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CAPÍTULO I – ELLEN G WHITE EM CONTEXTO

2.3 Ambiente Social

2.3.4 O industrialismo selvagem

O século XIX marcou a era do processo de industrialização dos Estados Unidos. Fundamentando-se nas máximas da produção, do consumo e do lucro, a industrialização norte-americana seguiu o mesmo objetivo capitalista de outros processos semelhantes, já em andamento em outros lugares do mundo comercial da época. Para que o lucro fosse assim ininterrupto, a ganância dos empresários logo descobriu na produção diuturna sua alternativa mais interessante. Em tal processo da época destacam-se de forma marcante a competição desleal, a especulação intermediária, a desvalorização do papel social do homem do campo e a excessiva e degradante exploração humana nos recém-criados postos de trabalho industriais. A economia agropecuária que predominava até então sofreu rápida expansão em seus processos de mecanização e comercialização até o final da primeira metade do século. Mas o que para o mundo rural parecia ser apenas o resultado positivo do acelerado desenvolvimento agrícola do País, para os especuladores da época era visto como a evidência da farta matéria prima disponível para o abastecimento dos novos empreendimentos industriais, nos quais logo trataram de investir.

148 WHITE, Ellen G. Medicina e Salvação. Tradução de Almir A. Fonseca e Carlos Trezza. 3. ed. Tatuí-SP:

De olho na realidade norte-americana, que incluía fartura de mão de obra não regulamentada, abundante matéria prima de metais e produtos, liberdade expansionista da ideologia da prosperidade material, infraestrutura de trens para transporte e portos para exportação de produtos, demanda consumidora interna e baixos tributos, muitos decidiram investir seus capitais no processo industrial, que se tornou o grande atrativo do território norte-americano na segunda metade do século. Os registros dão conta de que nas últimas décadas os primeiros investimentos já haviam se tornado grandes corporações empresariais:

Durante as últimas três décadas do século dezenove, os norte-americanos foram testemunhas de uma revolução tecnológica à medida que as máquinas substituíram os habilidosos artesãos, e novas e poderosas corporações, empregando centenas e milhares de obreiros sem experiência, fabricavam um conjunto sempre crescente de produtos.149

Esse processo foi rápido e aconteceu na contramão da cultura ruralista do povo norte- americano, a qual havia predominado desde a independência das colônias. A indústria trouxe consigo uma verdadeira revolução tecnológica que, a passos largos, impôs suas condições de um estilo de vida totalmente distinto do que até então se conhecia e se praticava nos Estados Unidos. Historiadores registram que:

Nas primeiras décadas do século XIX, os Estados Unidos caíram nas garras das mudanças que penetrariam em todos os setores da vida, transformando o País. Em um século, a nação agrícola, que havia nascido anos antes, quando as treze colônias se separaram da Inglaterra, em 1776, floresceria como uma potência industrial sem rival.150

Tal mudança ocorreu sem aviso nem licença, impactando em definitivo a política, a economia e todo o tecido social norte-americano. A própria cultura foi sendo transformada pelo novo estilo de vida imposto pelos fenômenos da urbanização e industrialização. Historiadores concordam que tal processo logrou “erradicar a cultura sulista – aristocrática, romântica e cavalheiresca – e substituí-la por outra – individualista, competitiva e racionalista –, que constitui até hoje a marca externa do yankee em todo o mundo”151. E tal realidade logo

149 SCHWANTES, Carlos A. El Surgimiento de Una Norteamérica Urbana e Industrial. In: LAND, Gary y

Otros. El Mundo de Elena G. de White. 1. ed. Flórida (Buenos Aires): Asociación Casa Editora Sudamericana, 1995, p. 99, com tradução própria.

150 SEPÚLVEDA, Ciro. Elena G. de White: Lo Que No Se Contó. 1. ed. Flórida (Buenos Aires): Asociación

Casa Editora Sudamericana, 1998, p. 20, com tradução própria.

