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3. Actores e interacções: a experiência da leitura partilhada

3.2. Os adultos envolvidos

3.2.1. O papel do bibliotecário e do professor

No projecto inicial estavam já previstas atribuições a cada um destes actores institu- cionais, precisamente no que se refere à sua representação institucional. Mais do que atri- buições, seriam as expectativas que se pensava poderem concretizar-se em trabalho efec- tivo para a realização do Projecto46

“As Escolas Secundárias do Concelho do Seixal disponibilizarão a colaboração dos professores res- ponsáveis pelas bibliotecas escolares para a leitura, selecção e sugestão de obras para as sessões a realizar na Biblioteca Municipal. Será ainda a partir da sugestão dos professores que será estabeleci- do o dia semanal e a hora em que as sessões decorrerão.

candidatado à Fundação Calouste Gulbenkian que se explanavam:

De acordo com as suas possibilidades e recursos as escolas:

 Disponibilizarão espaços para a divulgação dos materiais informativos e promocionais da ini- ciativa.

 Facultarão aos jovens acesso a espaços e equipamentos para o desenvolvimento do projec- to.

Concretamente aos professores coordenadores das bibliotecas escolares das escolas secundárias competirá:

44

CHARTIER, Anne-Marie – Enseignants et bibliothécaires de la Libération à l’an 2000: entre transmission et mediation. Lisboa, 2004 (texto policopiado)

45

PETIT, Michèle – “Porquoi inciter des adolescents à lire de la littérature?” in Bulletin de Bibliothèques de

France. Paris: BBF, 2003. T. 48, Nº 3 (Fevrier 2003), pp. 29-35

46

SANCHES, Tatiana ; SILVA, Vera – Passa a Palavra : grupos de leitura, leitura em antena. Seixal: Biblioteca Municipal, 2003 (texto policopiado).

 Reunir com os técnicos da Biblioteca Municipal periodicamente para avaliar o desenvolvimen- to e impacto do projecto.

 Fazer sugestões das obras para os grupos de leitura.

 Divulgar e fazer divulgar na sua escola a iniciativa «Passa a Palavra».  Assegurar o processo de eleição das obras para o projecto.

 Promover as inscrições, através da Biblioteca Escolar, dos alunos da sua escola.

 Dinamizar o corpo docente da sua escola relativamente à promoção da leitura das obras escolhidas para a iniciativa junto dos seus alunos.

 Obter a cooperação dos professores para eventuais apoios aos jovens na produção de con- teúdos para a rádio, a internet e os CD-Roms.

 Concertar esforços no sentido de efectuar a emissão do programa «Passa a Palavra»: leitura em antena” na sua escola, nomeadamente cooperando com o(s) professore(s) responsá- vel(eis) pela rádio escolar.

 Colaborar no processo de avaliação do projecto.”

Estas atribuições, como se depreende, estão intimamente ligadas a um papel facili- tador do professor responsável pela Biblioteca Escolar, que não só favorece uma articula- ção com a Biblioteca, por já existir uma relação prévia, através do Serviço de Apoio às Bibliotecas Escolares, como a um papel interventor junto da comunidade escolar potencial- mente participante na iniciativa: alunos frequentadores da B.E. e outros professores interes- sados em colaborar.

No caso da bibliotecária responsável pelo Projecto, existiu igualmente um enqua- dramento institucional que, à partida, condicionava a sua actuação. Vejamos pois como se perspectivavam inicialmente as suas competências:

“A Biblioteca Municipal, delegada pela Câmara Municipal do Seixal como promotora deste projecto, deverá ter uma atitude proactiva, quer na promoção da leitura para jovens, através da realização das acções complementares para a concretização do projecto «Passa a Palavra».

