera-se em função das condições que nos são oferecidas.

Caminhar é um conceito que se encontra a ser desenvolvido nas cidades portuguesas, e tem se tornado cada vez mais claro que tem um papel fundamental e determinante nos ambientes. Segundo, Jeff Speck, os bairros que promovem e facilitam o deslocamento a pé (para se chegar a escola, ao trabalho, as zonas comerciais) tem populações com estilos de vida mais saudáveis e são espaços de coesão social.

A necessidade de reconstruir o espaço cotidiano surge porque este modelo urbano, esta cidade a pedaços, este espaço isolado não funciona, é como una máquina quebrada. Una máquina ineficaz na qual se inverte cada vez mais tempo e energia e não resolve ou facilita as necessidades básicas de seus habitantes. Necessidades de acessibilidade, sociabilidade e, em definitivo, o que se pode considerar qualidade de vida.

(Françoise Choay in G, Roberto, pp. 4, 2010) O objectivo da caminhabilidade como meio de deslocação sustentável procura melhorar a qualidade de vida das pessoas nas cidades associando-se directamente com questões de habitabilidade, equidade e meio ambiente, na sua complexidade há as necessidades intrínsecas à população e aos limites dos recursos para a criação de espaços.

Do ponto de vista conceitual, a caminhabilidade é uma qualidade do lugar. O caminho que permite ao pedestre uma boa acessibilidade às diferentes partes da cidade, garantindo às crianças, aos idosos, às pessoas com dificuldade de locomoção e a todos.

(G, Roberto, pp.2-3, 2010) Portanto, assume-se que os espaços públicos devem proporcionar a motivação e a indução das pessoas adoptarem o caminho como meio de deslocamento diário, criando relações interdependentes com as ruas e os bairros. Compromete recursos e visa a reestruturação das infraestruturas físicas e sociais necessárias à vida humana e ecológica das comunidades.

O objectivo de caminhabilidade pode ser diverso, mas resume-se a uma tentativa de transformar as cidades em lugares mais agradáveis de se viver, tendo como objectivo a coesão e convivência social assim como a partilha quotidiana de todos os indivíduos.

Para além do objectivo acima referido, visa baixar o consumo de carbono e o consumo energético, para tal é necessário que os sistemas de transporte público respondam às necessidades económicas da sociedade. Para discutir o acto de caminhar é necessário explorar o ponto fulcral da mobilidade urbana: O crescimento das cidades e as suas problemáticas resultantes da escala dos assentamentos humanos.

Segundo, Jan Gehl, há que criar cidades para pessoas, e o lugar ideal para o individuo viver,

Certamente não é uma cidade em que se precise passar três horas por dia dentro de um carro preso no congestionamento. Em meu livro Cities for People (“Cidades para pessoas”) eu falo, por exemplo, sobre a síndrome de Brasília, uma prática repetida em várias cidades do mundo. É tudo grande demais, as distâncias são impossíveis de serem percorridas pelo corpo humano e os monumentos são grandes demais para apreciarmos a partir de nossa altura. Isso sem contar a falta de calçadas e ciclovias. Se você não tem um carro em Brasília, fica impossível se locomover.

(Jan Gehl, entrevista The City Fix Brasil) Portanto a capacidade da população se deslocar a pé é determinante para a cidade, pois caso contrário estaremos perto de Brasília (Gehl,2013), onde é impossível chegar-se a algum lado apenas a pé, pela

25 A caminhabilidade é uma atitude que pode recuperar as cidades, promovendo a equidade e restabelecendo o ser humano, deste modo é um elemento fundamental à ecológica urbana.

Assume-se, que a saúde e a caminhada têm uma relação intrínseca, e que caminhar só apresenta benefícios tanto para a cidade como para os seus habitantes.