151 MARTIN, André. Guerra de Secessão. In: MAGNOLI, Demétrio. História das Guerras. 3. ed. 2.ª

alcançou a pequena Portland dos dias de Ellen White. O nível de industrialização ali experimentado seguia o ritmo das demais cidades portuárias da costa leste:

Em Portland, a indústria estava resumidamente diversificada e, evidentemente, era de considerável importância para seu bem-estar econômico. O censo de 1840 enumerou as ditas atividades industriais: tabaco (6.000 dólares); chapéus e bonés (26.900 dólares); botas, sapatos e outros calçados (74.771 dólares); tijolos (6.000 dólares); cristais e louças de barro, etc.(5.500 dólares); confeitaria (14.500 dólares); cordões e cordas (29.000 dólares); carruagens (11.300 dólares); móveis (57.260 dólares); e embarcações (48.000 dólares).152

O resultado de uma tão rápida e impactante mudança no regime socioeconômico foi diferente para as distintas camadas sociais da época. Enquanto para os ricos o sentimento foi de desafio e cautela, para os pobres a sensação foi de perda do que possuíam e temor quanto ao novo futuro prenunciado. A nova cultura para muitos era assustadora e temerária:

Tão drástica foi a transformação do panorama econômico americano, que muitas pessoas foram surpreendidas por uma sensação de perda e temor. Em vão buscaram os antigos marcos e os caminhos familiares para que os guiasse a salvo em meio do novo e estranho mundo das companhias monopólicas e os trustes, os sindicatos de trabalho e a violência industrial.153

Fundamentando-se nas máximas da produção, do consumo e do lucro, a industrialização norte-americana seguiu o mesmo objetivo capitalista de outros processos semelhantes, já em andamento em outros lugares do mundo comercial da época. Historiadores registram que “o entusiasmo em torno do desenvolvimento científico e tecnológico fez com a mecânica se transformasse numa espécie de religião, de modo que o dinheiro, a máquina e o consumo de bens passaram a corresponder a uma nova „Santíssima Trindade‟”154. O seu tríplice fundamento demonstrava que, para a nova ideologia, a preocupação deixara de ser a subsistência humana para ser o lucro dos investidores, que já desde então enxergavam nas indústrias grandes máquinas de capitalização de suas fortunas. O meio de se garantir tal

152 HOYT, Frederick. La Ciudad Natal de Elena G. de White: Portland, Maine, 1827-1846. In: LAND, Gary y

Otros. El Mundo de Elena G. de White. 1. ed. Flórida (Buenos Aires): Asociación Casa Editora Sudamericana, 1995, p. 32-33, com tradução própria.

153 SCHWANTES, Carlos A. El Surgimiento de Una Norteamérica Urbana e Industrial. In: LAND, Gary y

Otros. El Mundo de Elena G. de White. 1. ed. Flórida (Buenos Aires): Asociación Casa Editora Sudamericana, 1995, p. 99, com tradução própria.

154 MARTIN, André. Guerra de Secessão. In: MAGNOLI, Demétrio. História das Guerras. 3. ed. 2.ª

façanha era a produção em série de todos os tipos de produtos possíveis que pudessem ser vendidos em qualquer lugar do País e do mundo alcançável da época.

Para que o maior número de pessoas pudesse consumir a produção e gerar os tão esperados lucros, contudo, o preço final dos produtos deveria ser atrativo frente ao grau de poderio econômico das massas de consumo da época. Logo se percebeu que quanto mais atrativo o preço final do produto, maior seria seu consumo, o que oportunizaria mais produção e resultaria em mais lucro para o investidor empresário. O lucro, que no processo agrícola era limitado pela estação do ano (sazonalidade da produção), pela quantidade máxima produzida por espaço plantado e pelo volume colhido e comercializado, não deveria agora ser mais limitado por nenhum fator de tempo e de espaço.

Para que o lucro fosse assim ininterrupto, a ganância dos empresários logo descobriu na produção diuturna sua alternativa mais interessante. A par da fabricação contínua, buscou- se manter o preço do produto final num patamar de custo que os consumidores pudessem comprá-lo. A alternativa encontrada para isso foi desde logo baratear o seu custo de produção desde a matéria-prima, passando pela mão de obra e demais custos intermediários até a sua entrega para o consumo final. Assim, estaria garantida a demanda que manteria a indústria em pleno vapor, garantindo os tão esperados lucros incessantes para seus proprietários e/ou investidores.

Diante de qualquer sinal de baixa no consumo e consequente ameaça de redução da produção e do lucro, a indústria procurava, como de fato ainda o faz, tornar o produto mais atrativo em termos de preço, sacrificando sempre os custos de produção, mas jamais seus patamares de lucros almejados. Dentre as inúmeras consequências de tal processo para a época destacam-se de forma marcante a competição desleal, a especulação intermediária, a desvalorização do papel social do homem do campo e a excessiva e degradante exploração humana nos recém-criados postos de trabalho industriais.

