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O espaço-tempo de Einstein: a relatividade da observação

2 VISADA TEÓRICA ATRAVÉS DE CINCO MARCOS

2.4 O espaço-tempo de Einstein: a relatividade da observação

A produção teórica do físico alemão Albert Einstein (1879-1955) extrapola questões científicas da física, apresentando outras vertentes de âmbito filosófico, tanto de cunho

metafísico como epistemológico. Entretanto, sua notoriedade foi estabelecida com a publicação dos célebres artigos de 1905 e 1916, responsáveis pela criação da Teoria da Relatividade Especial ou Restrita (TRE) e da Teoria da Relatividade Geral (TRG), as quais configuram o destaque que esta investigação determina, ao considerar Einstein o marco de número quatro, pela quebra de paradigmas na história da ciência e da filosofia sobre o tempo.

A base axiomática da TRE partiu da designação de dois postulados. O primeiro afirma que as leis da natureza são as mesmas para todos os observadores, contanto que estejam em movimento uniforme, uns em relação aos outros. O segundo determina que a velocidade da luz no vácuo não depende do movimento da fonte e apresenta a mesma medida para todos os observadores citados no postulado anterior.

Esses axiomas levaram Einstein a desenvolver deduções que estabeleceram consequências impactantes para o meio científico, culminando por abalar a noção do éter luminífero, além de desqualificar o espaço e o tempo absolutos newtonianos e comprovar a invariância de leis fundamentais da física natural. Ademais, a partir dos postulados da TRE, as operações matemáticas desenvolvidas por Einstein derivaram por desestabilizar o senso comum de vivências sensoriais cotidianas.

Ao desenvolver a TRE, Einstein atribui um continuum quadridimensional, por não considerar as coordenadas de um corpo no espaço dissociadas das desse mesmo corpo no tempo. Conforme veio a demonstrar, dois eventos simultâneos para um observador não o serão necessariamente para outro observador, que, por estar em um distinto movimento uniforme, tem outra configuração por coordenadas. Por meio da TRE, o espaço e o tempo passam a ser marcos que permitem medir coordenadas de posição e velocidade de corpos relativas a diversos observadores, cada um destes em seu particular estado de movimento uniforme. Por meio dessas deduções, Einstein nega a noção de simultaneidade absoluta.

Apesar dos méritos da TRE, Einstein mostrou-se insatisfeito com ela pelos restritos referenciais, limitados a movimentos retilíneos uniforme, e pela não aplicabilidade a determinadas situações, como a do campo gravitacional etc. A partir desse sentimento, Einstein valeu-se de lampejos imaginativos e muito trabalho para apresentar a primeira versão de sua TRG, em 1911, finalizada em 1915. Nessa trajetória, passou a conferir um valor de realidade para o espaço-tempo quadridimensional. Essa noção abriu um amplo leque de discussões de cunho filosófico acerca de sua realidade, ou seja, sua materialidade. Porém, muito além disso, passou a constituir o lastro que deu compreensão ao comportamento dos corpos em geral, com movimentos acelerados ou não, atribuindo realidade à quarta dimensão – o tempo.

Por meio da TRG, Einstein apresentou a compreensão de que a distribuição de matéria determina a curvatura do espaço-tempo, levando a considerar uma interdependência entre os dois e o campo gravitacional produzido. A ação gravitacional afeta a realidade e a materialidade do espaço-tempo, determinando o comportamento dos corpos. Por conseguinte, a geometria euclidiana deixou de ser a única maneira de representação possível para o espaço.

De acordo com o já visto neste capítulo, para Newton, espaço e tempo são exteriores aos corpos e atuam como meios em que os fenômenos ganham ocorrência, ou seja, um ambiente vazio, indiferente ao comportamento dos corpos que interagem nele. Da forma como Einstein passa a pensar o espaço-tempo, este não pode mais ser considerado independentemente dos objetos.

