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2.3 A AUDIODESCRIÇÃO EM CONTEXTO

2.3.2 O filme pela audiodescrição

Bauman (2005) afirma a existência de dois tipos de comunidades: a da vida e a do destino. As comunidades da vida, para o sociólogo, dizem respeito àquelas cujos membros vivenciam uma ligação que lhes precede, uma absoluta ligação; enquanto as de destino são aquelas cujos membros se unem por meio de ideias ou de princípios. Assim também podemos pensar a questão da deficiência visual e da cegueira, fugindo do erro de acreditar que ela forma um grupo homogeneizado. Há aqueles que nasceram sem visão, que se inserem na comunidade da vida; há aqueles, por sua vez, que se inserem na comunidade de destino, pois adquiriram a cegueira com o tempo. Estes últimos apresentam memória visual, ou seja, conseguem se lembrar de cores, contrastes, imagens.

Apesar de haver essa divisão (cegueira congênita e adquirida), não podemos considerar a identidade dos sujeitos como algo dicotômico, posto que cada membro das comunidades se formará social e historicamente de maneira distinta, apresentará sua singularidade e unicidade na vida concreta. Há, de fato, uma múltipla heterogeneidade de cegueira, que se percebe, a princípio, nos grupos em que se inserem e, depois, na vivência que cada um apresenta diante de barreiras sociais que tentam impedir a autonomia. Esse fato tem provocado diversas discussões a respeito de como construir enunciados que contemplem um grupo tão diverso como é o dos que vivenciam a cegueira ou a baixa visão.

A audiodescrição é um recurso de acessibilidade que busca garantir a autonomia dos sujeitos que sofrem impedimentos visuais, que não conseguem compreender enunciados que não sejam transmitidos de maneira sonora ou tátil. Alves (2014, p. 263) posiciona-se afirmando que “a audiodescrição se configuraria em um enunciado verbal que acompanha e que comenta um enunciado audiovisual, convertendo-se em uma contraimagem12”. Dessa forma, compreende-se a

audiodescrição como geradoras de imagens mentais, as quais permitem a superação de um confinamento pelo qual as pessoas cegas vivem em muitos momentos. O autor afirma ainda que

[...] a transformação das informações imagéticas em palavras amplia as possibilidades de apropriação estética por parte das pessoas com deficiência visual, proporcionando a superação do confinamento cultural a determinadas esferas. (ALVES, 2014, p. 263)

Para Alves (2012), audiodescrever significa ressignificar o visível e o imagético, posto que a audiodescrição é um processo que vai muito além de anunciar o que se vê, buscando valorar a visão por meio das palavras. Tudo isso precisa ser feito como forma de não ser autoritário, enquadrando a compreensão da pessoa com deficiência visual naquilo que o audiodescritor compreende.

Nesse processo de tradução, são importantes as palavras de Paulo Bezerra (2015, p. 236), que advoga que “como a tradução é uma atividade de fronteiras, é o sentido que, entre outras coisas, põe em diálogo duas culturas: a do texto original e a do texto-objeto da tradução”. Isso aponta para as relações dialógicas que aproximam os enunciados. Como considera Petrilli (2014, p. 300), a tradução deve “lembrar” o original e estabelecer com ele uma relação de compreensão responsiva e dialógica de proximidade. Isso significa, sobretudo, que o texto a ser traduzido não pode ser obstaculizado pelo original, isto é, a criatividade, as intervenções e a autonomia precisam ser postas em prática e materializadas no texto.

Quando se trata de AD, essas palavras fazem mais sentido, visto que toda criação verbal fica por conta do audiodescritor. Não é possível audiodescrever sem

12 Alves (2012) compreende a audiodescrição como uma “contraimagem” (termo que parafraseia a expressão usada por Volóchinov: “contra palavra”) já que medeia a articulação da imagem visível em imagem mental por meio, especialmente, das pessoas com deficiência visual. A audiodescrição objetiva, desde sua produção, a compreensão responsivamente ativa, ou seja, desde o momento em que ela alcança o ouvinte, a pessoa não vidente, é importante que o enunciado seja compreendido e a imagem seja construída na mente. Nesse sentido, a audiodescrição não pode, de maneira alguma, ser entendida com uma reprodução perfeita da imagem real, mas como uma refração valorada axiologicamente dessa imagem, isto é, uma “contra imagem”.

haver relação dialógica entre a imagem e o audiodescritor, que precisa ter um olhar sensível para perceber cenas relevantes e, então, construir um enunciado “em outra língua e se sair brilhantemente, ao ponto de a tradução ter valor em si mesma” (PETRILLI, 2014, p. 301).

