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O movimento da Matemática Moderna nos Estados Unidos da América

No documento APARECIDA RODRIGUES SILVA DUARTE (páginas 100-105)

tornou-se evidenciada, exigindo modificações na sociedade de modo que pudesse acompanhar o rápido desenvolvimento tecnológico. Expandiu-se o significado da matemática, o que exigiu a constituição de novos grupos de estudo compostos não somente por profissionais oriundos dos cursos de matemática.

O principal órgão responsável pela elaboração das recomendações educacionais era o “National Committee on Mathematical Requirements”, ligado à “Mathematical Association of América”. Além disso, o “National Council of Teachers of América” (NCTM) também apresentou recomendações gerais para o ensino da matemática, enfatizando a compreensão dos procedimentos e seu significado, em oposição a um ensino baseado na memória e destreza na realização de operações (BÚRIGO, 1989).

Os trabalhos desenvolvidos por esses grupos culminaram com o surgimento, em meados de 1950, do Movimento da Matemática Moderna nos EUA, tendo sua origem em grande parte vinculada às universidades. Os matemáticos universitários cuja atenção voltava-se para a Teoria dos Conjuntos e o método axiomático, lamentavam a ausência de questões de matemática pura nos programas escolares, considerando, igualmente, que a matemática pura poderia se transformar em poderosa aliada para a melhoria desses programas. A reforma visava adaptar os conceitos de Matemática Moderna como base para alterar os programas de ensino (KILPATRICK, 1996).

A preocupação com a melhoria da formação de cientista e técnicos levou à elaboração de projetos que culminou com a criação do primeiro grupo de pesquisa, o University of Illinois Committee on School Mathematics (UICSM), em 1951, sob a coordenação do educador matemático Max Beberman, cujo projeto caracterizava-se pela ênfase à precisão da linguagem, aos conceitos e à compreensão como base da habilidade matemática (D’AMBROSIO, 1987; BÚRIGO, 1989).

Em 1958, foi criado o School Mathematics Study Group (SMSG), sob a liderança de Edward Griffith Begle. Participavam desse grupo, matemáticos, professores de matemática, educadores, psicólogos e representantes da comunidade científica e tecnológica, os quais tinham como objetivo maior escrever livros didáticos da Matemática Moderna para o secundário. O material produzido foi testado, publicado e traduzido para quinze línguas diferentes. O SMSG foi indiretamente influenciado pelos trabalhos do grupo Bourbaki (D’AMBROSIO, 1987).

Tomaram parte na redação dos textos do SMSG cerca de 100 matemáticos e 100 professores secundaristas, com a finalidade de que os temas tratados fossem rigorosos tanto do ponto de vista matemático quanto do didático. Durante o período escolar de 1959/1960, 45 estados americanos receberam os textos e manuais para professores, numa experiência que envolveu 400 professores e 42.000 alunos. No transcurso desse período, os professores foram assessorados por matemáticos universitários. Professores, assessores e alguns alunos avaliaram os materiais recebidos, apresentando suas sugestões e críticas, as quais foram analisadas por uma equipe de revisão, composta por 50 professores e 50 matemáticos. Esta equipe realizou diversas alterações, reescrevendo novamente alguns pontos assinalados como complexos e difíceis pelos alunos. Entretanto, essas revisões não alteraram a orientação básica dos textos originais (BROWN, 1963).

Recebendo total apoio do governo e financiamento do NSF, o SMSG elaborou um conjunto de obras para variados níveis de ensino, iniciando suas publicações a partir de 1960. Nelas, apresentava novos conteúdos, assim como modificações na organização e apresentação dos assuntos clássicos. Insistia nas

idéias unificadoras, como o estudo das propriedades comuns de todos os sistemas matemáticos (as estruturas), a Teoria dos Conjuntos (BROWN, 1963).

O SMSG apresentou o estudo da geometria em um curso separado, iniciando pelo desenvolvimento da percepção do espaço. Algumas vezes, integravam a geometria dos sólidos com a geometria plana. Freqüentemente aparecia integrada com a álgebra. Buscava estimular a penetração intuitiva, insistindo particularmente no enunciado exato das definições e teoremas (BROWN, 1963).

O SMSG (1960) adotou o tratamento métrico tipo régua-transferidor, no qual a geometria euclidiana é desenvolvida a partir da noção de número e baseada em propriedades sugeridas pela régua (graduada) e pelo transferidor. Este tratamento, reservado ao ensino secundário, foi apropriado de diversas formulações geométricas desenvolvidas ao longo do tempo, dentre as quais se destacam aquelas elaboradas por Birkhoff.

Em 1925, Birkhoff elaborou as seguintes propostas para explicar fatos geométricos ao leitor não especializado:

a) As medidas de distâncias ao longo da reta podem ser realizadas com a régua.

b) As medidas de ângulos entre retas podem ser realizadas com o transferidor.

c) Dois pontos estão contidos em uma única reta.

d) O plano é igual e ainda semelhante a si mesmo em todas as suas partes (COSTA, 1985, p. 37).