(…)que ligam o peso à inatividade, mas ainda mais, agora temos estudos que ligam o peso ao lugar onde moram. Vivem numa cidade mais caminhável? Numa cidade menos caminhável? Onde é que vivem na vossa cidade? Em San Diego, usaram o Walk Score. O Walk Score avalia cada morada na América e, em breve, em todo o mundo em termos de quão caminhável é. Usaram o Walk Score para classificar bairros mais caminháveis e bairros menos caminháveis. Sabem que mais? Se viviam num bairro mais caminhável,tinham 35% de probabilidades de serem obesos. Se viviam num bairro menos caminhável, tinham 60% de probabilidades de serem obesos. Portanto agora temos estudos e mais estudos que ligam o sítio onde moramos à saúde, particularmente na América. A maior crise de saúde que temos é esta que tem origem numa inatividade induzida pelo ambiente. Aprendi uma palavra nova na semana passada. Chamam a esses bairros "obesogenéricos". Posso ter percebido mal, mas vocês percebem a ideia.

(Jeff Speck at TEDCity)

Gehl (2010) acredita que para estimular a utilização dos espaços públicos urbanos pelas pessoas, deve haver

um planeamento com base em premissas que tenha como foco principal o nível do olho, ou seja, o desenho dos espaços, é um aspecto fundamental para o estímulo da vida urbana, portanto, da caminhabilidade. Segundo, e de acordo com os resultados de Gehl (2010) as pessoas preferem caminhar em zonais confortáveis

e seguras (portando as medidas necessárias serão a largura da rua, largura da calçada, faixa adequada para peões, distância entre faixas, qualidade do pavimento).

Segundo o relatório da conferência Pluris2014, em Portugal, a população queixa-se da ausência de iluminação, de largura insuficiente de calçadas, de calçadas com muitos buracos, de carros estacionados no passeio, e na ausência de faixas adequadas para pedestres e de faixas estreitas.

As acções necessárias de modo a proporcionar variáveis positivas no acto de caminhar e de acordo com Pluris2014, salientam-se as seguintes medidas:

1. Aumento do passeio; 2. Pavimentos adequados; 3. Arborização em abundância;

4. Inexistência de Barreiras físicas, portanto escadas e rampas; 5. Separação de fluxos, vias exclusivas para pedestres;

6. Boa Iluminação;

7. Circulação em jardins e largos entre os edifícios; 8. Passeio largo – acima de 2 metros;

Para implementar o acto de caminhar é necessário ter em conta factores como a forma urbana. Segundo Medeiros (2013) o padrão da malha viária apresenta uma vasta gama de possibilidade, entre extremos de

regularidade ou irregularidade.

A composição da malha viária é definidora das concentrações e dispersões de usos e de actividades no espaço.

26 O aspecto socioeconómico é um forte elemento que determina a estruturação da cidade, mas há outros elementos que influenciam o processo de circulação urbana.8Por exemplo, onde há mais vias é comum encontrar grandes centros activos urbanos devido à promoção de possibilidades de acessos e percursos, ou seja, espaços mais acessíveis. Deste modo, a forma urbana influência o modo de ir e de vir das pessoas, das suas escolhas de percursos, influenciando intrinsecamente o deslocamento nas cidades e afectando a mobilidade num todo.9

A mobilidade urbana é outro tema que permite a facilidade de deslocamentos das pessoas na estrutura urbana. Segundo, a Associação Nacional Transportadoras Portuguesas (2002), a mobilidade é um atributo das

pessoas e dos agentes econômicos no momento em que buscam assegurar os deslocamentos de que necessitam, levando em conta as dimensões do espaço urbano e a complexidade das atividades nele desenvolvida.

Deste modo, inclui os diversos indivíduos e os seus percursos (pedestres, ciclistas, motoristas, usuários de transportes colectivos) acrescentando o factor da disponibilidade automóvel no local residencial que pode ser determinante para o usos de transportes públicos e de andar a pé.

O espaço determina a integração dos espaços acessíveis e permeáveis, ou seja, a partir do eixo integrado, que tende a ser o distribuidor, conecta-se a um maior número de eixos que hierarquicamente apresentam um potencial de integração superior, permitindo assim melhorias na cidade.

8[Fonte: Ojima,2006 in Barros,A.,Martínez,L.,Viegas,J.,2015] 9[Fonte: Nigriello, 2006 in Barros,A.,Martínez,L.,Viegas,J.,2015]

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No documento Desfazendo barreiras (páginas 55-59)

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