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1.3. Qual a Álgebra a ser ensinada?

1.3.2. O que propõem os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN)

Os PCN para a escola básica são referenciais importantes para a discussão dos saberes de matemática, tanto para a escola básica como para a formação dos professores. No Brasil, na escola básica, pode-se constatar que os programas curriculares de matemática para os anos

iniciais da escolaridade sempre enfatizaram o estudo de números e operações, ou seja, da Aritmética6.

Nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) de Matemática para o Ensino Fundamental (1998), Números é um dos quatro blocos de conteúdos. No estudo desse bloco, os PCN propõem que o aluno perceba os diferentes tipos de números, como instrumento para resolver problemas, mas também como objeto de estudo, considerando nesta dimensão, suas propriedades, suas inter-relações e o modo como foram historicamente construídos (PCN, Matemática, v.3, p.54). Nesse bloco estão incluídos: os números naturais e o sistema de numeração decimal; as operações com números naturais, envolvendo o cálculo mental, o exato e o aproximado; números racionais, irracionais e reais; utilização de representações algébricas para expressar generalizações sobre propriedades das operações aritméticas e as regularidades, estabelecer relação entre grandezas, modelizar, resolver problemas aritméticos; equações de primeiro e segundo graus e inequações (diferenciando parâmetros, variáveis, incógnitas).

Como se pode observar, o bloco Números inclui a álgebra a ser estudada no Ensino Fundamental, provavelmente com a intenção de não fragmentação ou de descontinuidade entre a aritmética e a álgebra, embora essa discussão não esteja explícita. Fala-se em “pré-álgebra” nos ciclos iniciais, em que as noções algébricas devem ser trabalhadas de modo informal, em um trabalho articulado com a aritmética.

Tópicos mais específicos ligados à Teoria Elementar dos Números são sugeridos na seção: Conteúdos Propostos para o Ensino de Matemática no Terceiro Ciclo7:

Conceitos como os de “múltiplo” e “divisor” de um número natural ou o conceito de “número primo” podem ser abordados neste ciclo como uma ampliação do campo multiplicativo, que já vinha sendo construído nos ciclos anteriores, e não como assunto novo, desvinculado dos demais. Além disso, é importante que tal trabalho não se resuma à apresentação de diferentes técnicas ou de dispositivos práticos que permitem ao aluno encontrar, mecanicamente, o mínimo múltiplo comum e máximo divisor comum sem compreender as situações-problema que esses conceitos permitem resolver. (PCN – Matemática – 5a e 8a séries, p.66).

No entanto, ao se referirem aos números naturais não se percebe que sejam destacados elementos que os caracterizam, como a idéia de sucessor, a multiplicação como soma iterada, a questão da divisibilidade e a extensão destas idéias para o conjunto dos números inteiros. Mais, ainda: não são apontadas explicitamente as possibilidades que o estudo desses temas

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Ver, VALENTE, W.R. (Org.). O nascimento da matemática no ginásio. São Paulo: Annablume; Fapesp, 2004.

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pode ter na compreensão das propriedades dos números inteiros, em especial no desenvolvimento de habilidades de raciocínio matemático, com relação à prova e à demonstração, e não apenas para resolver problemas.

Os PCN sugerem que a argumentação deva ser estimulada no terceiro ciclo, avançando para a prova no quarto ciclo:

Assim é desejável que no terceiro ciclo se trabalhe para desenvolver a argumentação, de modo que os alunos não se satisfaçam apenas com a produção de respostas e afirmações, mas assumam a atitude de sempre tentar justificá-las. Tendo por base esse trabalho, pode-se avançar no quarto ciclo para que o aluno reconheça a importância das demonstrações em Matemática, compreendendo provas de alguns teoremas. (Ibid, p. 71)

Embora seja feita uma discussão rápida sobre as diferenças entre o argumentar e o demonstrar (Ibid, p. 70), essas questões são polêmicas e o próprio professor não tem uma visão clara do que seja demonstrar. Dos significados atribuídos, por ele, à demonstração, pode estar ausente, inclusive, o processo mental de raciocínio dedutivo, conforme observaram Pais e Freitas (1999), em pesquisa8 realizada com professores de Matemática do Ensino Fundamental, da rede pública do estado de Mato Grosso do Sul. Essas questões merecem ser discutidas no processo de formação, de forma ampla, inclusive dentro das disciplinas específicas.

