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2. AS EMPRESAS FAMILIARES E A GOVERNANÇA CORPORATIVA

4.3 A Fábrica de Café

4.3.2 Sucessão na Fábrica de Café

Embora a Fábrica de Café tenha menos de uma década de existência, é importante considerar a tradição no segmento cafeeiro das duas famílias vinculadas ao negócio. A Figura 9 apresenta, de forma resumida, a trajetória das diferentes gerações de cada família empresária na atividade cafeeira.

Figura 9 – As famílias empresárias e sua tradição no café

Fonte: elaborado pelo autor.

A datas apresentadas na Figura 9, relacionadas à trajetória da família Guimarães, dizem respeito aos seguintes marcos:

1850 – início da atividade cafeeira pelo bisavô do atual dirigente da Fábrica de Café. 1970 – expansão do negócio pela segunda e terceira gerações da família, representadas

pelo avô, pai e tios do atual dirigente da Fábrica de Café.

1991 – criação da exportadora de café, que atualmente exporta para mais de 40 Países, elevando a família para uma posição destacada no ranking brasileiro de produção e exportação de café.

As datas referentes à tradição no café da família Albuquerque, destacadas no outro eixo da Figura 9, remetem a:

1949 – data que marca a fundação da primeira torrefação de café da família, iniciada pelo avô de um dos atuais dirigentes da Fábrica de Café, partindo em seguida para o comércio de café cru.

1984 – aquisição da primeira indústria de café gerida pelo avô e pela segunda geração da família empresária.

1996 – expansão e projeção nacional do negócio, representado pelo lançamento de novos produtos, com destaque para o capuccino.

2000 – venda da torrefação de café a um grupo israelense, antes da entrada da terceira geração no negócio;

2003 – as duas famílias se unem para o planejamento da nova Fábrica de Café, em sociedade.

2004 – a nova fábrica é inaugurada, sob o comando de dois dirigentes familiares, sendo um dirigente pertencente à 3ª geração da família Albuquerque e outro dirigente membro da 4ª geração da família Guimarães.

Em relação ao interesse pelo setor cafeeiro, os dois dirigentes relataram o contato na infância com os empreendimentos da família como um dos fatores que influenciaram sua predileção pela área.

(192) “O contato que eu tive era pra ir lá pra fazer bagunça, entendeu? [...] Era uma coisa assim... Eu nasci em 1984 e [a torrefação do meu avô] foi adquirida em 1984. Então minha infância foi toda lá, eu desde pequeno tava lá. Toda sexta-feira eu saía da aula e ia pra lá, ficava lá... Como meus pais trabalhavam de oito da manhã, até as dez da noite, eu ia pra lá pra ficar com eles, ficar lá... Então eu tinha muito dessa... Dessa

paixão mesmo por aquela empresa que eu vi crescer. Vi a construção de todos os

prédios. Participei da instalação do maquinário, meu pai ia lá e me levava com ele. Então tinha muito... As festas todas que tinham na empresa... Então eu participei muito disso.” (E10).

(193) “Eu acho que o primeiro ponto que eu comecei a ser obrigado a viver o café foi por causa de uma rebeldia de adolescência. Eu fui forçado a... Eu fui corrigido pelo

meu pai trabalhando, ao invés dele me bater, ao invés dele agir de outra forma... Ele

falou: ‘Não! Já que você tá fazendo errado, eu vou te ensinar é trabalhando pra você ser homem!’. Eu aprendi a ir pro campo, aí eu fui aprendendo e fui tomando gosto por

aquilo. E aí eu comecei a ver alguns desafios. Desafio de aprender a como plantar o

mundo era grande, que ele tinha um grande potencial, investi muito nisso e colhi frutos disso tudo.” (E09).

Neste ponto, é possível evidenciar como a experiência dos atuais dirigentes com os negócios da família foi marcante e influenciou sua opção de carreira. O entrevistado pertencente à família Albuquerque atrela sua presença na empresa da família durante a infância como um verdadeiro passatempo, em que a fábrica do avô representava um local para “fazer bagunça” e manter maior contato com os pais. Também fica claro que com o tempo foram desenvolvidos laços de afeto e de identificação com o negócio, reforçados pela expressão “paixão mesmo por aquela empresa que eu vi crescer”, destacada no fragmento (192).

