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Em 2016, fizemos uma busca nos arquivos do setor de acessibilidade a fim de encontrar todos os materiais referentes ao curta em análise nesta dissertação, o filme A força (ROQUE e DANTAS, 2016). Nessa busca, foram encontrados três roteiros: o primeiro, referente à primeira versão, escrito por Rafael Garcia e Andreia Gurgel (2014)24; o segundo uma revisão do primeiro, produzido por Bruna Leão e Klístenes Braga (2014)25; o terceiro, por sua vez, construído por Sidney Trindade e Bruno Lima (2015)26, consultores cegos de audiodescrição27.

Os três roteiros disponíveis foram separados em três colunas, colocados lado a lado, para perceber, no primeiro momento, alguma diferença visual entre eles. Notadamente, o terceiro roteiro apresenta uma quantidade menor de palavras, o que caracteriza um apagamento maior de expressões linguístico-discursivas. No segundo momento, o objetivo de colocar os três roteiros tão próximos era facilitar a visualização de descrições referentes a uma mesma imagem. Estruturado dessa forma, ficava mais fácil enxergar as formas de cada roteirista falar do mesmo objeto imagético, apagando ou acrescentando informação.

Além disso, separamos as descrições em três grupos diferentes, priorizando os critérios de montagem do curta-metragem. O primeiro grupo de descrição diz respeito às primeiras cenas dinâmicas do curta, que mostram um velho em agonia, deitado em sua rede, ouvindo senhoras rezarem ao seu redor. Essa cena finda quando uma água é jogada sobre seu rosto e passamos a ver uma alternância de cores diversas, representando a passagem de certa lucidez para o delírio de morte. A essa primeira cena, nomeamos de velhice.

Após a cena da velhice, há um elemento fílmico que estabelece a transição de cenas, associado diretamente ao delírio, que, na verdade, é uma rememoração de fatos vividos. Por isso, nomeamos essa segunda parte de Reminiscência, desta vez, feita por fotografias de pessoas e lugares; fato que se inicia na infância desse velho, passa pela sua juventude, chega à fase adulta. Outras imagens são essenciais para

24 Roteiro finalizado em 21 de julho de 2014. 25 Revisão finalizada em 07 de novembro de 2014. 26 Consultoria finalizada em 06 de junho de 2015.

27 O roteiro original, o roteiro revisado e o roteiro com consultoria encontram-se no Apêndice A desta dissertação.

a caracterização da personagem, como o pote de barro, a enxada, a terra e as plantas secas, entre outras.

Por fim, a terceira parte do curta, novamente dinâmica – e, consequentemente, matriz do terceiro grupo de descrição –, apresenta em plano aberto uma paisagem com serra ao fundo. Aos poucos, de um lado do enquadramento, um grupo vem caminhando para o lado oposto e carrega um caixão enquanto recita canções religiosas; do outro lado do enquadramento, uma mulher caminha em sentido oposto com um balde na cabeça. A cena, nomeada de cortejo

fúnebre, termina quando só resta a serra ao fundo.

O roteiro original é formado por 23 inserções de audiodescrição; a revisão, por 25; a consultoria, por 24. Os audiodescritores organizaram suas ideias em grupos de audiodescrição correspondentes às cenas do filme e aos momentos de transição entre essas cenas. Podemos notar, então, no Quadro 1 a seguir, a quantidade de inserção de enunciado descritivo por momento feito por cada grupo de audiodescritor:

Quadro 1– Quantidade de enunciado descritivo em cada roteiro Roteiro Original Roteiro

Revisado Roteiro com consultoria Velhice 4 4 4 Transição de cena 1 1 1 1 Reminiscência 15 15 15 Transição de cena 2 0 0 1 Cortejo Fúnebre 3 5 3

Fonte: Autoria própria

O capítulo a seguir se dedicará às análises dos roteiros de audiodescrição em processo de produção. Será dividido em três partes, as quais conduzirão à compreensão de como é feita a transmissão de um enunciado original a outros por meio de uma tradução intersemiótica. A primeira parte funcionará semelhante a uma “prequela”28 de um filme, mas, neste estudo, traremos uma prévia de análise, com elementos que serão essenciais para as partes seguintes. A segunda parte terá a análise das audiodescrições construídas pelos audiodescritores videntes, que buscarão corresponder ao objetivo específico primeiro desta dissertação. A última

28 Termo cujo significado descreve as obras cinematográficas que relatam acontecimentos anteriores a outra obra. Um exemplo é a segunda trilogia de “Star Wars” (1999, 2002, 2005), que narra eventos acontecidos antes da primeira trilogia (1977, 1980, 1983), nomeia-se de “prequela” ou “prequência”; a terceira trilogia da obra (2015, 2017, 2019), que narra eventos posteriores à primeira, nomeia-se “sequela” ou “sequência”.

parte, por sua vez, tomará o último roteiro produzido pelos videntes, após a revisão, e o comparará com o roteiro produzido após a consultoria.

As duas últimas partes vão existir em semelhança ao processo de produção de audiodescrição. Assim, quando forem analisados os roteiros dos videntes, a audiodescrição sempre acompanhará a imagem com a qual interage e responde ativamente, da mesma forma como é feito no processo de tradução. Quando forem analisadas as audiodescrições construídas pelos consultores não videntes, não traremos o apoio das imagens – apenas das palavras que vieram anteriormente –, semelhante ao processo de consultoria.

5 A FORÇA QUE OS OLHOS (NÃO) PODEM VER

Neste capítulo, vamos nos debruçar sobre os enunciados produzidos pelos audiodescritores videntes, dividindo-os em quatro subcapítulos, a saber: Prequela: A

força do Sertão e do sertanejo em questão no curta-metragem, dedicado a uma

abordagem geral da temática que envolve o curta-metragem; O que os olhos veem..., dedicado à análise dos roteiros dos videntes; O que os olhos não veem..., dedicado à análise comparativa do roteiro dos audiodescritores e da consultoria. Por fim, construiremos um paralelo entre os posicionamentos dos videntes e dos não videntes em uma subcapítulo nomeada de Das relações dialógicas entre os audiodescritores-

roteiristas/revisores e os consultores: posicionamentos em justaposição.

5.1 PREQUELA: A FORÇA DO SERTÃO E DO SERTANEJO EM QUESTÃO NO