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O processo de profissionalização da gestão na empresa familiar

2. AS EMPRESAS FAMILIARES E A GOVERNANÇA CORPORATIVA

2.1 Empresas familiares

2.1.5 O processo de profissionalização da gestão na empresa familiar

A ideia de profissionalização da gestão está há muito tempo presente nos trabalhos de diversos estudiosos. Conforme evidencia Gonçalves (2000), o economista austríaco Joseph Schumpeter afirmava que o progresso econômico demandava a atuação de um grupo de especialistas e que o desenvolvimento técnico levava a um processo cada vez mais coletivo e, consequentemente, despersonalizado. Schumpeter vislumbrou a unidade industrial cada vez mais gigantesca, perfeitamente burocratizada, tomando o espaço das pequenas e médias empresas e reduzindo gradativamente o empresário à condição de assalariado.

Peter Drucker, ao relacionar a burocracia competente com a organização moderna, caminha na mesma direção ao propor a substituição do magnata pelos técnicos e administradores profissionais como dirigentes da empresa privada. Assim, percebe nos executivos e nos administradores profissionais os novos líderes, exercendo uma liderança baseada na competência. Alimentada por esta linha de pensamento, a empresa familiar recebeu um estigma que iria marcá- la pelas décadas seguintes: o da incompetência pressuposta (GONÇALVES, 2000).

Para Chandler (1962, 1977), a necessidade de profissionalização das empresas consolidou-se a partir do desenvolvimento do sistema capitalista moderno e da evolução dos modelos organizacionais, que passaram a exibir configurações cada vez mais complexas, como a empresa

multidivisional. Assim, ao caminhar da pequena empresa gerida pelo proprietário para a empresa moderna e multidivisional, desponta a classe de dirigentes assalariados, guiando a “mão visível da administração”, proposta por Chandler, em contraposição à mão invisível das forças de mercado, de Adam Smith.

Na trajetória das empresas familiares, principalmente na fase de fundação, é comum que as empresas apresentem uma estrutura administrativa mais enxuta e fortemente centralizada na figura do fundador, que toma todas as decisões na organização. Porém, à medida que a empresa se desenvolve, assume maior complexidade, demandando novas competências e a reestruturação de seus processos organizacionais, culminando com o processo de profissionalização. Na visão de Pádua (1998), o processo de profissionalização inicia-se a partir do momento em que a organização deixa de ser enxergada pelos seus dirigentes apenas como "um negócio da família" para consolidar-se como uma empresa profissional.

Nesse sentido, a profissionalização da gestão das empresas familiares seria para Lodi (1993) o processo pelo qual os gestores da organização tradicional ou familiar adotam práticas administrativas mais racionais, modernas e despersonalizadas; assumem determinado código de formação ou de conduta; passam a substituir métodos intuitivos por métodos impessoais e racionais; e superam as formas de contratação de trabalho arcaicas ou patriarcais, passando a adotar as formas assalariadas.

Igualmente influenciada pelo princípio racional-legal weberiano, a definição de Rocha (2001) apresenta a profissionalização como um processo evolutivo que leva a organização a um nível mais elevado de formalidade, que pode ser traduzido em termos do desenvolvimento da estrutura organizacional. Assim, o processo de profissionalização se assemelharia ao processo de burocratização, proposto por Weber, com a figura do administrador profissional prevalecendo sobre o administrador patrimonial, melhor delimitação da autoridade na organização, exigências de qualificação para preenchimento de cargos na empresa e maior documentação das ações administrativas.

É válido destacar a visão de Floresta (1999), que percebe a profissionalização representada por duas grandes frentes de ação: o processo de delegação de responsabilidades; e o grau de formalização dos mecanismos utilizados para o controle das atividades no interior da empresa.

Dessa forma, o processo de profissionalização é apreendido como o caminho pelo qual as estratégias de coordenação de atividades e esforços organizacionais adotados vão se formalizando, à medida que a empresa vai passando pelas diferentes fases de crescimento. Conforme apontam Davel e Colbari (2000), muitos estudos buscam identificar a conexão entre a profissionalização e o ciclo de vida da organização. Dessa forma, a profissionalização toma a direção de um processo inevitável nas empresas familiares, decorrente da necessidade de os gestores melhor estruturarem o âmbito operacional ou, ainda, a fim de propiciar o adequado planejamento e a apropriada condução do processo sucessório em tais organizações. Neste contexto, a profissionalização da gestão pode representar uma alternativa de sobrevivência diante de problemas no processo de sucessão, como a ausência de sucessores capazes ou interessados em assumir a gestão.

Chittor e Das (2007), a partir de estudos em empresas indianas, defendem a profissionalização da gestão como uma etapa fundamental para um processo sucessório bem sucedido. Para os autores, a opção por profissionais não familiares para o preenchimento dos cargos de gestão da organização é justificável ao se considerar a existência de diversos executivos de mercado, com competência similar ou, muitas vezes, superior aos membros familiares. Os autores argumentam que a sucessão profissional da gestão aumentaria a performance e a longevidade da organização. Assim, a contratação de um profissional não familiar seria capaz de solucionar disputas entre membros familiares para os cargos de gestão, além de imprimir uma nova dinâmica à organização, ao separar gestão e propriedade.

Outro ponto tratado por Chittor e Das (2007) diz respeito ao momento ideal para o início do processo de profissionalização da gestão. Os primeiros anos de uma organização familiar são descritos pelos autores como a fase em que a empresa precisaria mais do impulso empreendedor presente na figura de seu fundador do que de habilidades gerenciais. Porém, a partir do desenvolvimento e expansão do negócio a necessidade de maior capacitação gerencial vai tornando-se cada vez mais crítica, sinalizando o momento apropriado para iniciar o processo de profissionalização da gestão da organização.

pode, e é preferível que seja iniciado pela seleção dos membros da própria família com interesse e perfis adequados para se profissionalizarem. Assim, caso seja possível inserir e preparar os membros da família para assumirem as atividades de planejamento, organização, direção e controle das ações organizacionais, seria dado um passo fundamental para a preservação dos valores e das características familiares da empresa.

Diante das exigências de um mercado cada vez mais competitivo, a profissionalização da gestão tornou-se um imperativo, sendo que no caso da empresa de controle familiar essa decisão implica a preparação dos herdeiros e dos grupos familiares envolvidos, a fim de possibilitar que esses indivíduos desenvolvam a visão e as ferramentas indispensáveis para nortear sua compreensão acerca de questões complexas nas esferas da família, da propriedade e da empresa. Para Aires (2003),

[...] a questão da profissionalização não pode ser abordada de maneira superficial. Não se trata apenas de retirar da diretoria os herdeiros, ou representantes das diversas famílias, e contratar no mercado de trabalho, executivos para assumirem suas posições. Nada disso vai adiantar se os ‘donos’ não souberem conduzir a sociedade a uma visão comum, ou se não conseguirem se afastar do dia-a-dia da empresa sem abandoná-la. (AIRES, 2003, p. 149).