Os historiadores registram que o processo industrial trouxe consigo uma competição extremamente desleal entre as grandes corporações e as pequenas fábricas, fossem essas artesanais ou mesmo fabriquetas que estivessem no início de sua mecanização para enfrentamento do mercado. Registra-se ainda que, “com o surgimento dos gigantes da indústria que dominavam os novos mercados de toda a Nação, as indústrias locais de menor escala ficavam como que impedidas de competir”155.

155 SCHWANTES, Carlos A. El Surgimiento de Una Norteamérica Urbana e Industrial. In: LAND, Gary y

Otros. El Mundo de Elena G. de White. 1. ed. Flórida (Buenos Aires): Asociación Casa Editora Sudamericana, 1995, p. 94, com tradução própria.

Contribuindo para o insucesso desses pequenos fabricantes estava ainda outra consequência da industrialização: a especulação abusiva, exercida pelos intermediários da produção de matérias primas. A negociação que antes era feita olho a olho entre o produtor e o comerciante agora era maldosamente intermediada por especuladores de plantão que, ardilosamente e sem nenhum escrúpulo, ditavam o preço que queriam pagar pela produção disponível. A exemplo dos dias de hoje, compravam-nas a preços baixíssimos para vendê-las às indústrias com altos ganhos, e os produtores eram obrigados a vender seus produtos pelo que lhes era oferecido, caso não quisessem perder tudo o que haviam conseguido com seu imenso esforço. Era a lei do tudo ou nada no manto especulativo. Registra-se que nesse tempo:

Os agricultores, que disponibilizavam colheitas para comercializá-las, descobriam que estavam a mercê da conveniência dos especuladores e dos compradores das grandes cidades. Frequentemente o baixo preço que era oferecido ao agricultor por seu trigo, algodão ou milho não guardava nenhuma relação com seu custo o com a dificuldade de produção.156

Era grande o desgosto dos produtores que tinham como única alternativa à perda de suas produções a sua venda a preços que não pagavam sequer seu custo, ou não compensavam os esforços empregados no seu plantio, cuidado, colheita, armazenamento, transporte e entrega. E para aumentar ainda mais tal angústia, a sociedade em pouco tempo passou a desvalorizar a figura do homem do campo. O respeito, admiração, prestígio e reconhecimento que a figura do trabalhador rural desfrutava por parte da sociedade em todos os seus níveis foram sendo substituídos por um sentimento geral de que seus métodos, seus meios e sua função social agora eram irrelevantes para as cidades. Sua figura tornara-se sinônimo de uma subcultura do passado recente frente ao modismo urbano e ao novo protótipo de trabalhador apreciável (operário, comerciante ou industrial). Diz-se desse período: “e o mais indignante de tudo, com a crescente importância da América do Norte urbana, foi que o agricultor perdeu status e prestígio. Aos olhos de muitas pessoas da cidade, o poderoso fazendeiro de ontem havia se convertido no grosseiro agricultor de hoje”157.

O industrialismo logo se mostrou um agente da excessiva e degradante exploração humana nos recém-criados postos de trabalho. Embora muitos apresentassem suas objeções

156 SCHWANTES, Carlos A. El Surgimiento de Una Norteamérica Urbana e Industrial. In: LAND, Gary y

Otros. El Mundo de Elena G. de White. 1. ed. Flórida (Buenos Aires): Asociación Casa Editora Sudamericana, 1995, p. 94, com tradução própria.

contra “a despersonalização resultante do novo sistema e o considerassem uma forma de escravidão”158, a exploração continuou por longas décadas projetando-se para além do século XIX e sendo a responsável direta por intensos e numerosos conflitos sociais. Investimento em maquinário, depressões econômicas, quedas no consumo ou qualquer outro fator que reduzisse os lucros tornava-se logo motivo para “que os empregadores insistissem numa maior produtividade individual por parte dos empregados. Já não bastava a estes trabalharem com a rapidez costumeira. Pedia-se agora aos trabalhadores que produzissem tanto quanto os empresários julgavam que fossem potencialmente capazes de produzir”159. Outro historiador registra na mesma linha que “por volta de 1860, calculava-se que um operário americano fazia o trabalho equivalente ao de três mil indianos”160.