Paralelamente, o outro dirigente ressalta seu contato “forçado” na adolescência com a fazenda de café da família como um elemento de forte influência para sua posterior inserção no universo do café. Como punição, devido ao mau comportamento, o jovem sucessor foi proibido de realizar uma viagem a lazer nas férias, sendo enviado pelo pai para trabalhar na lavoura de café. A despeito do risco de desenvolver aversão ao trabalho no setor cafeeiro, devido ao caráter forçado do primeiro contato, o dirigente percebeu a experiência como positiva, responsável por descortinar os diversos “desafios” inerentes à atividade econômica da família.

Outro fator de forte influência para a continuidade da tradição familiar no setor cafeeiro foi o incentivo dado aos sucessores pelos pais e pela própria atmosfera do ambiente familiar. Quando questionado sobre os principais assuntos recorrentes no dia a dia da família e nas reuniões nos finais de semana, um dos gestores afirma:

(194) “Era só negócio... Era só negócio... Só discussão de negócio. Era só discussão de empresa. Impressionante.” (E10).

A figura da mãe é apontada como detentora de forte influência em relação tanto à formação e educação dos sucessores quanto como um suporte emocional diante da rotina da empresa. Ao serem questionados sobre o papel desempenhado pela mãe, os entrevistados afirmam:

(195) “Minha mãe se preocupou. Eu nem fiz terceiro ano, fiz direto escola técnica de formação gerencial. Então sempre teve essa visão. Naquela época já falava: ‘Independente do que você quiser ser, médico ou o que for, saber gerenciar a empresa é

fundamental. Você vai ter a sua empresa’. Sempre teve esse diálogo de ter seu

negócio próprio, de empreender.” (E10).

(196) “Acaba que ela não é uma conselheira da operação, mas de certa forma ela é um

suporte nosso no dia a dia, na rotina da organização, pra gente vir trabalhar. Nos

desafios mais fortes que nós temos, ela está sempre apoiando, sempre buscando nos apoiar pra fazermos da melhor forma possível.” (E09).

Até mesmo a separação dos pais é assinalada como uma experiência que influenciou profundamente o espírito empreendedor dos sucessores da família Guimarães.

(197) “Nós fomos obrigados a lutar pelo nosso futuro, porque nossos pais

separaram muito cedo. Meu pai casou de novo. Então a história real é essa. Nós vimos

a coisa de uma forma... Nós temos que lutar pelo que é nosso, porque nós não temos mais ninguém mais pra lutar por nós. Porque minha mãe separou do meu pai. Agora a maior parte dos bens já é da outra família, nós temos que aprender a trabalhar senão nós estamos ferrados no futuro. E a nossa forma de criação foi essa, muito mais aberta, muito mais solta, muito mais pro mundo do que pra dentro de casa.” (E11).

Diante de um universo familiar permeado por assuntos relacionados à gestão dos negócios da família, a decisão por uma carreira relacionada ao segmento cafeeiro é percebida como natural pelo dirigente membro da família Albuquerque, conforme evidenciado no trecho (198). Já para o gestor integrante da família Guimarães a identificação com o negócio representa um fator de grande importância para o seu sucesso.

(198) “Foi mais natural... Eu, depois do curso técnico de administração, fui fazer engenharia. Mas sabe aquele negócio que você começa desde pequeno a viver o dia a

dia de empresa? Então saber de empresa, dia a dia de empresa, problema de empresa

foi sempre uma discussão que teve dentro de casa. Então foi uma coisa que eu vivi.” (E10).

(199) “Eu acho que o primeiro passo pra você dar certo é você estar envolvido em tudo. É a primeira palavra. E depois de você estar envolvido, você estar comprometido. Estando envolvido e estando comprometido, você já consegue ter, vamos falar assim, 60% do seu sucesso, os outros 40% é gostar do negócio. Não adianta só você querer,

você tem que gostar. Eu sempre gostei muito do café, do mundo do café. Eu nasci aqui dentro.” (E09).

