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5   ESTRATÉGIAS DE FORMAÇÃO DAS LIDERANÇAS ESTUDANTIS DA

5.3   EDUCAÇÃO INFORMAL: FORMAÇÃO POLÍTICO-CIDADÃ 105

5.3.7   O projeto educacional 118

De acordo com dados do IBGE, em 1960, a realidade populacional e educacional de Patos de Minas era a apresentada nas Tabelas 21 e 22:

Tabela 21 ANO

1960

POPULAÇÃO178

Total Urbana / % do total Rural

Patos de Minas 97.286 37.203 / 38,2% 60.083

Tabela 22 ANO 1960

POPULAÇÃO (com 5 anos e mais)

Total Sabem ler e escrever Não sabem ler e São estudantes

178 Vale ressaltar que, a partir de 1960, o IBGE passou a considerar a população dos distritos como sendo urbana, mas, na verdade, a maioria deles localizam-se distantes do distrito sede, portanto, alheios às benesses da cidade.

(Alfabetizadas)

/ % do total escrever / % do total

Patos de Minas 79.373 42.907 / 54,1% 36.466 14.641 / 18,4%

Conforme vimos no segundo capítulo, proporcionalmente, nesse tempo, os números da educação em Patos de Minas (tanto em relação ao número de alfabetizados como também de estudantes) eram superiores aos de Minas Gerais e do Brasil. Apesar da UEP ter sido fundada em 1958, aquela realidade não destoa muito desta, de 1960. Mas é necessário ressaltar que, nesse intervalo de dois anos, foram criadas mais quatro escolas, listadas no segundo capítulo179.

Esta era a realidade que motivou os líderes estudantis da UEP a preverem no Estatuto, em 1958, ações voltadas para a ampliação e melhoria da educação no município. O título VI do Estatuto da entidade, intitulado “Das Atividades Culturais”, traz em seu artigo 40º a seguinte responsabilidade para os líderes da UEP: “Pleiteará junto aos Poderes competentes a instalação de novas escolas, como também a criação de cursos superiores”180.

A primeira experiência concreta de luta em favor da educação veio logo em seguida, no ano de 1959, quando a UEP e a JEC mobilizaram o segmento estudantil numa campanha realizada em favor da criação de uma escola que oferecesse o curso científico, uma vez que ainda não havia essa modalidade de ensino na cidade. Em entrevista concedida ao Jornal

Patos Urgente, em 1967, Pe. Almir Neves de Medeiros relata que,

Em reuniões da Juventude Estudantil Católica, chegamos à conclusão da necessidade de uma campanha pela instalação de um Colégio na cidade. O curso científico era uma necessidade. Você deve se lembrar da grande campanha que foi aqui realizada em prol da criação e da instalação do Colégio Municipal. Foi uma campanha memorável. Cartazes, passeatas, concentrações e etc... este “etc” diz muito mais... (COURY, 2008, p. 37).

Segundo relato de Dercílio Ribeiro Amorim, graças ao movimento realizado com o apoio do religioso, o então prefeito, Sebastião Alves do Nascimento, em resposta ao apelo dos estudantes e das demais lideranças da cidade que trabalhavam em prol desta causa, criou o Colégio Municipal em 1959, sendo instalado efetivamente no ano seguinte (AMORIM, 2009). No entanto, as campanhas em prol da educação intensificam-se sobretudo a partir de 1965. Nesse ano, as lideranças da UEP começaram um movimento pela democratização do

179 Colégio Municipal, Escola Estadual Monsenhor Fleury, Ginásio Nossa Senhora de Fátima e Escola Estadual Professora Zoraida Mendonça Pinheiro.

ensino público, pleiteando a criação de novos colégios e a ampliação dos já existentes, com o objetivo de aumentar a oferta de vagas.

