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O impacto no orçamento público em razão das políticas de

1 POLÍTICAS PÚBLICAS RELACIONADAS AO CONSUMO DE CRACK:

1.3 O Estado frente ao crack: os problemas associados ao consumo da

1.3.2 O impacto no orçamento público em razão das políticas de

Diante do cenário traçado até o momento, não resta dúvida que ao Estado caberá formular políticas públicas específicas, que possam fazer frente às diferentes necessidades impostas pelo consumo, produção e comercialização do crack, possibilitando a repressão ao tráfico, sem descuidar da atenção ao usuário, sobretudo em relação a suas necessidades médicas e sociais.

O impacto financeiro para o Estado é bastante representativo101, sobretudo em um país que ainda possui muitas demandas a serem atendidas, como é o caso do Brasil. Essa falta de recursos públicos é potencializada ainda mais em razão da pulverização de esforços entre os diversos órgãos da Administração Pública, levando a situações de ausência de serviços em alguns momentos ou locais, assim como a execução de um mesmo serviço por vários órgãos públicos, constituindo-se isso em uma sobreposição sem sentido, pouco eficiente e dispendiosa.

A leitura do Projeto de Lei Orçamentária Anual de 2014 permite verificar que apenas para o programa "Política Antidrogas” a União destinou R$ 226,9 milhões a serem distribuídos para projetos e ações - entre os quais o programa “Crack, é possível vencer"- destinados à repressão, prevenção, tratamento, recuperação e reinserção social. Importante comentar que as ações se darão de maneira descentralizada, contando com a participação dos demais entes federativos102.

É necessário ressaltar que a previsão orçamentária retrocitada não representa a totalidade das despesas relacionadas ao crack ou às demais

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Os problemas decorrentes do impacto financeiro relacionado ao uso e comercialização de drogas não é exclusivo do Brasil, ao contrário, atingem todos os países que enfrentam a questão. Em reportagem publicada pelo Jornal do Brasil, sob o título "Relatório indica gastos de US$20 bi anuais com drogas", é informado que estudo divulgado em abril de 2009 pela ONG britânica Transform Drug Policy aponta que os gastos do Reino Unido apenas com a área de saúde e as políticas de combate ao crime e comercialização ilícita de drogas alcança a cifra de US$ 20 bilhões. Relatório indica gastos de US$20 bi anuais com drogas. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 8 abr.2009, p. A23.

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BRASIL. Orçamento Federal ao Alcance de Todos: Projeto de Lei Orçamentária Anual - PLOA 2014. Brasília: Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, 2013, p. 24.

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drogas. Ao contrário, no decorrer do orçamento é possível constatar a existência de outras rubricas que direta ou indiretamente estão relacionadas aos impactos decorrentes do uso e comercialização das drogas psicotrópicas, tais como as direcionadas à segurança pública e à saúde.

Cabe um parêntese para registrar que o impacto financeiro decorrente do consumo de drogas também é expressivo para o restante da Sociedade, que deverá arcar com os custos relativos à queda de produtividade nas empresas, o aumento dos gastos com saúde privada, a perda de oportunidades profissionais e educacionais, o aumento do custo de segurança (privada), dentre outros.

De qualquer forma, a quantificação dos custos necessários para fazer frente ao problema das drogas é de grande complexidade, pois, como já frisado, os reflexos alcançam inúmeras áreas, algumas nas quais as coletas de dados são mais viáveis, o que não significa que sejam fáceis, enquanto que em outras a avaliação dos prejuízos financeiros dependerá de fatores subjetivos, por exemplo, qual o prejuízo para alguém que abandonou os estudos e perdeu anos de sua vida em prol do vício?

No que diz respeito às relações entre trabalhadores e empregadores, a quantificação é possível, ainda que os dados estatísticos sejam bastante escassos. Em locais em que os dados estão disponíveis, como é o caso dos Estados Unidos, verifica-se que os prejuízos alcançam a casa dos bilhões de dólares. O aumento de custos das empresas em razão do consumo de drogas por parte de seus funcionários pode alcançar a cifra de até US$ 140 bilhões, prejuízo esse que está relacionado a três fatores principais: perda de produtividade, incidentes diversos e turnover103 de funcionários104.

Infelizmente, não há como fazer uma comparação com a realidade brasileira, pois não há dados estatísticos que possam aferir o impacto financeiro e a queda de produtividade do trabalhador brasileiro em virtude do consumo de drogas. Essa informação seria de grande importância, pois

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Na rotatividade de funcionários ou turnover se verifica um fluxo de empregados que são admitidos e que deixam o emprego.