Posteriormente, em 1932, propôs um tratamento métrico para a escola secundária, por meio de um sistema postulacional, em “A set of postulates for plane geometry, base don scale and protractor”. A partir de 1959, o matemático Saunders Mac Lane, no artigo “Metric postulates for plane geometry” colocou em evidência as vantagens do tratamento, alertando matemáticos e professores universitários. Mac Lane aperfeiçoou o sistema de Birkhoff, mas esse sistema ainda não se encontrava adequado para o ensino secundário. O SMSG (1960) apresentou uma variante do sistema numa explicitação compatível com o ensino básico, utilizando noções geométricas como as medidas de comprimento e de

ângulo, de modo simples, procurando retratar de imediato as propriedades comprovadas no espaço físico (COSTA, 1985).

As iniciativas desenvolvidas nos EUA, em especial aquelas efetuadas pelo SMSG, inspiraram o GEEM38 a promover a introdução de novos tópicos no currículo do ensino secundário, os quais normalmente estavam presentes em níveis mais avançados: geometria informal, probabilidades, álgebra e teoria dos números. Os conjuntos aparecem como tema unificador, sendo dada grande ênfase nas estruturas algébricas.

No começo dos anos 60, vários projetos foram consagrados a uma revisão do programa do nível secundário39 norte-americano, e posteriormente, começaram também a investir no ensino elementar. Inicialmente, a disposição dos programas voltava-se especialmente para alunos que reuniam potencial de ingressar na universidade e por conseqüência, aos mais estimulados, mais inteligentes, mais elegantes. Quando o Governo Federal lançou o programa de luta contra a pobreza, os alunos considerados desfavorecidos exigiram recursos para uma reforma de ensino que atendesse a seus interesses. Tratava-se de um desafio muito mais difícil para os reformadores.

As idéias que pareciam bem encaminhadas para High Schools dos subúrbios residenciais vizinhos das universidades com professores entusiasmados e alunos interessados fracassavam freqüentemente quando eles eram aplicados às escolas menos favorecidas (KILPATRICK, 1996, p. 253).

As críticas começaram a surgir e um grande número de pais e educadores passam a acreditar que a Matemática Moderna foi um fracasso. Houve intensa manifestação em prol do regresso aos currículos e métodos anteriores à reforma, o chamado “back to basics”, que se tornou expressão corrente nos manuais e nas instruções oficiais (KILPATRICK, 1996).

38 GEEM: Grupo de Estudos do Ensino da Matemática. Fundado em 1961, tinha como objetivo incentivar o

estudo da Matemática Moderna no Brasil e, uma das principais características do GEEM, foi a de promover cursos de verão como também seminários e palestras durante o ano letivo, para professores de todo o país e de outros países da América Latina.

39 Além do UICSM e do SMSG, destacamos os programas desenvolvidos pela Ball State Teacher’r College,

Boston College Mathematics Institute, University of Maryland Mathematics, dentre outros (D’AMBROSIO, 1987).

Para Kilpatrick (1969), o Movimento da Matemática Moderna não teve seus esforços recompensados nos programas americanos, mas de uma forma ou de outra provocou transformações substanciais na comunidade americana de ensino de matemática. Em particular, aquelas produzidas nos anos 1970 e 1980, em que as tentativas para modernizar o ensino do país foram acompanhadas por um aumento rápido no número de educadores matemáticos e um formidável desenvolvimento de suas atividades de pesquisa.

Além do mais, a reflexão sobre o ensino de Matemática sofreu um avanço significativo nos EUA a partir da segunda metade do século XX. Os americanos participaram ativamente de conferências promovidas pela OECE, em particular aquelas realizadas pelo CIEM, tanto com a pretensão de se informarem sobre as transformações do ensino de Matemática no estrangeiro quanto para apresentarem o que estava sendo feito em seu país. Os professores americanos de Matemática tiveram um papel dos mais ativos na comunidade internacional que se organizou depois dos anos 1950.

De acordo com Kilpatrick (1996), o gosto da experimentação nos EUA é um verniz que esconde um profundo conservadorismo em matéria pedagógica. Esse conservadorismo tem contribuído para congelar ao longo dos anos as veleidades dos programas de reforma. O prestigioso “National Advisory Committee on Mathematical Education” (Comitê Nacional de Consulta para o Ensino de Matemática) depois de ter examinado o andamento da reforma da Matemática Moderna, chegou à conclusão que “o impacto real foi modesto com relação ao que era esperado”, ou seja, a melhoria do ensino por meio da introdução de noções de Matemática Moderna. Para confirmar suas palavras Kilpatrick, busca auxílio em Peter Hilton, para quem a Matemática Moderna teria agradado apenas cerca de 15% dos alunos americanos (1996, p. 255).

As falhas na estrutura dos programas expressos na organização geral dos cursos e nas práticas de ensino ao longo da história do ensino de Matemática não marcam o início de uma reforma de ensino. Em compensação, elas assinalam, desde os primeiros anos do século XX (primeira reforma)40 a emergência de uma

40 A primeira década do século XX apresentou-se como crucial para discussões sobre o ensino de

Matemática norte-americano. Jacob Willian Albert Young e David Eugene Smith foram os principais nomes que se consagraram no desenvolvimento da pedagogia Matemática americana.

comunidade de educadores em Matemática e nos anos 1955-1970, a consolidação dessa comunidade (KILPATRICK, 1996).

No documento APARECIDA RODRIGUES SILVA DUARTE (páginas 100-105)