Em relação à abertura da Fábrica de Café, a figura do Sr. Alfredo, avô do atual dirigente pertencente à família Albuquerque, desempenhou papel de fundamental importância. O primeiro

ponto ressaltado diz respeito a sua forte veia empreendedora, conforme descrita por seu neto, que, mesmo após a venda da fábrica, o fez prosseguir trabalhando com comércio de café:

(200) “Como eu te falei o meu avô é uma pessoa muito ativa, meu avô é uma pessoa assim, completamente inquieta, empreendedora, vê oportunidade... [...]. Meu avô tem 82 anos. Trabalha todo dia. Todo dia oito da manhã está no escritório. É impressionante, é uma pessoa muito ativa. E quando ele vendeu [a Fábrica de Café], que era uma coisa que 16, 17 anos da vida dele, ele tava lá todo dia. Era o primeiro a chegar lá e tomava café com todos os funcionários, sempre foi muito ativo... E quando

ele vendeu, meio que ele sentiu... Então ele voltou a ser comerciante de café, no ano

2000, meu avô estava com setenta e poucos anos de idade.” (E10).

Após a venda da torrefação, Sr. Alfredo abre, sozinho, um novo negócio de compra e venda de café cru. Porém, como o novo negócio não atingira o resultado esperado, decide, a pedido dos filhos, encerrar sua atividade. Embora sua nova empreitada no comércio de café não tenha sido bem sucedida, esta etapa permitiu que ele tivesse acesso à informação de que existia um maquinário para torrefação de café à venda. Valendo-se de sua experiência e da percepção da urgência quanto à venda do equipamento, Sr. Alfredo realizou uma oferta e viabilizou, a baixo custo, a aquisição de todo o maquinário, que seria utilizado na nova fábrica.

(201) “Ofereceram pro meu avô um maquinário de café. Esse maquinário era de uma antiga [fábrica de biscoitos], que montou uma torrefação, mas não era o negócio deles, então funcionaram seis meses, desligaram a fábrica e foram embora, não iam mais mexer com café. E nesse processo, a [fábrica de biscoitos] foi vendida pra uma multinacional. E a multinacional não sabia nada de café e ficou lá com o maquinário inativo. Pagava um aluguel caro dessa área aqui. Então ofereceram esse maquinário pro meu avô... Meu avô falou que não tinha interesse, que não queria comprar, mas nisso ele viu uma oportunidade, porque eles estavam desesperados pra vender, daí ele disse: ‘Olha, eu pago menos de um décimo!’. Foi o que ele ofereceu no maquinário. Falou que tinha uma cara, nem falou que era pra ele, que pagava um décimo do valor. E isso veio aqui pra multinacional, a multinacional pegou e aprovou.” (E10).

Após a compra do equipamento, ainda restava decidir quais seriam os membros da família a comandar o novo negócio. Com a venda da antiga fábrica ao grupo israelense, os filhos de Sr. Alfredo optaram por desempenhar o papel de investidores nos negócios da família, distanciando- se de atividades de gestão e operação. Neste ponto, é possível evidenciar a mudança do perfil dos membros da 2ª geração da família Albuquerque, caminhando de um perfil empreendedor para uma postura mais próxima a de investidores ou de acionistas.

(202) “No momento que se deu a venda da [antiga torrefação], houve uma opção, né? E meio que se separou assim, a família [...]. Então praticamente, tirando [apenas um tio], que hoje ele tem empresa, ele empreende, os outros irmãos todos viraram, vamos

dizer assim, investidores. Tem o negócio, onde eles são investidores mas não

executam nada, sempre tem uma pessoa que executa ou é uma gestão profissionalizada. [...]. Então é assim, tem negócio que é de todos os irmãos, tem negócio que é de dois irmãos, meio que cada um se separou...” (E10).

Diante da falta de interesse por parte dos filhos pela gestão do novo negócio, Sr. Alfredo recorreu ao neto. Também, foi procurado por membros da família Guimarães, que se interessaram pelo negócio. Neste ponto, é interessante observar que a relativa tranquilidade em aceitar outra família como sócia foi decorrente de um histórico bem sucedido de outros negócios já realizados em sociedade entre as duas famílias. Além disso, a família Guimarães representaria um parceiro de peso, uma vez que já era detentora de enorme reconhecimento no setor, figurando entre as maiores famílias produtoras de café no ranking brasileiro.

