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O nível cognitivo das perguntas formuladas

CAPITULO IV Lendo contos na sala de aula

TOTAL DE SEQUÊNCIAS

2. A formulação de perguntas

2.2. A pergunta didáctica na interacção verbal

2.2.1. O nível cognitivo das perguntas formuladas

Foi sobre perguntas de exame, a que acima vimos Searle referir-se, que, no fim da década de 50 do século passado, se deu um importante avanço nesta reflexão.

É em 1956 que Bloom e seus colaboradores publicam a Taxionomia dos Objectivos Educacionais, obra que influenciou a reflexão sobre perguntas, no domínio pedagógico, até aos anos 70.

Construído empiricamente, a partir de questões efectivamente formuladas em exames e testes de diferentes disciplinas21, o sistema de classificação apresenta, no domínio cognitivo, um número limitado de categorias, de acordo com o tipo de capacidade que se supunha ser necessária para a resolução de uma dada tarefa. Assim, atendendo ao processo cognitivo requerido, identificam- se perguntas de conhecimento, de compreensão, de aplicação, de análise, de síntese e de avaliação (Bloom, 1979).

Algumas críticas foram sendo, entretanto, formuladas a esta taxinomia: o carácter vago ou demasiado amplo da definição de categorias que, entre si, não são mutuamente exclusivas; a heterogeneidade de princípios a que parece obedecer a sua definição; a sua pouco clara fundamentação psicológica22.

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Dillon nota, aliás, que a discussão se torna inviável quando o aluno tem receio de falar abertamente ou quando o professor não valoriza as suas opiniões (Dillon, 1984).

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A ideia da sua realização surge em Boston, em 1948, numa reunião de examinadores do ensino superior que participavam num congresso do American Psychological Association e teve, como intenção inicial, a elaboração de um documento de trabalho simples, permitindo distribuir as questões de exame segundo uma classificação aceite por todos os examinadores. (Cf. Bloom et al, 1979 e Landsheere, V e G, 1977.)

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Sobre essas limitações, consultar, entre outros, Bloom et al., 1979:1-21, Gall, 1970:707-721 e Landsheere, 1977:72-94.

Uma outra limitação, reconhecida pelos próprios autores da Taxionomia dos Objectivos Educacionais, prende-se com a incerteza quanto à determinação dos processos cognitivos de facto requeridos na resposta a uma dada questão, já que o nível a que o aluno opera é decorrente das suas experiências anteriores23.

Ao trabalho pioneiro de Bloom, sucedem-se outras propostas de análise e classificação de perguntas que, atendendo ao seu nível cognitivo, propõem categorias gerais, não considerando, regra geral, nem o conhecimento prévio do aluno quanto ao assunto especificamente questionado, nem o contexto específico desse questionamento.

Gall, num artigo publicado em 1970, aponta algumas destas falhas: “it would seem preferable to identify questions which are effective for a specific curriculum and classrom setting rather than to search for general question types” (Gall, 1970:711).

Fazendo a revisão sobre estudos realizados, desde os anos 20, relativos a questões formuladas oralmente pelo professor, a autora constata a acentuada ênfase colocada em questões de evocação de informação factual24., isto é, de “evocação”.

A tentativa de compreensão dos processos cognitivos mobilizados pela pergunta didáctica tentará, desde então, acompanhar os avanços entretanto ocorridos designadamente no âmbito da psicologia25. Sem entramos no debate sobre os níveis cognitivos que a pergunta pressupõe, registamos ser hoje relativamente consensual a identificação de dois níveis de perguntas: perguntas

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Diz Bloom que “ (...) uma das principais dificuldades na categorização de itens ou questões de testes é a de que é necessário, em todos os casos, conhecer-se ou considerar-se a natureza das experiências educacionais anteriores dos examinandos. Isto porque, se a situação é nova, o problema pode requerer um tipo muito complexo de comportamento para a solução de problemas, enquanto o mesmo problema pode requerer um simples tipo de recognição ou memória, se o indivíduo possui experiências anteriores de aprendizagem, nas quais vários problemas do mesmo tipo foram estudados e analisados. ” (Bloom, 1979: 18- 19).

Sobre este mesmo assunto, conclui Landsheere: “Quand on pose la question: «Quelle est la formule de l’acide sulfurique?», il y a un monde entre celui qui découvre la réponse par ses recherches personnelles et celui qui la restitue de simple mémoire. Pourtant, dans les deux cas, les réponses peuvent être les mêmesJ Une telle remarque s’applique à toute la taxonomie. Aussi, ne peut-elle être utilisée significativement en dehors d’un contexte psychologique précis et, idéalement, individuel.”(Landsheere, 1977 :80)

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“The findings in studies on techers’questioning practices are fairly consistent (...) It is reasonable to conclude that in a half-centuary there has been no essential change in the types of questions which teachers emphasize in the classroom. About 60% of teachers’ questions require students to recall facts; about 20% require students to think; and the remaining 20% are procedural“(Gall, 1970:713).

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Lembremos que, um ano depois da publicação da Taxionomia dos Objectivos Educacionais, se publica a obra Verbal Behaviour de B. F. Skinner.

A crítica que virá a ser, posteriormente, feita à teoria behaviourista da aprendizagem terá reflexo no âmbito da investigação sobre perguntas que aqui referimos.

de baixo nível cognitivo, “mobilizando processos cognitivos relativamente simples, apelando a conhecimentos básicos da criança e à sua memória”, e questões de nível cognitivo elevado, “promovendo processos cognitivos complexos como a capacidade para inferir, especular, fazer sínteses, etc.” (Martin, 1991:211)26

Desenvolvimentos da Linguística (designadamente no domínio da Sociolinguística e da Pragmática) e da investigação sobre a Interacção Verbal, virão, também eles, contribuir para que, no âmbito da Didáctica a reflexão sobre a pergunta em sala de aula possa ser aprofundada.

É assim que, a par do aspecto cognitivo acima focado, a pergunta passa a ser analisada, segundo novas dimensões., dando origem a diversas tipologias.

No entanto, “O problema da tipologia das perguntas deve, ele próprio ser considerado no quadro de uma tipologia das interacções, dado que cada género de «diálogo» implica modalidades específicas de questionamento” (Kerbrat- Orecchioni, 1991:18-23).

Não poderíamos, certamente, analisar do mesmo modo, perguntas formuladas em sala de aula, e as que, num tribunal, são feitas durante um julgamentoJ

É atendendo ao seu uso, em sala de aula, que procuraremos agora reflectir sobre as perguntas.