Pelo que tudo indica muito em breve Patos de Minas não mais terá o sério problema de vagas nos colégios para comportar todo o número de candidatos que aparecem. A ampliação do colégio estadual já é um grande acontecimento. Agora, graças ao esfôrço e dinamismo de Da. Filomena de Macedo Melo, também o Colégio Normal Oficial será ampliado e deverá comportar o dobro do atual número de alunos. [sic]. (OBSERVATÓRIO..., 1965, p. 4)181

Nessa mesma reportagem, era anunciada também a criação de um novo colégio, que ampliaria o atendimento à demanda existente no município: “Já se encontra em funcionamento o Curso de Admissão para o Colégio Experimental do Alto Paranaíba. [...] Em 1966 o Colégio funcionará apenas com a 1ª e a 2ª séries do curso ginasial, em horário noturno, dentro da moderna técnica escolar”. (OBSERVATÓRIO..., 1965, p. 4)182. Portanto, a UEP teve um papel fundamental na campanha pela criação de um novo colégio na cidade. Nas palavras de Marcos Martins de Oliveira, presidente da entidade na época:

Em boa hora a União dos Estudantes Patenses, lançou a campanha em prol de um Colégio Gratuito Noturno. Se fizéssemos uma análise no que diz respeito ao ensino em nossa Urbe, veríamos nitidamente a necessidade dêste educandário. [...] A necessidade do colégio é uma exigência do presente. [...] Precisamos mais ainda, precisamos partir firmes para a conscientização dos povos. Não obstante ser a longo prazo esta obrigação, contudo exige agora, aquilo que sempre foi necessário, escolas e mais escolas. Urge libertamos o homem daquilo que o escraviza. O homem nada é sem liberdade. Diz Jacques Maritain que “a liberdade é a essência da vida”. Como poderemos falar em liberdade, em democracia, sem primeiro falarmos em escolas. [...] Creio que seja somente com escola é que poderemos ajudar a classe oprimida pela ambição desenfreada de poucos que têm muito, e ajudar os muitos que nada tem, a possuir aquilo que lhes pertence por direito.

Temos que lutar contra a miséria que nos cerca e cresce e se multiplica. Essa miséria submissa e sem trégua que oprime os povos subdesenvolvidos. Combater as classes de privilegiados que pregam inverdades em nome da verdade. Somente guiados pelas normas da justiça e da equidade é que poderemos vencer essa minoria que se avilta, enriquecendo-se cada vez mais, e isto nós aprenderemos na escola. [...] Vamos lutar, vamos difundir nossa constituição que garante as escolas gratuitas. Cremos que êste movimento encetado pela UEP, entidade que congrega os interêsses da classe estudantil, surge do apôio dos que lutam e trabalham para o progresso intelectual de nossa Comuna. [...] queremos também que em futuro bem próximo, quando falar em Patos de Minas, não se lembre primeiro da “terra do milho” mas da terra de gente estudiosa e educada. [sic]. (OLIVEIRA, 1965, p. 4)183

Marcos Martins de Oliveira atribuiu um papel muito importante à educação: “despertar a consciência crítica das pessoas para libertá-las da prisão que as escravizam” (OLIVEIRA, 2009). A prisão a que se refere era a ausência do conhecimento formal, muito

181 OBSERVATÓRIO Estudantil. Folha Diocesana, 24 out. 1965, nº 341, p. 4. 182 Ibidem, loc. cit.

acentuada em países subdesenvolvidos como o Brasil, na época. Oliveira via a escola como uma alternativa para se alcançar a democracia econômica, ao menos em parte, ou seja, para ele a escola era um instrumento de equalização social. Em função disso, justificando-se num direito constitucional, conclamou seus pares à luta por mais educandários no município, com o intuito de sanar as mazelas produzidas pela falta de conhecimento.

A luta empreendida pelas lideranças estudantis da UEP para criação de novas escolas e ampliação do número de vagas não se limitou apenas ao âmbito da educação básica. Naquele tempo já eram perceptíveis os problemas provenientes da ausência do ensino superior na cidade, pois ao terminar o ensino secundário, muitos jovens deixavam Patos de Minas em direção aos grandes centros, sobretudo Belo Horizonte, Rio de Janeiro e Brasília, para dar continuidade aos estudos.