Outro aspecto a destacar é que muitos acreditam que o estudo da Aritmética se encerra nos anos iniciais do Ensino Fundamental, como já destacamos anteriormente, no entanto, ao serem apresentados os conteúdos para o ensino de Matemática no quarto ciclo, a seguinte observação é colocada nos PCN:

É importante salientar que no quarto ciclo não se pode configurar o abandono da Aritmética como muitas vezes ocorre. Os problemas aritméticos praticamente não são postos como desafios aos alunos deste ciclo... (Ibid., p.83).

Na seção referente às orientações didáticas para o terceiro e quarto ciclos, ao abordar os números inteiros, são apontados alguns aspectos do tratamento dado ao estudo dos naturais, nos ciclos finais do ensino fundamental, que comprometem sua aprendizagem, dentre os quais:

• desestímulo ao uso dos procedimentos aritméticos, considerados como “raciocínios inferiores” quando comparados aos procedimentos algébricos;

• trabalho centrado nos algoritmos, como o cálculo do mmc e do mdc sem a compreensão dos conceitos e das relações envolvidos e da identificação de regularidades que possibilitem ampliar a compreensão acerca dos números. (Ibid., p. 97)

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PAIS, L. C.; FREITAS, L.M. Um estudo dos processos de provas no ensino e na aprendizagem da geometria no ensino fundamental. Bolema, n.13,1999, p.62-70.

As considerações anteriores apontam para a pouca ênfase dada ao estudo dos naturais após a 5a série e, também, para a necessidade de que se desenvolva um trabalho sistemático do estudo desse tema, em diferentes momentos, para que a sua aprendizagem possa ser ampliada. Quanto ao estudo dos números inteiros, os PCN alertam para que as atividades propostas não se limitem às que se apóiam apenas em situações concretas, mas que sejam incluídas atividades que possibilitem a extensão dos conhecimentos já construídos para os naturais, permitindo a compreensão e a justificação das propriedades dos números inteiros.

Deste modo, podemos perceber que há uma demanda forte de que os professores, na sua prática docente, trabalhem com os números, o que certamente exige uma atenção especial nos currículos da licenciatura em matemática. Esse trabalho envolve conceitos e procedimentos que pressupõem conhecimentos de Teoria dos Números.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio, com relação ao estudo de números, sugerem que haja espaço para o aprofundamento desses conhecimentos, integrados a outros conceitos, numa perspectiva sócio-histórica e de resolução de problemas. (PCN – Ensino Médio - v.3, p.89). Um dos três temas ou eixos estruturadores propostos é Álgebra:

números e funções, em que se deixa claro que a ênfase no estudo dos números recai sobre os

reais:

No ensino médio, esse tema trata de números e variáveis em conjuntos infinitos e quase sempre contínuos, no sentido de serem completos. Os objetos de estudo são os campos numéricos dos números reais e, eventualmente, os números complexos e as funções e equações de variáveis ou incógnitas reais. (PCN + , 2002, p. 120)

Sobre essa proposta, é necessário ponderar que muitos problemas são modelados no conjunto dos inteiros e não no conjunto dos números reais. É o caso do estudo das seqüências, que é sugerido como um tema a ser abordado conectado à idéia de função. Esse assunto pode ser, inclusive, uma oportunidade para se trabalhar com a idéia de recorrência, caracterizadora do conjunto dos números inteiros positivos. Nesse nível de ensino, nenhum tópico está explicitamente ligado à Teoria Elementar dos Números, cuja presença poderia oportunizar o desenvolvimento de competências como a de investigação e compreensão, que é uma das três grandes competências proposta para a área de Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias.

Assim, os PCN de matemática apresentam diretrizes para a escola básica que incorporam discussões e pesquisas no campo da Educação Matemática, entretanto estão subjacentes idéias que ainda demandam pesquisas como a discussão dos aspectos caracterizadores do conjunto dos inteiros e o seu ensino e aprendizagem; as relações álgebra e

aritmética; as visões de álgebra, enfim qual a álgebra a ser ensinada. Essas questões, dentre outras, como a formação de conceitos, a evolução histórica e epistemológica destes conceitos, as práticas escolares envolvidas no ensino desses temas, certamente têm implicações na formação do professor e justificam pesquisas relacionadas à educação algébrica, tanto na escola básica como na formação de professores.