(203) “Hoje a família [Guimarães] é uma família modelo do setor, né? Uma das maiores produtoras e uma das maiores exportadoras de café no segmento de cafés finos. E estamos atualmente [entre os 15 primeiros] no ranking nacional de indústrias.” (E09). (204) “Aí foi nisso que ele me chamou, falou que tava com esse maquinário, chamou todos os filhos, mas meu tio estava [em outra empresa do grupo], os outros filhos não tiveram interesse e daí que ele me chamou. Nisso ele tentou vender o maquinário, porque não queria mexer com torrefação de café sozinho, foi aí que [a família

Guimarães] ficou sabendo disso e eles tinham vontade porque eles já tinham todo o processo de produção e exportação de café, né? [...]. Aí marcamos uma reunião

com [um membro da família Guimarães] pra conversar sobre o projeto. Só que a gente tinha o quê? Só a vontade e tinha um maquinário. Se eu te mostrar as fotos desse galpão aqui, era puro mato, né? Os maquinários não funcionavam, entre aspas, tinham quase seis, sete anos que não funcionavam.” (E10).

Após a etapa de negociações e de reuniões entre os sócios, a Fábrica de Café foi inaugurada e a empresa começou o mostrar os primeiros resultados. Contudo, mesmo considerando a afinidade existente entre as duas famílias, alguns conflitos e disputas começaram a ocorrer, sobretudo, nesta primeira fase do empreendimento. Os conflitos e tensões relatados pelos dirigentes da Fábrica de Café podem ser analisados sob dois focos principais: o conflito interfamiliar, entre os dirigentes das duas famílias empresárias; e o conflito intrafamiliar, entre pai e filho da família Guimarães. É válido apontar que a análise dos conflitos que já ocorriam no âmbito da família empresária, antes de iniciar sua participação na Fábrica de Café, é importante para evidenciar

como os aspectos familiares são internalizados pelos membros da família e são capazes de influenciar sua conduta, mesmo diante de um novo negócio.

Quanto ao conflito interfamiliar, ocorrido entre os sócio-dirigentes, é importante observar que cada um dos gestores pertence a uma família empresária diferente, sendo esta uma das razões apontadas para a disputa de poder. É possível inferir que, independente do histórico de amizade e empreendedorismo compartilhado pelas duas famílias, existem visões divergentes em relação aos negócios em comum. Assim, a internalização dessas diferenças pelos atuais gestores no âmbito familiar pode ter contribuído para que aflorassem no cotidiano da fábrica os conflitos iniciais. Conforme explicitado no trecho (205), os sócios, ao compartilharem os valores de suas respectivas famílias, já iniciaram o negócio com visões distintas, acarretando uma disputa pelo poder, em que estavam em jogo não apenas seus próprios interesses, mas também os interesses das duas famílias envolvidas.

Outro ponto que deve ser considerado seria a pouca idade e a inexperiência dos sócios, que, ao iniciarem a empresa, em 2004, tinham, em média, 20 anos de idade. Assim, a falta de experiência gerencial alimentou os embates relacionados ao dia a dia do negócio, gerando uma competição que, em suma, buscava a legitimação dos jovens dirigentes perante a família e os funcionários.

(205) “Então entre eu e [meu sócio] a principal questão é que a gente tinha no início

uma questão de disputa por poder [...]. [E a disputa ocorria] em relação a tudo, em

relação a todos. Era uma coisa de um falar:‘Eu quero isso assim!’. Então era uma questão de falta de maturidade mesmo, as próprias famílias já tinham isso aí, a gente

já carregou das famílias e depois que a gente foi ter maturidade pra sentar, conversar,

discutir, vamos dizer assim, pra melhorar. Então hoje a gente discute mas eu confio nele 100% em relação à gestão dele e ele confia 100% na minha gestão. Se ele acha algum ponto, a gente conversa. Hoje melhorou 500%, a gente discute as estratégias da empresa, essa sim a gente discute, essa sim a gente chega a um consenso, mas o consenso tá muito mais fácil” (E10).