[...] Os estudantes deixam a cidade em busca de Universidade. [...] E com isso a pomposa frase vai tendo o seu sentido mais real; “O progresso de uma cidade está em sua mocidade”. Pois bem, êles vão, e talvez não voltem. [...] Qual a solução? Que as autoridades se unam e consigam uma faculdade para Patos. Somente assim poderemos progredir. [...] Não adianta falar em progresso, em prosperidade, sem antes falar em Escolas. Aqui fica o nosso apêlo. [sic]. (LAMENNAIS..., 1966, p. 6)184

Especialmente a partir desse momento, começou a haver uma cobrança bastante incisiva dos líderes estudantis para que as autoridades políticas interviessem em favor da implantação do ensino superior em Patos de Minas, pois, aos olhos daquela geração, o progresso do município dependia da implantação de uma faculdade.

Patos precisa de uma escola superior. Veja o patense que estamos ficando para trás. Há pouco, a vizinha cidade de Dores do Indaiá criava sua faculdade de Filosofia, Ciências e Letras. Se outros conseguem, porque cruzamos os braços? [sic]. (OBSERVATÓRIO..., 1966, p. 4)185

Além de reivindicar a criação de mais escolas e o aumento de vagas, os líderes estudantis patenses reivindicavam também qualidade no ensino. Eles questionavam a política educacional do governador de Minas Gerais, Magalhães Pinto, alegando que escolas não podiam ser criadas sem que houvesse uma preocupação com a qualidade dos profissionais que fossem trabalhar nelas.

Criar novas escolas? Sim. Não seria o bastante, contudo. Dotar o Estado de vasta rêde escolar? Exato. Mas, antes de tudo, aperfeiçoar métodos e hábitos escolares.

184 LAMENNAIS. Estudantes deixam Patos de Minas. Folha Diocesana, 16 jan. 1966, nº 349, p. 6 185 OBSERVATÓRIO Estudantil. Folha Diocesana, 06 abr. 1966, nº 358, p. 4.

Um corpo docente seriamente selecionado. Professores e não mercenários. Mestres e não aventureiros. Capacidade. Habilitação – Vocação [sic]. (SPERA..., 1966, p. 4)186

Ademais, Marcos Martins de Oliveira reconhece que a educação superior em Patos de Minas essa era uma aspiração não só do segmento estudantil, mas de toda a comunidade patense, de modo que as lideranças políticas locais dividiam os méritos das lutas e das vitórias com os militantes da UEP.

[...] Esse sonho de crescimento na educação, acredito que estava presente na cidade, independente de ser só de movimento estudantil. Estavam agregados as aspirações de todo segmento da sociedade daquela época. Pra estudar todo mundo saía, né?! As lideranças, os jovens... então havia esse sonho, e depois, mas tarde, chegou a faculdade. Mas não é um mérito excepcional só da UEP! Foi uma participação muito coletiva! [sic] (OLIVEIRA, 2009)

Com este mesmo objetivo, foi realizada, em 1967, uma enorme passeata estudantil, que acarretou na prisão do então presidente da UEP, Jurandi Gomes Ferreira, por agentes do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS), sob a acusação de estar organizando um movimento subversivo.

O trabalho em prol da implantação do ensino superior em Patos de Minas continuou na gestão seguinte da entidade, com o presidente Paulo Amâncio de Araújo. Além do enriquecimento cultural que o ensino superior traria para toda a região, um dos principais argumentos a favor da fundação de uma faculdade no município de Patos de Minas foi a contenção do êxodo estudantil em direção aos grandes centros, o que dificultava ou mesmo impedia o progresso da cidade, segundo os líderes estudantis.

Após muitas reuniões, parecia certa a implantação da faculdade para o ano de 1969. Foi com muito entusiasmo que a imprensa patense narrou os preparativos para o funcionamento da mesma.

