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2.2. A EJA NA SEEDF E SEU PROCESSO AVALIATIVO

2.2.2 O processo avaliativo e a organização do trabalho pedagógico na EJA

O Currículo em Movimento da Educação Básica – EJA (2014), afirma que a avaliação deve ser contínua e processual, estabelecendo a autonomia dos/as educandos/as por meio de um trabalho reflexivo “sobre sua prática educativa, seus saberes e a (re) significação desses saberes dialogados com novos conhecimentos” (DISTRITO FEDERAL, 2014a, p. 25).

Segundo as Diretrizes Operacionais da EJA (2014), a avaliação escolar nessa modalidade deve “encorajar, orientar, informar e conduzir os estudantes em uma perspectiva contínua e formativa com vistas às aprendizagens” (DISTRITO FEDERAL, 2014b, p. 50).

Estas diretrizes reforçam a centralidade da avaliação na organização do trabalho pedagógico e sua intencionalidade sociopolítica, com foco nos sujeitos sociais e compromisso com a educação: em e para os direitos humanos, a diversidade, a cidadania e a sustentabilidade. Deve visar uma educação integral que propicie a autonomia e a inserção social dos/as educandos/as (DISTRITO FEDERAL, 2014c).

Dessa forma, a avaliação das aprendizagens (voltada para o desenvolvimento dos educandos), por ser uma categoria do processo pedagógico e um componente integrador dos

objetivos sociais e institucionais, precisa ser inclusiva e possibilitar a “democratização do conhecimento e a constituição de uma práxis educativa libertadora” (FREITAS, 2008, p. 58).

Por esta razão, a organização do trabalho pedagógico – dentro de uma instituição de ensino que dialogue com uma concepção de emancipação dos sujeitos – precisa contrapor-se a uma abordagem tradicionalista de ensino que privilegie e difunda o pensamento hegemônico, além de legitimar os mecanismos de dominação dos menos afortunados social e culturalmente. Urge, assim, transformar jovens, adultos/as e idosos/as trabalhadores/as, populares e oprimidos/as em cidadãos/as críticos/as e autônomos/as, considerando as lutas travadas pelo direito à educação, ao trabalho, à justiça e ao reconhecimento.

E, embora exista um consenso normativo entre os estudiosos da avaliação educacional sobre o ato de avaliar, ainda existe no chão da escola uma dissonância pragmática entre o “saber da ação” – teoria – e o “saber em ação” – prática – (CHARTIER, 2007), que dificulta sobremaneira o desenvolvimento de uma prática educativa com finalidade formativa, especialmente na EJA, que demanda formação específica e maior sensibilidade. Em se tratando de jovens e adultos, é preciso considerar sua condição de sujeitos trabalhadores, excluídos social, cultural e economicamente, possuidores de saber de experiência feito – o saber do senso comum –, tão peculiar quanto o seu viver, mas que não é valorizado pela comunidade acadêmica, que valoriza os conhecimentos científicos mais do que os adquiridos ao longo da vida.

De forma correlata, Arroyo (2017) reporta que as práticas avaliativas na EJA são inadequadas ao seu público-alvo, essencialmente por elas não se adequarem ao perfil socioeconômico-cultural e às possibilidades e necessidades reais dos/as educandos/as. Na percepção do autor, a avaliação deve considerar as autoimagens pessoais e coletivas de classe e raça, valorizando “as resistências e os esforços para construir imagens mais positivas em outros projetos de cidade, de campo, de sociedade” (ARROYO, 2017, p. 37).

Considerando a organização do trabalho pedagógico desenvolvido na EJA, Oliveira (2007) aponta como inadequados: a proposta única para todo o país, a organização e a seleção de conteúdos trabalhados sem uma aplicabilidade prática, o fato dos objetivos e dos conteúdos não se atrelarem às situações da vida cotidiana dos/as trabalhadores/as, a linguagem utilizada pelos educadores – que gera dificuldade de comunicação e, consequentemente, a não aprendizagem –, a infantilização dos/as educandos/as, o processo avaliativo que não contribui para o desenvolvimento da consciência crítica, a prática do dever de casa, e o excesso de cientificidade da proposta curricular, que não dialoga com a vida cotidiana e com as práticas

advindas desse estar no mundo, nem com os saberes, desejos e expectativas desses sujeitos populares.