Por volta de 1850, a carga horária era de cerca de 70 horas de trabalho semanais, número que sofreu redução até o final da década de 1880161, mas que era sempre resultado da excessiva jornada laboral que submetia os trabalhadores a uma condição desumana de produção. O relato seguinte detalha a situação:

Mesmo nas melhores épocas, a situação de grande parte dos obreiros da indústria ao final do século dezenove era precária. Ainda que os salários tendessm a ser incrementados a partir do final da década de 1870 até a depressão dos anos 1890, os trabalhadores não eram generosamente remunerados. Em 1893, o salário médio geral de ingresso para todos os trabalhadores era de quase 450 dólares, e para ganhar essa soma uma pessoa deveria trabalhar 10 horas por dia, seis dias por semana.162

A carga horária excessiva tinha como única contrapartida baixíssimos salários, que se combinavam apenas ao insuportável ambiente de trabalho. Os salários pagos não eram suficientes para subsistência do trabalhador e de sua família com o mínimo de dignidade. Ganhando apenas a média de 450 dólares por mês, os trabalhadores não conseguiam fazer

158 SCHWANTES, Carlos A. El Surgimiento de Una Norteamérica Urbana e Industrial. In: LAND, Gary y

Otros. El Mundo de Elena G. de White. 1. ed. Flórida (Buenos Aires): Asociación Casa Editora Sudamericana, 1995, p. 99, com tradução própria.

159 BURNS, Edward McNall. História da Civilização Ocidental: do homem das cavernas às naves espaciais – v.

2. Tradução de Donaldson M. Garshagen. 43. ed. São Paulo: Globo, 2005, p. 609.

160 MARTIN, André. Guerra de Secessão. In: MAGNOLI, Demétrio. História das Guerras. 3. ed. 2.ª

Reimpressão. São Paulo: Contexto, 2008, p. 226.

161 MCARTHUR, Benjamin. Divirtiendo a Las Masas. In: LAND, Gary y Otros. El Mundo de Elena G. de

White. 1. ed. Flórida (Buenos Aires): Asociación Casa Editora Sudamericana, 1995, p. 203, pontua que a semana de trabalho foi reduzida de “[...] 70 horas na década de 1850 a 60 horas semanais ao final da década de 1880”. (tradução própria)

frente às suas necessidades básicas de sobrevivência nas cidades, nas quais havia elevado custo de vida e apenas uma uma infraestrutura precária de atendimento aos serviços essenciais, necessários à sobrevivência com dignidade. Além disso, o fato de ter que trabalhar de 60 a 96 horas semanais163 impedia que o operário pudesse fazer qualquer serviço extra ou mesmo ter dois empregos, caso ainda suportasse. O máximo que poderia ocorrer seria a possibilidade de horas de sobretrabalho, cuja remuneração à época nem sequer era obrigatória. Apenas mais tarde, com as primeiras convenções e protestos dos primeiros sindicatos, o trabalho além das horas ditas normais passaria a ser de remuneração obrigatória. Comodidades como moradia e outras conveniências nem vinham ao pensamento com uma remuneração de tal medida:

Depois de pagar os compromissos de maior necessidade, pouco restava para comprar uma casa ou guardar para emergências tais como enfermidades ou acidentes. A invalidez ou a morte do membro da família que ganhava o maior salário era uma catástrofe familiar, já que à época ninguém havia inventado o sistema de seguro social, posteriormente substituído pela caixa de compensação do trabalhador, o seguro por enfermidade ou acidente, a Seguridade Social e os planos de pensões.164

A ausência de seguridade social (seguro médico, pensão ou aposentadoria)165 era outro problema de enormes proporções para uma época em que o índice de acidentes e mortes nas indústrias era altíssimo. As condições perigosas e insalubres dos ambientes de trabalho dessas fábricas vitimavam um grande número de pessoas que, quando não morriam, ficavam inválidas por toda a vida, não servindo mais para o cruel processo que os vitimara. Há relatos de fábricas cujo teto ou cujas paredes caía(m) sobre a cabeça dos empregados, matando dezenas e até centenas deles, além de ocorrências de incêndio e infiltrações que tornavam esses ambientes impróprios para permanência166. Quanto à tal realidade, os historiadores registram que:

163 SEPÚLVEDA, Ciro. Elena G. de White: Lo Que No Se Contó. 1. ed. Flórida (Buenos Aires): Asociación

Casa Editora Sudamericana, 1998, p. 22, informa que “as fábricas do Nordeste se encheram de mulheres, jovens, adultos e crianças que trabalhavam de 12 até 16 horas por dia”. (tradução própria)

164 SCHWANTES, Carlos A. El Surgimiento de Una Norteamérica Urbana e Industrial. In: LAND, Gary y

Otros. El Mundo de Elena G. de White. 1. ed. Flórida (Buenos Aires): Asociación Casa Editora Sudamericana, 1995, p. 98, com tradução própria.