Em suma, no caso da física newtoniana, o espaço foi considerado como realidade imaterial e infinita, uma condição metafísica, uma manifestação do poder divino. Já para Kant (2005), o espaço é um modo subjetivo necessário de representação de fenômenos e apreensão dos objetos. Ele estrutura a experiência e não é um conteúdo material da experiência; é, portanto, um espaço euclidiano tridimensional. Em contrapartida, Einstein quebra dois paradigmas ao negar o tempo absoluto e o tempo apriorístico. Assim, para Einstein, o espaço- tempo, espaço-curva riemaniano quadridimensional, seria um produto do entendimento, em uma compreensão bem distinta da definida por Kant (2005).

Outro aspecto que merece relevância na relatividade einsteiniana diz respeito à irreversibilidade do tempo. Assegurar esse caráter irreversível estaria de acordo com a percepção do passado, do presente e do futuro pela consciência de qualquer ser humano, cujo destino provável é o caminho de crescer e envelhecer até a morte. Desse ponto, fica mais lógico pensar o tempo aliado à consciência humana, ou seja, à vida. De fato, em alguns campos da ciência moderna, a exemplo da biologia, a irreversibilidade do tempo passou a ser acatada.

Em sua essência, as propostas da relatividade, desenvolvida por Einstein, pontuaram ferrenha oposição ao caráter absoluto da realidade do tempo, defendido por Newton. Inicialmente, as demonstrações matemáticas de Einstein conservaram o ponto de vista clássico da reversibilidade do tempo. Tanto as equações desenvolvidas pela dinâmica newtoniana como as da relatividade mantiveram o tempo como uma grandeza reversível, sem alguma direção privilegiada. Sob a ótica da matemática, naquelas equações, a inversão do sentido não alteraria a capacidade de representar o movimento, muito embora fosse percebido que, no caso da inversão do tempo, a cena da vida se daria ao contrário.

Todavia, no século XIX, os desdobramentos da termodinâmica estavam contribuindo para que fosse repensada a reversibilidade do tempo. Nessa nova perspectiva, uma espécie de perda de energia, como a difusão de calor em um sistema, mostrou-se mensurável. De início, o primeiro princípio da termodinâmica veio a defender que a energia não se perde, nem se cria, mas se conserva, podendo ter alteradas as suas formas qualitativas, a saber: luminosa, cinética, térmica etc. Até então, manteve-se conservada a ideia de reversibilidade da ordem do universo.

Em seguida, o segundo princípio estabeleceu que a transformação de uma energia em outra ocorre de maneira irreversível. Um exemplo desse princípio pode ser encontrado quando a mudança vem a atingir uma conversão em energia térmica, ocorrendo a dissipação de maneira inevitável, pelo resfriamento espontâneo. Outra prova se alcança, levando em consideração a entropia que se tem, quando dois corpos de temperaturas diferentes, ao serem aliados, passam a ter igualadas as suas temperaturas. Na medida que essa questão seja aplicada para a natureza, o segundo princípio da termodinâmica conduz a se pensar que sua ordem segue a tendência para a uniformidade e o equilíbrio entre os corpos.

Quanto ao deslocamento da luz, sabe-se que ele tem um sentido objetivo do passado para o futuro, validando objetivamente uma relação de causalidade entre dois eventos separados no espaço-tempo. De posse desses conhecimentos, com os princípios da TRE, Einstein definiu o abandono da ideia newtoniana de um tempo reversível, indiferenciado e simétrico.

Conforme visto, pela TRE, cada observador representa um estado de movimento. Nessas condições, o que for passado para um será futuro para o outro. De acordo com essas aparências, poderia se constatar que a distinção entre presente, passado e futuro não tem validade objetiva, sendo relativa e sob nenhuma hipótese absoluta. Porém, o que fica verdadeiramente constatado é que, na dependência do sistema de coordenadas, cada observador apreende um mesmo acontecimento em momentos diferentes.