104

VERGARA, Sylvia Constant; BENAZZI, João Roberto de Souza Coelho. A questão das drogas nas empresas brasileiras - estudo exploratório das práticas organizacionais. Revista de Administração, São Paulo, v.35, n.4, p.36-47, out./dez.2000.

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quantidade expressiva de pessoas passam várias horas de seus dias no ambiente de trabalho105.

Pois bem, deixando de lado a questão sobre a execução dos serviços e programas previstos em orçamento, deve se retornar à análise dos reflexos financeiros causados pelo crack nas despesas públicas. Para tanto, faz-se necessário, primeiramente, detectar quais as áreas e serviços deverão ser priorizados ao se buscar atender as demandas inerentes à droga106.

Nesse sentido, com base no estudo realizado pelo Conselho Nacional de Municípios, observa-se que os serviços públicos mais demandados, em razão do crack107, são aqueles relativos à assistência social, que aparecem em terceiro lugar em todas as regiões do país, à segurança e à saúde, com a peculiaridade de que estes dois se alternam entre a primeira e segunda posição a depender da localidade.

Demanda de serviços em razão dos problemas relacionados ao crack

Brasil Norte Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste Saúde 63,7% 61,2% 61,23 65,1% 64,7% 64,9% Segurança 58,5% 62,4% 60,3% 55,7% 56,8% 65,6% Assistência Social 44,6% 47,2% 42,0% 46,3% 44,1% 45,4% Educação 37,9% 34,8% 36,8% 37,2% 37,6% 46,1% Outros 12,3% 15,7% 11,7% 12,2% 11,1% 15,2%

Fonte: Estudos Técnicos CNM – Volume 4 – Tabulação própria

105

VERGARA, Sylvia Constant; BENAZZI, João Roberto de Souza Coelho. A questão das drogas nas empresas brasileiras - estudo exploratório das práticas organizacionais. Revista de Administração, São Paulo, v.35, n.4, p.36-47, out./dez.2000.

106

"Parte da ineficiência do Estado foi atribuída à falta de um melhor dimensionamento do problema das drogas e da dependência química por conta da falta de dados". FALTAM verbas e coordenação nas iniciativas do governo. Em discussão!: revista de audiências públicas do Senado Federal, Brasília, n 8, p. 48, ago. 2011.

107

Coleta de dados junto a 3.900 municípios. ESTUDOS Técnicos CNM. v. 4: Brasília. Confederação Nacional de Municípios, 2012, p. 55.

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O quadro acima toma por base o percentual de citações feitas pelos municípios em decorrências dos serviços públicos mais demandados em razão da comercialização e uso do crack. A primeira conclusão que se pode chegar, a partir da leitura dos dados acima é que a droga impacta especialmente nas áreas de segurança e saúde, havendo uma ligeira prevalência desta em relação àquela.

Ainda de acordo com o estudo elaborado pelo CNM, observa-se que alguns problemas são citados em todas as pesquisas realizadas, destacando-se a ausência de profissionais capacitados para lidar com o problema do vício em crack, a falta de destinação de recursos para a manutenção de equipes e locais especializados no tratamento aos usuários. E mais, os municípios entendem que o tráfico e o consumo de drogas não são vistos como prioritários pela União, sobretudo sob o enfoque da saúde pública108.

Em suma, as demandas são muitas, o que impõe despesas expressivas que comprometem parcelas consideráveis dos orçamentos públicos dos entes federativos. Nesse cenário, é natural que certos serviços e programas sejam privilegiados, enquanto outros ficam em segundo plano, pois não tidos como prioritários.

De qualquer forma, mesmo considerando o quão expressiva é a quantidade de citações que mencionam a questão da segurança pública, não deixa de ser surpreendente verificar que para a população o principal problema relacionado ao consumo de crack diz respeito às questões relacionadas à área da saúde.

Essa informação diz muito, pois fica claro que a Sociedade não ver o crack apenas como uma questão de política criminal, muito pelo contrário, há a compreensão de que o problema demanda ações em áreas que vão da educação à assistência social, mas, sobretudo, na área de saúde. De igual modo, parece não ser acertada a concepção de que o usuário é um criminoso que precisa ser reprimido e punido, parecendo emergir a ideia de que o consumo de substâncias como o crack é acima de tudo um problema de saúde

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pública, devendo o Estado se atentar a isso quando formular políticas publicas para essa parcela da população brasileira.