Competirá à Biblioteca Municipal, enquanto entidade responsável pela coordenação do projecto:

 Fazer o acompanhamento geral da iniciativa

 Estabelecer os contactos necessários com a Fundação Calouste Gulbenkian  Estabelecer os contactos necessários com a Rádio Baía

 Estabelecer os contactos necessários com as escolas

 Convidar os autores, fazer o seu acolhimento e acompanhamento e, sempre que necessário, assegurar o transporte dos mesmos

 Colaborar no processo de selecção das leituras para as sessões dos grupos de leitura  Proceder ao controle das inscrições dos grupos de leitura

 Proceder às aquisições das obras para os grupos de leitura

 Fazer-se representar por um técnico em todas as acções específicas decorrentes deste projec- to, sempre que se justifique.

 Propor as maquetas das edições do material de divulgação da iniciativa, nomeadamente: des- dobrável, cartaz e marcador de livros

 Assegurar a divulgação e promoção da iniciativa através dos meios habituais para o efeito e através da página da Internet da Câmara Municipal do Seixal.

 Estabelecer as articulações necessárias com os serviços municipais cujo apoio possa ser necessário ao desenvolvimento do projecto.

 Disponibilizar espaços para a realização das sessões e, se necessário, para o trabalho dos grupos.

 Facultar acesso a computadores e gravadores de CD-Rom para a concepção e reprodução dos conteúdos electrónicos

 Recolher elementos para a avaliação do projecto.

 Produzir o relatório de execução do projecto e enviá-lo para a Fundação Calouste Gulbenkian no final do mesmo”47

Repare-se que neste caso, o papel da bibliotecária está desvanecido no que são as atribuições da instituição Biblioteca Municipal.

.

Verifiquemos então, à luz das ideias expostas por Anne-Marie Chartier e por Michèle Petit, quais serão as atribuições destes profissionais na relação que estabelecem, enquanto facilitadores desse contacto, entre os jovens e a leitura.

Estes dois autores abordam, sobre perspectivas diferentes estas questões comuns. De facto, Anne-Marie Chartier aborda numa perspectiva histórica as recomendações de leitura num âmbito escolar, usando como exemplo a lista de obras indicadas para leitura no programa da língua materna em França, debruçando-se sobre esta problemática de forma muito abrangente, mostrando que desde a Revolução Francesa existem discursos comuns a estes profissionais até aos dias de hoje, mas práticas diferentes daquelas que são preco- nizadas:

“Derrière l’unanimité de discours officiels globalement acquis à la modernité et à la variété des goûts subjectifs, s’est révélée la permanence d’écarts caractéristiques de deux profission” 48

47

SANCHES, Tatiana; SILVA, Vera – Op. cit. 48

CHARTIER, Anne-Marie – “Enseignants et bibliothécaires de la Libération à l’an 2000: entre transmission et mediation”. Lisboa, 2004, p. 5

E mais à frente:

“L’objectif de cet article est d’axaminer ce neud en revenant sur l’histoire:les modèles de la lecture prônes d’une part dans l’école et d’autre part dans la bibliothèque ont été longtemps condraditoires.”

A autora, ao desenvolver o seu pensamento sobre as atitudes subjacentes à apre- sentação / recepção desta lista de obras recomendadas, extrapola deste conceito para outros mais amplos, referindo as atitudes globais dos profissionais relativamente às práticas de leitura dos jovens, sejam estas mais ou menos activas, mais ou menos implicadas. De facto, reflecte sobre as alterações sofridas no modelo de ensino, que foi alterando a sua focalização, desde o papel de protagonista dado ao professor, passando pela importância dada aos conteúdos da aprendizagem, até aos dias de hoje, em que o modelo é centrado no aluno. As práticas de leitura sofreram elas próprias alterações (ainda que não estejam mutuamente excluídas na actualidade), desde a leitura “obrigada, vigiada, acompanhada ou livre”, o que acompanhou os discursos oficiais sobre como deveria ser “dirigida” a leitura.

Já Michel Petit se refere a estes profissionais, bibliotecário e professor, a partir de uma observação do jovem e das implicações sociais e culturais que a leitura pode empres- tar à construção deste ser em crescimento. Não obstante, existem pontes entre estas duas propostas de observação dos papéis que analisaremos. Em concreto, veremos agora como estes autores caracterizam cada um destes profissionais.