Segundo Alves e Teles (2017), a AD é considerada uma tradução intersemiótica por agir na transmutação de um signo para outro, ou seja, parte do não verbal para o verbal. Audiodescrever, como as autoras afirmam, é o processo de tornar todos os signos visuais em sonoridade, o que fará com que a pessoa com deficiência visual tenha acesso somente a sons (trilha sonora, diálogos, efeitos sonoros e locução de AD) para a construção do significado. Para elas (ALVES; TELES, 2017),

O objetivo [da AD] deve estar em apoiar o texto de partida mediante as descrições (texto de chegada) para as pessoas com deficiência visual (receptores do texto de chegada) utilizando, para isso, um tipo textual com narrativas recorrentes, uso próprio (particular) de tempos verbais e elementos de coesão do mesmo modo que um léxico específico, que se propõe a resolver as necessidades tradutórias que os novos formatos de tradução exigem. (ALVES; TELES, 2017, p. 424)

Oliveira (2013), por sua vez, vai além ao defender a audiodescrição como a mediadora, o entre lugar entre a imagem e o espectador com deficiência visual, favorecendo a compreensão ativa daquilo que está sendo enunciado visualmente. Isso significa, para a autora, que a audiodescrição é a palavra que intermedeia a imagem e a pessoa com deficiência visual, que não consegue compreender signos que são transmitidos apenas visualmente, sem o auxílio de sons.

Um dos pontos que Oliveira (2013) apresenta é que a audiodescrição não é, necessariamente, uma tradução, mas uma recriação. Para ela, todo ato de traduzir passar por um processo criativo, o que faz do audiodescritor ser também autor e poeta, assim como o fotógrafo é autor de sua foto; o pintor, de sua pintura; o diretor, de seu filme.

Segundo Alves e Teles (2017), a AD, inserida em um material audiovisual, passa a compô-lo; não é um acessório a ele, mas parte dele. Dessa forma, não se pode pensar numa AD que não dialogue com esse material, que destoe do que está sendo apresentado visualmente. Isso quer dizer que a tradução das imagens em palavras deve respeitar o gênero que a origina.

A palavra, portanto, tem duplo direcionamento: por um lado, ela está substancialmente ligada ao enunciado imagético, não podendo, de forma alguma, distanciar-se dele; por outro lado, ela é uma recriação a partir do ponto de vista do tradutor, que falará de seu lugar do mundo, com escolhas lexicais e fraseológicas que lhes são próprias. Disso depreendemos a não neutralidade no processo de construção de enunciados que descrevem imagens.

É o audiodescritor, portanto, como considera Alves e Teles (2017), o primeiro leitor do texto visual e é ele quem deve pensar nas primeiras dúvidas que podem surgir na mente do espectador com deficiência, respondendo a essas dúvidas no processo de tradução, a fim de facilitar a compreensão do possível público. Esse audiodescritor deve perceber as intenções do texto imagético, os principais signos que merecem descrição por se mostrarem mais relevantes na construção narrativa do que outras imagens.

Tal fato eleva não só o audiodescritor à posição de protagonista do processo de tradução intersemiótica mas também o ouvinte, considerando que este também é partícipe da interação. Ele já está inserido na obra desde o planejamento; a linguagem é pensada em seu possível repertório linguístico e cultural. Dessa forma, podemos perceber a plena participação de três partes em todo o processo de tradução; três protagonistas, portanto, que são: o objeto artístico, o audiodescritor e o ouvinte.

Com essas considerações, desconstruímos as noções que exigem imparcialidade e neutralidade da tradução, porque, de fato, é impossível aos enunciados concretos. Essas noções não representam uma verdade discursiva, já que a interpretação é inerente a todo o processo de compreensão de um enunciado, isto é, para se traduzir uma imagem em palavra só se pode fazê-lo por meio de interpretação. Essa interpretação, como nomeia Oliveira (2013), é sempre axiológica, atravessada por valores e historicidade.