165 SEPÚLVEDA, op. cit., p. 178.

166 Ibid., p. 88, registra o episódio de uma fábrica de Lawrence, Massachusetts, onde o teto desabou matando

A atividade industrial não somente era árdua, mas também perigosa. Engrenagens e polias expostas frequentemente trituravam as mãos e arrancavam os braços. O calor, o pó e os gases tóxicos de fábricas pobremente ventiladas minavam a vitalidade dos trabalhadores e contribuíam para o envelhecimento e a morte prematuros.167

Dois problemas surgiam aí: o primeiro era o sustento do inválido, e o segundo o sustento de sua família, que dele dependia. A falta de qualquer mecanismo de amparo legal contribuía determinantemente para o aumento das condições de miséria de inúmeras famílias cujo sustentador havia sido vitimado por tais ocorrências. A omissão das autoridades ocorria tanto na prevenção quanto no trato de tal consequência da industrialização. Ora a inexistência168, ora a inefetividade das leis agravara a realidade até a metade do século, tendo as regulamentações e fiscalizações melhorado aos poucos até a virada para o próximo:

As leis de inspeção de fábricas e minas, que deveriam haver prevenido os acidentes, eram inexistentes ou, no melhor dos casos, escassamente cumpridas. Na realidade, até a metade do século, poucas leis se ocupavam das necessidades específicas dos obreiros. Os legisladores, refletindo a sociedade em sua maioria, tinham dificuldade de conceber um mundo de rápidas mudanças.169

Em um de seus pronunciamentos a respeito de tal situação, Ellen White protesta de forma direta contra o que considerava ser um tipo de liberdade econômica voltada para a exploração dos mais fortes contra os mais fracos, do capital contra o trabalho, consequência do industrialismo selvagem de seus dias. Solidarizando-se com os mais fracos, ela pontua:

Por meio de toda espécie de opressão e extorsão, acumulam os homens fortunas colossais, enquanto sobem para Deus os clamores da humanidade desfalecente. Multidões lutam contra a pobreza, obrigadas a trabalhar arduamente por salários ínfimos, sem poderem adquirir as coisas mais indispensáveis à vida. O cansaço e as privações, sem nenhuma esperança de coisas melhores, tornam-lhes muito pesada a carga. Se a isso se acrescentam

167 SCHWANTES, Carlos A. El Surgimiento de Una Norteamérica Urbana e Industrial. In: LAND, Gary y

Otros. El Mundo de Elena G. de White. 1. ed. Flórida (Buenos Aires): Asociación Casa Editora Sudamericana, 1995, p. 98-99, com tradução própria.

168 SEPÚLVEDA, Ciro. Elena G. de White: Lo Que No Se Contó. 1. ed. Flórida (Buenos Aires): Asociación

Casa Editora Sudamericana, 1998, p. 178, pontua que por volta de 1863 praticamente não existia legislação laboral.

a enfermidade e a dor, então a carga se torna quase insuportável. Minados pelas preocupações e opressos, não sabem onde buscar alívio.170

Seu protesto não ficou reduzido a esta observação. Em tantas outras partes de suas obras, Ellen White se declarou, por preceito e por exemplo, ao longo de toda a sua vida, terminantemente contrária a qualquer tipo de libertinagem que vitima por exploração e degradação, o ser humano em suas fragilidades.171 Ela demonstra em seus escritos especial atenção aos milhares de norte-americanos de seu tempo que tinham sua dignidade mitigada pela distorcida ideia prevalecente de liberdade. Protesta contra a violência do âmbito social, os acumuladores de fortunas do âmbito econômico, os desonestos do âmbito político e os indiferentes à miséria humana do âmbito religioso.172 Definitivamente, para a autora, a liberdade de uns não pode se realizar à custa da degradação da integralidade de outros.