Na ótica de Oliveira (2007), uma das problemáticas do trabalho pedagógico desenvolvido na EJA reside na concepção dominante sobre o desenvolvimento da aprendizagem, que, numa visão tradicionalista, ocorre numa concepção de ‘árvore do conhecimento’ – em que o processo é linear, sucessivo e cumulativo; adquirido e construído externamente, devendo seguir uma sequência (do mais simples ao mais complexo). Numa concepção progressista (visão crítica e emancipadora) de educação, o processo deve ocorrer em rede – por meio de experiências prévias que vão se tecendo socialmente às novas informações, ressignificando as já adquiridas, sem previsibilidade ou obrigatoriedade de seguir os processos formais de ensino-aprendizagem.

Assim, o processo de aprendizagem dos sujeitos educativos ganha sentido próprio, na medida em que há uma conexão com os interesses, crenças, valores e saberes dos/as educandos/as. Da mesma forma, aprender pressupõe atribuir sentidos e valores ao que é ensinado, o que vai se concretizando na conexão entre interesses, crenças, valores e saberes ensinados. E, em se tratando de jovens, adultos/as e idosos/as da EJA, há uma multiplicidade de contextos a serem valorizados, demandando trajetos diversificados, que o trabalho pedagógico e a avaliação podem contemplar.

Vilar e Anjos (2014) reforçam, dentro de uma abordagem dialógica, crítica e reflexiva, que a proposta pedagógica da EJA deve ser multicultural – capaz de acolher as diversidades – , contemplando: os aspectos cognitivos; a subjetividade; o conhecimento social, político e cultural, tão essenciais à formação humana; uma carga horária melhor distribuída; conteúdos selecionados de acordo com a realidade dos sujeitos educativos, com o intuito de prepará-los para o exercício da cidadania, para o mundo do trabalho e estudos posteriores; atividades (desenvolvidas apenas em sala de aula) e avaliação mais flexíveis.

O Currículo em Movimento da EJA (2014) ressalta a importância de um trabalho organizado de forma transversal e integrado aos três eixos norteadores da modalidade, considerando os tempos e espaços, as diferenças geracionais, a diversidade cultural, social e econômica desses sujeitos, bem como suas trajetórias e histórias de vida. Ainda de acordo com esse documento, a avaliação voltada para as aprendizagens deve ser associada à avaliação informal (autoavaliação, valores e juízo de encorajamento) e outros formatos que forem definidos no Projeto Político Pedagógico das escolas, de forma “construtiva, colaborativa e não punitiva e excludente” (DISTRITO FEDERAL, 2014a).

As Diretrizes Operacionais da EJA apresentam como formas de avaliação: a autoavaliação, a avaliação por pares, portfólio/EaD webfólio ou portfólio virtual, registros reflexivos, seminários, pesquisas e trabalhos em grupo, testes e provas – até 50% da nota (numa perspectiva formativa). Essas modalidades de avaliação são ratificadas nas Diretrizes de Avaliação Educacional (2014).

Diante do exposto, têm-se que a Educação de Jovens e Adultos precisa ser reconfigurada, o que, na visão de Oliveira (2007) e Arroyo (2007; 2017), é possível. Para Oliveira (2007), essa reconfiguração curricular deve visar a: a superação do formalismo e do cientificismo dos currículos; a participação prévia de toda a comunidade escolar na seleção e organização dos conteúdos; a potencialização da aprendizagem por meio de redes de poderes, saberes e fazeres; o respeito à diversidade; a não fragmentação do conhecimento em matérias ou disciplinas – sem privilégios de uma sob a outra –; a transversalidade entre as áreas do saber; o aprimoramento das competências argumentativas; uma formação técnica e política que possibilite a transformação social por meio da ressignificação dos saberes.

Na concepção de Arroyo (2007), as turmas devem ser agrupadas de acordo com as proximidades de trabalho, de “experiências sociais próximas de trabalho” (ARROYO, 2007, p. 46), para que se conceba uma estrutura curricular e um processo avaliativo que dialoguem com as especificidades e saberes de suas vivências cotidianas. Principalmente porque “o trabalho é a vivência mais forte nesses processos de sua formação” (ARROYO, 2007, p. 47), uma vez que trazem desde a infância os traços dessa identidade trabalhadora, marcada por experiências individuais e familiares de sujeitos que sobrevivem do trabalho.