Só podemos traduzir uma imagem a partir de um ponto de vista, único e singular, que assumimos juntamente com a nossa existência como sujeitos. Isso significa que a vida concreta, a historicidade, as construções sociais implicam diretamente a forma como os sujeitos olham o mundo ao redor e, por meio de palavras, traduzem-no ou o recriam em outro sistema de signos.

Villela (2017), analisando a linguagem erótica em duas cenas do filme Praia

do futuro, dispõe e cumpre com o objetivo de observar a descrição que chega aos

tradução interpretativa, ou seja, que desconsidera as noções tradicionais que apontam para a neutralidade. Ela ainda afirma que a linguagem deve se afinar com o que está sendo traduzido, isto é, o enunciado de chegada deve se vincular de maneira mais substancial ao enunciado de partida. Por isso, é adequado que um filme com cenas eróticas apresente uma linguagem diferenciada em relação a outros tipos de filmes.

Opondo-se também a essa noção de neutralidade, Carvalho, Leão e Palmeira (2017) defendem a importância de se trabalhar a postura da voz do locutor, uma vez que a pessoa com deficiência não terá contato apenas com as palavras do roteirista mas também com a voz de quem lerá esse enunciado. Eles tensionam contra aqueles que defendem uma locução neutra, isenta de modulações vocais que se adequem ao gênero fílmico, pois, para eles, essa voz neutra é impossível de ser realizada. Quando falamos, nossas vozes vão carregadas das experiências vividas, da historicidade do sujeito, do tipo de filme que está sendo traduzido e até mesmo do público-alvo que terá acesso ao material.

Alves e Teles (2017) defendem que o audiodescritor não deve explicar nem facilitar a obra, mas falar de maneira objetiva, pois é assim que se garante a acessibilidade. Vale ressaltar que, apesar da objetividade, não há possibilidade de neutralidade. Se, como a autora advoga, o audiodescritor precisa ter um olhar seletivo para aquilo que pode ser mais relevante – e esse olhar só se desenvolve a partir de uma formação pessoal –, não é possível que isso aconteça sem a subjetividade.

Cada sujeito falará a partir de um ponto de vista distinto, fazendo uso de escolhas lexicais, estilísticas, fraseológicas individuais, embora o tema da descrição seja basicamente o mesmo para todos os falantes. A questão da objetividade dialoga diretamente com os não ditos, visto que ocultamos informações para não sobrecarregar nosso texto com aquilo que pode não ser necessário obscurecemos o que consideramos demasiadamente esclarecido.

Villela (2017), diante disso, defende que a AD precisa ser feita em grupo, com o auxílio de uma pessoa com deficiência visual, favorecendo o público-alvo com uma linguagem que seja pensada não só para ele mas também a partir dele. Nesse ponto, ela destaca a importância da consultoria de uma pessoa com deficiência visual que tenha contato com o gênero que está sendo traduzido. Isso dialoga diretamente com o que Alves e Teles (2017, p. 424) consideram ao afirmar que “a tarefa de audiodescrever requer também uma investigação sobre o material a ser audiodescrito

como, por exemplo, a cinematografia, estudos da semiótica, gênero, público, entre outros”.

Em outros termos, é necessário que o material passe por uma consultoria, uma avaliação feita por alguma pessoa com deficiência que tenha experiência com AD e com o gênero imagético que está sendo traduzido. Isso faz evitar que a audiodescrição apresente elementos que não sejam necessários ou que estejam dificultando a compreensão. Essa consultoria analisará o roteiro e a locução, percebendo marcas de subjetividade que podem comprometer a interpretação da pessoa com deficiência.

Quanto ao exercício da consultoria, Mianes (2017) defende que deve ser realizado, necessariamente, por uma PcDV, com cegueira ou com baixa visão, uma vez que ele é o representante do público a quem se destina o material com AD. Esse é o fator que torna ainda mais relevante o trabalho em consultoria, por sua importância não apenas em discutir “sobre” mas também “com”; é relevante atravessar a fronteira para que se crie inteligibilidade estando no mesmo ambiente. Além disso, Mianes e Soares (2012) ainda destacam que não é suficiente ter deficiência visual para ser consultor, já que é necessário ter formação e capacitação na área, o que leva a crer que não é um trabalho que pode ser negligenciado ou de menor importância no processo de tradução.

