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CAPÍTULO 4 APROPRIAÇÃO DOS RECURSOS NATURAIS PELOS

4.2 Os extrativistas de pinhão

4.2.8 O metabolismo rural e metabolismo com a natureza a partir do extrativismo do

A primeira fase do metabolismo expressada por Toledo (2012; 2013), que trata do processo de apropriação dos recursos, está bastante presente na condição de vida dos extrativistas, especialmente no que tange ao Meio Ambiente Utilizado (MAU). De acordo com Toledo (2012), no MAU existe uma intervenção mínima do ser humano na natureza, ou seja, se apropriam dos recursos naturais disponíveis sem provocar transformações neste ambiente, o que é o caso do extrativismo na floresta de araucária.

Mesmo estando na etapa inicial do processo metabólico, os extrativistas de pinhão tem contribuído indiretamente em outras fases do metabolismo, tendo em vista que consomem os recursos dos quais se apropriam, ou seja, o pinhão se faz bastante presente na alimentação das famílias, ao mesmo tempo em que avançam também na fase de distribuição ou circulação do pinhão, pois além da venda direta que se estabelece com os consumidores na margem da rodovia, que por si já se configura como uma estratégia de distribuição, também existe uma rede de compradores (comerciantes intermediários) que fazem com que o pinhão chegue até os grandes centros de consumo.

Observa-se que o processo metabólico que se estabelece em torno do pinhão também possui um conjunto de regras, aspectos políticos, fiscalização, entre outros para que a ação tenha viabilidade. Como mencionado nos extrativistas de butiá, onde busca-se referencias em

125 Toledo (2013), que busca destacar que além dos aspectos visíveis, ou tangíveis do processo de apropriação, também existe uma parte que muitas vezes não é percebida ou é intangível, que segundo o autor é o que gera a dinâmica organizativa do processo metabólico. E que no caso dos extrativistas de pinhão esta parte intangível do processo de metabolismo está relacionada à legislação (que prevê o período para iniciar a colheita e comercialização do pinhão); a relação de parceria que se estabelece com os proprietários de terra que disponibilizam a araucária para os extrativistas colherem o pinhão; aos acordos estabelecidos pelos próprios extrativistas para estabelecerem preços semelhantes na venda do pinhão na margem da rodovia; as relações familiares que se estabelecem para que o processo de apropriação, distribuição e consumo ocorra; além dos aspectos festivos que de certa forma tornam o município de Muitos Capões mais conhecido sob o ponto de vista da disponibilidade do pinhão.

Constata-se, pois, que existem fatores sociais que interferem substancialmente no processo de metabolismo que ocorre entorno do pinhão.

Segundo Toledo (2013) o processo de apropriação da natureza se faz presente desde as sociedades mais humildes até às sociedades mais desenvolvidas, mas nas comunidades tradicionais como é o caso dos extrativistas de pinhão de Muitos Capões o processo de apropriação da natureza se faz muito mais presente, pois esta população depende destes recursos para garantir a reprodução da família.

Desde las sociedades tecnologicamente más simples el proceso metabólico material siempre há ocurrido, ha estado embebido, dentro de determinadas relaciones sociales, es decir, siempre ha estado condicionado por diversos tipos de instituciones, formas de conocimiento, cosmovisiones, reglas, normas y acuerdos, saberes tecnológicos, modos de comunicación y de gobierno y formas de propiedad.

(TOLEDO, 2013 p. 51).

As informações indicam que existe um processo de metabolismo com a natureza que se estabelece pelos extrativistas de pinhão. Quando os entrevistados comentam sobre os usos do pinhão, percebe-se que existe um conhecimento acumulado de longa data, especialmente em relação ao aproveitamento deste na alimentação familiar, tomando-se como exemplo a elaboração da paçoca de pinhão feita no pilão. Da mesma forma, o conhecimento sobre as diferenças nos pinhões, as características das pinhas, dos troncos e galhos das araucárias, são saberes locais importantes no processo de apropriação do pinhão.

Do ponto de vista da dimensão econômica, compreende-se que em muitos locais ainda existem relações de sociedade pré-capitalista, ou seja, grupos tradicionais de extrativistas,

126 camponeses, entre outros, que mantém relações de servidão. Neste sentido percebe-se nos extrativistas de pinhão uma lógica de apropriação dos recursos naturais que encontra-se em uma fase ainda incipiente do sistema capitalista, típico das sociedades tradicionais e camponesas, como mencionado por Diegues (2001)

[...] grande parte das florestas tropicais e outros ecossistemas ainda não destruídos pela invasão capitalista é, em grande parte, habitada por tipos de sociedades diferentes das industrializadas, isto é, por sociedades de extrativistas, ribeirinhos, grupos e nações indígenas. Muitas delas ainda não foram totalmente incorporadas à lógica do lucro e do mercado, organizando parcela considerável de sua produção em torno da auto-subsistência. Sua relação com a natureza, em muitos casos, é de verdadeira simbiose e o uso dos recursos naturais só pode ser entendido dentro de uma lógica mais ampla de reprodução social e cultural, distinta da existente na sociedade capitalista. (DIEGUES, 2001, p. 79).

No caso dos extrativistas de pinhão, a maioria destes estabelecem uma relação com o mercado local sem uma intenção de exploração intensiva da natureza para a obtenção de lucro, até por que as condições de trabalho para a apropriação do pinhão ainda são bastante rudimentares, pois a coleta é realizada em propriedades de outros e com instrumentos rudimentares. Entretanto, para um dos entrevistados que faz parte dos extrativistas, já vem observando a possibilidade de fazer a intermediação da venda do pinhão, pois percebeu que existe uma possibilidade de ganhar dinheiro comprando o pinhão dos demais e revendendo-o em outras regiões. Para este caso a tendência seria de intensificar a exploração da natureza buscando extrair o maior volume possível do pinhão da natureza.

Entretanto, a relação que os extrativistas de pinhão estabelecem com a comunidade local é importante, tendo em vista que dependem destes para se reproduzirem, seja na ocorrência de uma relação de parceria com os proprietários das áreas com araucárias, seja com o poder publico local que acaba por permitir que comercializem a produção na margem da rodovia sem que ocorra um processo de fiscalização ou controle da venda, ou ainda a relação estabelecida com os intermediários, que por mais que estejam – até certo ponto – sendo explorados, também possuem uma garantia da venda do pinhão colhido na possibilidade de não conseguirem vender todo o volume de forma direta ao consumidor.