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CAPÍTULO II – O terrorismo e o contraterrorismo

II. 2. O Contraterrorismo

3.3 O extremismo violento: um veículo para a radicalização e o terrorismo

Como referimos, a adesão ao extremismo violento está na base da radicalização potencialmente conducente ao terrorismo. O extremismo violento representa uma das principais ameaças à paz e segurança internacionais, tendo sido reconhecido como tal desde o 11/9. Porém, a ameaça tem evoluído desde 2001 requerendo atualmente urgência para a sua prevenção e combate.

Nas palavras de António Guterres, o recém-empossado SG da ONU, “os crimes de natureza anti-islâmica e outras formas de intolerância [como] a xenofobia, o racismo e o antissemitismo estão a aumentar. Em tempos de insegurança, as comunidades que são diferentes tornam-se convenientes bodes expiatórios. Precisamos de resistir a esforços que servem para dividir comunidades e retratar o próximo como «o outro».” (UNRIC, 2017). Um estudo do CSIS (Green e Proctor, 2016) relativo às perceções públicas sobre a ameaça revela que 66% encara o extremismo violento como uma “ameaça a nível global” e 58%

como uma “ameaça em crescimento significativo”.12 Vários são os registos deste

crescimento. Apesar da atenção focalizada no terrorismo jihadista, os grupos de extrema- direita na Europa têm surgido como catalisadores desse crescimento ao promover uma retórica baseada na alegada “islamização do mundo ocidental” e na exploração da crise migratória, levando “a opinião pública a adotar uma posição xenófoba e islamofóbica” (TE- SAT, 2016: 46).

Têm também surgido na arena europeia outros movimentos com uma força contrária. Impulsionados pela “geração Erasmus” (ou “the new integrationist Europhilia”) grupos como o The Pulse of Europe têm trabalhado ativamente contra as tendências nacionalistas e populistas, como demonstra a recente vitória de Emmanuel Macron nas Presidenciais francesas de 2017 (The Economist, 2017a)13. Além disso, projetos como

“Finding a place for Islam in Europe” foram lançados a fim de compreender “os fatores subjacentes à radicalização” e “avaliar a eficácia das medidas tomadas” (UE, 2016a: 4).

Contudo, os esforços não são os suficientes pois o perigo do extremismo violento reside no seu alcance a nível global. Ao ser explorado por grupos terroristas internacionais como o ISIS, a al-Qaeda ou o Boko Haram através da promoção de “mensagens de intolerância” religiosa, cultural ou social (AGNU, A/70/674, 2015) pelo uso dos meios tecnológicos e de comunicação, torna-se num fenómeno (não novo) mas “vasto e diverso” que ultrapassa quaisquer fronteiras contribuindo para a sua rápida difusão. Em resultado, amplifica-se o perigo de contágio das ideias fundamentalistas, o que dificulta não só a implementação das estratégias de contraradicalização mas também se diminui a sua potencial eficácia. Ainda assim, apesar da insegurança generalizada e dos constantes alertas, 73% dos respondentes ao estudo acreditam que a ameaça é resolúvel. A CVE constitui assim uma das prioridades centrais em matéria de contraterrorismo.

Apesar das divergências conceptuais relativamente à definição de “extremismo violento” (Striegher, 2015), a CVE refere-se a um “conjunto de instrumentos não coercivos orientados para combater as ideologias extremistas a fim de atenuar o seu potencial atrativo e “prevenir o recrutamento e a radicalização de indivíduos” que, em última instância, podem integrar organizações de cariz extremista com intenções de praticar atos terroristas (Green e Proctor, CSIS, 2016: 17).

12 O estudo envolveu 8000 participantes de 8 países – Estados Unidos, França, Reino Unido, China, Egipto, Índia, Indonésia e Turquia. Foram perguntadas 65 questões relacionadas com o extremismo violento como as motivações e fatores potenciadores, respostas à ameaça e estratégias para o seu combate 13 Um fenómeno curioso. De acordo com Campanella (2016), esta geração “is the least politically- engaged groups”. Por exemplo, em Junho, apenas 36% dos britânicos entre 18 e 24 anos participaram no referendo sobre o Brexit, contra 83% de votantes com mais de 65 anos".

O grande desafio em matéria de contraradicalização é a identificação das causas para o extremismo violento. Apesar do vínculo entre extremismo violento e terrorismo salientado pelo CSNU na RES 2178 (2014), a sua suposta conexão não é linear pois, como vimos, não estabelecem necessariamente uma correlação direta entre si (isto é, um fenómeno pode ou não levar ao despoletar do outro). Não obstante as diferentes formas de categorizar as “causas”, “fatores” ou “aceleradores”, o extremismo violento - sublinha a ONU - “não é um fenómeno em vácuo” e passada uma década e meia de investigação sobre os seus potenciais fatores (drivers), é possível identificar algumas “tendências e padrões” embora se reforce continuamente a necessidade de maior consenso entre investigadores. Distinguem-se duas categorias, “the push and the pull factors”, que relevam fatores similares aos que distinguimos para “as causas do terrorismo”.

Embora não seja exclusivo de uma determinada região ou nacionalidade, o extremismo violento desenvolve-se em contextos mais vulneráveis, isto é, em que os push fators se evidenciam de forma mais intensa. Sendo uma ameaça cada vez mais presente nas democracias contemporâneas (particularmente na forma de “extremismo religioso”, sobretudo associado ao fundamentalismo islâmico), os motivos para o desenvolvimento e atracão pelas mensagens extremistas associam-se a outros problemas de larga escala como a crise económica e financeira; a insatisfação geral das populações com a governação das elites políticas nacionais e europeias na resolução de problemas como o desemprego, a precariedade ou a corrupção; ou ainda o declínio da confiança nos partidos políticos que parecem não ser representativos das suas aspirações e anseios (Biezen e Poguntke, 2014). Todo este contexto disruptivo, quando aliado a discursos islamofóbicos e antagonistas bem como à exclusão racial e religiosa, potenciam o desenvolvimento e/ou crescimento dos pull factors.

Desse modo, fomentam-se “ressentimentos dando margem a mais recrutamento” e, consequentemente, alimenta-se a prática da violência. “É na inevitável polarização das sociedades que nasce a radicalização” (Pathé Duarte, Público, 2017) e, explica Scott Atran (The Guardian, 2015), “quanto maior for o antagonismo contra os muçulmanos na Europa e maior o envolvimento militar do Ocidente no Médio Oriente, mais satisfeitos ficarão os líderes do ISIS. [Isso] é a chave estratégica da organização: encontrar, criar e explorar o caos”. Em suma, recorrendo à teoria dos movimentos sociais, os fatores push and pull refletem potencialmente o princípio controverso da “strain theory”: “quanto mais os indivíduos se sentem frustrados e alienados, maior é a probabilidade de se juntarem a grupos que resistem às mesmas fontes da sua frustração” (ICSR, 2008: 5-6).