A respeito do trabalho em consultoria, Silva e Barros (2017) apresentam duas maneiras de atuação, quais sejam:

Na maioria dos casos, o consultor atua como revisor de roteiros previamente elaborados por audiodescritores videntes. Há casos mais raros, contudo, nos quais a participação do consultor é mais efetiva e ele desenvolve os roteiros em parceria com seus pares videntes. Seja qual for o modelo adotado, a importância do consultor é amplamente reconhecida e sua participação no processo vista como garantia de qualidade. (SILVA e BARROS, 2017, p. 161)

Essa exposição das autoras dialoga diretamente com um dos apontamentos apresentados por Mianes (2017), que diz respeito ao movimento de imersão do consultor durante todo o processo de pré-produção do material a ser traduzido. Ele afirma que, durante muito tempo, quando a consultoria era solicitada, sua atividade era exercida, geralmente, quando todo o material estava pronto e só faltava o “olhar” das PcDV para que fosse finalizado o roteiro. Quando o consultor inicia seu trabalho com os roteiristas, é possível desenvolver mais interação tanto com os sujeitos que participam quanto com a imagem.

Mianes e Soares (2012, p. 9) afirmam que a pessoa com deficiência visual “deve estar presente em qualquer equipe de produção de AD, atuando junto com os demais profissionais em todas as etapas de trabalho, desde a concepção do projeto até a realização do produto final”. Isso significa que há uma relevância muito grande na função do consultor, o que torna seu exercício durante a produção do material visual ou audiovisual de extrema importância.

Os autores ainda consideram que a atividade de consultoria, feita necessariamente por quem tem deficiência visual, deve levar em consideração as experiências desse sujeito como base para uma audiodescrição que contribua para a inclusão de um número maior de pessoas com cegueira ou baixa visão. Isso não significa dizer que todas as pessoas com deficiência visual têm a mesma experiência e fazem uso dos mesmos recursos e repertórios linguísticos ou têm contato com outras audiodescrições, mas é necessário que o consultor expresse o que, para ele, pode ser compreendido pelos demais que ele representa.

Para Mianes e Soares (2012), portanto, não cabe ao consultor somente as experiências de vida, considerando que ter experiência acadêmica e escolar são pontos essenciais para exercer a função de consultor. Outro ponto de destaque é dominar a língua portuguesa, tanto a norma culta quanto muitas normas populares, demonstrando conhecimento da estrutura, dos valores semânticos das palavras, do contexto social em que a palavra se insere. É importante também, segundo os autores, que a consultoria conheça bem o gênero discursivo que está sendo traduzido, bem como a temática que o constitui. Se não domina o tema nem o gênero, Mianes e Soares (2012) sugerem que os consultores sejam pesquisadores ativos do que estão trabalhando. Silva e Barros (2017) também defendem a relevância de um consultor com boa formação na área. Elas afirmam que, se nem todos os videntes podem ser roteiristas, nem todas as pessoas com deficiência visual podem trabalhar na consultoria.

Sá (2017) apresenta uma informação relevante sobre essa atividade. Para ela, o trabalho do consultor não consiste apenas em dizer se aprova ou desaprova o roteiro, mas ele deve “avaliar a pertinência das escolhas tradutórias, a qualidade, a eficácia e a funcionalidade de um produto audiodescrito, em consonância com a heterogeneidade do público ao qual se destina” (SÁ, 2017, p. 95). A avaliação é essencial para a construção do roteiro de audiodescrição, visto que, como já foi dito,

são os consultores as pessoas que representam o público-alvo que receberá o material audiovisual acessível.

Face ao exposto, podemos ponderar sobre o exercício dos participantes da audiodescrição, desde a construção do roteiro e revisão, passando pela consultoria e chegando até a narração, identificando, especialmente, a relação existente em todas essas funções. Isso é preciso porque não consideramos a separação, o desengajamento nem a individualidade do trabalho; pelo contrário, o processo de construção de um material visual ou audiovisual acessível para pessoas com deficiência visual requer um engajamento entre todos os sujeitos, que trabalham em constante diálogo entre si. Em outras palavras, é importante considerar que as relações existentes entre os participantes da audiodescrição são todas dialógicas13, ou seja, elas se estabelecem na compreensão e na responsividade ao enunciado alheio.