Faculdade é sempre assunto atuante em Patos. Alunos se preparam para os vestibulares. Comissão colhe dados da cidade. Professôres tratam do seu currículum- vitae. Toda a cidade quer ter Faculdade. Aguarda-se entretanto a aprovação dos estatutos para a nomeação dos seus membros dirigentes. O mês de setembro já se foi. Que o outubro seja mais promissor e que todo o papel burocrático já esteja em andamento, para que em breve tudo seja resolvido. Patos precisa de Faculdade, e a Faculdade depende de você, Patense. [sic]. (FACULDADE..., 1968, p. 6)187

Frustradas as pretensões para o início do funcionamento em 1969, a comunidade patense teve que aguardar mais um ano, porém não passivamente. Como ocorrera em 1967, os

186 SPERA. Mais Escolas... Melhores Escolas... Folha Diocesana, 13 fev. 1966, nº 352, p. 4. 187 FACULDADE de Filosofia. Folha Diocesana, 3 out. 1968, nº. 476, p. 6.

estudantes voltaram novamente às ruas numa passeata organizada pela UEP, na qual reivindicavam a imediata implantação da faculdade no município.

A passeata estudantil de 1969 representou a culminância de um trabalho que vinha sendo realizado pela UEP desde o início da década de 1960. Nesse sentido, Carlos Roberto Ribeiro observa que a instalação da faculdade não foi resultado apenas da ação do movimento estudantil, mas de diversos segmentos da sociedade patense, sobretudo de suas principais lideranças políticas. Todavia, se a passeata não foi determinante para o imediato funcionamento da faculdade, ao menos contribuiu para agilizar o processo, uma vez que as aulas tiveram início no ano seguinte, em 1970 (RIBEIRO, 2009).

Apesar de constituir a maior preocupação daquele tempo, as reivindicações em favor da instalação de uma faculdade em Patos de Minas não absorveram todas as atenções das lideranças estudantis, que continuaram trabalhando, concomitantemente, para a ampliação da rede de educação básica do município. A diretoria de Paulo Amâncio de Araújo deu continuidade ao projeto, reivindicando a instalação de mais um colégio na cidade, um ginásio gratuito.

Essa idéia surgiu, levando-se em consideração o grave problema da falta de vaga em nossos estabelecimentos de ensino e, então, baseados nisto, as duas entidades entraram em contato com a CAMPANHA NACIONAL DE EDUCANDÁRIOS GRATUÍTOS (CNEG) pleiteando junto a esta, a instalação de um ginásio gratuito no próximo ano. Para felicidade dos nossos estudantes, o pedido obteve receptividade espetacular por parte do CNEG e, com um pouco de esfôrço estaremos a partir de março de 1970, contanto mais um ginásio em Patos de Minas. [sic]. (U.E.P..., 1969, p. 3)188

Como se pode observar, a referida campanha contou com o apoio da Associação dos Patenses em Belo Horizonte (Aspa), composta por estudantes universitários de Patos de Minas que haviam deixado a cidade em busca do ensino superior na capital. Apesar da distância, esses estudantes não romperam os laços com a cidade e a parceria estabelecida com a UEP, além de firmar uma relação amistosa entre as lideranças estudantis de ambas as entidades, serviria a projetos políticos futuros de ambas as partes189. Infelizmente o projeto do ginásio gratuito malogrou.

Em 1971, especialmente durante a 11ª Semana dos Estudantes, a UEP voltou a manifestar-se em prol da educação patense, porém, a militância resumiu-se à tentativa de trazer a Patos de Minas o ministro da educação na época, Jarbas Passarinho. O objetivo das

188 U.E.P. e Aspa: Ginásio gratuito em 70. Folha Diocesana, 7 ago. 1969, nº 517, p. 3.

189 Para exemplificar, nas eleições municipais de 1972, Waldemar da Rocha Filho, ex-presidente da Aspa, candidatou-se a prefeito pela Arena, e o jovem Paulo Amâncio de Araújo, ex-presidente da UEP, candidatou-se a vice-prefeito pela MDB.

lideranças estudantis era reclamar melhorias para as escolas públicas de ensino básico da cidade, bem como reivindicar uma faculdade federal que oferecesse também os cursos tradicionais, como Medicina, Direito e Engenharia.