(206) “Eu diria que não teve um consenso, na verdade, entre eu e [meu sócio]. A gente se desrespeitou ao longo da gestão. É claro que com limites, bate bocas normais de qualquer acionista. E ao longo do tempo também ele foi entendendo o que eu tinha de bom e o que é que ele tinha de bom.” (E09).

A busca pela sinergia entre os sócios foi descrita como um processo lento, em que ambos foram colocando, gradativamente, as diferenças de lado e estabelecendo uma relação de confiança e respeito. É possível inferir que a ausência de diferenças hierárquicas entre os sócios contribuiu

para a lentidão do processo de conciliação entre eles. Além disso, não existem mecanismos de governança capazes de arbitrar as contendas entre os dirigentes ou, mesmo, a presença de um sócio majoritário que concentrasse o poder decisório. Assim, a construção do consenso entre os dirigentes teve, obrigatoriamente, que passar por um processo moroso, marcado pela negociação e redistribuição do poder decisório na organização.

Em relação à ausência de diferenças hierárquicas entre os gestores, o dirigente pertencente à família Albuquerque faz um paralelo com a antiga torrefação da família, em que o avô era considerado o patriarca do negócio, gozando de autoridade suficiente para dirimir os eventuais conflitos entre os filhos gestores.

(207) “[Disputa de poder] é uma coisa comum em empresa familiar e [na fábrica do meu avô] tinha menos, porque tinha a presença do meu avô no processo decisório, como majoritário vamos dizer assim. Até como majoritário, como patriarca do

negócio, se tinha algum problema ele resolvia. E aqui a gente sempre esteve no

mesmo nível e se fosse levar pro conselho resolver, o conselho é 50-50% também.” (E10).

Já o conflito intrafamiliar, existente entre o dirigente da família Guimarães e seu pai, membro do Conselho de Acionistas da Fábrica de Café, possui uma natureza diferente do conflito vivenciado entre os sócios. Neste caso, verifica-se a dificuldade de separar os papéis profissionais dos papéis familiares, gerando situações em que os papéis de pai e filho se confundem com os de acionista e gestor. Além disso, a interferência do pai e acionista da empresa em relação à gestão realizada pelo filho é apontada como uma ameaça à sua autoridade diante dos funcionários da Fábrica de Café.

(208) “É, o conflito no começo foi muito forte, né? Geramos altos conflitos, não foi fácil administrar. É igual briga de pai e filho, não adianta, mas ao longo do tempo cada um aprendeu a respeitar o que cada um tem de bom. Então hoje eu tenho uma credibilidade com meu pai que ele sabe que o que eu falo ele pode me ouvir, às vezes ele tem alguma dúvida, ele até questiona, mas ele não bate de frente. Ele sabe que ali tem algum fundamento, existe alguma experiência por trás daquilo ali que eu já tô falando. Então ele já me escuta, às vezes ele até toma a decisão baseada no que eu falo.” (E09).

(209) “Meu pai me liga a noite pra falar de assuntos pessoais e me cobra. Mas é uma cobrança muito informal, precisa ser uma coisa formal. E a mesma coisa do lado da família do meu sócio. Então a gente precisa evoluir nessa cobrança formalizada.” (E09).

(210) “É, tinha muita presença no dia a dia. Às vezes até interferindo um pouco na tomada de decisão em torno da gestão. Eu perdendo um pouco meu poder de

gerência para um outro acionista, gerando alguns conflitos mas, ao mesmo tempo, isso

foi minimizado ao longo do tempo porque todo mundo viu que a gente tinha

credibilidade pra assumir tal experiência e tal desafio que foi dado.” (E09).

Neste ponto, é importante retomar a questão da legitimação dos dirigentes diante das famílias empresárias envolvidas no negócio e dos demais funcionários, fornecedores e clientes que fazem parte do universo da organização. Dessa forma, os próprios conflitos evidenciados estão nitidamente entrelaçados ao processo de construção da legitimidade dos gestores familiares. Nos dois aspectos analisados, existia uma competição, ainda que implícita, pelo reconhecimento da capacidade e da autoridade dos dirigentes perante todos os stakeholders relacionados à empresa.