O roteirista responde ao enunciado imagético, construindo a respeito dele um enunciado verbal em estreita afinidade. Ele precisa olhar atentamente para a imagem, observando o que há de essencial nela, ou seja, aquilo que carrega o tema ou o assunto que mais se destaca no enunciado. Se for audiovisual, além de ter uma sensibilidade de olhar, também se requer uma linguagem concisa, direta e objetiva para colocar nos espaços de silêncio a descrição.

Em síntese, por parte do roteirista, é importante, especialmente, que seu olhar seja atento para as informações do que está sendo exposto. Um vídeo pode carregar diversas imagens, no entanto, nem todas são centrais ou relevantes para o tempo de silêncio disponível ao audiodescritor. Perceber o que deve ser recriado em palavra requer, além de boa formação, experiência no olhar.

Ainda assim, o trabalho em audiodescrição não se conclui quando o roteiro é feito por esse audiodescritor. O revisor tem uma função muito importante, considerando que outros olhares podem trazer novas contribuições para o material audiovisual acessível. Dessa forma, trazer outro vidente contribui para perceber e avaliar como os roteiristas dialogam com o vídeo e o traduzem em palavras.

O revisor, diferentemente do roteirista, não se apoia apenas na imagem ou no audiovisual, pois precisa se relacionar também com a descrição já construída. Ele será, portanto, um respondente a dois enunciados e dialogará com ambos. Muitas

vezes, a relação entre o revisor e o roteirista não se constrói, necessariamente, no ambiente da concordância. A tensão e a discordância também podem fazer parte e se manifestar por meio da polêmica ou da paródia, por exemplo. Em outras palavras, é possível que a não aceitação à palavra do outro surja por meio da polêmica, especialmente quando se altera o enunciado construído pelo primeiro, mudando o tema/assunto apresentado na imagem.

Para exemplificar, o roteirista pode acreditar que determinada imagem de uma fotografia ou vídeo merece mais destaque na audiodescrição do que outra imagem. Em contrapartida, o revisor considera outra imagem de mais relevância. Nesse caso, os posicionamentos ideológicos, as maneiras de ver o mesmo objeto serão distintos e, portanto, as ideias entram em tensões dialógicas por meio da polêmica. Apesar do nome, não podemos afirmar que isso é algo inadequado ou representa um erro. Pelo contrário, isso reafirma que todos os grupos se organizam para construir enunciados que dialoguem com as perspectivas das pessoas com deficiência visual.

Nesse processo, serão consultores as pessoas responsáveis por avaliar e responder dialogicamente a respeito do que foi apresentado pelos videntes – roteiristas e revisores. Esses consultores, como já foi dito, não devem somente estar inclusos no grupo de pessoas com deficiência, mas ainda precisam ter formação na área, a fim de contribuir de maneira técnica a partir de sua perspectiva.

As relações dos consultores com o objeto se darão exclusivamente com as palavras alheias, pois não poderá ter acesso à imagem alguma. Caso o roteiro de audiodescrição e a revisão estabeleçam concordância, basta o contato com apenas um texto, sem a necessidade de fazer comparações, para que seja apresentada a sua sugestão com acatamento, correção ou mesmo reorganização do enunciado. Caso o roteiro de audiodescrição e a revisão caminhem para lados opostos, a consultoria terá a responsabilidade de ponderar sobre qual será mais adequada para o contexto do material audiovisual.

Depois disso, para finalizar o trabalho em audiodescrição, a atuação do narrador, ou do locutor, é essencial, visto que ele dará sonoridade às palavras que serão prenhes de imagens mentais pelas pessoas com deficiência visual. É importante destacar que, muitas vezes, o audiodescritor é o mesmo que faz a locução. Sua atuação deve dialogar tanto com o roteiro apresentado/escrito por ele como também com o filme. Isso significa que ele não será apenas um leitor do roteiro de audiodescrição mas também que a sua locução deve manifestar todo o ato criativo

que está presente tanto na escrita (já que consideramos a impossibilidade de uma